Por Memória Globo

Renato Velasco | Arte/Memória Globo

Baterista na adolescência, o carioca Marcelo Luís Mendes Soares da Silva fez uma longa volta para reencontrar-se com sua paixão de juventude. “Trabalhar com música é mais ou menos como ser astronauta, você não acha que vai acontecer de verdade”, confessa. Passou por setores tão distintos quanto empresas de bebida e telefonia antes de entrar na Globo.com, para liderar um projeto de criação de conteúdo para celular. Em pouco tempo, foi convidado para ingressar na Som Livre. Entrou em 2007, como diretor da editora musical da gravadora, e, em 2011, tornou-se o diretor-geral da empresa. Marcelo Soares liderou a transformação digital da maior gravadora brasileira em atuação no país, com a entrada no streaming e a revolução nos negócios que veio a reboque. Sob sua liderança, a Som Livre se tornou um modelo de sucesso no mercado fonográfico.

O Brasil é o único mercado num país ocidental que tem uma empresa como a Som Livre disputando em pé de igualdade com três multinacionais. Claro que graças à Globo.

Marcelo Soares em depoimento ao Memória Globo, 2013. — Foto: Renato Velasco/Memória Globo.

Início da carreira

Filho do economista Luís Carlos Soares da Silva e da professora e promotora de Justiça Nelma Lúcia Mendes Soares da Silva, Marcelo Luís Mendes Soares da Silva nasceu em 8 de junho de 1970, no Rio de Janeiro. Formou-se em comunicação social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), fez um MBA em Finanças em Nova York e começou sua vida profissional cedo, aos 21 anos, na Ambev. Como trainee, teve oportunidade de conhecer diversas áreas e atividades na empresa. Do mercado de cervejas, foi para o de telefonia, primeiro na Telemig Celular, em seguida na Telemar e finalmente na TIM.

A experiência nas telefônicas foi fundamental para que, em 2004, Marcelo Soares começasse sua trajetória na Globo. Contratado pela Globo.com como gerente de produto, sua primeira função foi conduzir a área responsável pela criação de conteúdos para celular. “Era uma fase de conversas e descobertas estratégicas sobre qual seria o melhor posicionamento da Globo para todas as empresas na internet. Um momento de bastante indefinição, mas ao mesmo tempo de muito debate criativo”, relembra. Entre os projetos que desenvolveu na época, estiveram o de votações por mensagens de texto (SMS), como os que aconteciam no Big Brother Brasil, e o Ringtone, que previa o uso de temas musicais de programas da emissora como toques de aparelhos celulares.

Entrada na Som Livre

Para levar à frente essas iniciativas, a interação de Marcelo com outros setores e empresas do grupo tornou-se essencial. Foi assim que surgiu o convite do então diretor-geral da Som Livre, Gustavo Ramos, para dirigir uma unidade de negócio dentro da empresa, em 2007: a editora musical, área responsável pela relação com os autores das composições.

O mercado fonográfico vivia, majoritariamente, da venda física de CDs – de onde vinham 90% das receitas da Som Livre. A maior parte do catálogo da editora havia sido vendida para a Warner-Chappell, mas o acervo ainda contava com algumas músicas reconhecidas como patrimônio cultural da Globo, como Dancin’ Days (1978) e os temas do Fantástico e da Fórmula-1. O desafio de Marcelo era revitalizar e reconstruir o catálogo da empresa, em um cenário em que as trilhas sonoras de novelas representavam de 60% a 70% por cento do negócio – o álbum de Mulheres Apaixonadas (2003), quatro anos antes de sua chegada, vendera 120 mil cópias.

Marcelo Soares empreendeu importantes mudanças. Buscou rejuvenescer a marca da editora – que passou a se chamar Som Livre Edições Musicais –, facilitar o acesso dos artistas à área e, especialmente, mudar o modelo dos contratos, que deixaram de ser definitivos para ter validade limitada. “A gente passou a fechar um contrato de cinco anos, virou padrão. O contrato de cinco anos era renovado se o autor quisesse”, pontua.

Já no fim de 2007, Gustavo Ramos assumiu uma diretoria na Globo.com, e a nova estrutura da Som Livre passou a ter Leonardo Ganem como diretor-geral e Marcelo como diretor de Novos Negócios. Nessa nova posição, Marcelo continuou à frente da editora e acumulou as áreas de execução pública, licenciamento, projetos especiais e os recém-criados departamento de shows e selo Som Livre Apresenta.

Entre 2008 e 2009, a Som Livre passou a investir fortemente em música sertaneja. O ritmo despontava no interior do país, mas ainda não havia chegado com força à maioria das capitais. Luan Santana, um dos primeiros músicos lançados pela gravadora, mostrou que a aposta era promissora, com sucesso de vendas de CDs e DVDs.

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O Som Livre Apresenta (rebatizado para Slap por Marcelo alguns anos depois), voltado para novos artistas, teve como um de seus êxitos o lançamento de Maria Gadú. O primeiro CD da cantora e compositora foi sucesso instantâneo, rapidamente atingindo a marca de 240 mil cópias vendidas, um número absolutamente raro para títulos de MPB nesse período. Artistas como Tiago Iorc, Marcelo Jeneci, Silva, a Orquestra Contemporânea de Olinda e Rodrigo Amarante, também ajudaram a consolidar o Slap como uma grande referência para a nova cena musical brasileira.
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Na direação-geral

Em 2011, Leonardo Ganem recebeu o convite para assumir a GEO, empresa de eventos da Globo, que encerrou atividades no final de 2013. Para o seu lugar na gravadora, a Globo apontou Marcelo Soares, aos 40 anos. “O maior desafio estratégico nesse momento era direcionar a Som Livre, com mais atenção e foco, para um caminho que até aquele momento estava sendo ligeiramente subestimado: o crescimento do negócio digital”, explica ele.

Naquele momento, as trilhas de novelas perdiam paulatinamente a importância, e a pirataria digital, facilitada pelos mecanismos de download, crescia vertiginosamente, colocando em risco toda a indústria da música. Foi quando surgiu o modelo de streaming, inicialmente acelerado pelo YouTube com seu modelo baseado em publicidade, e em seguida o modelo de assinatura, que tem no Spotify sua maior expressão. “Houve um período grande em que muita gente acreditava, e tinha motivos para acreditar, que mesmo se fizesse a coisa certa morreria. Isso porque a pirataria era muito grande e demorou-se muito para criar um modelo viável de música digital. O Brasil foi direto da pirataria para o streaming”, conta o executivo, que soube conduzir a Som Livre a fazer da crise uma oportunidade. Adaptando-se ao consumo digital e lançando novos artistas, a Som Livre se reposicionou, garantindo a lucratividade do negócio. Excetuando-se o fenômeno infantil DVD da Galinha Pintadinha, campeão absoluto de vendas da Som Livre, a música sertaneja se tornou o ritmo de maior sucesso comercial da gravadora, seguido pela música religiosa, com nomes como o do padre Fábio de Melo.

Nesta mesma época, passou a produzir, também, shows, como o Festeja, um festival sertanejo que ganhou espaço na grade da Globo; o Pagode da Hora; e dois voltados ao universo religioso, Você Adora e Promessas.

Sistema Globo de Rádio

Em 2015, Marcelo foi convidado a assumir, também, a direção-geral do Sistema Globo de Rádio. O Grupo Globo buscava construir sinergias entre suas rádios e a Som Livre, e o executivo recebeu a tarefa de modernizar a Rádio Globo. A partir de pesquisas de opinião e modelos internacionais, empenhou-se na reformulação da programação, com objetivo de popularizar o canal. Novas atrações foram lançadas, no Rio de Janeiro e São Paulo, com apresentação de profissionais como Otaviano Costa, Mariana Godoy, Monica Martelli, Fernanda Gentil e Tiago Abravanel. Além disso, investiu também na produção de podcasts.

Com as mudanças empreendidas pelo Grupo Globo a partir de 2018, o que culminou com a unificação de Globo, Globosat, Globo.com, Globoplay, DGcorp – a área corporativa do grupo – e Som Livre em uma só empresa, a Rádio Globo passou por nova reformulação. Encerrou suas atividades em São Paulo, em 2020, mantendo apenas sua programação local no Rio de Janeiro. Marcelo pôde, então, voltar a concentrar-se, exclusivamente, na Som Livre e no que veio a ser um momento decisivo de sua história.

50 anos de Som Livre

A Som Livre completou 50 anos, em 2019, mantendo seu lugar de maior gravadora do Brasil – embora, como ressalta Marcelo Soares, o nome “gravadora” já não seja mais o suficiente para caracterizar a atuação da empresa. Tendo como fonte primária de receita os negócios digitais, seu principal ativo é o seu cast. “Streaming é um negócio de volume, um negócio muito grande. Você não vai conseguir ter uma receita relevante se não tiver alguns milhões de plays acumulados por mês”, ressalta o executivo, para quem o futuro do negócio de música depende do investimento maciço na promoção de artistas.

Com um catálogo diversificado, em que grandes sucessos populares – do pop ao funk, passando pelo sertanejo e gospel – convivem com clássicos do rock e da MPB, a Som Livre continua atenta aos novos talentos e gêneros musicais. As cinco décadas de atuação não acabaram com seu frescor.

Jornal da Globo: reportagem sobre os 50 anos de Som Livre, 12/11/2019.

Jornal da Globo: reportagem sobre os 50 anos de Som Livre, 12/11/2019.

Venda da gravadora

No segundo semestre de 2020, concluindo que o negócio da Som Livre não tinha alinhamento com a visão estratégica da Globo, os acionistas decidiram abrir um estudo de possível venda da Som Livre. Depois de 10 anos consecutivos de grande crescimento, a empresa se transformara em um negócio muito lucrativo, cobiçado por seus competidores. Em abril de 2021, a Globo fechou um acordo com a Sony Music para a venda da gravadora.

Fontes

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