Carlos Eduardo Mansur
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Carlos Eduardo Mansur
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Carlos Eduardo Mansur

Por , O Globo — Rio de Janeiro

Antes de aparecer vestindo a camisa do Corinthians, Gabigol tinha alguns trunfos importantes no jogo de xadrez em que se transformara a renovação de seu contrato com o Flamengo. O mais potente deles, a fidelidade da arquibancada.

Era sintomático que, partida após partida, seu nome fosse gritado pela torcida rubro-negra, como um pedido para que o treinador de turno o colocasse em campo. Porque, claramente, o futebol jogado pelo atacante, ao menos nos últimos 15 meses, já não correspondia ao clamor popular. Ao contrário, a cada vez que entrava, exibia uma versão pálida, embora mais corpulenta, do jogador de 2019. Na verdade, como num exercício de fé, era a melhor versão de Gabigol que a arquibancada invocava. Mesmo que, no subconsciente, soubesse ser difícil reencontrá-la. Gabigol se tornara o símbolo de dias felizes, ídolo de uma geração.

Num raciocínio que colocasse na mesa apenas aspectos técnicos e econômicos, era fácil concluir que este Gabigol de 2023 e do que vai de 2024 não justifica o custo de uma renovação. Ao menos nos termos desejados pelo atacante. A complexidade, no entanto, estava em assumir a autoria do divórcio com um ídolo, ser o dirigente responsável pela assinatura que oficializa a separação. E se Gabigol, revigorado ao respirar novos ares, desandasse a fazer gols como em 2019?

Pois, ao menos por ora, foi este trunfo que Gabigol perdeu ao machucar, com uma foto, tanta gente que o apoiava. E, pior, ao apresentar uma versão que, logo se saberia, não era verdadeira. A entrevista em que assumiu não ter dito a verdade ainda não parece tirá-lo de uma posição em que há alguns anos ele não se via no ecossistema rubro-negro: a de parte mais fragilizada, a de um jogador que precisa reconquistar o público.

E aqui surge um cenário aparentemente paradoxal: Gabigol nunca se viu tão em xeque desde que chegou ao Flamengo mas, ao mesmo tempo, nunca viu se desenhar um cenário tão próximo daqueles em que sua melhor versão emergiu. Se ainda há alguma possibilidade de reparar esta relação, talvez esteja no caos que, hoje, cerca o atacante.

Projetar o futuro depende, primeiro, de saber o que Gabigol realmente deseja. Se sua ideia é deixar o Flamengo, é possível antever meses um tanto melancólicos na reta final deste relacionamento. No entanto, se estiver disposto a reconquistar a arquibancada, pode enxergar na própria desconfiança que passou a cercá-lo um ponto de partida. Afinal, há jogadores que funcionam melhor quando desafiados. Gabigol sempre foi assim.

Em 2018, voltou da Europa um jogador que precisava desfazer a impressão de ter fracassado fora do Brasil, por mais cruel que fosse dar uma sentença deste tamanho sobre um jovem que, à época, tinha 21 anos. E aquele Gabigol terminou o ano como artilheiro do Brasileiro e da Copa do Brasil pelo Santos. No ano seguinte, emprestado pela Inter de Milão e com um ano para provar que merecia ser comprado pelo Flamengo, fez a temporada de sua vida, coroada com os gols da final da Libertadores, um momento de antologia. No ano seguinte, o primeiro de seu novo contrato como Flamengo, manteve o nível alto. Até que, pouco a pouco, fosse indisfarçável a sensação de que, conforme seu contrato longo lhe dava estabilidade, esta vinha acompanhada de certa acomodação.

Agora, Gabigol voltou a se ver obrigado a se provar. No futebol, os gols redimem, absolvem, mas o caminho parece tão longo quanto o tempo perdido. Gabigol tem, no máximo, mais seis meses de Flamengo. Resta saber se será o bastante para recuperar a forma, o jogo e a arquibancada. E, assim, fazer o dilema sobre um novo contrato voltar à mesa da direção rubro-negra.

Influência

Doze ligas em 15 temporadas, seis títulos ingleses em oito anos, quatro seguidos... Há uma coleção de números sobre Guardiola. No entanto, o que definirá sua trajetória será outra palavra: influência. Seus times reverteram uma tendência conservadora no futebol, redefiniram conceitos do que é jogar bem e criaram um modelo que o mundo tentou copiar. Há um antes e um depois de Guardiola.

Respeito

Ao dar adeus ao Liverpool, Jürgen Klopp deixou uma lição de respeito: “Não sei o que aconteceu (em relação às denúncias contra o City), mas nenhum outro técnico ganharia quatro vezes seguidas. Guardiola é o melhor do mundo”. O catalão quase foi às lágrimas: “Klopp foi muito importante, me levou a outro nível”. No esporte, a busca da melhor versão depende de grandes adversários.

Incógnita

É impossível qualquer prognóstico sobre o Vasco que pega o Fortaleza, hoje. Não se pode dizer se Álvaro Pacheco irá comandar o time. Tampouco se a folga permitiu ao interino Rafael Paiva melhorar o nível de jogo. O clube, em meio à disputa acionária entre a associação e a 777 Partners, vive natural insegurança. Isolar o futebol da batalha nos tribunais é a missão de quem cuida do Vasco.

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