A Advocacia-Geral da União (AGU) desistiu de recorrer da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que deu à primeira mulher transexual da Força Aérea Brasileira (FAB), Maria Luiza da Silva, 63, o direito de se aposentar como subtenente.
Em uma manifestação encaminhada ao STJ nesta sexta-feira, a AGU, que representa a União, informou não ter "interesse recursal" contra a decisão tomada pela Segunda Turma do tribunal na última terça-feira. Com a desistência do recurso pela AGU, a decisão de conceder aposentadoria a Maria Luiza se torna definitiva.
O processo foi aberto por Maria Luiza após ela ser expulsa da Aeronáutica, em 2000, quando finalizou a transição de gênero. Ao fazer o procedimento de mudança de sexo, ela foi considerada "incapaz" e obrigada a se afastar de suas funções, mesmo após 22 anos de serviço militar.
Ao longo de mais de duas décadas de batalha judicial, ela tentou, sem êxito, ser reintegrada à Aeronáutica. Agora, conseguiu não só o direito à aposentadoria, como também a todas as promoções às quais teria direito se tivesse sido permitida a trabalhar.
A decisão de conceder aposentadoria a Maria Luiza foi tomada pelo STJ em 2020, mas houve recurso da AGU. Foi justamente contra este recurso que ela ganhou novamente – mas a união ainda poderia acionar o Supremo Tribunal Federal (STF).
Para a defesa de Maria Luiza, a formalização da manifestação de desinteresse recursal da União é o "marco histórico e definitivo do direito à sua reintegração à Aeronáutica e consequente aposentadoria".
"É simbólico, pois há mais de duas décadas esse processo tramita no Poder Judiciário com inúmeros recursos da União. A discussão acaba e se pode dizer que teve uma finalização positiva com um ato formal da União em não mais recorrer, pois haveria, ainda que com ressalvas sobre seu real poder jurídico, a possibilidade de mais recursos", afirma o advogado Max Telesca.
Na decisão mais recente do STJ, o ministro Herman Benjamin, relator do processo, confirmou o entendimento de que Maria Luiza deve ter todos os seus direitos garantidos.
"À vista disso, é inconcebível dizer, como faz a União, que a agravada tem direito à aposentadoria integral apenas no posto de cabo engajado. Prestigiar tal interpretação acentua a indesculpável discriminação e os enormes prejuízos pessoais e funcionais sofridos nos últimos 20 anos", apontou o ministro.
A história dela foi contada no documentário "Maria Luiza: primeira mulher trans das Forças Armadas brasileiras", lançado em 2019, com direção do cineasta Marcelo Díaz.