Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a "Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à proibição dos compostos organoestânicos nos navios" (COM(2002) 396 final — 2002/0149 (COD))
Jornal Oficial nº C 085 de 08/04/2003 p. 0028 - 0031
Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a "Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à proibição dos compostos organoestânicos nos navios" (COM(2002) 396 final - 2002/0149 (COD)) (2003/C 85/07) Em 30 de Julho de 2002, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 80.o, n.o 2, do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta supramencionada. Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação emitiu parecer em 31 de Outubro de 2002. Foi relatora Anna Bredima-Savopoulou. Na 395.a reunião plenária de 11 e 12 de Dezembro de 2002 (sessão de 11 de Dezembro), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 98 votos a favor e 3 abstenções, o seguinte parecer. 1. Antecedentes 1.1. Durante décadas, as tintas antivegetativas utilizadas nos navios continham organoestânicos. Desde os anos setenta, o tributilestanho (TBT) tem vindo a ser usado como aditivo para impedir a fixação nos cascos das embarcações e nas redes da aquicultura, de determinados organismos (p. ex. a criação de vermes tubícolas, algas e cracas). Os seus efeitos nocivos sobre o ambiente foram sentidos pela primeira vez nos anos setenta nas culturas de ostras da costa atlântica da França. Desde essa altura, tem-se detectado, à escala mundial, nos organismos marinhos níveis elevados de organoestânicos, a montante da cadeia alimentar, tais como peixes, aves marinhas e mamíferos marinhos. Ficou demonstrado que estas substâncias químicas têm propriedades de desregulação hormonal em certas espécies e que também os seres humanos poderiam correr riscos no caso de consumirem peixe contaminado. 1.2. As preocupações ambientais em relação ao possível impacto ambiental da pintura de navios com tintas antivegetativas com TBT redundaram, no passado, em medidas reguladoras nos Estados Unidos e em várias partes do mundo. Há países que submeteram o TBT a uma regulamentação mais severa do que outros (por exemplo, o Japão proibiu a utilização de todas as tintas à base de TBT). 1.3. As tintas com TBT com copolímeros auto-reguladores (SPC) constituem o padrão mundial nos revestimentos antivegetativos da marinha mercante, representando mais de 70 % (em volume) das tintas antivegetativas utilizadas pela frota mundial(1). Neste momento, não há quaisquer alternativas comprovadas para a pintura de cascos com um efeito antivegetativo tão eficaz como as tintas à base de TBT-SPC, as únicas com uma garantia de eficácia que pode ir até cinco anos. As tintas alternativas sem TBT protegem os cascos durante um período máximo de três anos, mas as embarcações têm de ficar em doca seca e ser pintadas com mais frequência. Acresce ainda o facto de estas tintas não oferecerem, em princípio, uma protecção equivalente às tintas à base de TBT-SPC e o seu impacto ambiental ser ainda desconhecido. 1.4. Embora as alternativas às tintas com TBT sejam vendidas no mercado mundial, os investigadores não lhe têm dedicado a atenção necessária. A toxicidade destes compostos apenas foi avaliada numa base de curto prazo, não de longo prazo, como é o caso da exposição prolongada a tintas antivegetativas. 1.5. A UE decidiu, já em Dezembro de 1989, proibir no seu território a comercialização de compostos organoestânicos utilizados como biocidas para impedir a fixação de microrganismos nos cascos de embarcações de comprimento inferior a 25 metros. 1.6. Em 1990, a Organização Marítima Internacional (OMI) adoptou uma resolução recomendando aos governos que tomassem medidas para restringir a aplicação das tintas antivegetativas com TBT. Em 1999, esta mesma organização solicitou, ao nível mundial, a proibição da aplicação, nos navios, dos compostos organoestânicos actuando como biocidas nos sistemas antivegetativos, a partir de 1 de Janeiro de 2003, e a proibição total da presença destes compostos organoestânicos nos navios, a partir de 1 de Janeiro de 2008. 1.7. Em 5 de Outubro de 2001, a OMI adoptou a Convenção Internacional relativa ao controlo dos sistemas antivegetativos nocivos nos navios (Convenção AFS). A Convenção da OMI proíbe a utilização de compostos organoestânicos nocivos nas tintas antivegetativas para navios e estabelece um mecanismo para evitar que, futuramente, sejam utilizadas outras substâncias nocivas nos sistemas antivegetativos. 1.8. A Convenção encontra-se para assinatura desde 1 de Fevereiro de 2002, entrando em vigor doze meses após a sua ratificação por 25 Estados que representem 25 % da arqueação da frota comercial mundial. 1.9. A Resolução n.o 1 da Conferência Internacional sobre o Controlo dos Sistemas Antivegetativos Nocivos nos Navios reconheceu que o tempo disponível até 1 de Janeiro de 2003 pode não ser suficiente para permitir a entrada em vigor dessa Convenção nessa data. Desejando que os compostos organoestânicos deixem efectivamente de ser aplicados nos navios, a partir de 1 de Janeiro de 2003, a Conferência solicitou aos Estados membros da OMI que adoptassem com toda a urgência as disposições da Convenção. Simultaneamente, os sectores envolvidos foram instados a abster-se de colocar no mercado, vender e aplicar compostos organoestânicos a partir dessa mesma data. 1.10. Imediatamente após a Conferência AFS, a Câmara Internacional da Marinha Mercante (ICS) sublinhou que a questão de saber se a Convenção entrará ou não em vigor em 1 de Janeiro de 2003 era, até certo ponto académica, já que as datas fixadas de 1 de Janeiro de 2003 e 1 de Janeiro de 2008 deviam ser consideradas definitivas para qualquer navio da frota de comércio internacional. Não obstante a boa vontade para ratificar a Convenção AFS até 1 de Janeiro de 2003, poucos serão os Estados capazes de o fazer. 2. A proposta da Comissão 2.1. O regulamento proposto tem por base as prescrições fundamentais da Convenção AFS e evita duplicar as disposições de execução a adoptar pelos Estados-Membros em conformidade com as suas obrigações enquanto partes da referida Convenção. Além disso, ao contrário da Convenção AFS, redigida como uma convenção-quadro com base no princípio da precaução, o regulamento em apreço apenas abrange os compostos organoestânicos. 2.2. O objectivo do regulamento proposto é reduzir ou eliminar os efeitos adversos sobre o ambiente marinho e a saúde humana dos compostos organoestânicos que actuam como biocidas nos sistemas antivegetativos utilizados em navios. A Comissão Europeia propõe a adopção, antes do final de 2002, de um regulamento proibindo tanto a aplicação desses compostos organoestânicos nos navios que arvoram bandeira de um Estado-Membro, a partir de 1 de Janeiro de 2003, como a presença dos compostos organoestânicos activos nos navios que operam com destino ou partida em portos comunitários, a partir de 1 de Janeiro de 2008, independentemente da entrada em vigor da Convenção. 2.3. Antes da entrada em vigor da Convenção AFS, a proibição será suspensa para os navios que não arvoram bandeira de um Estado-Membro. A Comissão é de opinião que o regime mais adequado para o controlo da aplicação da proibição de TBT nos navios é o estabelecido na Directiva 95/21/CE do Conselho, de 19 de Junho de 1995, relativa à inspecção de navios pelo Estado do porto(2). Mas esta directiva só pode ser aplicada aos navios arvorando bandeira de países terceiros depois de ter entrado em vigor a Convenção AFS. 2.4. À luz da Convenção AFS, o regulamento prevê um regime de vistoria e certificação para os navios consoante as suas dimensões. 2.5. A Comissão Europeia reconhece que, no período intercalar de 1 de Janeiro de 2003 até à data de entrada em vigor da Convenção AFS, haverá desvantagens competitivas para os armadores e estaleiros da UE, mas espera que estas sejam evitadas através da observância voluntária por parte dos navios arvorando bandeira de países terceiros. Além disso, propõe um procedimento segundo o qual, e consoante o alcance da observância voluntária, o regulamento em apreço cobrirá igualmente os navios arvorando bandeira de países terceiros. 3. Observações na generalidade 3.1. Por uma questão de princípio, o CESE continua a sustentar que o sector marítimo, enquanto indústria mundial, deveria reger-se por normas mundiais, elaboradas e acordadas, em primeira instância, ao nível internacional por intermédio da OMI. À UE caberia o papel de encorajar o estabelecimento de normas internacionais elevadas e assegurar a sua aplicação efectiva na UE. 3.2. O CESE recorda o antigo propósito de estender o âmbito de aplicação da Directiva 76/769/CEE(3) e o acordo subsequente de aguardar o desenrolar dos acontecimentos na OMI, saudando a abordagem da Comissão no atinente à aplicação da Convenção AFS, nomeadamente: - recomendar aos Estados-Membros que assinem e ratifiquem a Convenção AFS o mais rapidamente possível; - alterar a Directiva 76/769/CEE e - propor o regulamento baseado nos princípios da Convenção AFS. Neste contexto, o CESE apoia plenamente o princípio de restringir a proposta aos navios arvorando bandeira dos Estados-Membros e de não procurar obter jurisdição extraterritorial sobre os navios de países terceiros. 3.3. No entanto, o CESE regista com inquietação as potenciais desvantagens comerciais para os navios arvorando bandeira da UE e os estaleiros comunitários durante o período intercalar. O CESE insiste em que é necessário dar a máxima prioridade à rápida ratificação da Convenção AFS pelos Estados-Membros, a Noruega e a Islândia e pelos treze países candidatos, os quais perfazem um total de trinta países com uma arqueação de, pelo menos, 30,9 % da frota comercial mundial, excedendo as condições para a entrada em vigor da Convenção AFS. Note-se o facto de entre os treze países candidatos se encontrarem nações marítimas importantes (Malta e Chipre) e países com uma arqueação bastante significativa (Polónia, Roménia e Bulgária). 3.4. Para os Estados-Membros que não consigam ratificar a convenção AFS antes de 1 de Janeiro de 2003, a aplicação retroactiva do requisito de "1 de Janeiro de 2003" estabelecido na Convenção e no regulamento poderá constituir um obstáculo ao processo de ratificação de acordo com a sua legislação nacional. Inversamente, para as novas embarcações com entrega planeada para 2003, em cujo contrato está prevista a pintura com tinta à base de TBT, assim como para os navios com entrada, em 2003, em doca seca para nova pintura com tinta à base de TBT, esta aplicação retroactiva terá implicações financeiras consideráveis. Para minimizar o impacto sobre o sector marítimo da UE, o regulamento deveria excluir estes navios e prever prazos mais flexíveis para a sua aplicação. 4. Observações na especialidade 4.1. Artigo 3.o 4.1.1. O CESE propõe que se altere as alíneas a) e b) do n.o 1 do artigo 3.o aditando a frase "que entram num porto ou terminal offshore de um Estado-Membro". O impacto será menor se não se impuser um requisito geral aos navios comunitários e se excluir aqueles que operam fora das águas territoriais da UE. Uma boa percentagem da frota da UE está envolvida em operações fora da UE e poderia tirar partido das vantagens desta derrogação temporária. 4.1.2. O CESE propõe que se inclua no n.o 2 do artigo 3.o do regulamento proposto, a disposição do n.o 2 do artigo 3.o (segunda frase) da Convenção AFS, a saber: "No entanto, cada Estado-Membro deverá assegurar, pela adopção de medidas apropriadas, contanto que não comprometam as operações e as capacidades operacionais dos navios de sua propriedade ou sob a sua autoridade, que estes navios se coadunem de forma consequente, nos limites do razoável e do praticável, com este Regulamento." 4.2. Artigo 5.o O CESE apoia com a opção constante do n.o 1 do artigo 5.o de revestir o casco dos navios para evitar a lixiviação da tinta com TBT subjacente. Esta disposição reflecte a disposição homóloga consagrada na Convenção AFS. Deve preferir-se o revestimento à remoção das tintas com TBT e ao tratamento com jacto de areia devido ao impacto ambiental dos resíduos resultantes dessas operações. 4.3. Artigo 6.o O n.o3 deste artigo afigura-se um tanto pessimista, contrariando as expectativas de uma rápida entrada em vigor da Convenção AFS, pelo que deverá ser suprimido. De qualquer modo, esta noção já é abrangida pelo artigo 10.o 4.4. Artigo 7.o Aplica-se ao segundo parágrafo deste artigo a observação feita ao artigo 6.o 4.5. Artigo 11.o O CESE propõe que a data de entrada em vigor passe a ser 1 de Janeiro de 2004, tornando assim possível o abandono gradual das tintas com TBT e ter em conta a compatibilidade dos navios e a existência de novas tintas no mercado. Este período de um ano também permitirá a avaliação da conformidade prevista no artigo 10.o sem sobrecarregar desnecessariamente o sector marítimo da UE. 5. Conclusões 5.1. O CESE comunga da aspiração comum de reduzir o impacto ambiental negativo das tintas antivegetativas nocivas utilizadas nos navios e entende que a acção da UE deve ser coerente com os princípios da Convenção AFS da OMI com a devida atenção às restrições jurídicas e às considerações comerciais. 5.2. Ao negociarem e adoptarem instrumentos internacionais, os governos devem estabelecer objectivos realistas e cumprir os seus compromissos para evitar implicações desnecessárias. Os Estados-Membros deveriam ratificar com urgência a Convenção AFS, avaliar o alcance da sua observância e as perspectivas de mercado, bem como definir um âmbito realista para a acção complementar. 5.3. A proibição total quanto antes das tintas com TBT deverá basear-se na firme convicção de que as novas tintas não serão tão ou mais nocivas. Com efeito, não há neste momento provas científicas concludentes que apontem para qualquer um dos sentidos. A necessidade de mais experiência justifica uma abordagem prudente e um certo grau de flexibilidade. 5.4. A aplicação do abandono gradual das tintas com TBT durante o período intercalar concilia as preocupações ambientais com a necessidade de preservar a competitividade da frota da UE à escala mundial. Bruxelas, 11 de Dezembro de 2002. O Presidente do Comité Económico e Social Europeu Roger Briesch (1) CEFIC 1996. (2) Directiva 95/21/CE do Conselho, de 19 de Junho de 1995, relativa à aplicação, aos navios que escalem os portos da Comunidade ou naveguem em águas sob jurisdição dos Estados-Membros, das normas internacionais respeitantes à segurança da navegação, à prevenção da poluição e às condições de vida e de trabalho a bordo dos navios (inspecção pelo Estado do porto) (JO L 157 de 7.7.1995, p. 1) - Parecer do CESE in JO C 393 de 31.12.1994, p. 50. (3) Directiva 2002/62/CE da Comissão, de 9 de Julho de 2002, que adopta, pela nona vez, o anexo I da Directiva 76/769/CEE do Conselho de 27 de Julho de 1976, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros respeitantes à limitação da colocação no mercado e da utilização de algumas substâncias e preparações perigosas (compostos organoestânicos) (JO L 183 de 12.7.2002, p. 58) - Parecer do CESE sobre a Directiva 76/769/CEE do Conselho, in JO C 16 de 23.1.1975, p. 25.