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Document 62016TJ0639

Acórdão do Tribunal Geral (Secção dos recursos) de 23 de janeiro de 2018.
FV contra Conselho da União Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal da Função Pública — Função pública — Funcionários — Classificação — Relatório de avaliação de carreira — Exercício de avaliação de 2013 — Negação de provimento ao recurso em primeira instância — Composição da formação de julgamento que proferiu o acórdão em primeira instância — Processo de nomeação de um juiz do Tribunal da Função Pública — Tribunal estabelecido por lei — Princípio do juiz legal.
Processo T-639/16 P.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2018:22

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Secção dos recursos das decisões do Tribunal da Função Pública)

23 de janeiro de 2018 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal da Função Pública — Função pública — Funcionários — Classificação — Relatório de avaliação de carreira — Exercício de avaliação de 2013 — Negação de provimento ao recurso em primeira instância — Composição da formação de julgamento que proferiu o acórdão em primeira instância — Processo de nomeação de um juiz do Tribunal da Função Pública — Tribunal estabelecido por lei — Princípio do juiz legal»

No processo T‑639/16 P,

que tem por objeto um recurso do acórdão do Tribunal da Função Pública da União Europeia (Segunda Secção) de 28 de junho de 2016, FV/Conselho (F‑40/15, EU:F:2016:137), em que é pedida a anulação desse acórdão,

FV, antiga funcionária do Conselho da União Europeia, representada por L. Levi, advogado,

recorrente,

contra

Conselho da União Europeia, representado por J.‑B. Laignelot e M. Bauer, na qualidade de agentes,

recorrido em primeira instância,

O TRIBUNAL GERAL (Secção dos recursos das decisões do Tribunal da Função Pública),

composto por: M. Jaeger, presidente, M. Prek, D. Gratsias, S. Papasavvas e A. Dittrich (relator), juízes,

secretário: E. Coulon,

profere o presente

Acórdão

1

Com o seu recurso interposto nos termos do artigo 9.o do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, a recorrente, FV, pede a anulação do acórdão do Tribunal da Função Pública da União Europeia (Segunda Secção) de 28 de junho de 2016, FV/Conselho (F‑40/15; a seguir «acórdão recorrido»; EU:F:2016:137), em que foi negado provimento ao seu recurso de anulação do seu relatório de avaliação referente ao período compreendido entre 1 de janeiro e 31 de dezembro de 2013.

Factos na origem do litígio

2

Em 14 de abril de 2014, a recorrente, FV, então funcionária do Conselho da União Europeia, recebeu um projeto de relatório de avaliação relativo ao ano de 2013, elaborado por um primeiro notador. Em 19 de abril de 2014, apresentou observações a este respeito, tendo contestado formalmente o conteúdo do referido projeto de relatório e solicitado a respetiva revisão. Em 20 de maio de 2014, o primeiro notador respondeu às observações da recorrente e confirmou a sua primeira apreciação. A recorrente pediu a revisão do projeto de relatório de avaliação. Depois de ter tido um encontro com um segundo notador em 10 de junho de 2014, este último comunicou‑lhe, em 26 de junho seguinte, a sua decisão que confirmava a apreciação do primeiro notador. Na sequência do parecer do Comité de Classificação, solicitado pela recorrente, o segundo notador alterou o projeto de relatório de avaliação, tendo a recorrente dele tomado conhecimento em 27 de novembro de 2014 (a seguir «relatório de avaliação controvertido»).

Tramitação do processo em primeira instância, composição da formação de julgamento e acórdão recorrido

3

Pela Decisão 2009/474/CE, Euratom do Conselho, de 9 de junho de 2009, que nomeia um juiz do Tribunal da Função Pública da União Europeia (JO 2009, L 156, p. 56), M. I. Rofes i Pujol foi nomeada juíza do Tribunal da Função Pública por um período de seis anos compreendido entre 1 de setembro de 2009 e 31 de agosto de 2015.

4

Em 3 de dezembro de 2013, para efeitos de nomeação de dois juízes para o Tribunal da Função Pública por um período de seis anos compreendido entre 1 de outubro de 2014 e 30 de setembro de 2020, foi publicado um convite público à apresentação de candidaturas no Jornal Oficial da União Europeia (JO 2013, C 353, p. 11). Esse convite foi lançado na perspetiva da chegada a termo, em 30 de setembro de 2014, dos mandatos de dois juízes do Tribunal da Função Pública, a saber, os juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel. Posteriormente, o comité referido no artigo 3.o, n.o 3, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, na versão aplicável ao presente litígio (a seguir «Comité de Seleção»), estabeleceu uma lista de seis candidatos (a seguir «lista de candidatos em causa»).

5

Dado que o Conselho não procedeu à nomeação de juízes para os lugares ocupados pelos juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel, estes últimos permaneceram no cargo além do termo do seu mandato, ou seja, 30 de setembro de 2014, em aplicação do artigo 5.o, terceiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, segundo o qual o juiz permanece no cargo até que o seu sucessor assuma funções. Esta disposição era aplicável aos juízes do Tribunal da Função Pública por força do artigo 5.o, primeiro parágrafo, do anexo I do referido Estatuto, na versão aplicável ao presente litígio.

6

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal da Função Pública em 9 de março de 2015, a recorrente interpôs um recurso de anulação do relatório de avaliação controvertido, registado sob a referência F‑40/15.

7

O processo F‑40/15 foi atribuído à Segunda Secção do Tribunal da Função Pública, composto pelo juiz H. Kreppel, pela juíza M. I. Rofes i Pujol e pelo juiz K. Bradley.

8

Nenhum convite público à apresentação de candidaturas foi publicado tendo em conta a chegada a termo do mandato de juíza M. I. Rofes i Pujol, em 31 de agosto de 2015, pelo que permaneceu no cargo além dessa data, em aplicação das disposições referidas no n.o 5, supra.

9

Uma primeira audiência para alegações teve lugar em 8 de outubro de 2015. Nessa data, a Segunda Secção do Tribunal da Função Pública era composta pelo juiz H. Kreppel, pela juíza M. I. Rofes i Pujol e pelo juiz J. Svenningsen.

10

Por decisão do Conselho de 8 de dezembro de 2015, a recorrente foi colocada em situação de licença no interesse do serviço nos termos do artigo 42.o‑C do Estatuto dos Funcionários da União Europeia. Após o indeferimento da sua reclamação contra essa decisão, a recorrente interpôs recurso de anulação da referida decisão, que é objeto do processo T‑750/16, FV/Conselho (JO 2017, C 6, p. 42), o qual continua pendente.

11

Em 22 de março de 2016, o Conselho adotou a Decisão (UE, Euratom) 2016/454 do Conselho, que nomeia três juízes para o Tribunal da Função Pública da União Europeia (JO 2016, L 79, p. 30), a saber, S. Van Raepenbusch, com efeitos a partir de 1 de outubro de 2014, J. Sant’Anna e A. Kornezov, com efeitos a partir de 1 de abril de 2016. Os considerandos 1 a 6 dessa decisão têm a seguinte redação:

«(1)

Os mandatos de dois juízes do Tribunal da Função Pública da União Europeia […] terminaram com efeitos desde 30 de setembro de 2014, e o mandato de um outro juiz terminou com efeitos desde 31 de agosto de 2015. Por conseguinte, nos termos do artigo 2.o e do artigo 3.o, n.o 1, do anexo I ao […] Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia […], é necessário nomear três juízes para preencher essas vagas

(2)

Na sequência de um convite público à apresentação de candidaturas publicado em 2013 […], tendo em vista a nomeação de dois juízes para o Tribunal da Função Pública, o comité criado pelo artigo 3.o, n.o 3, do anexo I do [Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia] emitiu um parecer sobre a adequação dos candidatos ao exercício das funções de juiz do Tribunal da Função Pública. O Comité de Seleção fez acompanhar esse parecer de uma lista de seis candidatos que possuem a experiência de alto nível mais apropriada.

(3)

Na sequência do acordo político sobre a reforma da arquitetura judiciária da União Europeia que conduziu à adoção do Regulamento (UE, Euratom) 2015/2422 do Parlamento Europeu e do Conselho […], o Tribunal de Justiça [da União Europeia] apresentou, em 17 de novembro de 2015, uma proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à transferência para o Tribunal Geral […] da competência para decidir, em primeira instância, dos litígios entre a União e os seus agentes, com efeitos a partir de 1 de setembro de 2016.

(4)

Nestas circunstâncias, por razões de calendário, é adequado não publicar um novo convite público à apresentação de candidaturas, mas antes recorrer à lista de seis candidatos que possuem a experiência de alto nível mais apropriada estabelecida pelo Comité de Seleção na sequência do convite público à apresentação de candidaturas publicado em 2013.

(5)

Por conseguinte, é conveniente nomear três das pessoas cujos nomes constam da lista acima referida como juízes do Tribunal da Função Pública, velando por que a composição do Tribunal da Função Pública seja equilibrada e assente na mais ampla base geográfica possível de cidadãos dos Estados‑Membros e dos sistemas jurídicos representados. As três pessoas cujos nomes constam da referida lista que possuem a experiência de alto nível mais apropriada são Sean VAN RAEPENBUSCH, João SANT’ANNA e Alexander KORNEZOV. João SANT’ANNA e Alexander KORNEZOV deverão ser nomeados com efeitos a partir da data de entrada em vigor da presente decisão. Uma vez que Sean VAN RAEPENBUSCH já foi juiz no Tribunal da Função Pública até 30 de setembro de 2014, tendo continuado a exercer funções enquanto se aguardava a decisão do Conselho nos termos do artigo 5.o do [Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia], é adequado nomeá‑lo para um novo mandato com efeitos desde o dia seguinte ao do termo do seu mandato anterior.

(6)

Decorre do artigo 2.o do anexo I ao [Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia] que, em caso de vaga, se procederá à nomeação de um novo juiz por um período de seis anos. Contudo, aquando da aplicação do regulamento proposto sobre a transferência para o Tribunal Geral da União Europeia da competência para decidir, em primeira instância, dos litígios entre a União e os seus agentes, o Tribunal da Função Pública deixará de existir, e o mandato dos três juízes nomeados pela presente decisão terminará, ipso facto, no dia anterior ao da aplicação do referido regulamento.»

12

J. Sant’Anna e A. Kornezov prestaram juramento em 13 de abril de 2016.

13

Por decisão de 14 de abril de 2016 (JO 2016, C 146, p. 11), o Tribunal da Função Pública afetou os juízes K. Bradley, J. Sant’Anna e A. Kornezov à Segunda Secção do Tribunal da Função Pública para o período compreendido entre 14 de abril e 31 de agosto de 2016.

14

Por carta de 19 de abril de 2016, o Tribunal da Função Pública informou as partes de que, devido à saída de dois membros da formação de julgamento que participaram na audiência realizada em 8 de outubro de 2015 (v. n.o 9, supra), a saber, o juiz H. Kreppel e a juíza M. I. Rofes i Pujol, tinha decidido reabrir a fase oral do processo e fixar a nova data para a audiência de alegações em 12 de maio de 2016, em aplicação do artigo 27.o, n.o 3, segunda frase, do seu Regulamento de Processo.

15

Por carta de 29 de abril de 2016, a Secretaria do Tribunal da Função Pública informou as partes da nova composição da Secção.

16

Em 12 de maio de 2016, teve lugar uma segunda audiência de alegações na Segunda Secção do Tribunal da Função Pública, composta pelos juízes K. Bradley, J. Sant’Anna e A. Kornezov.

17

A recorrente concluiu, em primeira instância, pedindo que o Tribunal da Função Pública se dignasse:

anular o relatório de avaliação controvertido;

condenar o Conselho nas despesas.

18

O Conselho concluiu, em primeira instância, pedindo que o Tribunal da Função Pública se dignasse:

negar provimento ao recurso;

condenar a recorrente nas despesas.

19

No acórdão recorrido, o Tribunal da Função Pública negou provimento ao recurso em primeira instância e condenou a recorrente a suportar as suas próprias despesas e as despesas efetuadas pelo Conselho. Nos n.os 53 a 98 do acórdão recorrido, examinou e julgou improcedente o primeiro fundamento invocado em primeira instância, relativo a erros manifestos de apreciação e à violação do dever de fundamentação. Nos n.os 99 a 121 do acórdão recorrido, examinou e julgou improcedente o segundo fundamento invocado em primeira instância, relativo à violação do dever de solicitude.

Tramitação do processo no Tribunal Geral e pedidos das partes

20

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de setembro de 2016, a recorrente interpôs o presente recurso.

21

Em 21 de dezembro de 2016, o Conselho apresentou a contestação.

22

Em 20 de janeiro de 2017, a recorrente apresentou um pedido de apresentação da réplica, que o presidente da Secção dos recursos das decisões do Tribunal da Função Pública deferiu. Em 27 de março de 2017, a recorrente apresentou a réplica. Em 10 de maio de 2017, o Conselho apresentou a tréplica.

23

Em 15 de novembro de 2017, em aplicação do artigo 28.o do seu Regulamento de Processo e sob proposta da Secção dos recursos das decisões do Tribunal da Função Pública, o Tribunal Geral decidiu remeter o presente processo para a formação de julgamento alargada.

24

No quadro das medidas de organização do processo, previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral solicitou ao Conselho que apresentasse a lista dos candidatos em causa. O Conselho acedeu a esse pedido no prazo fixado.

25

Sob proposta do juiz‑relator, e na falta de pedido das partes para serem ouvidas no âmbito de uma audiência de alegações, o Tribunal Geral (Secção dos recursos das decisões do Tribunal da Função Pública), considerando‑se suficientemente esclarecido pelas peças constantes dos autos do processo, decidiu julgar o recurso sem fase oral, nos termos do artigo 207.o, n.o 2, do seu Regulamento de Processo.

26

A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

anular o acórdão recorrido;

em consequência, julgar procedentes os seus pedidos deduzidos em primeira instância e, como tal:

anular o relatório de avaliação controvertido;

condenar o Conselho nas despesas;

condenar o Conselho nas despesas de ambas as instâncias.

27

O Conselho conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

Quanto ao presente recurso

28

A recorrente invoca três fundamentos de recurso. O primeiro fundamento é relativo à constituição irregular da formação de julgamento. O segundo fundamento visa as considerações do Tribunal da Função Pública em que este último se baseou para julgar improcedente o primeiro fundamento invocado em primeira instância, relativo, por um lado, a erros manifestos de apreciação e, por outro, à violação do dever de fundamentação. O terceiro fundamento visa as considerações do Tribunal da Função Pública em que este último se baseou para julgar improcedente o segundo fundamento invocado em primeira instância, relativo à violação do dever de solicitude.

29

No âmbito do primeiro fundamento, a recorrente alega que a formação de julgamento que proferiu o acórdão recorrido não foi constituída de forma regular. O Conselho não podia recorrer à lista de candidatos em causa, que tinha sido estabelecida pelo Comité de Seleção na sequência do convite público à apresentação de candidaturas lançado em 3 de dezembro de 2013, para nomear um juiz para o lugar ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol. Esse convite público à apresentação de candidaturas incidiu apenas sobre os lugares ocupados pelos juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel, cujos mandatos chegavam a termo em 30 de setembro de 2014, e não sobre o lugar ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol, que foi nomeada para um mandato compreendido entre 1 de setembro de 2009 e 31 de agosto de 2015. Esta lista não era uma lista de reserva geral. O Conselho devia ter respeitado o quadro jurídico instituído pelo convite público à apresentação de candidaturas. O juiz nomeado para o lugar ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol foi nomeado sem publicação prévia de um convite público à apresentação de candidaturas, pelo que não foi nomeado validamente. Consequentemente, a juíza M. I. Rofes i Pujol permaneceu no cargo e a constituição da formação que proferiu o acórdão recorrido ficou ferida de irregularidade. Por outro lado, as condições previstas no artigo 27.o, n.o 3, segunda frase, do Regulamento de Processo do Tribunal da Função Pública não estavam reunidas. Neste contexto, a recorrente alega também que, ao adotar a Decisão 2016/454, o Conselho não podia alterar o processo de nomeação de um juiz do Tribunal da Função Pública previsto no anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, na versão aplicável ao presente litígio. Esse processo só podia ser alterado ao abrigo do artigo 281.o TFUE, que prevê a participação do Parlamento Europeu e do Tribunal de Justiça da União Europeia.

30

O Conselho contesta estes argumentos. A formação de julgamento foi constituída de forma regular. A Decisão 2016/454 não é ilegal. Contrariamente ao que a recorrente alega, o Conselho podia recorrer à lista em causa. Não estava obrigado a lançar um novo convite público à apresentação de candidaturas cada vez que um lugar ficasse vago no Tribunal da Função Pública. Como é prática conhecida noutros órgãos jurisdicionais internacionais, é possível criar uma lista de reserva de candidatos que podem ser nomeados sempre que um lugar fique vago. Assim, o Conselho podia recorrer à lista de candidatos em causa para nomear um juiz para o Tribunal da Função Pública, sem publicação prévia de um novo anúncio de vaga. Enquanto essa lista contivesse um número suficiente de candidatos, podia optar por recorrer à lista ou por publicar um novo convite público à apresentação de candidaturas. Dispunha de uma margem de apreciação a este respeito. Nem a Decisão 2004/752/CE, Euratom do Conselho, de 2 de novembro de 2004, que institui o Tribunal da Função Pública da União Europeia (JO 2004, L 333, p. 7), nem a sua prática anterior a tal se opunham. Contrariamente ao que a recorrente alega, o Conselho não desrespeitou nem alterou o anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, na versão aplicável ao presente litígio.

31

No âmbito do primeiro fundamento, a recorrente alega, em substância, que o acórdão recorrido foi proferido por uma formação de julgamento que tinha sido constituída de forma irregular, devido ao facto de o processo de nomeação de um dos juízes que integrou essa formação estar ferido de irregularidade. Neste contexto, alega que o processo de nomeação do juiz que foi nomeado para o lugar ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol era irregular.

32

Tendo em conta estes argumentos, há que examinar, num primeiro momento, se o juiz, cujo processo de nomeação é visado pelos argumentos da recorrente (a seguir «juiz em causa»), integrava a secção que proferiu o acórdão recorrido; num segundo momento, se o processo de nomeação do juiz padecia de irregularidade; e, se for caso disso, num terceiro momento, qual o impacto de tal irregularidade sobre a regularidade da composição da referida secção.

33

Num primeiro momento, importa examinar se o juiz em causa integrava a Segunda Secção do Tribunal da Função Pública que proferiu o acórdão recorrido.

34

Neste contexto, em primeiro lugar, cabe recordar que, quando proferiu o acórdão recorrido, a Segunda Secção do Tribunal da Função Pública era composta pelos juízes K. Bradley, J. Sant’Anna e A. Kornezov (v. n.os 13 e 16, supra).

35

Em segundo lugar, há que salientar que o juiz K. Bradley não foi nomeado juiz do Tribunal da Função Pública pela Decisão 2016/454 e, por conseguinte, não pode ser o juiz em causa. Em contrapartida, os juízes J. Sant’Anna e A. Kornezov foram nomeados juízes do Tribunal da Função Pública por essa decisão.

36

Em terceiro lugar, importa recordar que os três candidatos nomeados juízes do Tribunal da Função Pública pela Decisão 2016/454 são S. Van Raepenbusch, J. Sant’Anna e A. Kornezov. Como resulta do dispositivo e do considerando 5 da Decisão 2016/454, S. Van Raepenbusch foi o primeiro candidato a ser nomeado pelo Conselho e foi confirmado no seu lugar para um novo mandato com efeitos a partir do dia seguinte ao termo do seu anterior mandato, ou seja, 1 de outubro de 2014. Consequentemente, S. Van Raepenbusch não foi nomeado para o lugar ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol, pelo que não é o juiz em causa.

37

Em quarto lugar, há que salientar que os outros dois candidatos nomeados juízes do Tribunal da Função Pública pela Decisão 2016/454 são J. Sant’Anna e A. Kornezov, pelo que um deles é o juiz em causa. Ora, estes dois juízes integraram a Segunda Secção do Tribunal da Função Pública que proferiu o acórdão recorrido.

38

Assim, cumpre concluir que o juiz em causa integrava a Segunda Secção do Tribunal da Função Pública que proferiu o acórdão recorrido.

39

Num segundo momento, importa examinar os argumentos da recorrente destinados a demonstrar que o processo de nomeação do juiz em causa padecia de irregularidade.

40

Neste contexto, deve recordar‑se que, nos termos do artigo 257.o, quarto parágrafo, TFUE, os membros dos tribunais especializados serão escolhidos de entre pessoas que ofereçam todas as garantias de independência e possuam a capacidade requerida para o exercício de funções jurisdicionais. São nomeados pelo Conselho, deliberando por unanimidade.

41

De acordo com o artigo 2.o, n.o 1, terceiro parágrafo, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, na versão aplicável ao presente litígio, em caso de vaga, procedia‑se à nomeação de um novo juiz do Tribunal da Função Pública por um período de seis anos.

42

Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, primeira frase, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, na versão aplicável ao presente litígio, os juízes eram nomeados pelo Conselho, deliberando nos termos do quarto parágrafo do artigo 257.o TFUE, após consulta do Comité de Seleção. Segundo o artigo 3.o, n.o 1, segunda frase, desse anexo, ao nomear os juízes, o Conselho devia garantir que a composição do Tribunal da Função Pública fosse equilibrada e assente na mais ampla base geográfica possível de cidadãos dos Estados‑Membros e dos regimes jurídicos nacionais representados.

43

Resulta do artigo 3.o, n.o 2, primeira frase, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, na versão aplicável ao presente litígio, que qualquer cidadão da União que preenchesse as condições previstas no quarto parágrafo do artigo 257.o TFUE podia apresentar a sua candidatura. Nos termos do artigo 3.o, n.o 2, segunda frase, desse anexo, o Conselho, deliberando sob recomendação do Tribunal de Justiça da União Europeia, fixava as regras a que deviam obedecer a apresentação e instrução das candidaturas.

44

Nos termos do artigo 3.o, n.o 4, primeira frase, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, na versão aplicável ao presente litígio, o Comité de Seleção dava parecer sobre a adequação dos candidatos ao exercício das funções de juiz do Tribunal da Função Pública e anexava a esse parecer uma lista de candidatos que possuíssem a experiência de alto nível mais apropriada. Segundo o artigo 3.o, n.o 4, terceira frase, desse anexo, essa lista devia incluir um número de candidatos correspondente a pelo menos o dobro do número de juízes a nomear pelo Conselho.

45

É à luz dessas disposições que cumpre analisar o argumento da recorrente de que o processo de nomeação do juiz em causa padecia de irregularidade, por o Conselho ter nomeado esse juiz para o lugar ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol recorrendo à lista de candidatos em causa, quando a lista não tinha sido elaborada com vista à nomeação de um juiz para o lugar.

46

A este respeito, em primeiro lugar, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, mesmo quando uma instituição dispõe de um amplo poder de apreciação no que respeita à nomeação de um candidato, este amplo poder de apreciação deve ser exercido com o maior respeito por todas as regulamentações pertinentes, ou seja, não apenas pelo aviso de vaga mas também pelas eventuais regras processuais adotadas pela própria autoridade para exercer o seu poder de apreciação. Assim, o aviso de vaga e as regras aplicáveis ao processo de nomeação constituem uma parte do quadro legal que a instituição tem de respeitar rigorosamente no exercício do seu amplo poder de apreciação (v., neste sentido, acórdãos de 4 de julho de 2006, Tzirani/Comissão, T‑88/04, EU:T:2006:186, n.o 78, e de 11 de julho de 2007, Konidaris/Comissão, T‑93/03, EU:T:2007:209, n.o 121).

47

Este princípio também era aplicável no âmbito do processo de nomeação de um juiz do Tribunal da Função Pública, quando o Conselho nomeava um juiz recorrendo a uma lista de candidatos estabelecida na sequência de um convite público à apresentação de candidaturas.

48

Consequentemente, o Conselho devia respeitar não só o quadro legal constituído pelas disposições referidas nos n.os 40 a 44, supra, mas também o quadro legal decorrente do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 (v. n.o 4, supra).

49

Ora, como resulta desse convite público à apresentação de candidaturas, o mesmo foi lançado com vista à nomeação de dois juízes para os lugares ocupados pelos juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel, não com vista à nomeação de um terceiro juiz para o lugar ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol.

50

Consequentemente, a lista elaborada na sequência do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 só podia ser utilizada para preencher as vagas ocupadas pelos juízes H. Kreppel e S. Van Raepenbusch.

51

Daqui decorre que, ao utilizar essa lista para preencher o terceiro lugar vago ocupado por M. I. Rofes i Pujol, o Conselho violou o quadro legal imposto pelo convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013. Com efeito, importa recordar que, de acordo com o dispositivo da Decisão 2016/454 e o seu considerando 5, o Conselho nomeou como juízes do Tribunal da Função Pública, em primeiro lugar, S. Van Raepenbusch, em segundo lugar, J. Sant’Anna, e, em terceiro lugar, A. Kornezov. Ora, embora pudesse recorrer à lista no que diz respeito às duas primeiras nomeações, o Conselho não o podia fazer no que respeita à terceira.

52

Em segundo lugar, há que observar que a utilização da lista de candidatos em causa que o Comité de Seleção tinha elaborado para as nomeações de dois juízes para os lugares ocupados pelos juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel, por um período de seis anos, com início a 1 de outubro de 2014, para o preenchimento do lugar vago ocupado por M. I. Rofes i Pujol não era conforme com as regras do processo de nomeação dos juízes do Tribunal da Função Pública referidas nos n.os 40 a 44, supra.

53

Neste contexto, por um lado, há que recordar que, nos termos do artigo 3.o, n.o 4, terceira frase, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, a lista dos candidatos devia incluir um número de candidatos correspondente ao dobro do número de juízes a nomear pelo Conselho. Daqui resulta que o convite público à apresentação de candidaturas com vista à elaboração dessa lista devia identificar os lugares vagos. Ora, o convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 estava limitado aos lugares vagos ocupados pelos juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel, não visava o lugar ocupado por M. I. Rofes i Pujol.

54

Por outro lado, há que recordar que, nos termos do artigo 3.o, n.o 2, primeira frase, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, na versão aplicável ao presente litígio, qualquer cidadão da União que oferecesse todas as garantias de independência e que possuísse a capacidade requerida para o exercício de funções jurisdicionais podia apresentar a sua candidatura. Deve ainda recordar‑se que, nos termos do artigo 3.o, n.o 4, segunda frase, do referido anexo, a lista elaborada pelo Comité de Seleção devia indicar os candidatos que possuíssem a experiência de alto nível mais apropriada. Daqui resulta que um dos objetivos prosseguidos por estas disposições era o de permitir a todos os candidatos elegíveis a apresentação da sua candidatura, de modo a garantir que os candidatos que figurassem na lista de candidatos elaborada pelo Comité de Seleção fossem aqueles que possuíssem a experiência de alto nível mais apropriada.

55

Uma abordagem que não garante plenamente a consecução deste objetivo não pode, por conseguinte, ser considerada conforme com as regras do processo de nomeação dos juízes do Tribunal da Função Pública.

56

Ora, não se pode excluir que a utilização da lista de candidatos em causa, que tinha sido elaborada para preencher lugares ocupados pelos juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel, tenha tido como consequência a exclusão de uma parte dos potenciais candidatos, a saber, os que não tinham participado no convite público à apresentação de candidaturas para estes lugares, mas que teriam tido interesse em apresentar a sua candidatura para o lugar ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol. Quanto a esses eventuais candidatos, por um lado, há que salientar que, por força do artigo 3.o, n.o 1, segunda frase, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, na versão aplicável ao presente litígio, aquando da nomeação dos juízes, o Conselho devia velar por uma composição equilibrada do Tribunal da Função Pública assente na mais ampla base geográfica possível de cidadãos dos Estados‑Membros e dos regimes jurídicos nacionais representados. Tendo em conta os critérios que o Conselho devia observar no âmbito da sua escolha, não se pode excluir que, por força do respeito pelo equilíbrio geográfico, alguns juristas de certos Estados‑Membros, por exemplo cidadãos espanhóis, possam ter decidido não participar no convite público à apresentação de candidaturas para os lugares ocupados pelos juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel porque já existia um membro espanhol no Tribunal da Função Pública, a saber, a juíza M. I. Rofes i Pujol. Por outro lado, não se pode excluir que, por razões legítimas, potenciais candidatos elegíveis com experiência relevante tenham decidido não apresentar a sua candidatura a um mandato com início a 1 de outubro de 2014, mas que estariam dispostos a apresentar a candidatura a um mandato com início a 1 de setembro de 2015.

57

Por último, há que salientar que, no momento em que o convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 para a nomeação de dois juízes para os lugares ocupados pelos juízes S. Van Raepenbusch e H. Kreppel foi lançado, os eventuais candidatos para o posto ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol não podiam contar com o facto que a lista elaborada pelo Comité de Seleção fosse seguidamente utilizada para preencher o lugar vago ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol.

58

Tendo em conta estas considerações, há que concluir que o processo de nomeação do juiz em causa era irregular, não só porque o Conselho não respeitou o quadro de legal imposto pelo convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013, mas também porque a abordagem do Conselho não era conforme com as regras da nomeação de um juiz do Tribunal da Função Pública referidas nos n.os 40 a 44, supra.

59

Nenhum dos argumentos avançados pelo Conselho é suscetível de pôr em causa esta conclusão.

60

Em primeiro lugar, há que rejeitar o argumento do Conselho de que a condição prevista no artigo 3.o, n.o 4, terceira frase, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, na versão aplicável ao presente litígio, segunda a qual a lista devia incluir um número de candidatos correspondente a pelo menos o dobro do número de juízes a nomear pelo Conselho, estava preenchida, uma vez que os nomes de seis candidatos figuravam nessa lista. A este respeito, basta observar que não se tratava da única condição que devia estar preenchida no âmbito de um processo de nomeação de um juiz do Tribunal da Função Pública.

61

Em segundo lugar, visto que o Conselho alega que dispunha de um amplo poder discricionário, basta recordar que esse poder não lhe permitia afastar‑se do quadro legal resultante do convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 nem das disposições sobre o processo de nomeação de um juiz do Tribunal da Função Pública referidas nos n.os 40 a 44, supra.

62

Em terceiro lugar, há que rejeitar o argumento do Conselho de que não estava vinculado à sua prática anterior. A este respeito, basta observar que as considerações desenvolvidas nos n.os 33 a 58, supra, não assentam numa comparação da abordagem do Conselho da nomeação do juiz em causa com a sua prática anterior, mas na constatação de que essa abordagem não era conforme com o quadro legal aplicável.

63

Em quarto lugar, o Conselho apresenta argumentos que visam demonstrar que, em aplicação das disposições pertinentes, tinha o direito de constituir uma lista de reserva que podia ser utilizada para preencher os lugares vagos de juízes do Tribunal da Função Pública. A este respeito, basta referir que, no presente contexto, a questão relevante não é a de saber se o Conselho estava no direito de constituir uma tal lista de reserva mas sim a de saber se tinha o direito de prover o lugar vago ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol, nomeando um candidato com base numa lista que não tinha sido constituída para o efeito. Consequentemente, este argumento também deve ser rejeitado, sem que seja necessário responder à questão de saber se o Conselho podia constituir uma tal lista de reserva.

64

Assim, há que concluir que o processo de nomeação do juiz em causa padecia de irregularidade e também não se pode excluir que, se um convite público à apresentação de candidaturas para preencher o lugar ocupado pela juíza M. I. Rofes i Pujol tivesse sido lançado, os candidatos que não participaram no convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 teriam apresentado a sua candidatura e que, nesse caso, a seleção efetuada pelo Comité de Seleção teria sido diferente. Nestas circunstâncias, não se pode excluir que as irregularidades verificadas possam ter tido um impacto na decisão de nomeação do juiz em causa para o lugar ocupado pela M. I. juíza Rofes i Pujol.

65

Num terceiro momento, há pois que analisar se as irregularidades que viciam o processo de nomeação do juiz em causa podem pôr em causa a regularidade da composição da Segunda Secção do Tribunal da Função Pública que proferiu o acórdão recorrido.

66

Neste contexto, cabe recordar que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, caso surja uma contestação em relação à irregularidade da formação do tribunal que julgou em primeira instância que não seja manifestamente desprovida de fundamento, o juiz de recurso está obrigado a verificar a regularidade da mesma. Com efeito, um fundamento baseado em irregularidade da formação de julgamento constitui um fundamento de ordem pública que deve ser apreciado oficiosamente, mesmo que essa irregularidade não tenha sido invocada em primeira instância (v., neste sentido, acórdão de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.os 44 a 50).

67

Como resulta do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeira frase, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, uma das exigências da composição da formação de julgamento é a de que os tribunais devem ser independentes, imparciais e previamente estabelecidos por lei.

68

Desta exigência, que deve ser interpretada no sentido de que a composição do órgão jurisdicional e suas competências devem ser previamente reguladas por lei, decorre o princípio do juiz legal, cujo objetivo é garantir a independência do poder jurisdicional relativamente ao executivo (v., neste sentido, acórdão de 13 de dezembro de 2012, Strack/Comissão, T‑199/11 P, EU:T:2012:691, n.o 22).

69

Neste contexto, importa recordar que, por força do artigo 52.o, n.o 3, primeira frase, da Carta dos Direitos Fundamentais, na parte em que esta contém direitos correspondentes aos direitos garantidos pela Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), o sentido e o âmbito desses direitos são iguais aos conferidos por essa Convenção.

70

Importa igualmente recordar que, nos termos do artigo 6.o, n.o 1, terceiro parágrafo, TUE e do artigo 52.o, n.o 7, da Carta dos Direitos Fundamentais, na interpretação dos direitos enunciados nesta última, as Anotações destinadas a orientar a sua interpretação (JO 2007, C 303, p. 17) são devidamente tidas em consideração pelo juiz da União. Quanto à interpretação do artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais, essas anotações precisam:

«No direito da União, o direito a julgamento imparcial não se aplica apenas a litígios relativos a direitos e obrigações do foro civil. É uma das consequências do facto de a União ser uma comunidade de direito, tal como estabelecido pelo Tribunal de Justiça no processo 294/83, Os Verdes contra Parlamento Europeu (acórdão de 23 de abril de 1986, Colet., 1986, p. 1339). Porém, com exceção do seu âmbito de aplicação, as garantias dadas pela CEDH são aplicadas de modo similar na União.»

71

Daqui resulta que, no que respeita à interpretação do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeira frase, da Carta dos Direitos Fundamentais, é necessário ter em conta a garantia oferecida pelo artigo 6.o, n.o 1, primeira frase, da CEDH, que também prevê o princípio do juiz legal.

72

Segundo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «TEDH»), o princípio do juiz legal consagrado no artigo 6.o, n.o 1, primeira frase, da CEDH reflete o princípio do Estado de direito, do qual decorre que um órgão judicial deve ser estabelecido em conformidade com a vontade do legislador (v., neste sentido, TEDH, 27 de outubro, Pandjikidzé e outros c. Geórgia, CE:ECHR:2009:1027JUD 003032302, n.o 103, e 20 de outubro de 2009, Gorguiladzé c. Geórgia, CE:ECHR:2009:1020JUD 000431304, n.o 67).

73

Segundo o TEDH, um tribunal deve, portanto, ser constituído em conformidade com a legislação relativa à criação e à competência dos órgãos judiciais e com qualquer outra disposição de direito interno cujo incumprimento torna irregular a participação de um ou vários juízes na apreciação do caso. Trata‑se, nomeadamente, das disposições relativas aos mandatos, às incompatibilidades e à recusa de magistrados (v., neste sentido, TEDH, 27 de outubro, Pandjikidzé e outros c. Geórgia, CE:ECHR:2009:1027JUD 003032302, n.o 104, e 20 de outubro de 2009, Gorguiladzé c. Geórgia, CE:ECHR:2009:1020JUD 000431304, n.o 68).

74

Como resulta da jurisprudência do TEDH, o princípio do juiz legal exige que as disposições que regem o processo de nomeação dos juízes sejam respeitadas (v., neste sentido, TEDH, 9 de julho de 2009, Ilatovskiy c. Rússia, CE:ECHR:2009:0709JUD 000694504, n.os 40 e 41).

75

Com efeito, é essencial não só que os juízes sejam independentes e imparciais mas também que o processo de nomeação dos juízes dê essa aparência. É a razão pela qual as regras de nomeação dos juízes devem ser rigorosamente cumpridas. Caso contrário, poder‑se‑ia erodir a confiança dos particulares e do público na independência e na imparcialidade dos tribunais (v., neste sentido, decisão do Tribunal EFTA de 14 de fevereiro de 2017, Pascal Nobile/DAS Rechtsschutz‑Versicherungs, E‑21/16, n.o 16).

76

É à luz destes princípios que há que analisar se as irregularidades que viciam o processo de nomeação do juiz em causa se podem repercutir na regularidade da composição da Segunda Secção do Tribunal da Função Pública que proferiu o acórdão recorrido.

77

A este respeito, importa observar que resulta dos considerandos 1 a 6 da Decisão 2016/454, que estão reproduzidos no n.o 11, supra, que o Conselho estava plenamente consciente do facto de a lista de candidatos em causa não ter sido elaborada para a nomeação de um juiz para o lugar ocupado por M. I. Rofes i Pujol. Não obstante, decidiu utilizá‑la para esse fim. Resulta, assim, do próprio ato de nomeação que o Conselho se afastou intencionalmente do quadro legal imposto pelo convite público à apresentação de candidaturas de 3 de dezembro de 2013 e das regras de nomeação dos juízes do Tribunal da Função Pública.

78

Nestas circunstâncias, atendendo à importância do respeito pelas regras de nomeação de um juiz para a confiança dos particulares e do público na independência e na imparcialidade dos tribunais, o juiz em causa não pode ser considerado um juiz legal na aceção do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeira frase, da Carta dos Direitos Fundamentais.

79

Consequentemente, há que julgar procedente o primeiro fundamento, relativo ao facto de a Segunda Secção do Tribunal da Função Pública que proferiu o acórdão recorrido não ter sido constituída de forma regular.

80

Tendo em conta estas considerações, há que anular o acórdão recorrido na sua totalidade, sem que seja necessário apreciar o segundo e terceiro fundamentos.

Quanto ao recurso em primeira instância

81

Nos termos do artigo 4.o do Regulamento (UE, Euratom) 2016/1192 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de julho de 2016, relativo à transferência para o Tribunal Geral da União Europeia da competência para decidir, em primeira instância, dos litígios entre a União Europeia e os seus agentes (JO 2016, L 200, p. 137), se o Tribunal Geral anular uma decisão do Tribunal da Função Pública e considerar que o litígio não está em condições de ser julgado, remete o processo para uma secção diferente daquela que decidiu do recurso da decisão.

82

No caso em apreço, o recurso em primeira instância não está em condições de ser julgado. Com efeito, por um lado, o Tribunal Geral não se pode basear em factos apurados por uma formação de julgamento do Tribunal da Função Pública que foi constituída de forma irregular e, por outro, não lhe compete, no quadro da sua função de juiz de recurso, apreciar ele próprio os factos.

83

Consequentemente, há que remeter o processo para uma secção diferente daquela que decidiu do presente recurso para que o Tribunal Geral decida em primeira instância sobre do recurso interposto pela recorrente no Tribunal da Função Pública.

Quanto às despesas

84

Sendo o processo remetido para uma secção diferente do Tribunal Geral, há que reservar para final a decisão quanto às despesas do presente processo de recurso.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Secção dos recursos das decisões do Tribunal da Função Pública)

decide:

 

1)

O acórdão do Tribunal da Função Pública da União Europeia (Segunda Secção) de 28 de junho de 2016, FV/Conselho (F‑40/15), é anulado.

 

2)

O processo é remetido para uma secção do Tribunal Geral diferente daquela que decidiu do presente recurso.

 

3)

Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

 

Jaeger

Prek

Gratsias

Papasavvas

Dittrich

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 23 de janeiro de 2018.

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: francês.

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