Saúde
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Por — Rio de Janeiro

Uma nova revisão conduzida por pesquisadores da Universidade de Queensland, na Austrália, e publicada na revista científica Schizophrenia Bulletin, repercutiu ao analisar 17 estudos, conduzidos entre 1980 e 2023, e concluir que há uma associação entre ter gatos na infância e um risco aumentado para esquizofrenia. Mas o quão sólida é essa ligação? E quais seriam os motivos para isso?

Os autores escrevem na revisão que, com base nos estudos analisados, “indivíduos expostos a gatos tinham aproximadamente o dobro de chances de desenvolver esquizofrenia” – embora afirmem que alguns trabalhos tinham qualidade baixa e que melhores estudos são necessários.

“Em conclusão, a nossa revisão fornece suporte para uma associação entre a posse de gatos e doenças relacionadas com a esquizofrenia. (...) Dentro desse contexto, há necessidade de mais estudos de alta qualidade, baseados em amostras grandes e representativas, para melhor compreender a posse de gatos como um candidato a fator modificável de risco para transtornos mentais”, dizem os pesquisadores.

O psiquiatra Ricardo Steffen, coordenador da pós-graduarão em Psiquiatria da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), explica que a associação não é algo novo na ciência, os próprios autores da revisão citam um estudo de 1995 que já investigava a relação.

— O estudo é uma revisão sistemática que pegou todos os trabalhos já publicados sobre o tema. Esse tipo de trabalho utiliza métodos estatísticos para combinar todos os estudos numa única medida. E o que os pesquisadores encontraram é essa associação entre o contato com gatos na infância e o desenvolvimento da esquizofrenia. É uma indicação, mas os próprios pesquisadores pedem estudos melhores. E como são trabalhos observacionais, não se pode falar em fator causal — diz o especialista.

Estudos observacionais são trabalhos que analisam a ocorrência de fenômenos, eventos, comportamentos, hábitos durante um período de tempo e busca uma relação entre eles. Ainda que possa traçar associações importantes – com estudos desse tipo indicando, por exemplo, práticas associadas a um maior risco de câncer – o estudo observacional não pode definir 100% que se trata de uma relação de causa e consequência.

— Quando falamos em doença mental falamos em fatores de risco. Muitos não são modificáveis, como idade, histórico familiar. Mas exposição a algo é modificável, o tabagismo por exemplo. Então esse estudo precisa ser um pontapé para entender se existe uma janela de exposição que aumenta mais o risco pela exposição a gatos, se há algo que de fato pode ser feito — diz o psiquiatra.

Steffen explica, porém, que essa relação não é à toa: a ligação de gatos com a esquizofrenia seria explicada pela infecção com o parasita Toxoplasma gondii, causador da toxoplasmose. Isso porque o felino é parte crucial do ciclo de vida do protozoário.

Quando ele ingere presas infectadas, o parasita se instala no trato digestivo do animal, onde se reproduz e produz oocistos. Depois, os gatos infectados excretam esses oocistos (um estágio de desenvolvimento do parasita) nas fezes. O contato com as fezes contaminadas – ou com a terra que tenha sido exposta a elas – pode levar ao contágio do humano.

— Existe essa explicação plausível (entre ter gatos e ter maior risco para esquizofrenia) que é a infecção pelo T. Gondii. É um protozoário que se reproduz no intestino dos gatos e quem está exposto aos animais está em maior risco. Costuma ser infecção comum, mais grave apenas para pacientes imunossuprimidos e gestantes. Mas qualquer infecção, e a reação a ela, pode gerar alterações no cérebro e comportamentais. E alguns estudos com pacientes com esquizofrenia mostram que eles têm uma maior taxa de infecção pelo toxoplasma. Isso já é bem investigado — continua o psiquiatra.

Trabalhos estimam que até cerca de 30% da população pode já ter sido infectada pelo T. gondii durante a vida. O parasita pode ser contraído também por meio de água contaminada ou carne mal cozida. Entre pacientes com esquizofrenia, porém, uma análise de 38 estudos, publicada também no Schizophrenia Bulletin, em 2012, apontou que a a probabilidade é quase três vezes maior de haver anticorpos contra o toxoplasma no sangue, ou seja, um indicativo de infecção pela prévia pelo protozoário.

— O indivíduo infectado pode apresentar diversas manifestações, inclusive neurológicas e, dentre as neurológicas, as alterações de comportamento de caráter psicótico, assemelhadas ou próprias da esquizofrenia — diz o psiquiatra Luiz Sampaio, diretor do Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura.

Isso porque o parasita na sua fase de oocisto pode se infiltrar no sistema nervoso central. A infecção com o T. gondii já foi inclusive associada a mudanças de personalidade e comportamentais em outras espécies animais. Um trabalho na revista científica Communications Biology mostrou que lobos contaminados no Parque Nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos, têm até 46 vezes mais chances de liderar a matilha do que os saudáveis. Ainda assim, Sampaio pondera que o novo estudo não deve ser utilizado como um alerta para não ter gatos:

— Embora os resultados mostrem uma associação positiva, isso não deve ser interpretado como uma relação causal, ou seja, nem todas as pessoas que convivem ou possuem gatos vão ser infectadas pelo toxoplasma, e nem todas as infectadas vão desenvolver distúrbios psicóticos, dentre eles a esquizofrenia. Portanto, quem tiver filhos pequenos e gatos podem continuar convivendo com seus felinos, desde que mantenham os cuidados.

Um ponto, por exemplo, é que a revisão não separou gatos que apenas permanecem dentro de casa, alimentando-se de ração, daqueles que vão para a rua – e por isso estão em maior risco de caçar e contrair o parasita.

— É importante que os gatos sejam levados com constância ao veterinário e sejam bem alimentados com ração própria, isso evita com que os bichinhos cacem para comer, que é uma fonte de infecção, bem como a ingestão de carne crua — orienta.

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