Dorrit Harazim
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Dorrit Harazim

Jornalista e documentarista

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Dorrit Harazim

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GERADO EM: 30/06/2024 - 00:05

Desafios de Biden após debate

O naufrágio de Biden no debate contra Trump gerou preocupações nos democratas sobre sua capacidade de liderar. A imprensa destacou sua fragilidade física e cognitiva, levantando questões sobre sua candidatura e a possibilidade de reeleição de Trump.

Faltam dois meses até a convenção nacional do Partido Democrata, marcada para os próximos dias 19 a 22 de agosto, em Chicago. O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, vencedor das arrastadas eleições primárias em que foi praticamente candidato único, aguardava apenas a consagração formal. A participação da escritora e líder espiritual Marianne Williamson foi efêmera, entrou em colapso na largada. E a tentativa do congressista pelo estado de Minnesota Dean Phillips, de 55 anos, para se manter no páreo chegou a ser considerada insolente pelos caciques do partido.

Tudo mudou ao longo dos 90 minutos de agonia e choque, na noite de quinta-feira, quando 47,9 milhões de telespectadores assistiram a um presidente dos Estados Unidos de esgar opaco, aspecto confuso e vulnerável, em busca de um raciocínio perdido. O naufrágio de Biden no primeiro debate com o oponente republicano, Donald Trump, sacudiu os democratas de alto a baixo. As primeiras horas após a debacle foram de “barata-voa”.

Os mais alarmados consultavam os estatutos partidários à procura de regras para substituir Biden antes da convenção nacional. Nada encontraram, por ser uma situação sem precedentes. Os mais catastrofistas chegaram a aventar a hipótese de ele renunciar ao mandato e abrir caminho desde já à vice, Kamala Harris. E os mais realistas sugeriram seu afastamento apenas da disputa eleitoral, deixando aos delegados à convenção a escolha de uma alternativa de última hora. Segundo a Ballotpedia, conhecida como enciclopédia da política americana, serão 4.672 os delegados aguardados em Chicago, 3.933 dos quais votam no primeiro escrutínio. Desses, Biden somou nas primárias 3.894 votos fechados. Na primeira rodada, basta ao candidato obter maioria simples para ser ungido. Se isso não ocorrer, há nova rodada e passam a votar os 739 delegados cujo voto não está vinculado (também conhecidos como “superdelegados”).

“Fale somente se for para melhorar o silêncio. Gandhi”, postou o congressista Phillips. No day after, em meio a todas essas conjecturas correndo soltas, Joe Biden parece não ter percebido a extensão da insegurança global gerada pelo desempenho na véspera. Reapareceu energizado, como se nada tivesse ocorrido, num comício em Raleigh, Carolina do Norte, e anunciou a sua arma para derrotar Trump em novembro:

— Pessoal, eu não caminho com a agilidade de antes, não falo com a fluidez do passado, tampouco sou o debatedor bom que já fui. Mas sei o que definitivamente sei: eu sei falar a verdade.

Capa do audio - Vera Magalhães - Viva Voz

Por mais louvável que seja lembrar o valor da verdade em tempos atuais, isso não basta para impedir que uma figura tóxica como Trump, movido a instintos ferais, além de astuto e sem compromissos com a decência, volte a ser eleito para a Casa Branca. Biden tinha uma única missão no debate: tranquilizar os americanos de que estará apto, com 82 anos em janeiro, a assumir novo mandato de quatro anos como comandante em chefe do país. Não conseguiu, apesar de ter se trancado por uma semana em Camp David com 16 assessores e coaches, em meticulosa preparação para o embate. Uma réplica dos dois pódios foi montada na casa de campo presidencial, com simulação exata da posição dos dois moderadores da CNN, e vários assessores se revezando no papel do adversário. Nada adiantou: Trump pôde surfar à vontade numa vigorosa sucessão de mentiras colossais.

Ao final do debate, desorientado, Biden encontrou a saída do palco guiado pelo braço amigo de sua mulher. Sua chegada a Atlanta já deveria ter alertado sobre algo que não estava bem. Biden descera do Air Force One da Presidência, fizera uma saudação militar ao vento e rumara em direção à limusine sem perceber a galeria de autoridades que o esperava. A comitiva alinhada, incluindo o prefeito da cidade, não sabia o que fazer. Só então o presidente retornou ao pé da escada e cumprimentou um a um. Detalhe: a CNN fez o possível para não destacar esse “momento sênior” do presidente.

A grande mídia dos Estados Unidos, aliás, é corresponsável pelo espanto e pelo choque sentidos por meio mundo diante da fragilidade física e cognitiva de Biden no debate. Ao longo dos últimos três anos e meio, tanto a Casa Branca e sua equipe de comunicação quanto os caciques do Partido Democrata, boa parte da imprensa liberal e os familiares de Biden se dedicaram a minimizar o fator idade do presidente. Quando o conservador Wall Street Journal, poucas semanas atrás, publicou ampla reportagem sobre os momentos de ausência mental do presidente em reuniões e no exercício do poder, foi severamente criticado, até por outros jornais.

— Esse tema precisava ser levantado, mas nenhuma outra mídia de envergadura quis abordá-lo — contou à Semafor a diretora de redação do WSJ, Emma Tucker.

A reportagem é devastadora.

Em nome de sua biografia, pela sobrevivência do que resta do Partido Democrata e pelo futuro dos Estados Unidos, Joseph Biden não deveria correr o risco de eleger Donald Trump.

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