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Document 52008AE0770

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre outras taxas de IVA além das taxas de IVA uniformes COM(2007) 380 final — SEC(2007) 910

JO C 211 de 19.8.2008, p. 67–72 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

19.8.2008   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 211/67


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre outras taxas de IVA além das taxas de IVA uniformes»

COM(2007) 380 final — SEC(2007) 910

(2008/C 211/18)

Em 5 de Julho de 2007, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a:

Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre outras taxas de IVA além das taxas de IVA uniformes.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, que emitiu parecer em 28 de Março de 2008, tendo sido relator Umberto BURANI.

Na 444.a reunião plenária 22 e 23 de Abril de 2008 (sessão de 22 de Abril), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 112 votos a favor, nenhum voto contra e 5 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE acolhe favoravelmente a iniciativa da Comissão de lançar as bases para um debate político no Parlamento Europeu e no Conselho, com o fito de estabelecer princípios comummente aceites para as derrogações ao regime de IVA. Como se trata de um processo com conotações marcadamente políticas, parece-nos inteiramente realista a data definitiva de finais de 2010 prevista para a adopção de novas regras.

1.2

O objectivo inicial da adopção do regime de IVA era criar as premissas para uma harmonização fiscal que permitisse o bom funcionamento do mercado interno. Contudo, as numerosas alterações introduzidas oportunamente, mas sobretudo as isenções e as derrogações, tiveram um efeito contrário e, no fim de contas, a tentativa de uniformizar as derrogações é o melhor que se pode fazer nas presentes condições.

1.3

As derrogações são aplicadas em cada Estado-Membro com base em critérios de fiscalidade, combinados com preocupações de carácter político e social. Essas derrogações são permitidas quando não têm impacto transfronteiriço ou obedeçam a critérios consolidados de política comunitária. O CESE considera, por seu turno, que, embora respeitando estes critérios, haverá que examiná-los — ainda que não exclusivamente — a partir do seu contributo para uma política de redistribuição dos rendimentos.

1.4

Durante o debate, dever-se-ia dedicar atenção especial aos serviços locais que não possam ser fornecidos a partir de um local remoto e que não têm, portanto, um impacto directo no mercado interno. É uma categoria de que fazem parte inúmeras actividades que, a par de uma indubitável utilidade económica e social, apresentam aspectos controversos ou que se prestam a considerações diversas, por exemplo, actividades artesanais, restauração, serviços de saúde públicos e privados, sectores com grande intensidade de mão-de-obra não qualificada, livros e jornais.

1.5

O CESE adverte para a necessidade de conferir isenções com base num critério de diferenciação dos gastos de consumo de grupos de baixos e elevados rendimentos. Mas recorda especialmente que as isenções devem inspirar-se em critérios de transparência e ter em conta os custos decorrentes de regras inexactas ou genéricas para as administrações fiscais e para as empresas, custos estes que, em última instância, recaem sobre os consumidores finais.

1.6

Também haveria que atender em particular às subvenções directas como opção alternativa a uma taxa reduzida de IVA, uma solução que a Comissão admite sem, no entanto, tomar posição. Na opinião do CESE, é preciso encarar esta alternativa com especial cautela e adoptá-la com parcimónia e apenas nos casos em que outras soluções se afigurem difíceis de aplicar. Seja como for, as subvenções não deverão jamais assumir o carácter de auxílios estatais.

2.   Historial

2.1

O regime do IVA, pela sua própria natureza, baseia-se num sistema complexo. Foi criado em 1977 como regime «provisório» (1) e ainda hoje — trinta anos mais tarde — é assim denominado! Entretanto, já foi modificado vezes sem conta devido a adaptações a situações temporárias ou duradouras, a considerações de natureza política, a certas evoluções do mercado interno e ao processo de alargamento.

2.2

A Comissão tomou as medidas necessárias para simplificar o trabalho das administrações e dos agentes económicos através da «directiva IVA de 2006» (2), que ordenou a legislação e que constitui, na prática, um «texto único» na matéria. Esta nova directiva inspira-se nos princípios originais de 1977, parcialmente revistos em 1992. Regra geral, a taxa normal mínima é de 15 % (3) e o imposto é, por norma, cobrado no local de origem. Estão, contudo, previstas algumas derrogações e excepções, nomeadamente a possibilidade de reduzir a taxa normal e a tributação no destino de alguns bens e serviços.

2.3

Ao abrigo da legislação, os Estados-Membros podem aplicar uma ou duas taxas reduzidas, mas apenas aos bens e serviços enunciados na directiva IVA (4). Todos os Estados-Membros, com a excepção parcial da Dinamarca, tiram partido desta possibilidade, ainda que em diferentes medidas e aplicando-a a diversos bens e serviços seleccionados de entre os permitidos. Esta incoerência não contribui para alcançar a coordenação indispensável ao bom funcionamento do mercado único. A Comissão propõe agora lançar um «convite ao debate político» entre o Conselho e o Parlamento Europeu — com a participação do CESE, cujo parecer foi solicitado — com vista a chegar a um acordo entre os Estados-Membros sobre a nova arquitectura das taxas reduzidas de IVA.

2.3.1

Na prática, esse debate implica a revisão de todo o quadro de derrogações específicas e temporárias já concedidas — as primeiras aos Estados-Membros que aderiram há mais tempo e as segundas aos «novos» Estados-Membros –, bem como a recriação de um quadro que tenha em consideração objectivos coerentes com a lógica do mercado interno. Este processo não é simples, pois será necessário encontrar um equilíbrio consensualmente aceite entre todos os imperativos políticos, económicos e sociais que, ao longo dos anos, foram usados para justificar as derrogações e exclusões que cada Estado-Membro tem aplicado consoante os seus requisitos particulares. A Comissão não tem ilusões quanto aos escolhos do percurso e parte do princípio de que o processo de consulta não se traduzirá em nova regulamentação antes de finais de 2010.

2.4

Um primeiro passo necessário para que todos os Estados-Membros se encontrem em pé de igualdade foi já dado com a proposta de directiva que prolonga até 31 de Dezembro de 2010 as derrogações temporárias concedidas aos novos Estados-Membros  (5). O motivo desta proposta, já aprovada em 20 de Dezembro de 2007, é não ser unívoco o regime em vigor para as derrogações: os Estados-Membros de adesão menos recente beneficiam de derrogações de duração indeterminada, ao passo que as derrogações dos novos Estados-Membros caducaram no final de 2007. A prorrogação até 20.12.2007 concedida a estes últimos coloca todos os Estados-Membros em pé de igualdade, pelo menos até 2010, altura em que a Comissão espera que o Conselho e o Parlamento Europeu tenham chegado a acordo sobre a adopção de um regime estável e homogéneo de outras taxas de IVA para além da taxa uniformizada.

2.5

A comunicação a que o presente documento se refere tem por objectivo lançar «as bases de um debate político» no Parlamento Europeu e no Conselho, com vista a estabelecer princípios consensualmente aceites que permitam a elaboração de propostas regulamentares com grande probabilidade de serem aceites. Tendo em conta experiências passadas e presentes, a Comissão adopta acertadamente uma posição cautelosa nas suas declarações e realista no que toca às decisões a tomar, mostrando, assim, que está à espera de sinais. Com efeito, na sua comunicação limita-se a fornecer de um modo equilibrado todos os elementos úteis a uma avaliação e a um juízo de valor, inspirando-se nos princípios consolidados do mercado único e da Estratégia de Lisboa, mas sem assumir uma posição definida. O CESE considera esta iniciativa crucial para o futuro do mercado interno em matéria fiscal, sendo uma oportunidade única cujo êxito dependerá do sentido de responsabilidade e da boa vontade dos decisores.

3.   Síntese da comunicação

3.1

A comunicação apresenta sucintamente um estudo realizado pela empresa Copenhagen Economics que, em nome da Comissão e no âmbito do mandato que lhe foi atribuído pelo Conselho e pelo Parlamento Europeu, analisou o impacto das taxas reduzidas de IVA e das derrogações, debruçando-se, em especial, sobre os aspectos sociais (distribuição do rendimento) e os custos do sistema. O CESE felicita a Comissão pela qualidade do documento que elaborou com base nesse estudo, uma vez que não há elementos descurados nem questões sem resposta e constam dele todas as informações necessárias para o próximo debate.

3.2

A Comissão começa por definir o seu objectivo que é o «de garantir a igualdade de oportunidades dos Estados-Membros, bem como mais transparência, coerência e — sobretudo — o bom funcionamento do mercado interno, diminuindo os obstáculos às actividades económicas transfronteiriças e reduzindo os custos de aplicação do IVA (6), por exemplo.»

3.3

A Comissão salienta concretamente, e reportando-se ao estudo supramencionado, que de um ponto de vista meramente económico, a solução mais racional seria uma taxa única de IVA, pois permitiria poupanças em custos de aplicação para as empresas e as administrações fiscais e, em teoria, reduziria distorções da concorrência. Como acontece com toda a regulamentação rígida, há, todavia, o risco de a taxa única não se adequar a todas as situações, podendo, por isso, ser necessária uma certa dose de flexibilidade, princípio que está na base das taxas reduzidas.

3.4

As taxas reduzidas dão resposta aos critérios económicos, mas também, em parte, sociais e políticos. Podem citar-se como exemplo serviços com grande intensidade do factor trabalho (especialmente não qualificado) e serviços locais quando não tenham grande impacto na circulação transfronteiriça. O raciocínio subjacente é que taxas mais baixas (e, portanto, preços mais baixos) aumentariam a produtividade e o emprego, pois as pessoas, em vez de praticarem a bricolagem, estariam mais dispostas a contratar um profissional, gastando menos dinheiro na economia subterrânea.

3.5

A lista completa de bens e serviços que beneficiam de taxas reduzidas (artigo 98.o da directiva IVA) figura no anexo III dessa directiva. Quanto aos serviços com grande intensidade do factor trabalho, devem preencher três condições (artigo 107.o): para além dos mencionados no ponto anterior, devem ser serviços prestados em grande parte directamente aos consumidores finais e ser de carácter local e não susceptíveis de criar distorções de concorrência. No caso de bens e serviços «normais», os critérios são menos explícitos, mas uma análise dessa mesma lista denuncia claramente os motivos «sociais» subentendidos. Trata-se, com efeito, de produtos alimentares e farmacêuticos, água, publicações, serviços televisivos, etc. O Comité formulará observações sobre estes aspectos mais adiante (ver ponto 4.12).

3.6

A Comissão tece considerações sobre um dos argumentos mais comuns a favor das taxas reduzidas, segundo o qual estas contribuem para uma maior justiça social, melhorando a distribuição do rendimento em benefício dos menos abastados. O referido estudo e, ao que parece, a Comissão têm reservas em apoiar este argumento, salientando que as taxas reduzidas só têm um efeito verdadeiramente distributivo quando a parte dos gastos de consumo de bens que delas beneficiam se for estabilizando com o tempo e surgir uma diferença real entre os grupos de baixos e elevados rendimentos. Para além disso, a comunicação constata que existem diferenças significativas entre os países e que a maior ou a menor eficácia das taxas reduzidas depende da diferença maior ou menor de rendimentos entre as classes sociais.

3.7

Outro aspecto a não descurar são os custos do sistema, já que as taxas reduzidas criam encargos administrativos consideráveis às empresas e às administrações fiscais, especialmente quando a sua aplicação se presta a várias interpretações, o que acontece quase sempre.

3.8

Citando o estudo, a Comissão não questiona o sistema de taxas reduzidas, embora se interrogue sobre a possibilidade de instrumentos políticos alternativos se coadunarem mais com os objectivos dos Estados-Membros. Por exemplo, um sistema de subvenções directas atingiria os mesmos objectivos com menos custos. Poder-se-ia conceber um sistema desse tipo para evitar efeitos negativos ao nível comunitário, garantir mais transparência e um menor peso sobre os orçamentos dos Estados-Membros. Contudo, a Comissão observa que as subvenções directas não seriam porventura tão vantajosas para as empresas, uma vez que a sua concessão poderia ser aleatória e temporária, consoante os imperativos orçamentais nacionais ou as orientações políticas do momento.

3.9

A Comissão parece atribuir muita importância a esta última alternativa e, na verdade, a qualquer alternativa ao sistema das taxas reduzidas, recomendando «que os Estados-Membros examinem cuidadosamente todas as opções disponíveis». Sem parecer tomar partido, a Comissão afirma que «muitas vezes os instrumentos diferentes das taxas de IVA reduzidas são mais eficientes e menos onerosos em termos de orçamento de Estado, devendo este aspecto ser tido em consideração no processo de tomada de decisão».

4.   Comentários e observações

4.1

A Comissão merece todo o aplauso pela sua comunicação rigorosa e equilibrada. É com especial agrado que o CESE encontra a confirmação de algumas das suas posições anteriores, que serão relembradas nas observações seguintes. Em primeiro lugar, e remetendo para o ponto 2.9, o Comité recorda que manifestou a sua perplexidade quanto ao sistema de derrogações no seu parecer sobre a Directiva IVA (7) com as seguintes palavras: «Não parece que exista vontade [da parte dos Estados-Membros] de examinar todas as derrogações (…) com o objectivo de as suprimir». Esta posição encontra-se agora confirmada e reforçada pelo estudo abalizado da Copenhagen Economics, sendo aparentemente também partilhada pela Comissão. Contudo, é manifesto que, na situação actual, e salvo uma repentina mudança de opinião por parte dos Estados-Membros, quaisquer hipóteses de soluções alternativas não passarão disso mesmo.

4.2

O IVA é um imposto intrinsecamente complexo, de cobrança difícil, muito atreito a evasão e de aplicação onerosa para os Estados-Membros e as empresas (8). Porém, o que é mais importante ainda, não alcança o objectivo inicial de criar um regime definitivo de harmonização fiscal. Ainda assim, é de assinalar que a harmonização não constitui um fim em si, sendo antes um pré-requisito para o bom funcionamento do mercado interno. Essa foi, de qualquer modo, a intenção dos seus criadores, como a Comissão lembra na sua comunicação de Janeiro de 1993, que o Comité considera um marco fundamental na história do IVA. Lamenta, contudo, que não lhe tenha sido dado seguimento (para além da aceitação da taxa mínima de 15 %) devido à oposição de alguns Estados-Membros. Actualmente, a situação permanece inalterada: a tentativa da Comissão de resolver, pelo menos, a questão das derrogações é certamente apreciada, mas denuncia simultaneamente uma incapacidade de progredir no sentido da harmonização fiscal ao nível comunitário. A Comissão não é objectivamente responsável por esta situação, mas também não seria justo atribuir toda a responsabilidade aos Estados-Membros. O problema fundamental reside na própria estrutura do IVA enquanto «regime temporário», como se explicará em seguida.

4.3

Basicamente, é necessário compreender e aceitar durante algum tempo ainda que o IVA, na sua concepção actual, serve os objectivos predominantemente fiscais de cada um dos Estados-Membros, os quais, aliados a preocupações de natureza política e social, os levam a aplicar uma taxa inferior ou superior ao mínimo estabelecido. Por conseguinte, ao nível comunitário, a harmonização permanece uma aspiração que não se traduz em factos. A presente comunicação constitui uma tentativa de solução parcial, ao harmonizar a taxa reduzida de IVA, pelo menos para as actividades com impacto transfronteiriço ou que estejam em conformidade com critérios aceites da política comunitária. Por seu lado, o CESE considera que os decisores devem ter sempre em mente que, embora a redistribuição do rendimento seja um dos objectivos da taxa reduzida de IVA, esta deve ser realmente perceptível na prática. Significa isto que toda e qualquer redução de IVA tem de ser meticulosamente analisada para garantir que corresponde verdadeiramente a um critério social e não oculta quaisquer objectivos menos louváveis. No que respeita à simplificação das obrigações e à transparência das regras, estas facilitam a vida das empresas, mas tornam igualmente mais fáceis e menos onerosos os controlos das administrações fiscais.

4.4

O anexo III da directiva IVA contém uma lista de 18 categorias a que se aplica a taxa reduzida. Cada Estado-Membro tem a opção de escolher as categorias, aplicar exclusões dentro delas e determinar o montante da redução. A comunicação exorta os Estados-Membros a «analisar os vários casos passíveis de redução de taxa para determinar o nível de distorções que podem decorrer da escolha — em opção — e decidir se esse nível de distorção é aceitável» (9). A partir do contexto geral da comunicação, não parece possível interpretar esta mensagem como um convite ao alargamento da lista de bens e serviços, antes pelo contrário. De qualquer forma, o CESE opõe-se abertamente à extensão das taxas reduzidas a outros bens e serviços. Caso se pretenda prosseguir — pelos menos idealmente, para já — na via da harmonização, os Estados-Membros deverão na realidade encurtar, e não alargar, a lista constante do anexo III.

4.5

Porém, a via adoptada pela Comissão é compreensível de um modo geral. Dado que a miragem de um regime «definitivo» foi esquecida ou relegada para segundo plano, uma das prioridades é conceder aos Estados-Membros maior autonomia para estabelecerem taxas reduzidas para os serviços locais que não podem ser fornecidos à distância. A Comissão indica que estes serviços «em nada influenciam o funcionamento do mercado interno», o que não é mero pragmatismo mas antes um reconhecimento dos imperativos políticos ou sociais subjacentes à concessão das isenções.

4.6

Ademais, afirmações que se prestam facilmente a generalizações devem ser analisadas com cuidado. Se a tributação da actividade local não afecta o funcionamento do mercado interno, então todos os bens e serviços produzidos e consumidos localmente teriam de estar sujeitos a tributação estabelecida numa base local, princípio que iria deteriorar por completo a própria essência da directiva IVA. É óbvio que a Comissão não tenciona instituir nem aceitar esse princípio.

4.7

Entrando em detalhe nos aspectos mencionados pela Comissão, há que tecer alguns comentários sobre a afirmação de que podem surgir benefícios específicos decorrentes da aplicação de um IVA reduzido em sectores cuidadosamente seleccionados, aumentando a produtividade global e, por conseguinte, o PIB. Esta categoria inclui os serviços fornecidos localmente, nos quais uma redução do IVA induziria os consumidores a praticar menos bricolagem e dedicar mais tempo às suas actividades profissionais. É necessário, porém, encarar os factos: a bricolagem é uma actividade de lazer que tem não só utilidade social mas também vantagens económicas para as famílias, devendo, por conseguinte, ser estimulada. Além disso, embora seja possível que uma redução do imposto faça aumentar as receitas fiscais, tal apenas se verificaria em actividades de bricolagem que possam ser substituídas pela intervenção de empresas colectadas. Fica-se sem saber em que medida a economia paralela poderia retirar daí algum benefício. Certamente que a economia subterrânea ou parcialmente subterrânea — para não mencionar a evasão fiscal — não vai desaparecer só porque pode beneficiar de uma taxa reduzida de IVA. Serão necessárias medidas muito diversas para alcançar esse objectivo.

4.8

É feita uma menção especial aos serviços de restauração, que a Comissão considera estarem numa situação intermédia ou, melhor dizendo, controversa. Por um lado, destinam-se principalmente ao consumo das famílias mas, por outro, reconhece-se que podem ter uma importância decisiva na política do turismo em alguns países e nas regiões fronteiriças de todos os países. Não será fácil chegar a acordo nesta matéria, como já se viu antes: o Comité crê que será necessária uma decisão de natureza exclusivamente política. Ter em conta quaisquer outras considerações económicas ou fiscais poderá prolongar o debate indefinidamente, visto que ninguém mudará de posição apresentando como justificação razões válidas de política interna.

4.9

Ainda no que respeita aos serviços fornecidos localmente, o Comité gostaria de chamar a atenção para um sector que se arrisca a tornar-se matéria de um debate importante, o dos serviços de saúde públicos e privados, que podem beneficiar já — em certas circunstâncias — de taxas reduzidas (10). Nota-se uma tendência crescente no recurso pelos cidadãos de alguns Estados-Membros a serviços médicos e cirúrgicos públicos de outros países, que consideram com razão ou sem razão mais eficientes. Este fenómeno pouco tem a ver com fiscalidade. É aqui muito mais pertinente a escolha, por motivos fiscais, de apelar, noutros países, a serviços prestados por clínicas e profissionais de saúde do sector privado. As grandes diferenças entre as taxas cobradas em vários Estados-Membros provocam — especialmente em algumas áreas da saúde — um desvio do mercado nacional para outros países. Por conseguinte, o carácter «local» destes serviços tem vindo a esbater-se cada vez mais, em certos serviços e nalguns países em particular, e assume cada vez mais uma conotação transnacional. Neste âmbito não é fácil estabelecer distinções nem é possível generalizar, pois são grandes os riscos de controvérsia.

4.9.1

A obtenção de um acordo depende do equilíbrio conseguido entre requisitos diferentes e opostos: por um lado, dada a natureza eminentemente social da protecção da saúde, parece aconselhável incluir estes serviços na lista dos que beneficiam de uma taxa reduzida, por outro, poderiam ser evocadas questões de concorrência. A decisão final terá de considerar o direito dos indivíduos de procurar o tratamento o menos oneroso possível para o seu orçamento familiar, ou seja, o interesse do cidadão/consumidor terá de prevalecer sobre os princípios da concorrência.

4.10

A aplicação de uma taxa reduzida de IVA a sectores com grande intensidade de mão-de-obra não qualificada é controversa. O estudo mencionado pela Comissão indica que pode conduzir a um aumento permanente do emprego, mas que os benefícios «são provavelmente menores», o que talvez seja verdade. Ademais, é difícil chegar a uma decisão nesta matéria, pois estes sectores (construção civil, obras rodoviárias, empresas de limpeza, mercados, etc.) respondem a uma procura geralmente rígida, o que significa que uma redução do IVA teria um efeito muito marginal no emprego. Além disso, é nestes sectores que se verifica com maior frequência uma tendência para empregar trabalhadores não qualificados da «economia paralela». Uma redução do IVA contribuiria certamente para diminuir os custos das empresas, mas desconhece-se ainda se corresponderia a uma descida dos preços e a um aumento «real» do emprego.

4.11

De um modo mais geral, a Comissão refere que as taxas reduzidas só são eficazes quando a parte dos gastos de consumo de bens/serviços se for estabilizando com o tempo e houver uma diferença substancial entre os grupos de baixos e elevados rendimentos. Estas diferenças são mais acentuadas nos sectores da alimentação, do vestuário e da construção civil. São notáveis as diferenças entre os países, mas geralmente as mais gritantes (e mais injustas do ponto de vista social) observam-se no interior de cada Estado-Membro. O CESE gostaria de relembrar que, em vários Estados-Membros, a taxa reduzida é aplicada por categoria, sem ter em consideração que em muitas categorias figuram simultaneamente produtos de grande difusão e outros nitidamente exclusivos com preços várias vezes superiores aos dos primeiros. Fica em aberto o problema de como — e segundo que critérios — aplicar taxas de imposto diferentes a bens e serviços com a mesma denominação mas que visam classes sociais diferentes, consoante a qualidade e o preço. Outro problema consiste em como adoptar distinções duradouras não sujeitas aos caprichos da moda e como garantir o seu cumprimento sem ter de recorrer a inspecções onerosas e complicadas. Finalmente, há que ter em consideração a fraude, que pode ocorrer em todos os sectores, mas especialmente nos dois em apreço: as denominações minuciosas e detalhadas podem facilitá-la e aumentar a morosidade dos controlos. O CESE adverte para a necessidade de aplicar critérios que diferem entre si com base em considerações de carácter social, ou seja, fazer com que as taxas reduzidas contribuam para uma política social de redistribuição de rendimento ou, quando não sejam viáveis as alternativas referidas no ponto 4.15, de apoio a programas sociais relevantes. Seja como for, haverá que garantir a transparência para com os seus cidadãos e os demais Estados-Membros.

4.11.1

A mesma observação pode ser formulada em relação aos livros e jornais, categoria na qual são por vezes reunidas publicações válidas do ponto de vista social com outras sem valor educativo ou lúdico ou, pior ainda, ilegais ou quase ou no limite da consciência cívica comum. Embora problemáticas, as distinções parecem necessárias e, em todo o caso, justificáveis em termos de transparência democrática.

4.12

Finalmente, a Comissão constata que a aplicação de várias taxas implica custos significativos para as empresas e as administrações fiscais, o que é óbvio. O Comité preferia que se falasse de um aumento dos custos, dado que, em matéria fiscal, o IVA é já de longe o imposto mais oneroso de aplicar e cobrar. O CESE tem salientado este facto (11) e gostaria de apelar aos Estados-Membros para que tornem públicas as suas receitas líquidas provenientes do IVA, após deduzidas a parte destinada ao orçamento comunitário e as despesas com a aplicação, a cobrança, a inspecção e o combate à fraude fiscal. A Comissão poderia fazer eco a este apelo, no interesse da transparência, e reflectir se não será conveniente analisar a hipótese de adoptar um sistema fiscal alternativo  (12). É de esperar que uma reconsideração de toda esta matéria tenha igualmente por base os resultados (que poderão ser surpreendentes) em termos de benefícios líquidos para o fisco . Uma vez conhecidos os resultados «reais», não é impossível que sejam as próprias administrações fiscais a tomar essa iniciativa.

4.13

Contudo, actualmente está apenas em debate a questão, secundária, do aumento dos custos «para as empresas e as administrações fiscais» correspondentes às despesas administrativas e contabilísticas associadas à aplicação — e à interpretação — de regras que diferem da norma. O Comité observa que qualquer aumento de custos para as empresas é transferido para o consumidor final, pelo que será necessário avaliar, caso a caso, se e em que medida a aplicação de uma taxa reduzida se converte numa vantagem real para o cidadão. Hoje a grande maioria dos inúmeros casos de contencioso deve-se ao carácter genérico das classificações e às consequentes interpretações contraditórias, às intervenções de assessores, de inspecções e de recursos. Na concepção das novas regras é preciso, por isso, ter em mente que a sua aplicação deve ser económica.

4.14

Para já, o sistema de taxas reduzidas, embora oneroso, é o único praticável. Porém, visto que a própria Comissão o qualificou de «rígido e incoerente» (13), o Comité espera que o debate político entre o Conselho e o Parlamento Europeu conduza a decisões conjuntas inspiradas nos princípios do mercado interno, embora respeitando sempre as necessidades dos cidadãos/consumidores, empresas e administrações fiscais.

4.15

No que respeita às alternativas às taxas reduzidas, a Comissão pergunta se estas poderão ser substituídas por subvenções directas, um instrumento político mais eficaz, mais transparente e menos oneroso. O Comité crê que alternativas de tipo nacional são viáveis, em todos os casos particulares e como opção temporária, na condição de se evitar toda e qualquer medida com características de auxílio estatal. Em todo o caso, qualquer tipo de solução nacional alternativa às derrogações do IVA deveria ser decidida com base em critérios de transparência, sem esquecer que representaria, de qualquer modo, um afastamento dos objectivos do mercado único.

4.16

Por último, em complemento dos seus inúmeros pareceres na matéria, o Comité reitera uma sugestão inspirada na transparência e no bom senso: deixemos de classificar de «provisório» o regime de IVA actual. Este adjectivo — utilizado ainda hoje, trinta anos volvidos e sem perspectivas a médio prazo de se tornar definitivo — é falacioso e retira toda a credibilidade às regras da União Europeia. Justifica igualmente, acaso fosse necessária uma justificação, o velho adágio de que «nada é mais definitivo do que o provisório».

Bruxelas, 22 de Abril de 2008.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Um regime definitivo deveria, logicamente, prever a tributação no destino, mais concretamente, no local de consumo. Nessa altura, a sua aplicação geral foi impedida por vários obstáculos, que se mantiveram até ao presente.

(2)  Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347 de 11.12.2006).

(3)  Artigos 96.o e 97.o da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347 de 11.12.2006); nunca foi estabelecida uma taxa máxima.

(4)  Cf. artigos 98.o a 101.o e anexo III da directiva.

(5)  Proposta de directiva COM (2007) 381 final e parecer 1467/2007 do CESE sobre a «Proposta de directiva do Conselho que altera a Directiva 2006/112/CE no que diz respeito a certas disposições temporárias relativas a taxas do imposto sobre o valor acrescentado».

(6)  Ver Introdução da Comunicação COM(2007) 380 final.

(7)  Cf. o Parecer do CESE sobre a «Proposta de directiva do Conselho relativa ao sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado (revisão)» (JO C 74 de 23.3.2005, p. 21).

(8)  Cf. o Parecer do CESE sobre a «Proposta de directiva do Conselho que altera a Directiva 77/388/CEE a fim de simplificar as obrigações relativas ao imposto sobre o valor acrescentado» e a «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1798/2003 no que respeita à introdução de modalidades de cooperação administrativa no âmbito do regime de balcão único e do procedimento de reembolso do imposto sobre o valor acrescentado» (JO C 267 de 27.10.2005, p. 45).

(9)  Cf. comunicação COM(2007) 380 final, ponto 3.3 «Imperativos do Mercado Interno», segundo parágrafo.

(10)  Pontos 15 e 17, anexo III da directiva IVA.

(11)  O CESE levantou esta questão pela primeira vez no seu parecer sobre «A luta contra a fraude fiscal no mercado único» (JO C 268 de 19.9.2000, p. 45), bem como em várias ocasiões posteriores, a última das quais no seu Parecer sobre a «Proposta de directiva do Conselho que altera a Directiva 77/388/CEE a fim de simplificar as obrigações relativas ao imposto sobre o valor acrescentado» e a «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1798/2003 no que respeita à introdução de modalidades de cooperação administrativa no âmbito do regime de balcão único e do procedimento de reembolso do imposto sobre o valor acrescentado» (JO C 267 de 27.10.2005, p. 45), que — naturalmente — ficou sem resposta.

(12)  O CESE começou igualmente a chamar a atenção para este ponto em 2000 no parecer referenciado na nota anterior, tendo continuado a focálo em vários pareceres desde então. Formulou igualmente observações a este respeito no seu parecer sobre o «Sistema Comum de imposto sobre o valor acrescentado (revisão)» (JO C 74, de 23.3.2005, pág. 21).

(13)  Cf. parecer do CESE sobre a «Proposta de directiva do Conselho que altera a Directiva 77/388/CEE a fim de simplificar as obrigações relativas ao imposto sobre o valor acrescentado» e a «Proposta de regulamento do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 1798/2003 no que respeita à introdução de modalidades de cooperação administrativa no âmbito do regime de balcão único e do procedimento de reembolso do imposto sobre o valor acrescentado» (JO C 267 de 27.10.2005, p. 45).


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