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Por Julio Cesar Lyra — Rio de Janeiro

O número de pessoas desaparecidas na Baixada Fluminense chegou, entre janeiro e novembro de 2022, ao maior patamar desde 2016. Foram 1.360 registros na região, o equivalente a um caso a cada seis horas, em média, segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP). O dado representa um aumento de 20% em relação ao mesmo período de 2021.

Janeiro e outubro de 2022 foram os meses com mais ocorrências: 146 e 140 desaparecimentos. Em novembro, último mês com dados divulgados pelo ISP, houve 122 pessoas desaparecidas na Baixada.

Segundo especialistas, os casos gerais de desaparecimentos na região podem estar ligados à ainda alta presença de adolescentes e jovens nas periferias com alto índice de vulnerabilidade socioeconômica e até mesmo casos decorrentes de transtornos psiquiátricos sem acompanhamento adequado. No entanto, uma modalidade de desaparecimento chama atenção e recai sobre os dados e registros: os desaparecimentos forçados. É o que explica o coordenador do Fórum Grita Baixada (FGB), Adriano de Araujo, responsável por um estudo que trata dos desaparecimentos forçados na Baixada, desenvolvido junto à Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

— Em nossa leitura, há uma percepção de que parte significativa são casos de desaparecimentos forçados, ou seja, não intencionais, oriundos de ações criminosas, seja do tráfico, seja da milícia ou mesmo pela ação ilegal, e portanto, tambem criminosa, de agentes das forças públicas de segurança — diz Adriano.

Eixos da criminalidade e o impacto nos números

Do total de desaparecimentos entre janeiro e novembro de 2022, quase um terço dos casos (31%) ocorreu na Área Integrada de Segurança Pública (Aisp) 20, que cobre os municípios de Nova Iguaçu, Mesquita e Nilópolis. Uma Aisp é equivalente ao espaço de atuação de um batalhão da Polícia Militar. Na área do 20º BPM, 429 pessoas desapareceram entre janeiro e novembro do ano passado, um crescimento de 15% em relação aos mesmos 11 meses de 2021. Em todos os seis batalhões da região, porém, houve aumento no índice.

O fato é explicado pelo sociólogo José Cláudio Souza Alves, professor e pesquisador da UFRRJ. Segundo José Cláudio, dois grandes eixos atuantes nos três municípios atendidos pelo batalhão ilustram os dados, que, para ele, estão aquém da realidade na região e não correspondem à verdadeira quantidade de pessoas desaparecidas.

— Os dados oficiais não correspondem à realidade. A existência dos cemitérios clandestinos e de toda uma prática pedagógica do terror nessas comunidades inibe de uma forma assustadora e monstruosa qualquer tentativa de denúncia, de registro. O eixo Nova Iguaçu-Mesquita-Nilópolis possui duas grandes dinâmicas de atuação de grupos armados que explica imensamente porque essa região concentra números tão expressivos de desaparecidos — explica.

Em Nova Iguaçu, cidade com cerca de 800 mil habitantes, a ação e a expansão intensa da milícia ligada a Wellington da Silva Braga, o Ecko, morto em 2021 — com domínio no entorno da Estrada de Madureira e operação em bairros como o Km 32, Jardim Paraíso, Grão Pará e Marapicu, tomados em 2019 —, está diretamente ligada à alta de desaparecimentos, diz o especialista.

Atuação da milícia

Já em Mesquita e Nilópolis, outro eixo, um pouco diferente de Nova Iguaçu, se destaca: os dois municípios também têm ligação com a atuação das milícias, mas, além disso, há relação com a própria ação dos agentes lotados no 20º BPM. Ou seja, segundo José Cláudio, os agentes agem com intensidade em embates com o Comando Vermelho que atua no Complexo do Caonze e, principalmente, no que ele chama de Complexo da Chatuba, localizado em Mesquita, com fronteira em Nilópolis.

— São dois vetores, dois eixos que intensificam muito os desaparecidos, a partir da lógica do desaparecimento forçado. Um é a Liga da Justiça, em Nova Iguaçu, e o outro é a presença forte e consolidada do Comando Vermelho na Chatuba, principalmente, mas também no Caonze, formando um bloco de confronto com o 20º BPM e com toda a estrutura miliciana que disputa esses territórios — explica.

Pesquisa desenvolvida recentemente pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), lançada em setembro deste ano e em fase de conclusão, mostrava que, em cinco anos, entre 2016 e 2020, existiram 361 desaparecimentos forçados na Baixada Fluminense.

De acordo com a titular da Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense (DHBF), Ana Carolina Lemos, os desaparecimentos crescem na região à medida que as milícias passam a ser cobradas de forma mais dura pelas mortes. É a partir disso que há uma alteração no modus operandi das mortes na região.

— Passaram a “dar sumiço” nos corpos, com isso aumentando o número de desaparecimentos. Soma-se a isso o fato de termos passado por uma pandemia, durante a qual os números caíram pois as pessoas não saiam de casa, observando-se um aumento natural após este período mais restritivo. Mas cabe salientar que estamos trabalhando com um bom percentual de elucidação, leia-se, encontro de desaparecidos, girando em torno de 80% — diz a delegada.

A intensificação da violência, para os especialistas, explica o aumento dos desaparecimentos ocasionados pela dinâmica da estrutura de poder com controle territorial armado, com participação da milícia operando contra as comunidades de domínio do Comando Vermelho, com consequências até mesmo eleitorais em regiões como o município de Belford Roxo.

— É uma lógica muito presente na dinâmica da cidade. E como matar traz um prejuízo, a dinâmica de desaparecer com os corpos ganha um super destaque nesse caso — explica o sociólogo José Cláudio.

Denúncias por categoria na Baixada Fluminense — Foto: Reprodução
Denúncias por categoria na Baixada Fluminense — Foto: Reprodução

Analisando-se as áreas de atuação das delegacias — denominadas Circunscrições Integradas de Segurança Pública, ou Cisps — fica ainda mais evidente o problema dos desaparecimentos na Baixada Fluminense. Das dez delegacias do estado com mais casos registrados entre janeiro e novembro de 2022, cinco ficam na região. A 54ª DP (Belford Roxo) teve 215 ocorrências, seguida pela 58ª DP (Posse), com 149 desaparecimentos, 64ª DP (Vilar dos Teles), com 148 casos, 59ª DP (Duque de Caxias), com 107 desaparecidos, e 56ª DP (Comendador Soares), com 101 vítimas.

Realidade histórica

Segundo Adriano de Araujo, os indicadores de violência e desaparecimento vem, historicamente, alternando entre as cidades de Belford Roxo, Nova Iguaçu, Caxias e São João de Meriti. Além de serem regiões populosas, são marcadas pela presença de áreas diversas em situação de disputa.

— No caso específico de Belford Roxo há um confronto generalizado dos grupos criminosos e forças de segurança que vem produzindo mortes diárias, invisíveis para a maioria da sociedade e do próprio poder público, conivente com esse quadro. Há envolvimento de determinados agentes políticos que, em decorrência de acordos eleitorais, acabam impactando de maneira especial no município — diz o coordenador do FGB.

A história dos desaparecimentos começa na década de 1960, quando já existiam casos notificados na Baixada. A partir de 1964, a prática tornou-se uma marca, segundo o sociólogo José Cláudio Alves, que contextualiza o fato à formação dos grupos de extermínio na região. Com o passar dos anos, a operação desses grupos começa a tomar uma nova forma, configurando-se, então, na figura das milícias, já na década de 1990.

— Esse grupo armado ampliou muito seus negócios, o controle territorial e, principalmente, os confrontos com outros grupos armados, principalmente com o Comando Vermelho, o que é fator decisivo de confrontos, mortes e desaparecimentos forçados nessa região como um todo. Essa é uma marca da história da Baixada. Todo esse conjunto paisagístico, o bioma, a ocupação urbana, a estrutura de poder político, a existência de estruturas de execução sumária por dentro do aparelho do estado — explica José Cláudio.

Em Belford Roxo, o especialista considera que há uma originalidade na maneira como os desaparecimentos se dão e na relação deles com a estrutura de milícia, a começar pelo que apontam como sendo uma estrutura “fortemente articulada com a estrutura do poder estatal municipal”, sobretudo a partir da implantação de um destacamento do 39º BPM no Complexo do Roseiral.

— O Complexo do Roseiral, que vinha, desde 2010, se transformando em uma área de controle do Comando Vermelho, passou a sofrer, a partir de então, operações permanentes e constantes de confronto entre a estrutura miliciana e a estrutura do Comando Vermelho — diz o sociólogo.

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