15.2.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 62/305


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à abolição das mudanças de hora sazonais e que revoga a Diretiva 2000/84/CE»

[COM(2018) 639 final — 2018/0332 (COD)]

(2019/C 62/49)

Relatora-geral:

Maria NIKOLOPOULOU

Consulta

Parlamento Europeu, 13.9.2018

Conselho, 19.9.2018

Base jurídica

Artigo 114.o, n.o 1, e artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

 

Decisão da Mesa

18.9.2018

 

 

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

 

 

Adoção em plenária

17.10.2018

Reunião plenária n.o

538

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

109/1/6

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) toma conhecimento da proposta da Comissão Europeia de revogar as mudanças de hora sazonais. O CESE assinala uma série de limitações importantes relativas ao método, aos prazos e ao conteúdo. Por estas razões, considera essencial consagrar mais tempo ao debate e à análise da questão. A fim de garantir uma aplicação eficaz, harmonizada e consensual da proposta, é essencial chegar a um consenso alargado entre os cidadãos e contar com o apoio unânime de todos os Estados-Membros.

1.2.

O CESE reconhece o interesse de alguns cidadãos europeus em revogar o atual mecanismo que estabelece um sistema harmonizado de mudança da hora duas vezes por ano, como demonstrado na recente consulta pública em linha. Para o CESE, uma consulta pública em linha bem organizada constitui um instrumento capaz de indicar as preferências do público e de complementar os processos democráticos estabelecidos. O CESE lamenta que os governos nacionais e a sociedade civil organizada não tenham sido suficientemente consultados antes da publicação urgente da proposta.

1.3.

O CESE considera que a consulta pública da Comissão suscitou uma questão importante para alguns cidadãos da UE, principalmente porque este assunto foi discutido durante vários anos em alguns Estados-Membros, mas em outros não. No entanto, a Comissão não teve devidamente em conta o facto de uma grande maioria dos participantes provir de um único país, de a proposta ter sido rejeitada em determinados Estados-Membros e de não haver uma clara unanimidade quanto aos verdadeiros benefícios que a abolição do atual sistema harmonizado poderá trazer, nem quanto à questão de ser preferível optar pela hora de verão ou pela hora de inverno.

1.4.

O CESE assinala que o procedimento urgente adotado pela Comissão foi criticado em vários Estados-Membros, tendo os cidadãos considerado que as prioridades da UE são outras (a crise económica, o desemprego, a imigração, etc.), o que pode prejudicar a aceitação social da iniciativa.

1.5.

A proposta de diretiva prevê que, atendendo ao princípio da subsidiariedade, cada Estado-Membro é livre de manter a hora de verão ou de inverno durante todo o ano, substituindo o atual sistema harmonizado que tem amplamente demonstrado a sua eficiência. O CESE, bem como a Comissão, considera que, para assegurar o atual nível de harmonização, é essencial haver unanimidade entre todos os Estados-Membros sobre a hora a selecionar. Caso contrário, a diferença horária entre os países que se encontram no mesmo fuso horário poderá provocar a fragmentação e a distorção do mercado interno.

1.6.

O CESE constata que a aplicação da iniciativa implicaria a reprogramação de todos os sistemas e dispositivos digitais a nível mundial, com um custo económico evidente para as empresas e os governos e um eventual impacto nas pessoas. A transição para um novo sistema horário exigirá um longo período de teste das TIC, antes da entrada em vigor deste sistema, a fim de assegurar a sua aplicação efetiva. No caso de um resultado negativo da avaliação de impacto prevista para 2024, seria inconcebível reverter com celeridade o sistema, tendo em conta que tal acarretaria custos económicos e prejudicaria a credibilidade das instituições europeias. Uma vez mais, é visível a necessidade de dispor-se de mais tempo para aprofundar os estudos, alargar a recolha de dados, estabelecer a vontade política e aumentar a aceitação pela sociedade e pelos cidadãos, antes de submeter os Estados, os cidadãos e as empresas a uma mudança tão delicada.

2.   Síntese da proposta da Comissão

2.1.

A legislação da UE que rege a hora de verão foi introduzida pela primeira vez em 1980, com o objetivo de unificar as práticas e os calendários nacionais que então eram divergentes, assegurando assim uma abordagem harmonizada da mudança da hora no mercado único.

2.2.

Desde 2001, as disposições da UE relativas à hora de verão regem-se pela Diretiva 2000/84/CE, que estabelece a obrigação de todos os Estados-Membros passarem à hora de verão no último domingo de março e voltarem à hora legal (hora de inverno) no último domingo de outubro.

2.3.

Contudo, atendendo ao princípio da subsidiariedade, as decisões sobre o fuso horário são tomadas individualmente por cada Estado-Membro para a totalidade do respetivo território ou para diferentes partes do mesmo.

2.4.

O sistema de mudança da hora duas vezes por ano foi recentemente questionado em vários países europeus, tal como indicado na consulta pública efetuada pela Comissão entre 4 de julho e 16 de agosto de 2018, que recebeu cerca de 4,6 milhões de respostas, sendo que 84 % dos respondentes pronunciaram-se a favor da abolição da mudança bianual da hora e os restantes 16 % a favor da sua manutenção. Os que são a favor da abolição das mudanças de hora manifestaram uma preferência pela hora de verão (60 %). É importante notar que a grande maioria dos participantes proveio de um só país (Alemanha, com 3,1 milhões de participantes) e que a proposta foi rejeitada em alguns países (Grécia e Chipre) ou não obteve uma clara maioria (Malta).

2.5.

Na sua resolução, de 8 de fevereiro de 2018, o Parlamento Europeu apoiou a ideia de alterar as atuais disposições, e convidou a Comissão a apresentar uma proposta legislativa. Recentemente, os ministros dos Transportes abordaram esta questão nas reuniões do Conselho de dezembro de 2017 e junho de 2018, sem alcançarem uma clara unanimidade. A questão não foi debatida por outros ministros pertinentes, nem previamente em reuniões entre os primeiros-ministros. O CESE também não foi previamente consultado.

2.6.

A proposta consiste em revogar o atual mecanismo que institui um sistema harmonizado de mudança da hora duas vezes por ano, mantendo a mesma hora ao longo de todo o ano. Em conformidade com o princípio da subsidiariedade, caberá a cada Estado-Membro a tomada de decisão sobre a hora. A Comissão espera que todos os países, sem exceção, adotem a mesma hora de verão e de inverno, mantendo, assim, a atual harmonização e evitando a fragmentação do mercado interno. A proposta deverá entrar em vigor em 1 de abril de 2019.

2.7.

A Comissão reconhece que os estudos disponíveis sobre os benefícios das mudanças da hora para a energia, a saúde, a segurança rodoviária e a agricultura nem sempre são conclusivos. Foi demonstrado que a falta de harmonização da hora pode ter impacto no mercado único, nos transportes aéreos, marítimos e rodoviários, bem como nas pessoas que viajam por motivos de lazer ou de trabalho (1).

3.   Observações gerais

3.1.

O CESE considera interessante a proposta da Comissão Europeia relativa à abolição das mudanças de hora sazonais, tal como previstas na Diretiva 2000/84/CE, mas chama a atenção para uma série de limitações importantes relativas aos métodos, aos prazos e aos conteúdos. O CESE considera essencial consagrar mais tempo ao debate e à análise da questão, a fim de se alcançar um consenso verdadeiramente amplo entre os cidadãos e de obter o apoio unânime de todos os Estados-Membros. Estes fatores são cruciais para assegurar uma aplicação eficaz e harmonizada da proposta.

3.2.

O CESE considera que o método utilizado pela Comissão — uma consulta pública em linha realizada entre julho e agosto de 2018 — proporciona dados interessantes sobre as expectativas de parte da população europeia, mas não é a única ferramenta disponível para avaliar a opinião pública. Tendo em conta os numerosos impactos políticos, económicos e sociais, a sociedade civil organizada e um maior número de Estados-Membros deveriam ter sido devidamente envolvidos e consultados antes de a proposta ter sido apresentada.

3.3.

O CESE observa que a consulta pública não identificou uma verdadeira unanimidade entre todos os Estados-Membros (a proposta foi rejeitada na Grécia e em Chipre) e, mais importante ainda, a grande maioria dos respondentes proveio de um só país (Alemanha), o que demonstra que alguns países têm um verdadeiro interesse nesta questão, mas não toda a UE. Mais especificamente, o CESE considera que uma consulta pública em linha não pode substituir os processos de consulta democrática a todos os níveis e em cada fase legislativa (antes, durante e após).

3.4.

O CESE assinala que o procedimento urgente adotado pela Comissão foi criticado em alguns Estados-Membros, tendo os cidadãos considerado que as prioridades urgentes da UE deveriam ser outras (a crise económica, o desemprego, a imigração, etc.), sublinhando um potencial problema em termos de aceitação social da iniciativa. Além disso, alguns governos nacionais ainda não definiram claramente a sua posição sobre a revogação da atual regulamentação, nem sobre a hora a selecionar (de verão ou de inverno), nem consideram a questão uma prioridade.

3.5.

Quanto ao conteúdo, o CESE considera interessante a ideia de se lançar um debate sobre o assunto, mas observa que a atual proposta da Comissão apresenta determinadas limitações que justificariam que se consagrasse mais tempo ao debate, a fim de se obter um amplo consenso entre todos os cidadãos e a unanimidade entre os Estados-Membros:

3.5.1.

O direito de escolher a hora é uma competência nacional. A nova proposta de diretiva prevê que, atendendo ao princípio da subsidiariedade, cada Estado-Membro é livre de manter a hora de verão ou de inverno durante todo o ano. O risco é que, se todos os países não chegarem a um acordo unânime sobre o alinhamento do tempo, assegurando assim o mesmo nível de harmonização atualmente existente, os custos decorrentes da diferença entre os países teriam um impacto grave no mercado interno (fragmentação), o que criaria mais problemas do que benefícios. A Comissão reconhece este problema na sua avaliação de impacto e o CESE considera necessário alcançar um maior consenso antes da apresentação oficial da proposta da Comissão.

3.5.2.

A própria Comissão salienta que a iniciativa assenta numa série de estudos — contraditórios ou não conclusivos — realizados por várias associações e Estados-Membros. O CESE recomenda que se lance uma avaliação de impacto mais aprofundada, com a participação de todos os setores económicos e sociais, em todos os países da UE, a fim de poder compreender qual o sistema mais adequado.

3.6.

A adaptação tecnológica dos sistemas a nível mundial tem um custo económico evidente para as empresas e os governos, além de poder ter impacto nas pessoas. Acresce que, antes da entrada em vigor deste sistema e a fim de assegurar a sua aplicação efetiva, é necessário testar as TIC durante um longo período.

3.7.

Embora a Comissão introduza um mecanismo para avaliar o impacto da diretiva (em 2024), o Comité salienta que os custos associados à mudança da hora são bastante elevados. Por este motivo, é irrealista imaginar que, no caso de uma avaliação de impacto negativa, seria possível reverter com celeridade o sistema, tendo em conta que tal acarretaria custos económicos e prejudicaria a credibilidade das instituições europeias.

Bruxelas, 17 de outubro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Estudo realizado em nome da DG MOVE pela ICF International: «The application of summer time in Europe» [A aplicação da hora de verão na Europa], 19 de setembro de 2014.


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