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Document 52005AE0533

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Conselho relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias»(COM(2004) 501 final — 2004/0170 (CNS)

JO C 267 de 27.10.2005, p. 57–63 (ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, NL, PL, PT, SK, SL, FI, SV)

27.10.2005   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 267/57


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de decisão do Conselho relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias»

(COM(2004) 501 final — 2004/0170 (CNS)

(2005/C 267/09)

Em 22 de Outubro de 2004, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado CE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supamencionada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, que emitiu parecer em 15 de Abril de 2005, sendo relator U. BURANI.

Na 417.a reunião plenária de 11 e 12 de Maio de 2005 (sessão de 12 de Maio), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 118 votos a favor, 2 votos contra e 15 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Introdução

1.1

O artigo 9.o da decisão do Conselho relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias (1) prevê que a Comissão procederá, antes de 1 de Janeiro de 2006, a uma reapreciação geral do sistema de recursos próprios — previsto para o período 2007-2013, acompanhada, se for caso disso, de propostas adequadas. O Parlamento Europeu, por seu lado, apresentou um pedido explícito de revisão dos critérios de contribuição. Em execução do seu mandato, a Comissão apresentou, em acordo com o Conselho, a proposta em apreço. O mandato conferido à Comissão revela-se difícil e complexo em virtude das suas características técnicas, mas é sobretudo delicado pelos seus aspectos políticos relativos às relações entre os diversos Estados-Membros e às de cada um deles com os seus cidadãos.

1.2

A parte técnica do documento nem sempre é de compreensão imediata, mesmo para quem conhece os princípios das finanças públicas. Importa, contudo, reconhecer que a Comissão fez o seu melhor para que a matéria pudesse, pelo menos, ser discutida pelos especialistas e compreendida por quem tem responsabilidades de decisão. Com efeito, a proposta foi acompanhada de um relatório (2) que expõe a situação actual e as vantagens e desvantagens das diversas alternativas possíveis, bem como de um anexo técnico (3) que aborda os aspectos econométricos e contém informações pormenorizadas de carácter contabilístico, matemático e económico.

1.3

O Comité pretende, pois, concentrar a sua atenção nos aspectos directamente ligados à equidade das contribuições e aos mecanismos de contribuição e de distribuição dos custos e dos benefícios entre os Estados-Membros, consciente, por outro lado, de que os tecnicismos de difícil compreensão podem, por vezes, obscurecer a importância económica ou política das suas implicações. O conceito inspirador da «equidade» do mecanismo de recursos próprios é, por outro lado, difícil de definir de uma forma inequívoca, já que para ele concorrem elementos objectivos e subjectivos. Enquanto, por exemplo, o nível de prosperidade é mensurável, os benefícios indirectos decorrentes da pertença à União são mais difíceis de avaliar. O resultado final dependerá, em todo o caso, dos equilíbrios que for possível alcançar no termo das negociações a nível do Conselho, que, desde já, não se adivinham fáceis.

1.3.1

A qualidade das soluções será a prova de que se alcançou um justo equilíbrio entre dois princípios: por um lado, o princípio do «justo retorno», segundo o qual cada Estado-Membro espera que a sua contribuição seja proporcional à soma dos benefícios — nem todos quantificáveis — resultantes da adesão à União; por outro, o princípio da solidariedade, que implica a flexibilidade necessária para conceder mais — ou exigir menos — tomando em consideração as necessidades de toda a colectividade. Além disso, há que ter em conta que estes princípios são geralmente aceites, sendo todavia interpretados por cada Estado-Membro de acordo com a sua apreciação dos mesmos. Cada governo procura proteger as suas próprias finanças, e sabe que a opinião pública do seu país desempenha, muitas vezes, um papel determinante nas suas decisões. A realização de acordos satisfatórios para todos e para cada um dependerá da aceitação de soluções imbuídas de um espírito de verdadeiro «federalismo financeiro».

2.   A situação actual

2.1

A existência de recursos próprios é uma característica específica da União Europeia e constitui um dos elementos de afirmação da personalidade autónoma da Comunidade, o que implica que esta deve dispor de meios de financiamento próprios e não dependentes dos Estados-Membros. Neste contexto, os recursos próprios da Comunidade podem ser definidos como receitas que lhe são atribuídas para o financiamento do seu orçamento e lhe cabem por direito próprio, sem necessidade de outras decisões das autoridades nacionais.

2.2

Segundo os critérios inspiradores, enunciados pelo Conselho Europeu de Berlim de 24 e 25 de Março de 1999, o sistema de recursos próprios da Comunidade deve ser equitativo, transparente e rentável e basear-se em critérios que exprimam da melhor forma possível a capacidade de contribuição de cada Estado-Membro. Esta declaração, absolutamente óbvia, foi ignorada em diversos aspectos e em várias ocasiões.

2.3

A decisão do Conselho de constituir recursos próprios remonta a 21 de Abril de 1970, tendo sido posteriormente integrada e alterada por uma decisão de 24 de Junho de 1988 e, por último, pelo Conselho de Berlim de 1999. Em síntese, neste momento os recursos próprios são de três tipos:

recursos próprios tradicionais (RPT): constituídos essencialmente por direitos alfandegários e direitos niveladores agrícolas;

recursos baseados no IVA: trata-se de uma taxa — inicialmente fixada em 1 % e posteriormente alterada — sobre as receitas nacionais provenientes do IVA, calculadas numa base estatística «teórica»harmonizada; essa base não pode, em todo o caso, exceder 50 % do Rendimento Nacional Bruto (RNB);

recursos baseados no RNB: taxa proporcional ao RNB de cada Estado-Membro; não existe um limite por país, mas foi estabelecido um «tecto» que limita o montante total de todos os recursos próprios da Comunidade a 1,24 % do RNB de toda a União.

2.3.1

Em 1996, o total dos RPT e dos recursos provenientes do IVA representava mais de 70 % das receitas; em 2003, essa percentagem tinha passado para 38 %, e os cálculos da Comissão prevêem nova redução para cerca de 26 %, tanto em 2004 como no ano em curso, o que é revelador da tendência para uma redução progressiva que evidencia o correspondente aumento da importância relativa dos recursos baseados no RNB (o chamado «quarto recurso»).

2.4

O mecanismo do quarto recurso foi alterado por decisão do Conselho de 7 de Maio de 1985. Reconhecendo-se que ao Reino Unido teria correspondido uma quota demasiado elevada em relação às suas capacidades contributivas, decidiu-se que se reembolsaria aquele país em 2/3 da sua contribuição líquida. Esta decisão sofreu, ao longo do tempo, diversas alterações. A Comissão observa que as sucessivas variações tornaram o mecanismo cada vez mais complexo e menos transparente.

2.4.1

A decisão de proceder a um «ajustamento» já fora, de resto, tomada pelo Conselho de Fontainebleau de 1984, ainda que em termos genéricos, que pareciam implicar uma orientação de carácter geral segundo a qual «qualquer Estado-Membro que suporte um ónus orçamental excessivo em relação à sua prosperidade relativa pode beneficiar de uma correcção a conceder no momento oportuno». O Reino Unido foi o único beneficiário da «correcção» a partir do ano seguinte (decisão de Fontainebleau) e continua a sê-lo: o montante anual atribuído a este país a titulo de reembolso (média dos anos 1997-2003) é de cerca de 4,6 mil milhões de euros. O Comité interroga-se sobre o significado da expressão «no momento oportuno», que parecia implicar uma medida de carácter temporário sujeita a verificação periódica (o que não aconteceu). Interroga-se ainda se, ao tempo, não haveria outros Estados, para além do Reino Unido, em condições de beneficiarem de uma correcção análoga.

2.4.2

A noção de ónus orçamental excessivo deveu-se, em parte, ao facto de, naquela altura, o Reino Unido ocupar o último lugar na classificação (4) do Rendimento Nacional Bruto (RNB) por habitante em relação à média europeia (100): 90,6, contra 92,6 (Itália), 104 (França) e 109,6 (Alemanha). Hoje, a classificação inverteu-se (dados de 2003): o Reino Unido ocupa, com efeito, o primeiro lugar, com um PNB de 111,2, igual ao da Dinamarca, enquanto a França atinge 104,2, a Alemanha 98,6 e a Itália 97,3. Foi também tido em conta o facto de a contribuição do Reino Unido baseada no IVA ser demasiado elevada, retirando este país benefícios relativamente reduzidos das contribuições da política agrícola e da política regional. O Reino Unido surgia, pois, como o primeiro contribuinte líquido para o orçamento comunitário, uma situação desequilibrada que exigia correcção, como efectivamente aconteceu.

2.4.3

O reembolso a favor do Reino Unido foi suportado, e continua a sê-lo, pelos demais Estados-Membros, na proporção do respectivo PNB. O Reino Unido está obviamente excluído deste cálculo. A regra da relação com o PNB foi objecto de um importante ajustamento em 1999, quando foi concedida a quatro dos maiores contribuintes (em termos relativos) para o orçamento (Alemanha, Países Baixos, Áustria e Suécia) uma redução de 75 % sobre os montantes devidos por estes países a título da correcção. Resulta deste novo sistema contributivo que a França e a Itália em conjunto financiam 52 % da correcção a favor do Reino Unido.

2.4.4

A manter-se o sistema actual, a evolução prevista para o período 2007-2013 conduziria a uma situação paradoxal, ou seja, a correcção britânica aumentaria, em média, 50 %, o que faria do Reino Unido o menor contribuinte líquido, aumentando assim substancialmente o ónus suportado pelos outros Estados-Membros, incluídos os de adesão recente (5), isto sem contar com o facto de a prevista extensão do mecanismo a outros países (ver ponto 3.6) exigir, na opinião do Comité, uma actualização das regras. Torna-se, pois, evidente que o mecanismo de correcçãocaso se confirme a sua necessidade (ver ponto 3.6.4)deveria, em todo o caso, ser reformado, como é, de resto, intenção da Comissão, e substituído por outro que, respeitando os critérios de Fontainebleau, conduza a soluções equitativas e transparentes.

3.   A proposta da Comissão: observações sobre os principais artigos

3.1

Artigo 2. o : recursos próprios — A alínea a) do n.o 1 retoma, com algumas alterações, o sistema actual. As receitas do primeiro tipo (RPT) — ver ponto 2.3 — são essencialmente constituídas por direitos niveladores, prémios, montantes suplementares ou compensatórios, direitos aduaneiros estabelecidos sobre as trocas comerciais com países terceiros e quotizações e outros direitos no sector do açúcar. A título de despesas de cobrança, os Estados-Membros retêm 25 % dos montantes devidos. Uma dedução desta magnitude exige um esclarecimento. Inicialmente, a percentagem de redução era de 10 %, tendo passado para 25 % em 1999, altura em que foi definida, pela primeira vez, como «despesas de cobrança». Tratou-se, obviamente, de uma correcção atípica de que foram principais beneficiários os Países Baixos e o Reino Unido, o que constitui um exemplo de falta de transparência dos procedimentos.

3.1.1

As receitas provenientes dos RPT em percentagem do total das receitas comunitárias estão em declínio constante (os dados relativos a este ponto, bem como os demais que se seguem, foram extraídos do relatório da Comissão «Financia-mento da União Europeia»  (6)). Passaram, com efeito, de 19 % em 1996 para 11,4 % em 2003. Os cálculos e as estatísticas necessários para determinar os montantes devidos implicam uma utilização de recursos e despesas consideráveis, mesmo com a redução dos direitos alfandegários.

3.1.1.1

O CESE interroga-se sobre se, efectivamente, valerá a pena manter este sistema contributivo, ou se, ao invés, será mais conveniente reduzir drasticamente a sua importância, substituindo-o por um ajustamento das taxas aplicáveis ao RNB. Por outro lado, o CESE verifica que a Comissão adoptou uma orientação exactamente oposta, com base no entendimento de que os recursos fiscais pertencem naturalmente à União, não tencionando alterar esta linha de abordagem, tanto mais que a mesma parece contar com o apoio da maioria dos Estados-Membros.

3.2

A alínea b) do n. o 1 prevê a aplicação de uma taxa uniforme à matéria colectável do IVA harmonizada, válida para todos os Estados-Membros. A matéria colectável a ter em conta é limitada a 50 % do RNB para cada Estado-Membro. A taxa uniforme é fixada no n.o 4 em 0,30 %. A diminuição da importância relativa desta entrada para o orçamento comunitário é significativa: de 51,3 % em 1996 passou para cerca de 14 % (previsão) em 2004 e 2005.

3.2.1

O CESE criticou por diversas vezes o sistema de IVA, que, mais marcadamente ainda do que os RTP, impõe elevadas despesas de cobrança, de administração e de controlo. Segundo o OLAF, o IVA é, por outro lado, «o imposto em relação ao qual a evasão é maior», com os consequentes prejuízos para o orçamento comunitário (prejuízos compensados, de resto, pelo aumento da taxa sobre o RNB).

3.2.2

Também neste caso, o CESE interroga-se sobre a racionalidade da manutenção desta imposição, que parece, de resto, merecer as preferências da Comissão, ainda que tencione transformá-la num verdadeiro recurso fiscal, como inicialmente previsto. Devia ser possível ajustar a percentagem cobrada sobre o RNB de forma a que os recursos próprios provenientes do IVA sejam substituídos pelos recursos provenientes da cobrança sobre o RNB. Dada a relação estreita que existe entre os recursos IVA e o volume do RNB, não devia haver uma modificação significativa da repartição das contribuições entre os países. No entanto, os cálculos estatísticos e a cobrança da contribuição proveniente do IVA para os recursos comunitários terminariam. No citado relatório sobre o financiamento da União (ver ponto 3.1.2), a Comissão encarou, com efeito, a hipótese de uma supressão do recurso IVA, tendo chegado, porém, a uma conclusão negativa.

3.2.2.1

O CESE está consciente da complexidade do problema, mas considera que, antes de uma decisão final, vale a pena aprofundar os estudos sobre a natureza e os numerosos defeitos deste imposto, que o CESE analisou em diversas ocasiões. Para além do que afirmou no ponto anterior, o Comité recorda que existe, há décadas, um «regime provisório» de IVA.

3.3

A alínea c) do n. o 1 constitui o elemento mais importante da proposta: prevê uma taxa a aplicar à soma dos RNB de todos os Estados-Membros «a fixar no âmbito do processo orçamental». Este procedimento é matéria especializada sobre a qual o Comité não se pronuncia, mas sublinha que esta imposição está a tornar-se, proporcionalmente, cada vez mais importante em relação aos outros tipos de recursos e apresenta, nomeadamente, a vantagem de ser, de longe, a que implica uma administração menos onerosa entre as diversas fontes de financiamento. No anexo ao seu relatório, a Comissão lembra que o custo administrativo é um dos critérios a ter em conta, mas não o único, e não necessariamente o principal. O CESE toma boa nota desta observação, chamando a atenção para o facto de que, em matéria de contribuição para o orçamento, o respeito dos princípios tem, não raras vezes, de passar para segundo plano face a considerações de carácter económico.

3.4

As três fontes acima referidas (alíneas a), b) e c) do n.o 1) constituem uma combinação (que integra os «outros impostos ou taxas que venham a ser instituídos», previstos no n.o 2) que pode variar consideravelmente de ano para ano. Há muito que o Conselho e a Comissão se interrogam sobre se tal sistema deve, ou não, ser mantido. No já citado relatório sobre o financiamento da União (7), a Comissão estuda a forma de encontrar a melhor estrutura, analisando três opções: manutenção do sistema actual, adopção de um sistema de financiamento puramente baseado no RNB e adopção de um sistema mais marcadamente baseado nas receitas fiscais. É provável que esta questão seja examinada no próximo ano, a fim de se chegar a uma decisão definitiva. O Comité espera ser mantido ao corrente dos progressos realizados, mas alerta para a tendência, que parece ressaltar dos estudos já realizados, para se adoptar uma abordagem puramente técnico-contabilística que descura os aspectos políticos das opções.

3.4.1

Entre os «outros impostos ou taxas que venham a ser instituídos» a que se alude no ponto anterior, ou mesmo em substituição do recurso IVA, foi aventada a hipótese de uma taxa sobre a energia poluente, que reverteria a favor do orçamento comunitário, sendo todavia investida especificamente na melhoria do ambiente. O CESE opõe-se a tal solução, dado não existir qualquer regra que permita destinar uma parte das contribuições a fins específicos, além de que a situação política internacional não permite que se tomem decisões susceptíveis de influir nas dinâmicas futuras.

3.5

Artigo 3. o : recursos e dotações para autorizações — Este artigo institui um «tecto» para receitas e despesas: no que respeita aos recursos próprios, esse tecto é fixado em 1,24 % da soma dos RNB dos Estados-Membros e, no que toca às dotações para autorizações, em 1,31 %. O equilíbrio deve ser assegurado através de receitas de outro tipo. Em matéria de despesas, os debates entre Estados-Membros revelam a existência de tendências diferentes no que se refere à determinação do tecto máximo previsto nas chamadas perspectivas financeiras. O êxito dependerá dos equilíbrios que for possível encontrar entre a posição dos que defendem um papel mais relevante da Comissão e programas ambiciosos de progresso económico-social, que exigirão novos e mais amplos recursos, e a dos que, pelo contrário, são favoráveis a uma maior autonomia dos Estados-Membros e a políticas de consolidação que implicariam a manutenção do status quo, ou mesmo uma (improvável) redução dos recursos actuais. Em todo o caso, será necessário dedicar especial atenção aos problemas dos novos Estados-Membros. As orientações futuras serão, em grande medida, determinadas pela aceitação de dois conceitos que se poderiam definir como «solidariedade global» e «desenvolvimento global», conceitos fáceis de enunciar, mas nada fáceis de traduzir em termos de orçamento.

3.6

N. o 1 do artigo 4. o : mecanismo «generalizado de correcção» (MGC) — A decisão de Fontainebleau relativa ao Reino Unido passa a ser a norma geral, estabelecendo que o MGC será aplicado a qualquer Estado-Membro que registe um défice orçamental superior a um limiar equivalente a uma certa percentagem do seu RNB, limiar esse que não está claramente indicado na proposta, mas que o relatório introdutório que a acompanha fixa em — 0,35 % do RNB. Por outro lado, a soma de todas as correcções não pode ultrapassar «o volume de reembolso máximo disponível». O cálculo das correcções e do montante disponível será efectuado pelo Conselho com base no processo previsto no n.o 2 do artigo 279.o do Tratado CE. As correcções serão estabelecidas pelo Estado-Membro interessado, calculando a diferença entre o total dos pagamentos e o total dos montantes recebidos, e multiplicando essa diferença pelo total das despesas repartidas. Se o resultado obtido for positivo, será multiplicado por uma taxa de restituição fixada num nível máximo de 66 % do total dos pagamentos, efectuando-se, «se for caso disso», uma redução proporcional, de modo a respeitar o volume disponível máximo de restituições. A fórmula é dificilmente compreensível e o seu resultado ainda mais dificil de controlar, o que, se não constitui um exemplo adicional de falta de transparência, é certamente revelador da necessidade de simplificação.

3.6.1

O CESE verifica que as dúvidas colocadas no ponto 2.4.1 e as propostas apresentadas no ponto 2.4.4 tiveram efectivamente resposta através da extensão a todos os Estados-Membros de uma medida que, embora justificável, se limitava a um Estado-Membro e para a qual não fora fixada data de caducidade. O CESE salienta, por outro lado, que o MGC transformou o conceito de «ónus excessivo» numa abordagem de carácter matemático-contabilístico que, se por um lado tem a vantagem de eliminar avaliações subjectivas, por outro não tem em conta aspectos que se poderiam considerar de carácter «quase qualitativo», e que são, para além do rendimento per capita, a competitividade, o nível de protecção social e a economia subterrânea. Por outro lado, se é verdade que os números por si sós não reflectem a situação real de um país, uma norma generalizada que tivesse em conta elementos de apreciação estranhos poderia introduzir aspectos de subjectividade não compatíveis com as exigências de transparência. Resta aceitar o MGC na sua forma actual, com a consciência de que a sua aplicação nem sempre conduzirá aos melhores resultados.

3.6.2

O n.o 1 do artigo 4.o tem a vantagem de eliminar a contribuição directa dos Estados-Membros destinada a cobrir o montante da «correcção», fazendo-a passar pelo orçamento comunitário. Deste modo, pôr-se-ia fim a um sistema que nada tinha de lógico e que, em todo o caso, não era transparente. O relatório da Comissão contém uma profusão de cálculos — nem sempre de fácil compreensão — e de considerações cuja leitura ajuda a compreender o alcance da proposta de decisão. Entre as informações que ajudam a entender o alcance do MGC, conta-se a de que a aplicação de um limiar de — 0,35 % do RNB gerará um nível médio estimado de correcções brutas equivalente a cerca de 7 mil milhões de euros. A aplicação do MGC em conjugação com a alteração das regras de financiamento significa, na opinião da Comissão, que o nível da correcção no âmbito do actual sistema«é de alguma forma desvanecido». Com a adopção do sistema e dos parâmetros propostos, os cálculos da Comissão conduzem a resultados quantitativos, indicados em quadros que comparam as diferentes alternativas, a apresentar aos Estados-Membros para avaliação e decisão. O CESE não dispõe dos elementos necessários para entrar no cerne de uma matéria tão complexa.

3.6.3

O CESE gostaria de chamar novamente a atenção para duas considerações que poderiam pôr em causa o próprio MGC. Em primeiro lugar, trata-se de um mecanismo rígido e sem limites temporais. A este propósito, o Comité observa que é perigoso estabelecer regras com base na situação actual, que poderá vir a alterar-se radicalmente. O Pacto de Estabilidade e Crescimento é disso prova evidente. Em segundo lugar, poderia não ser racional impor contribuições posteriormente sujeitas a «correcções», que seria mais correcto designar por «restituições» em nome do princípio da transparência.

3.6.4

Por último, o CESE recorda que, num parecer recente (8), manifestou sérias reservas quanto à instituição do MGC, e interroga-se, em todo o caso, se não seria de alterar radicalmente o conceito de «correcção», passando o MGC a ser parte integrante dos critérios de contribuição. Mais explicitamente, os parâmetros propostos para o MGC deveriam fazer parte do cálculo da contribuição. A Comissão já adoptou na prática este procedimento, que seria conveniente institucionalizar conjuntamente com uma cláusula de revisão periódica, por exemplo, de sete em sete anos.

3.7

Alínea a) do n. o 2 do artigo 4. o : a correcção do Reino Unido — Este número prevê uma medida transitória, segundo a qual o Reino Unido, para além das correcções referidas no número anterior, mantém os direitos de «Fontainebleau» até 2011, de acordo com uma escala decrescente: 2 mil milhões de euros em 2008; 1,5 mil milhões de euros em 2009; 1,0 mil milhões de euros em 2010; 0,5 mil milhões de euros em 2011. Estes montantes seriam desvinculados do MGC e, na prática, continuariam a ser financiados de acordo com as regras actuais, segundo as quais o Reino Unido não participa no financiamento e a parte correspondente à Alemanha, Países Baixos, Áustria e Suécia limita-se a 25 % da sua parte normal (ver pontos 2.4.3 e 2.4.4). A Comissão considera que estas novas disposições deverão atenuar o impacto financeiro da introdução do MGC para o Reino Unido em quatro fases graduais. Nos últimos anos (período 1997-2003), o Reino Unido beneficiou de uma correcção líquida média de 4,5 mil milhões de euros, enquanto que, com o MGC, deveria receber uma média de 2,1 mil milhões de euros anuais. As medidas transitórias propostas elevam o montante médio anual global (Fontainebleau mais MGC) para 3,1 mil milhões de euros.

3.7.1

A disposição preconizada resulta claramente da combinação de diversos elementos: tomada em consideração de situações anteriores, necessidade de transparência e oportunidade política. Não é, certamente, a primeira vez que se introduzem derrogações às regras comuns. Tanto os tratados antigos como os actuais são prova disso. Para os observadores externos e não directamente interessados, poderá ser difícil aceitar as regras que estão a ser ponderadas, mas a realidade com que estamos confrontados poderá porventura aconselhar aos responsáveis pela tomada de decisões a apresentação de soluções equilibradas, mas sobretudo transparentes e bem motivadas. Neste caso, além do compromisso entre «justo retorno» e solidariedade a que se alude no ponto 1.4, é necessário que os negociadores dêem provas de uma particular sensibilidade política que tenha em conta a opinião pública da Europa e, especialmente, dos países de adesão recente.

3.8

Alínea b) do n. o 2 do artigo 4. o : gradualidade na introdução do MGC — A regra que introduz o MGC deveria ter uma aplicação gradual: a taxa máxima de restituição de 66 % referida no n.o 1 do artigo 4.o (ver ponto 3.6) apenas se aplicaria a partir de 2011; no momento da sua introdução, em 2008, seria de 33 %, passando para 50 % em 2009 e 2010 e atingindo o seu valor definitivo no ano seguinte. A Comissão observa que esta medida é necessária «a fim de compensar o custo mais elevado causado pelos novos pagamentos propostos efectuados ao Reino Unido, de forma a limitar os custos globais de financiamento durante o período transitório». Trata-se de um sinal claro das dificuldades que a Europa enfrenta e que seria condenável esconder aos cidadãos. O CESE não pode deixar de reiterar, reforçando-as, as observações formuladas no ponto 3.7.1 supra.

3.9

Artigo 5. o : procedimentos contabilísticos relativos às correcções — O encargo financeiro das correcções será assumido por todos os Estados-Membros em função da parte respectiva no total do RNB da União. A correcção será concedida ao Estado-Membro que a ela tenha direito mediante redução dos seus pagamentos, enquanto o encargo financeiro assumido por todos os Estados-Membros é acrescentado aos respectivos pagamentos resultantes da aplicação de uma taxa à soma dos RNB de todos os Estados-Membros. O CESE não formula qualquer observação específica: uma vez aceite o mecanismo, a sua aplicação não pode ser diferente.

3.10

Artigos 6. o , 7. o e 8. o : procedimentos não contabilísticos relativos aos recursos próprios — Tão-pouco estas regras suscitam observações específicas, já que são conformes aos princípios gerais da contabilidade pública: proibição de atribuir receitas a rubricas de despesas específicas, transição dos excedentes para os anos seguintes, modalidades de cobrança dos recursos próprios.

3.11

Artigo 9. o : alteração da estrutura de recursos próprios — Nos termos deste artigo — caso seja aprovado — a Comissão compromete-se a apresentar um sistema de recursos próprios verdadeiramente baseado nos impostos, que deverá entrar em vigor em 1 de Janeiro de 2014.

3.11.1

O já referido relatório sobre o financiamento da União (9) contém uma análise pormenorizada desta questão. Em síntese, a Comissão pretende propor uma redução radical da contribuição do RNB, substituindo-a por um aumento correspondente da contribuição baseada nos impostos. Numa síntese levada ao extremo — e necessariamente simplista — consideram-se três alternativas: tributação do consumo de energia, imposição real e não estatística sobre o IVA e imposto sobre as sociedades. A substituição parcial do quarto recurso por um regime «fiscal» teria, segundo a Comissão (ponto 4.1 (3) do relatório) a vantagem de aumentar a visibilidade da Europa junto dos cidadãos e de criar uma ligação directa com eles. Hoje, ao invés, em virtude do peso preponderante do quarto recurso, os Estados-Membros e, em particular, os contribuintes líquidos tendem a julgar as políticas e as iniciativas da Europa exclusivamente em termos de dotações nacionais, prestando pouca atenção à substância das políticas comunitárias e correndo o risco de subestimar o seu «valor acrescentado».

3.11.2

O CESE reitera as observações anteriormente formuladas sobre o mencionado relatório, que exige particular atenção, mas que o Comité considera transitório e merecedor de aprofundamento. Sem entrar na análise das três hipóteses de tributação mencionadas no ponto precedente (a primeira das quais parece, à primeira vista, ser de descartar (10)), chama a atenção para a observação da Comissão a que se alude no ponto anterior, que ilustra bem a fundamentação do artigo 9.o. O Comité considera que a introdução de uma taxa «europeia» aplicável aos cidadãos, com base na convicção de que isso os aproximaria da Europa e esta ganharia em «visibilidade», poderia produzir precisamente o efeito contrário. A crítica da Comissão à atitude dos Estados-Membros — que o CESE subscreve — poderia, por analogia, aplicar-se também aos cidadãos.

3.11.3

O CESE regista que a intenção da Comissão não é propor um aumento dos impostos, mas sim indicar claramente aos contribuintes a parte dos impostos que se destina ao fisco nacional e a que é reservada ao financiamento da União. Apesar desta clarificação, o CESE mantém as suas reservas. Se, por um lado, a indicação explícita de uma «taxa europeia» poderia contribuir para uma maior transparência sem aumento do encargo global para o contribuinte, por outro não se pode ignorar que parte dos cidadãos de diversos países ainda se mostra hostil ao ideal «europeu», ou, pelo menos, não está devidamente informado sobre o mesmo. Uma «taxa europeia» poderia — ainda que impropriamente — constituir mais um argumento a desfavor.

3.12

O ponto anterior conclui as observações do CESE sobre o documento da Comissão. Submete-se, todavia, à atenção dos órgãos de decisão uma reflexão adicional como contributo para um futuro reexame da matéria. Uma abordagem com soluções transparentes e de simples aplicação poderia, no entender do CESE, consistir em:

uma contribuição bruta determinada com base no RNB per capita (o CESE já tinha chamado a atenção para este ponto no seu parecer sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Construir o nosso futuro em comum — Desafios políticos e recursos orçamentais da União alargada para 2007-2013» (11));

uma contribuição líquida calculada com base na contribuição bruta e corrigida pelo MGC, que passaria, portanto, a ser parte integrante do mecanismo contributivo, sem necessidade de restituições ou ajustamentos a posteriori.

Uma abordagem deste tipo, ainda que certamente susceptível de ulteriores aperfeiçoamentos e correcções, teria, nomeadamente, a vantagem de reflectir em permanência a situação de cada país, sem necessidade de revisões da estrutura contributiva.

4.   Conclusões

4.1

O CESE está consciente de que as decisões finais, que serão certamente influenciadas por considerações de carácter político, continuam a caber aos Estados-Membros. O Comité formula as observações e propostas que precedem na sua qualidade de representante da sociedade civil, ou seja, de quem, afinal, suporta o encargo das contribuições para o orçamento europeu, na esperança de que as mesmas possam ser tomadas em consideração.

4.2

A sociedade civil e, em última análise, o cidadão europeu, constata que o mecanismo de contribuição para os recursos próprios da União é pouco conhecido e, sobretudo, não é transparente. Menos transparente ainda se afigura um MGC entendido como restituição de contribuições já efectuadas, a cargo, não do orçamento, mas de outros Estados-Membros. Se efectivamente se pretende «aproximar o cidadão da Europa», os Estados-Membros devem estar conscientes das responsabilidades que lhes cabem no que se refere ao seguinte objectivo, repetidamente reafirmado e proclamado: a comunicação deve basear-se na clareza e na acessibilidade da linguagem. Mais do que à Comissão, esta missão cabe aos governos nacionais, ou seja, às únicas entidades que estão em condições de comunicar com os cidadãos, cuja mentalidade e necessidades conhecem. A credibilidade da Europa é, em definitivo, uma responsabilidade específica das autoridades nacionais.

4.3

Se esta condição se verificar, a proposta de criação de um sistema contributivo baseado numa fiscalidade «europeia» poderia ter um fundamento racional. Caso contrário, o mecanismo proposto parece ser, pelo menos, prematuro.

Bruxelas, 12 de Maio de 2005.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  JO L 253 de 7.10.2000, pág. 42.

(2)  COM(2004) 505 final.

(3)  COM(2004) 505 final, Vol. II.

(4)  Ver Quadro 1, pág. 3, do documento da Comissão COM(2004) 501 final.

(5)  Ver Quadro 4 do documento supracitado.

(6)  COM(2004) 505 final.

(7)  COM(2004) 505 final.

(8)  Parecer do CESE sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu – Construir o nosso futuro em comum — Desafios políticos e recursos orçamentais da União alargada para 2007-2013» — JO C 74 de 23.03.2005, ponto 5.5.1.

(9)  COM(2004) 505 final, de 14.07.2004.

(10)  Uma taxa sobre a energia é anacrónica na situação actual e no futuro (ver parecer do CESE sobre «A política fiscal da União Europeia – prioridades para os próximos anos» — JO C 48, de 21.02.2002, ponto 3.1.2.1.1). A propósito da taxa sobre a energia que seria destinada à protecção do ambiente, o CESE salientou repetidamente que «a introdução de impostos e taxas com incidência ambiental não deveria comprometer a competitividade das empresas europeias nem provocar a diminuição de empregos, sobretudo nos ramos com uma utilização mais intensiva de energia».

(11)  JO C 74 de 23.03.2005, pág. 32, ponto 5.5.


ANEXO

A proposta de alteração seguinte foi rejeitada durante o debate:

Ponto 3.1.1.1

Suprimir.

Justificação

O cálculo das receitas aduaneiras e os custos resultantes para a administração das alfândegas mantêm-se iguais, ainda que as receitas em questão não contribuam para os recursos próprios da UE. Dado que a política comercial é da competência da UE, é natural que todos os seus elementos se inscrevam no quadro da política comunitária, incluindo a cobrança dos direitos alfandegários e das receitas aduaneiras.

Resultado da votação:

Votos a favor: 38

Votos contra: 51

Abstenções: 18


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