19.2.2009   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

CE 41/70


P6_TA(2008)0018

Resolução do Parlamento Europeu, de 17 de Janeiro de 2008, sobre o Quénia

O Parlamento Europeu,

Tendo em conta a Declaração Preliminar da Missão de Observação Eleitoral da União Europeia (EUEOM) no Quénia, de 1 de Janeiro de 2008,

Tendo em conta a Declaração da Presidência do Conselho da União Europeia em nome da União Europeia, de 11 de Janeiro de 2008, relativa aos esforços de mediação às eleições presidenciais no Quénia,

Tendo em conta a Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, de 1981, e a Carta Africana sobre Democracia, Eleições e Governação, de 2007,

Tendo em conta a Declaração da União Africana sobre os Princípios que regem as eleições democráticas em África, de 2002,

Tendo em conta a Declaração de Princípios para a Observação Internacional de Eleições e o Código de Conduta para Observadores Internacionais de Eleições, celebrados nas Nações Unidas, em 27 de Outubro de 2005,

Tendo em conta o Acordo de Parceria entre os membros do grupo de Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico, por um lado, e a Comunidade Europeia e os seus Estados-Membros, por outro, assinado em Cotonu, em 23 de Junho de 2000(a seguir designado «Acordo de Cotonu»), e alterado no Luxemburgo, em 25 de Junho de 2005, nomeadamente os artigos 8o e 9o,

Tendo em conta o no 4 do artigo 103o do seu Regimento,

A.

Considerando que em 27 de Dezembro de 2007 foram realizadas no Quénia eleições presidenciais e legislativas às quais se candidataram membros de nove partidos, incluindo o Presidente Mwai Kibaki do Partido de Unidade Nacional (PNU) e Raila Odinga, pelo Movimento Democrático Laranja (ODM),

B.

Considerando que os dois maiores partidos, a saber, o PNU e o ODM, obtiveram, respectivamente, 43 e 99 dos 210 lugares no parlamento nacional,

C.

Considerando que as eleições presidenciais no Quénia, em 2007, ficaram aquém das normas internacionais e regionais básicas em matéria de eleições democráticas e foram seguidas por tumultos que causaram a morte de mais de 600 cidadãos,

D.

Considerando que a violência política que se seguiu às eleições provocou a deslocação de 250 000 pessoas e afectou entre 400 000 e 500 000 quenianos, especialmente das cidades de Eldoret, Kericho e Kisumu, segundo o Gabinete das Nações Unidas para a Coordenação das Questões Humanitárias (OCHA),

E.

Considerando que a actual crise política resulta sobretudo provocada pela tensão verificada na anterior Coligação Nacional de Arco-íris (NARC), que venceu as eleições de 2000, quando Mwai Kibaki e Raila Odinga acordaram na partilha o poder, acordo que não foi respeitado,

F.

Considerando que as recomendações formuladas pela EUEOM em 2002 não foram tomadas em devida conta, incluindo as que diziam respeito à dimensão e aos limites dos círculos eleitorais para as eleições gerais, e à prorrogação do mandato dos comissários da Comissão Eleitoral do Quénia (CEQ) por seis meses após as eleições gerais, a fim de reforçar a sua independência e profissionalismo,

G.

Registando que o espírito da campanha eleitoral de 2007 se caracterizou por uma importante polarização política entre as facções de Kibaki e Odinga que gerou tensões nas respectivas comunidades étnicas,

H.

Considerando que as eleições presidenciais defraudaram as esperanças e as expectativas do povo queniano, que se envolveu avidamente no processo eleitoral, votando em grande número e de forma pacífica e paciente,

I.

Considerando que os intensos esforços diplomáticos, incluindo a missão de mediação do Presidente da União Africana e Presidente da República do Gana, Kofi Agyekum Kufuor, e os esforços despendidos por quatro antigos presidentes não resolveram a crise política,

J.

Considerando que, em 8 de Janeiro de 2008, Mwai Kibaki nomeou unilateralmente 17 membros do seu governo, antes de concluída a mediação internacional, inviabilizando desse modo, efectivamente, uma negociação tripartida e levando o ODM a retomar os protestos de massas,

K.

Considerando que, durante a campanha eleitoral, a liberdade de associação, a liberdade de expressão e a liberdade de reunião foram, em geral, respeitadas; considerando, contudo, que a campanha ficou igualmente marcada por divisões étnico-políticas que contribuíram para a criação de uma situação volátil no período que antecedeu as eleições,

L.

Considerando que a comunidade internacional não prestou uma atenção suficiente a estas tensões étnicas latentes e que deverá, doravante, tomar em conta esta questão em futuros esforços de mediação da actual crise no Quénia,

M.

Considerando que a CEQ assegurou a supervisão dos aspectos logístico e técnico das eleições, melhorou o acesso aos centros de recenseamento eleitoral e deu formação ao pessoal das assembleias de voto,

N.

Considerando que a CEQ não demonstrou, todavia, a imparcialidade, transparência e confidencialidade indispensáveis numa eleição democrática, facto que se reflectiu nas irregularidades nos processos nomeação dos respectivos comissários,

O.

Considerando que os observadores da EU EOM foram acolhidos pelas autoridades competentes nas assembleias de voto, onde a votação decorreu de forma ordeira,

P.

Considerando que os observadores da EU EOM não beneficiaram, contudo, de um acesso semelhante aos centros de escrutínio, tendo concluído que a falta de transparência e de procedimentos de segurança adequados comprometia gravemente a credibilidade dos resultados da eleição presidencial,

Q.

Considerando que algumas mesas de voto registaram taxas de participação superiores a 90 % e que a CEQ manifestou dúvidas quanto a estes números irrealistamente elevados,

R.

Considerando que a EU EOM concluiu que, em geral, o processo eleitoral anterior ao escrutínio foi bem gerido e as eleições legislativas se desenrolaram correctamente,

S.

Considerando, contudo, que a EU EOM concluiu que o processo de escrutínio da eleição presidencial não é credível, manifestando, por conseguinte, dúvidas quanto ao rigor dos resultados,

T.

Considerando que, de acordo com o Observatório para a Protecção dos Defensores dos Direitos do Homem, foram feitas ameaças contra os membros da Iniciativa de Quenianos para a Paz com Verdade e Justiça (KPTJ), uma associação de organizações não governamentais independentes, constituída imediatamente após as eleições para denunciar a fraude eleitoral e apoiar a liberdade de expressão e de associação no país,

U.

Considerando que o Quénia assumiu o compromisso de respeitar os direitos civis fundamentais e a democracia, com base no Estado de Direito e na governação transparente e responsável, no âmbito do Acordo de Cotonu,

1.

Condena a trágica perda de vidas e a situação humanitária crítica, instando vivamente as autoridades competentes e os interessados a realizarem todo o esforço possível para instaurar a paz na República do Quénia e garantir o respeito dos Direitos do Homem e do Estado de Direito;

2.

Apoia as conclusões apresentadas pela EU EOM na sua declaração preliminar;

3.

Lamenta que, apesar do êxito generalizado das eleições parlamentares, os resultados das eleições presidenciais não possam considerar-se credíveis devido aos relatos generalizados de irregularidades eleitorais;

4.

Lamenta que Mwai Kibaki tenha nomeado o governo unilateralmente, tendo assim prejudicado gravemente os esforços de mediação;

5.

Insta Mwai Kibazki a respeitar os compromissos democráticos assumidos pelo seu país e consagrados na Constituição do Quénia, na Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos e na Carta Africana sobre Democracia, Eleições e Governação, e a autorizar uma avaliação independente das eleições presidenciais; insta, por outro lado, as autoridades do Quénia a facilitarem uma tal investigação para corrigir a situação e fazer com que os responsáveis pelas irregularidades eleitorais respondam pelos seus actos;

6.

Insta as autoridades quenianas a garantir, em todas as circunstâncias, a integridade física e psicológica dos membros do KPTJ e de todos os defensores dos Direitos do Homem no Quénia, e a pôr termo a todos os actos de intimidação dos defensores dos Direitos do Homem no país;

7.

Solicita a ambas as partes que adoptem, urgentemente, medidas tangíveis para remediar a situação através de negociações; apoia, neste contexto, os ulteriores esforços de mediação realizados por um grupo de dirigentes africanos sob a liderança de Kofi Annan, ex-Secretário-Geral das Nações Unidas;

8.

Insta a Presidência da União Europeia e a Comissão a acompanharem de perto a mediação liderada por Kofi Annan e, se necessário, a assegurarem a prossecução imediata destes esforços de mediação por uma delegação de alto nível da União Europeia, possivelmente, no âmbito de uma iniciativa conjunta UE-UA; insta a Comissão a proporcionar às autoridades quenianas todo o auxílio técnico e financeiro necessário no âmbito do processo de avaliação independente das eleições presidenciais e das acções correctivas que se considerem indispensáveis;

9.

Congratula-se com o facto de o parlamento recém-eleito ter mostrado a sua independência com a eleição de Kenneth Marende como seu presidente, e sublinha o papel decisivo a desempenhar por esse parlamento na restauração das liberdades civis no Quénia;

10.

Solicita a adopção de medidas concretas para instituir uma comissão eleitoral verdadeiramente imparcial, mais apta a organizar futuramente eleições livres e justas;

11.

Chama a atenção para a declaração de Samuel Kivuitu, Presidente da COQ, que se demarcou dos resultados das eleições presidenciais publicados pelos meios de comunicação social e solicitou a abertura de um inquérito independente sobre as alegações de fraude;

12.

Solicita a realização de novas eleições presidenciais, caso se revele impossível organizar uma recontagem credível e justa dos votos das eleições presidenciais, por parte de um órgão independente;

13.

Lamenta ter-se desperdiçado a oportunidade oferecida pelas eleições presidenciais de 2007 para consolidar e desenvolver o processo eleitoral e o processo democrático mais vasto;

14.

Convida os líderes dos partidos políticos a assumirem a responsabilidade de evitar a escalada da violência no país, a mostrarem o seu empenho no Estado de Direito e a assegurarem o respeito dos Direitos do Homem;

15.

Manifesta a sua profunda preocupação face às repercussões sociais da actual crise económica e aos efeitos nocivos para o desenvolvimento socioeconómico do país, bem como às consequências económicas para os países vizinhos, que dependem, em grande medida, das infra-estruturas do Quénia e cuja situação humanitária está a ser prejudicada pela crise;

16.

Insta o Governo do Quénia a e Comissão a facultarem rápida assistência humanitária às pessoas deslocadas no interior do país e a disponibilizarem todo o pessoal humanitário necessário;

17.

Exorta as autoridades competentes a assegurar uma cobertura noticiosa livre e independente e a restabelecer de imediato as transmissões em directo;

18.

Lamenta o pagamento de uma ajuda no quadro do orçamento do Fundo Europeu de Desenvolvimento ao governo de Kibaki imediatamente após as eleições, que poderá ser mal interpretado como acto de favorecimento político, e solicita a suspensão de quaisquer outras ajudas financeiras ao Governo queniano enquanto não se encontrar uma solução política para a actual crise;

19.

Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, aos governos dos Estados-Membros, ao Governo do Quénia, aos Co-Presidentes da Assembleia Parlamentar Paritária ACP-UE e aos presidentes da Comissão e do Conselho Executivo da União Africana.


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