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Parecer do Comité Económico e Social sobre «O recurso ao princípio de precaução»

Jornal Oficial nº C 268 de 19/09/2000 p. 0006 - 0011


Parecer do Comité Económico e Social sobre "O recurso ao princípio de precaução"

(2000/C 268/04)

Em 2 de Março de 2000, o Comité Económico e Social decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 3 do artigo 23.o do Regimento, elaborar um parecer sobre "O recurso ao princípio de precaução".

A Secção de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 21 de Junho de 2000 (Relator: A. Bedossa).

Na 374.a reunião plenária de 12 e 13 de Julho de 2000 (sessão de 12 de Julho), o Comité Económico e Social adoptou, por 101 votos a favor, 2 votos contra e 1 abstenção, o seguinte parecer.

1. A Comunicação da Comissão

1.1. Resumo

1.1.1. A Comunicação da Comissão sobre o princípio de precaução dá seguimento, inter alia, ao convite do Conselho à Comissão, de 13 de Abril de 1999, "a deixar-se nortear, de futuro, ainda mais, pelo princípio da precaução ao preparar propostas legislativas e nas suas outras actividades relacionadas com os consumidores, bem como a desenvolver prioritariamente orientações claras e eficazes destinadas à aplicação deste princípio".

1.1.2. A Comunicação tem por objectivo traçar as linhas gerais da abordagem da Comissão para o uso deste princípio, tanto na União Europeia como a nível internacional. Procura igualmente contribuir para o debate em curso sobre este assunto, tanto na Comunidade como à escala internacional.

1.1.3. O princípio de precaução deve ser considerado no âmbito de uma abordagem estruturada da análise dos riscos, a qual inclui três elementos: a avaliação de riscos, a gestão de riscos e a comunicação de riscos. A Comissão considera que esse princípio é particularmente relevante no que se refere à gestão de riscos: confrontados com uma situação em que foram identificados os efeitos potencialmente perigosos decorrentes de um fenómeno, de um produto ou de um processo e em que a avaliação científica preliminar não permite a determinação do risco com suficiente segurança, cabe às instâncias políticas de decisão determinar qual é o nível de risco aceitável para a sociedade. Face a uma situação desse tipo, as instâncias de decisão podem invocar o princípio de precaução, o que se pode traduzir por uma decisão de actuar ou de não actuar.

1.1.4. Sempre que se considerar necessária uma actuação, as medidas baseadas no princípio de precaução devem corresponder a uma série de condições, como a proporcionalidade, a não-discriminação, a coerência, a análise das vantagens e dos encargos, a análise do progresso científico, etc.

1.1.5. A nível comunitário, a única referência jurídica expressa ao princípio de precaução encontra-se no artigo 174.o (Ambiente) do Tratado CE. No entanto, a Comissão considera que este princípio é um princípio de aplicação mais geral, que deve ser tido em conta, no âmbito da gestão de riscos, nos domínios da saúde das pessoas e da segurança dos consumidores.

1.1.6. A nível internacional, as referências jurídicas são mais numerosas. Constam, nomeadamente, da Declaração do Rio, da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, da Convenção sobre a Diversidade Biológica, bem como do Protocolo sobre Biossegurança. Na OMC, esse princípio tem um âmbito muito concreto no quadro do Acordo sobre a aplicação de medidas sanitárias e fitossanitárias (Acordo SPS) e do Acordo sobre os obstáculos técnicos ao comércio (Acordo OTC).

1.1.6.1. No quadro do Codex alimentarius, com a participação activa da Comissão, está em curso um debate sobre a definição de critérios de análise de risco no domínio alimentar, incluindo nomeadamente de disposições sobre o princípio de precaução.

2. Observações preliminares

2.1. No dealbar do século XXI, a aceitabilidade do risco impõe novos modelos de regulação. O perigo induz o medo, mas o risco não é o perigo, o risco corre-se quando se pode evitar o perigo. O surgimento da noção de risco na cultura ocidental é testemunho de uma profunda transformação na relação com o perigo: pode-se decidir, de forma inteiramente racional, correr determinados perigos. O risco não vai de par com o medo, mas sim com a coragem.

2.2. Pode-se analisar a actual situação de duas maneiras. Perante os riscos, a prova contemporânea é a da catástrofe. Ao passo que nos séculos XIX e XX a obsessão era o acidente, o período contemporâneo está confrontado com uma alteração na natureza dos riscos: passou-se do acidente à catástrofe. Estas catástrofes são naturais e climáticas. No caso em apreço, são tecnológicas e, também, cada vez com mais frequência, sanitárias.

2.3. É notável constatar como as problemáticas ambientais passaram da questão da defesa da natureza a preocupações sanitárias.

2.4. A mudança da natureza dos riscos não deixa de ter efeito sobre a natureza dos danos. Os danos de dimensões catastróficas superam actualmente não só a capacidade de se assegurar contra eles, como sobretudo a capacidade de se ser indemnizado. Isto põe em causa o grande pacto social do século XX, o princípio que afirma que o risco aceitável é um risco indemnizável.

2.5. Os riscos ultrapassam a capacidade de indemnização, mas também envolvem um elemento de irreversibilidade. É a tese do desenvolvimento sustentável, que estabelece como norma limitar a sua acção à possibilidade de recuar. Em nenhuma das nossas acções devemos comprometer definitivamente as gerações futuras.

2.6. O sentimento de medo suscita o problema da relação social numa sociedade que se descobre como profundamente assimétrica, devido às técnicas que utiliza. A sociedade tecnológica não se pode referir a um modelo contratual, devido às relações de desigualdade que a técnica introduz. Estamos numa sociedade não igualitária, em que o risco introduz a assimetria. É este o motivo por que se coloca, com tanta acuidade, o problema da responsabilidade daqueles que manipulam o risco, bem como da confiança que neles podemos depositar.

2.7. Isto conduz à problemática da decisão. É a questão colocada pela Comunicação da Comissão: o que é um risco aceitável? Quando é que se pode correr um risco? O vocabulário escolhido é agora o da precaução. A precaução distingue-se da noção de prevenção. Para adoptar, frente a um risco, uma atitude de prevenção, é preciso poder avaliar o risco: só existe prevenção em relação a um risco que se pode avaliar ou controlar.

2.8. A precaução designa a atitude que se exige a alguém a quem se diz que, para além do risco que se impõe controlar e avaliar, deve correr um risco que ainda não pode conhecer, mas que é susceptível de, no futuro, se revelar, numa nova fase da ciência. Uma dimensão do risco contemporâneo consiste em que está ligado a uma extraordinária dilatação do tempo. É, portanto, a deslocação de uma problemática da segurança técnica para uma problemática da segurança ética.

2.9. Através da multiplicação dos processos, através da emoção contemporânea que o risco suscita, através dos debates que mereceriam algum rigor científico, procuram-se a ética e o direito, para este novo mundo que vai ser o do século XXI.

2.10. A precaução é um elemento essencial de qualquer "processo" de "análise do risco". O princípio de precaução, como elemento deste processo, é uma abordagem à gestão do risco que é utilizada quando há um risco desconhecido de perigo potencialmente significativo, enquanto se aguardam ulteriores resultados da investigação científica.

2.11. Que conteúdo se pode dar ao princípio de precaução? Um triplo conteúdo:

- Em primeiro lugar, a precaução exige maiores esforços para desenvolver os conhecimentos;

- A precaução supõe introduzir elementos de vigilância científica e técnica para aceder a novos conhecimentos e compreender as suas implicações;

- Por fim, a precaução implica a organização de um amplo debate social sobre o que é desejável e o que viável.

2.12. O regresso da confiança passa pelo estabelecimento de um dispositivo de controlo dos conhecimentos acima de toda a suspeita. Há que estruturar o controlo científico, que tem como objectivo a identificação dos indícios fracos. Sem capacidade de tratar os indícios fracos, o decisor só pode reagir em termos de tudo ou nada e, no contexto da saúde pública actual, vai provavelmente reagir: a população não exige um risco zero, mas exige que os conhecimentos sobre os factores de risco sejam tomados em conta, sem demora.

2.13. Cabe aos poderes públicos criar as condições para um debate que permita aos interlocutores sociais confrontar dados objectivos sobre os riscos sanitários, as previsões sobre a eficácia real das acções de prevenção e a expressão das necessidades sentidas pela população. Esta dimensão social faz parte integrante de um princípio de precaução manejado com razão: é aqui que as conferências de consenso encontram o seu lugar.

2.14. O modelo de análise quantitativa dos riscos ou o do estudo da relação custo-benefício não devem ser sobrevalorizados. Não se deve dar demasiada importância aos números, a promoção da avaliação dos riscos deve inserir-se num dispositivo de negociação social. O seu verdadeiro papel social é fornecer as bases do diálogo.

2.15. Os cidadãos necessitam de interlocutores bem identificados, a quem se possam dirigir em caso de se sentirem ameaçados. Instaurar a confiança passa por criar uma organização que assuma esta responsabilidade, no quadro de um dispositivo europeu. É este dispositivo social, organizativo e científico, de que é portador o princípio de precaução.

2.16. Para fazer progredir a democracia impõem-se novos modelos de decisão: virá a ser necessário decidir em nome da incerteza e do excesso de complexidade e não com certezas científicas. Tal implica uma alteração considerável de perspectiva. É apenas com esta condição que a exigência de segurança sanitária, longe de alimentar o discurso totalitário, poderá fazer avançar a Democracia.

3. Observações na generalidade

3.1. O princípio de precaução amplia aquilo a que, em Direito Público, se chama as "competências de controlo" da administração. O Estado, que tradicionalmente tem a seu cargo a salubridade, a segurança, a tranquilidade, pode e deve tomar medidas que venham contradizer, reduzir, limitar ou suspender as liberdades do indivíduo e do cidadão: expressão, manifestação, comércio, empresa. O princípio de precaução quer ampliar este poder de intervenção, não no seu objectivo, mas no seu exercício.

3.2. A nível internacional, esta nova responsabilidade acarreta consequências importantes. Permite a um Estado, de certo modo temporariamente, suspender os seus compromissos em matéria de liberdade comercial. O princípio de precaução institui uma soberania do Estado, de quem faz o único juiz quando se trata da segurança dos seus cidadãos. É uma forte contradição com o Tratado CE.

3.3. A presente Comunicação visa resolver esta contradição: desde o momento em que se reconhece a aplicabilidade do princípio num quadro europeu ou internacional, a Comissão procura dar uma definição comum, de maneira que cada Estado já não possa dar a sua própria definição. É uma maneira de fazer intervir uma excepção de ordem pública.

3.4. Se o princípio de precaução é uma responsabilidade do Estado, é exclusivamente uma responsabilidade do Estado. O princípio de precaução exige ao Estado que adopte medidas nas hipóteses por ele previstas: compromete a sua responsabilidade em não as adoptar. Se não as adopta, coloca em perigo os produtores do seu país, perante os Estados da UE e países terceiros, que poderiam então invocá-lo. O princípio de precaução é um princípio de acção, e não de abstenção.

3.5. As disposições que adopte aplicar-se-ão aos responsáveis das decisões envolvidos, mas não lhes compete tomar a dianteira, o que de resto é verdadeiramente impossível, dada a imprecisão do princípio de precaução. Como pode um decisor determinar de forma razoável o "que é um risco de dano grave e nocivo", "uma medida efectiva e proporcionada", um "custo economicamente aceitável"?

4. As bases jurídicas

4.1.1. À escala europeia, o Comité Económico e Social constata que as bases jurídicas deste princípio ainda são ténues e que a jurisprudência apenas se começa a construir.

4.1.2. Uma referência implícita ou explícita a este princípio não constitui uma base sólida; o Comité Económico e Social solicita à Comissão que apresente em breve um argumento sólido e viável.

4.1.3. O Comité Económico e Social concorda com que a definição dos contornos políticos deste princípio passe a competir às instâncias de decisão políticas e, em última análise, às instâncias jurisdicionais.

4.1.4. À escala internacional, o reconhecimento do princípio de precaução é um vasto processo de construção que remonta à Carta Mundial da Natureza, de 1982, e tem sido sempre incluído nos diferentes convénios até chegar a "uma progressiva consolidação" em direito internacional do ambiente, que faz dele um verdadeiro princípio de direito internacional de âmbito geral.

4.1.5. Os acordos da OMC fazem seu este direito e adaptam-no ao comércio internacional, para o ligar ao mesmo tempo à protecção do ambiente.

4.1.6. No quadro dos acordos da OMC, o Acordo SPS e o Acordo OTC permitem regulamentar o comércio tomando em consideração os objectivos de protecção dos cidadãos. O Acordo SPS refere-se às medidas sanitárias e fitossanitárias de protecção da saúde das pessoas e dos animais, bem como de protecção vegetal, em nome apenas de razões científicas. O campo de aplicação do Acordo OTC abrange o conjunto dos obstáculos técnicos ao comércio (etiquetagem, normas, composições, etc.) e o seu objectivo é reduzir os obstáculos técnicos injustificados. O Acordo SPS e o Acordo OTC garantem uma aplicação adequada do princípio de precaução no ordenamento jurídico da OMC, sem todavia o citarem expressamente.

4.1.7. O Comité Económico e Social está de acordo com a Comissão em que a UE deve ter o direito de estabelecer o nível de protecção adequado, justificado e delimitado em matéria de protecção em todos os domínios: ambiente, saúde das pessoas e dos animais bem como de protecção vegetal. A UE enriquece assim a sua posição para a apoiar a nível internacional ou multilateral.

5. Observações específicas sobre as directrizes enunciadas na Comunicação

5.1. A razão das directrizes

5.2. Para tentar dar uma imagem mais completa do princípio, a sua aplicação dever ser evolutiva e variável com o tempo e os acontecimentos. Importa tentar daí extrair os principais elementos que devem contribuir para estabelecer dados cada vez mais objectivos, assentes em dados jurídicos o mais amplos possível, daí extrair os elementos de uma jurisprudência se possível sólida e fixar as orientações políticas.

5.3. O Comité Económico e Social considera, tal como a Comissão, que o princípio de precaução é um princípio que passou a ser geral e que afecta nomeadamente o domínio da protecção do ambiente, progressivamente alargado ao da saúde das pessoas e dos animais, bem como da protecção vegetal.

5.4. Após ter constatado que a origem do princípio de precaução era, quer nacional, quer internacional, nomeadamente nos acordos da Organização Mundial do Comércio, o Comité Económico e Social, tal como a Comissão, considera que a Comunidade Europeia dispõe, de forma absoluta, do direito de estabelecer o nível de protecção que deseja nos domínios previstos por este princípio. É tanto mais importante possuir um modus operandi deste princípio, quanto o mesmo terá repercussões nas margens de manobra e nas posições que a Comunidade defende e apoia a nível internacional e ou multilateral, no atinente à gestão dos riscos.

5.5. As medidas resultantes do recurso ao princípio de precaução são de dois tipos.

5.5.1. Actuar ou não actuar é responsabilidade exclusiva das instâncias de decisão, na ocorrência a autoridade política ou administrativa competente.

5.5.2. O Comité Económico e Social considera também que o recurso ao princípio de precaução se pode interpretar de muitas formas, nomeadamente para ter em conta as problemáticas de diferentes sectores, sem necessariamente ir até à adopção de actos finais de natureza jurídica, que são sempre susceptíveis de controlo jurisdicional.

6. Aplicação

6.1. Segundo a Comunicação, a aplicação de uma abordagem assente no princípio de precaução deveria começar por uma avaliação objectiva dos riscos, definindo em cada fase, tanto quanto possível, o grau de incerteza científica.

6.2. Existe, no entanto, uma diferença fundamental entre a avaliação dos riscos e a sua gestão. A avaliação dos riscos deve ser efectuada por cientistas especializados independentes ou, pelo menos, deve estar aberta ao exame de cientistas independentes, mas são as instâncias de decisão quem decide sobre a gestão dos riscos, sobre a necessidade e a forma de recorrer ao princípio de precaução.

6.3. A única forma de reforçar o carácter preventivo deste princípio consiste em:

- Tornar o procedimento de tomada de decisão aberto e o mais transparente possível;

- Fazer a pedagogia do princípio e prestar comunicações o mais claras possível, mediante uma concertação muito vasta.

6.4. O princípio de precaução deve ser um princípio construído para guiar o processo de decisão na ausência de certeza: a avaliação formal dos riscos, com o diagnóstico das incertezas científicas, deverá ser enquadrada em calendário e prazos, para ser útil e eficaz.

7. O factor desencadeador

7.1. Segundo a Comunicação, todas as partes interessadas devem participar no estudo das várias opções de gestão de riscos que se possam considerar, quando estiverem disponíveis os resultados da avaliação de riscos, e o procedimento deve ser tão transparente quanto possível.

7.2. Isto permite melhorar a transparência da avaliação dos riscos, aumentar a qualidade dessa avaliação recolhendo conhecimentos ou informações complementares e contribuir para reforçar a credibilidade e a aceitação da avaliação do risco.

7.3. O factor desencadeador será, assim, a incerteza científica, e não a certeza.

7.4. A disponibilidade para desencadear a aplicação corresponde exclusivamente às instâncias de decisão.

7.5. Para que o processo seja transparente, impõe-se que as opções previstas sejam claras, acessíveis, compreensíveis a todos, e que o dossier completo (avaliação do risco, dados científicos, opções consideradas) esteja disponível: esta abertura deve ser total, salvo casos especiais devidamente explicitados.

8. A proporcionalidade

8.1. Segundo a Comissão, as medidas baseadas no princípio de precaução deveriam ser proporcionais em relação ao nível de protecção pretendido e ao risco que se pretende limitar ou eliminar.

8.2. Frequentemente, os efeitos negativos apenas se fazem sentir muito tempo após a exposição, pelo que se torna mais difícil provar as relações causa-efeito. Por isso, deve aplicar-se e utilizar-se com maior frequência o princípio de precaução, em particular quando o risco não é directamente perceptível, o que obriga a assumir a proporcionalidade das medidas, que consiste em actuar sobre um risco cujos efeitos poderão só tornar-se aparentes num prazo longínquo.

9. A não discriminação

9.1. Segundo a Comunicação, a aplicação das medidas não deveria causar uma discriminação.

9.2. O Comité Económico e Social aprova esta disposição, baseada no princípio que estabelece que situações comparáveis devem ter um tratamento comparável, justificado objectivamente.

10. A coerência

10.1. Segundo a Comunicação, as medidas deveriam ser coerentes com medidas já adoptadas em circunstâncias semelhantes ou usando abordagens semelhantes.

10.2. O Comité Económico e Social aprova, obviamente, este critério. As medidas tomadas a título de precaução deveriam ser de um alcance e de uma natureza comparáveis com as medidas já tomadas em domínios equivalentes em que estejam disponíveis todos os dados científicos.

11. Análise das vantagens e dos encargos

11.1. Segundo a Comunicação, as medidas baseadas no princípio de precaução deveriam incluir uma análise económica custo-benefício, com o fim de reduzir o risco para um nível aceitável por todas as partes interessadas.

11.2. Não se podem quantificar única e exclusivamente em termos financeiros as consequências negativas para a sociedade, a saúde humana e o ambiente, nem medir-se as consequências económicas e morais com uma simples análise custo-benefício.

11.3. A análise das vantagens e dos encargos ocorre entre a avaliação científica e a escolha da gestão do risco. Comporta a análise custo-benefício e deve ter em conta considerações não económicas, características mais subjectivas (aceitabilidade social e cultural, qualidades organolépticas, etc.). Este exame de forma alguma deve ter influência no nível de protecção dos cidadãos fixado pela sociedade, mas ajudar a escolher a gestão do risco melhor para o conjunto da sociedade.

11.4. As análises económicas custo-benefício devem ter em conta os custos e as vantagens de uma modalidade de gestão do risco para a União Europeia no seu conjunto, mas também para cada sector socioeconómico envolvido na gestão do risco. As análises não se podem limitar a medir os custos e as vantagens em termos orçamentais, mas devem considerar um conjunto de indicadores: emprego, competitividade, mercados, etc.

11.5. No final deste processo, a autoridade responsável poderá escolher a opção do risco mais adequada relativamente às suas prioridades e obrigações políticas. Deveria, além disso, estar ciente das consequências da sua decisão para o conjunto dos agentes socioeconómicos "stakeholders" implicados para lhe propor, caso necessário, no quadro desta gestão de risco, medidas de compensação.

12. O ónus da prova

12.1. Segundo a Comissão, as medidas baseadas no princípio de precaução podem estabelecer uma responsabilidade em matéria de produção das provas científicas necessárias para uma avaliação de riscos completa.

12.2. O Comité Económico e Social subscreve o ponto de vista da Comissão de que a cláusula que lança o ónus da prova sobre o produtor, o fabricante e o importador não pode ser transformada em princípio geral. Todavia, o CES considera que essa inversão do ónus da prova é possível, se houver uma lista "positiva" prévia, como, designadamente, no caso das substâncias consideradas perigosas a priori ou que se podem tornar potencialmente perigosas a um certo nível de absorção.

13. A análise da evolução científica

13.1. Segundo a Comunicação, as medidas baseadas no princípio de precaução devem ter carácter provisório, na pendência de resultados da investigação destinada a obter as informações em falta e da realização de uma avaliação mais objectiva dos riscos.

13.2. O Comité Económico e Social aprova este princípio, sobretudo quando são necessárias investigações científicas mais completas para poder proporcionar novos resultados, para assegurar uma avaliação objectiva contida dos riscos. Dada a sua própria natureza, a investigação tem frequentemente necessidade de períodos adicionais de investigação e de desenvolvimento, sem que tal implique procedimentos jurídicos e políticos, longos e complicados.

14. Conclusão

14.1. O Comité Económico e Social acolhe como positiva a vontade da Comissão de criar um instrumento concreto de orientação para aplicar o princípio de precaução.

14.2. O Comité Económico e Social, tal como a Comissão, constata que a decisão depende das instâncias de decisão políticas, que devem actuar ou não actuar, e que o desencadeamento deve obedecer a um Codex (conjunto de regras), acima definido. O Comité convida a Comissão a clarificar os procedimentos de análise de risco, bem como a situar as directrizes para o recurso ao princípio de precaução num contexto que inclua os sistemas de gestão, a interacção entre as instituições envolvidas e, nomeadamente, a implicação de todos os agentes envolvidos ("stakeholders") no processo.

14.3. Por fim, o Comité Económico e Social considera que é muito importante para a União Europeia encontrar, se possível, um consenso internacional para a aplicação das modalidades do princípio de precaução.

Bruxelas, 12 de Julho de 2000.

A Presidente

do Comité Económico e Social

Beatrice Rangoni Machiavelli

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