Aborto legal: o que é a assistolia fetal e por que os médicos a consideram importante?

Procedimento, que foi alvo recente de resolução do CFM, é necessário para garantir a interrupção da gravidez em fases mais avançadas

Por O GLOBO — Rio de Janeiro


Mulher aperta as mãos durante procedimento de aborto no Alabama, EUA NYT

Nesta semana, a Câmara dos Deputados aprovou um pedido de urgência para o projeto de lei que equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples – ainda que a Constituição brasileira não estabeleça limite de tempo gestacional para os casos de interrupção legal da gravidez.

Em abril, o Conselho Federal de Medicina (CFM) fez um movimento semelhante ao publicar uma resolução em que proibia a realização de um procedimento necessário para o aborto depois da 22ª semana, a assistolia fetal. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a medida.

Mas afinal, o que é a assistolia fetal, técnica que está no centro das propostas recentes que buscam restringir o aborto legal, e por que ela é defendida pelos especialistas para os casos de interrupção da gravidez em fases avançadas?

'PL do estupro': entenda o que muda se projeto de lei for aprovado

O que é a assistolia fetal?

A assistolia fetal é um método recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) quando a gestação é interrompida acima de 20 semanas, segundo as últimas diretrizes divulgadas em junho de 2023.

Ela consiste na injeção de determinados agentes farmacológicos, geralmente o cloreto de potássio, para interromper os batimentos cardíacos do feto, que depois é retirado da barriga da mulher para completar o procedimento do aborto.

Na época da resolução do CFM, Rosires Pereira, presidente da Comissão Nacional Especializada em Violência Sexual e Interrupção Gestacional Prevista em Lei da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), explicou que a assistolia é indispensável:

— Sem a conduta da assistolia fetal, a interrupção da gravidez tardiamente não pode ser realizada. Porque o direito na Lei é para um aborto que tire a vida do feto. Mas a indução do parto nessa fase gestacional pode levar ao nascimento de bebês com vida e com risco de diversos problemas de saúde, como questões neurológicas. E a Lei não define limite de idade.

O aborto é permitido no Brasil?

Hoje, no Brasil, a interrupção da gravidez é permitida quando há risco de vida para a mulher e quando a gestação resulta de um estupro, de acordo com o Código Penal, além dos casos em que há anencefalia do feto, por entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF). Para todos os casos, não há limite de tempo gestacional.

— Os estudos mostram que (a assistolia fetal) é indolor para o feto. Com o feto morto, se induz o aborto, e será expulso via vaginal. Não é um parto. Outra mentira é que esse procedimento é feito com oito ou nove meses. Isso não ocorre. Existe um ou outro caso de sete meses, como aquele de Santa Catarina, porque enclausuraram a menina por motivações ideológicas — disse o ginecologista Olímpio Moraes, diretor médico da Universidade de Pernambuco e referência em aborto legal no país, em entrevista ao GLOBO.

Pereira da Febrasgo lembrou ainda que muitos casos chegam a idades gestacionais avançadas devido a fatores como a baixa oferta de serviços no país, a burocracia necessária para acessar o direito, como exames e, por vezes, autorização judicial, e o fato de grande parte dos casos serem em menores de idade que foram violentadas:

— Como temos poucos serviços que o fazem, muitas mulheres não têm acesso no início da gestação. Outro ponto é que meninas de 10, 11 anos que engravidam por um estupro demoram para buscar o procedimento, porque muito frequentemente a violência vem da própria casa, de familiares. Podem demorar até mesmo para notarem as mudanças corporais. E há muitos casos de violência em que as mulheres são mantidas em cativeiro. São esses casos, que geralmente envolvem mulheres pobres, negras e sem acesso, que serão afetados pela resolução — continua.

Mais recente Próxima Bryan Johnson, milionário americano que busca passar dos 200 anos lança venda de sua 'dieta antienvelhecimento': 100 pílulas em suco