Campo e negócios

Por Anaísa Catucci, G1 SC


Pesquisadores analisam impacto de flor da árvore espatódea que pode intoxicar abelhas em SC — Foto: Epagri e João de Deus Medeiros/Reprodução

Aos poucos, as abelhas conhecidas popularmente como sem ferrão ou nativas, vêm ganhando sua importância reconhecida em Santa Catarina. No ano passado, uma portaria que regulamenta a criação, o comércio e o transporte, foi criada para padronizar e apoiar os sistemas produtivos da apicultura e meliponicultura.

Por se adaptarem a áreas urbanas, o número de criadores que cuidam dos insetos em casa aumentou, há quem encontre nas colmeias uma atividade econômica. Entre eles há uma preocupação diante das ameaças à vida das abelhas por conta da ação tóxica de algumas espécies de plantas exóticas, como a Espatódea.

A planta de origem africana, que também é conhecida como bisnagueira, foi introduzida no Brasil como árvore ornamental e integra o paisagismo de muitas cidades catarinenses. Apesar da lei estadual que proíbe a produção de mudas e plantio, alguns municípios estão fechando o cerco à espécie, com medidas que determinam cortes e outras ações restritivas. Uma substância nas flores tem ação inseticida pode ser tóxica para abelhas.

Criação de abelhas pode ser afetada por planta tóxica em SC — Foto: Epagri/ Divulgação

A criação de abelhas sem ferrão ajuda na conservação ambiental, pois os meliponicultores costumam preservar ecossistemas locais e restaurar áreas para subsidiar a atividade, porque as abelhas nativas brasileiras dependem de um habitat saudável para se reproduzir. Por conta disso, as recomendações de representantes da categoria defendem o corte de plantas como a Espatódea e substituição por árvores nativas.

O chefe da divisão de estudos apícolas da Epagri, Rodrigo Durieux da Cunha, explica que os cortes da Espatódea podem trazer benefícios tanto para famílias que tem meliponicultura como fonte de renda, como para fauna e flora local.

Chefe da divisão de estudos apícolas da Epagri fala sobre impactos da Espatódea

Chefe da divisão de estudos apícolas da Epagri fala sobre impactos da Espatódea

"O que se observa mais e os relatos maiores de problemas com mortalidade de abelhas devido a Espatódea são relacionados à abelha sem ferrão, até pelos ambientes urbanos e periurbanos, onde tem a maior concentração dessas árvores. O mel de abelha sem ferrão, apesar de ter um grande potencial, ainda não tem grande expressão na comercialização. Hoje o produto principal da criação de abelhas sem ferrão é a comercialização das colônias e também tem um valor ambiental imensurável", afirma.

Impactos a longo prazo

Segundo o professor de zoologia da Universidade Regional de Blumenau (Furb) e meliponicultor Sérgio Luiz Althoff, diversos pesquisadores no Brasil sugerem que os apiários sejam colocados longe destas plantas.

De acordo com o professor, as leis são muito recentes e ainda há poucos estudos que citam efeitos práticos da eliminação dessa espécie de árvore e os reflexos no aumento da população das abelhas.

"Infelizmente, em nosso estado, estudos sobre a dinâmica natural de abelhas nativas são muito raros. Porém, sabendo dos efeitos tóxicos do pólen e néctar desta planta, a inexistência destes estudos não invalida a importância desta lei", afirma.

Abelha sem ferrão — Foto: Epagri/ Divulgação

Althoff destaca que atualmente vem crescendo a meliponicultura, que é a criação das abelhas nativas. "Acredito que, em um futuro próximo, os produtos destas abelhas seja também importantes na economia estadual. Pensando nisso, a eliminação da Spathodea é muito significativa para o desenvolvimento desta atividade. O mais importante é não só pensar apenas nas atividades econômicas, mas principalmente analisar que a eliminação desta planta que não é nossa (exótica), estamos salvando animais de nossa biodiversidade", disse.

O professor destaca que é necessário incentivar a substituição. "Ao meu ver, regulamentar melhor quais atitudes devem ser tomadas com a Spathodea, como a obrigatoriedade de retirada e substituição por espécies nativas, pois algumas pessoas se aproveitaram apenas para ter a argumentação legal para o corte das árvores, mas sem a necessidade de plantar novas árvores".

Ele também destaca que outras espécies merecem atenção especial, tanto quanto a Espatódea. "Mas deveriam já ter pensando em plantas exóticas que afetam drasticamente nossa fauna como por exemplo o Nim (Neem), que vem aumentando sua plantação no Brasil, essa sim afetaria drasticamente a produção de mel de Santa Catarina", afirma.

Abelha sem ferrão — Foto: Epagri/ Divulgação

Aumentar a proteção das abelhas nativas

As medidas restritivas à Espatódea são necessárias para aumentar a proteção das abelhas nativas brasileiras, conforme Fabiana Barros, presidente fundadora da Associação de Meliponicultores (AME) de Blumenau, proprietária do Meliponário Família Abelha, representante regional da Federação de Apicultura e Meliponicultura de Santa Catarina (Faasc).

"Muitas vezes, não é pensado quando se introduz uma planta exótica como a espatódea. Podemos exemplificar o Neem, que são altamente prejudiciais aos polinizadores em geral. Há um receio de se retirar por serem árvores frondosas que proporcionam sombra boa e bonitas quando floridas. Mas é exatamente por serem assim que são prejudiciais, pois florescem quando há escassez de outras floradas, fazendo com que as abelhas e outros polinizadores a procurem. Não podendo fazer a supressão delas, por algum motivo de força maior, estamos recomendando sua poda antes da floração", disse.

Colmeia de abelha nativa sem ferrão — Foto: Gabriel Siqueira/BBC

Sigfrid Fromming, que integra a Faasc, também destaca a importância da substituição das árvores e que a preocupação na criação de políticas públicas deveria ser estendida para outras árvores exóticas que causam danos aos polinizadores.

"Há uma preocupação com o bem-estar das abelhas de modo geral. Porém, essa iniciativa vem antes pensando na preservação das abelhas nativas sem ferrão, cuja criação está em franco crescimento em todo o Brasil. No momento, a produção de mel das abelhas nativas ainda é insignificante em questões comerciais. Mas em termos de preservação da biodiversidade e da própria subsistência da humanidade, em pouco tempo o valor das abelhas nativas será reconhecido como fundamental. E eliminar uma árvore exótica que causa danos aos polinizadores é um benefício. Vale acrescentar que o maior risco para as abelhas [e para todos os seres vivos] é o ser humano. Mas como esse não pode ser proibido de existir, precisa haver um trabalho consistente de conscientização. É o único jeito", afirma.

Áreas urbanas mais verdes: substituição com plantas nativas

Para o professor do Departamento de Ciências Naturais da Furb André Luís de Gasper, o ideal é que todos municípios tenham planos de arborização urbana efetivos para que as áreas urbanas sejam mais verdes e que favoreçam a fauna local.

"Se for para suprimir árvore, especialmente em área urbana, é necessário um plantio e acompanhamento das novas espécies, que devem ser nativas. O problema é que até uma nativa chegar a grande porte demora, e muitas vezes são plantadas, não acompanhadas e acabam morrendo. Há mais de 5.000 espécies de plantas nativas em Santa Catarina, e acredito que muitas podem servir como fonte de pólen e néctar para as abelhas", explica.

Conheça as espécies exóticas invasoras em Santa Catarina no Desafio Natureza

Conheça as espécies exóticas invasoras em Santa Catarina no Desafio Natureza

VÍDEOS: Veja as reportagens mais assistidas da NSC TV no G1

Veja mais notícias do estado no G1 SC

Veja também

Mais lidas

Mais do G1
Deseja receber as notícias mais importantes em tempo real? Ative as notificações do G1!
  翻译: