Com expansão de fontes renováveis, empresas treinam funcionários para driblar escassez de mão de obra

Em consultorias especializadas, seleção de candidatos para a área responde por até 40% do recrutamento. Salários podem chegar a R$ 40 mil em cargos gerenciais

Por — Rio de Janeiro


Após seis anos na área de planejamento da Neoenergia, a economista Mariana Cerqueira, de 39 anos, migrou para a unidade de negócios renováveis da empresa Márcio Alves/Agência O Globo

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GERADO EM: 26/06/2024 - 06:00

Empresas investem em energia renovável e enfrentam escassez de mão de obra qualificada

Empresas investem em energia renovável e enfrentam escassez de mão de obra qualificada. Treinam funcionários internos e buscam parcerias com instituições de ensino. Salários de até R$40 mil em cargos gerenciais. Impulsionando a criação de empregos verdes no Brasil.

O investimento na geração de energias renováveis vem abrindo novas oportunidades no mercado de trabalho, os chamados “empregos verdes”. São vagas desde o chão de fábrica até os mais altos níveis de liderança, com salários de até R$ 40 mil. Em alguns casos, a dificuldade de encontrar profissionais qualificados para os novos projetos tem levado as empresas a treinarem pessoas do próprio quadro para preencher as vagas.

Somente o setor de energia solar abriu 363.340 postos de trabalho em 2023, considerando empregos diretos e indiretos, 10% a mais que em 2022. Neste ano, até maio, são mais 186 mil vagas, segundo a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).

Já a cadeia de produção de energia eólica criou cerca de 8,1 mil empregos em 2023, mais que o triplo do registrado no ano anterior, de acordo com a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica e Novas Tecnologias (ABEEólica), Elbia Gannoum.

Para os próximos anos, o ritmo de abertura de vagas no segmento eólico tende a reduzir, com menos parques entrando em operação. Ainda assim, Adriano Bravo, CEO da Petra Group, consultoria de recrutamento, avalia que o setor de renováveis é promissor. O serviço especializado nessa área já responde por 40% das atividades da companhia.

— Nas posições operacionais, não existe oferta de mão de obra suficiente para ocupar a demanda. Por isso, é comum as empresas fazerem parcerias com centros de ensino técnico e criarem turmas de capacitação, mirando principalmente quem já tem alguma experiência em indústrias — diz Bravo.

Ele avalia que o salário para um eletricista em início de carreira em cidades do interior do Brasil chega a R$ 4.000 no segmento de renováveis. Entre outros profissionais requisitados estão os que atuam na fabricação, instalação e manutenção de equipamentos, engenheiros e especialistas em marketing, gestão de projetos, meio ambiente e responsabilidade social.

Segundo Bravo, há dificuldade também na retenção de talentos. Por isso, de 2023 para 2024, houve aumento salarial real de 15% a 20% para cargos de gerência e diretoria nessa área. A remuneração para funções gerenciais varia de R$ 25 mil a R$ 40 mil, estima.

Capacitação

A AES Brasil, de geração e comercialização de energia elétrica a partir de fontes renováveis (hídrica, eólica e solar), tem atualmente 670 funcionários, 12% a mais do que em 2023. A ampliação do quadro é fruto da expansão contínua da empresa, que dobrou sua capacidade de geração de energia nos últimos seis anos.

Em outubro de 2023, a companhia inaugurou o Complexo Eólico Tucano, na Bahia, que é 100% operado por mulheres. Das 11 operadoras efetivadas na unidade — responsáveis pela fiscalização, manutenção e gestão dos aerogeradores e outros equipamentos da usina —, cinco se formaram em um curso de especialização técnica desenvolvido pela AES Brasil em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial da Bahia (Senai Bahia).

Uma delas é a operadora de turbinas eólicas Lysara Pinheiro, de 25 anos. Ela, que é técnica em eletromecânica, atuava antes como eletricista em uma indústria química. Quando soube da oferta, resolveu participar do processo seletivo.

— A princípio, me inscrevi por curiosidade. Mas o curso despertou em mim a expectativa de mudar de área — conta Lysara, que terminou a capacitação em agosto de 2021, foi contratada em março de 2022 e, agora, entrou para a faculdade de Engenharia Elétrica.

Lysara Pinheiro é uma das 11 operadoras do parque eólico da AES na Bahia — Foto: Divulgação

No Rio Grande do Norte, a AES Brasil deve finalizar, até o fim do ano, a construção do Complexo Eólico Cajuína, que também será totalmente operado por mulheres. Parte da unidade começou a funcionar no segundo semestre de 2023, e nove colaboradoras foram contratadas.

Um curso de especialização técnica nos mesmos moldes do oferecido na Bahia foi concebido pela empresa junto com o Senai RN, com o objetivo de capacitar trabalhadoras da região. A primeira turma se formou em agosto do ano passado.

Segundo o diretor de Recursos Humanos, Gestão e Serviços Compartilhados da AES Brasil, Rodrigo Porto, a iniciativa de ter unidades com operação 100% feminina surgiu da urgência de promover a diversidade, após um censo interno em 2020 apontar que 98% dos operadores nos parques de energia eram homens:

— Em quatro anos, a inserção feminina nas nossas operações chegou a 31%.

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Equipe multidisciplinar

Na Neoenergia, que tem 16 mil empregados, a expectativa é contratar cerca de 50 pessoas nos próximos 24 meses na frente de negócios em energias renováveis, que corresponde a 88% da geração de energia da companhia.

A empresa ampliou recentemente a equipe de consultores comerciais, com mais 30 posições nos últimos seis meses, em razão das demandas de negociação com clientes no mercado livre. Metade foi recrutada no mercado, e a outra metade, selecionada internamente.

Diante da dificuldade de encontrar mão de obra, a empresa criou uma solução caseira, uma espécie de escola de formação em energias renováveis com conteúdo para várias carreiras.

— Consolidamos um caminho para preparar e treinar colaboradores — explica o diretor de Pessoas da Neonergia, Fabio Dias Folchetti.

Após seis anos atuando na área de planejamento e controle financeiro da Neoenergia, a economista Mariana Cerqueira, de 39 anos, migrou para vertical de Negócios Renováveis da empresa, onde ocupa o cargo de gerente de Planejamento de Negócios Renováveis há dois anos.

No novo departamento, ela, cuja função é desenhar modelagens financeiras em conformidade com os desafios ESG (sigla para ambiental, social e de governança), acredita que passou a ter uma visão mais completa do setor.

— No planejamento de negócios renováveis, é preciso integrar várias áreas e trabalhar com uma equipe multidisciplinar composta, por exemplo, por advogados, meteorologistas e antropólogos — diz.

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