#03 | Criatividade em tempos de perda: um luto de ideias
Uma edição sobre o luto em suas diversas formas: a perda de um ente querido, o fim de um ciclo e as transições da vida, e como tudo isso impacta nossa criatividade.
Às vezes, o luto nos leva a querer apagar tudo, como se pudéssemos borrar nossas experiências e as memórias que fazem parte da nossa bagagem criativa que acumulamos ao longo da vida.
Para quem, como eu, vive da criação, as experiências de perda e términos, podem se transformar em um verdadeiro cemitério para novas e boas ideias.
Mas aqui vai a chave: entender que a criatividade também é alimentada por essas experiências — mesmo as mais dolorosas — é essencial para reencontrar nossa voz e reinventar nosso processo criativo.
A dor do luto: um luto sem fim?
Após a perda do meu pai, vivenciei um processo de luto que transformou radicalmente minha relação com a criatividade.
A dor foi tão intensa que, em momentos de desespero, senti como se estivesse tentando apagar memórias na esperança de aliviar o sofrimento.
Mas, ao tentar eliminar essas lembranças, percebi que também estava eliminando partes essenciais de mim mesma e da minha história.
O luto não é apenas a ausência de alguém; ele muda profundamente a nossa realidade.
Tentar passar por uma experiência de perda sem sentir a dor é como se tentássemos reescrever nosso próprio roteiro, sem perceber que são essas memórias — mesmo as mais difíceis — que alimentam nossa imaginação e nossa capacidade de criar.
Nesse espaço de dor, muitas vezes encontramos nosso próprio acolhimento e autocuidado, que se manifestam em novos pensamentos, opiniões e sentimentos.
"Sentimento oprimido gera ansiedade e bloqueio criativo também!"
Quando nos forçamos a reprimir o que sentimos, a carga dessa repressão acaba afetando em outras áreas da nossa vida. A ansiedade toma conta, e a criatividade, que precisa de espaço para respirar, fica sufocada. Por isso, se permitir sentir é também se permitir criar.
Além da perda: oprimindo as memórias
Quando falamos sobre o desejo de apagar a experiência de perda, seja qual tipo de perda for, estamos lidando com algo que vai muito além da ausência da pessoa. Trata-se de apagar toda uma história, as memórias que construímos e a relação vivida com essa pessoa.
Essa vontade de apagar não é só sobre eliminar o sentimento de saudade, mas de erradicar tudo o que aquela pessoa nos trouxe: as lições, os momentos compartilhados, o legado que, de certa forma ainda carregamos conosco.
É como se, ao tentar silenciar a dor, também tentássemos silenciar as memórias que nos fazem lembrar do que foi significativo.
Como nossas experiências moldam nossas ideias
Quando a gente enfrenta o luto, as experiências se entrelaçam de um jeito que, muitas vezes, é difícil de perceber. A dor pode parecer uma barreira, uma espécie de muro que nos separa da nossa criatividade.
Mas aqui vai uma verdade: a criatividade não é só sobre repetir o que já vivemos. Ela também é sobre transformar o que nos aconteceu em algo novo. — Quem lançou essa verdade nem fui eu, mas Vygotsky.
E, olha, nosso cérebro não é apenas uma máquina de lembrar, tipo um HD antigo que só reproduz arquivos. Ele cria e reinventa! Se a gente só reproduzisse o que já conhecemos, seríamos como um disco arranhado, presos no mesmo lugar, sem conseguir tocar música — a vida — como ela pede.
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Do luto à luta criativa: práticas para reencontrar sua essência criativa
Aqui estão algumas práticas que me ajudaram a lidar com o luto e a reencontrar minha criatividade durante esse processo:
Percebi que somos como as plantas: passamos por florescimentos, secas e perdas.
Ao cuidar delas, aprendi a confiar no processo, entendendo que o crescimento muitas vezes surge após os períodos mais difíceis.
Cada nova folha que brotava se tornava um recado de que, mesmo depois da seca, sempre há espaço para renascer e florescer de novo.
Criar um espaço onde a dor e a criatividade coexistem abriu um caminho para a cura — um caminho que ainda estou percorrendo.
O luto, em suas múltiplas faces, me ensinou que a criatividade é menos sobre o destino e mais sobre a jornada, uma estrada sem fim que se transforma a cada dia em que eu digo sim aos meus sentimentos, ao meu passado, aos meus traumas, ao meu sofrimento e, principalmente, a mim mesma, uma pessoa moldada por más e boas experiências.
Até breve, mas sem despedidas definitivas
Porque de finais não felizes já basta a edição de hoje. Mas estamos apenas encerrando esta edição. E calma, isso não é o fim da jornada — é apenas o começo de um novo ciclo!
📼 Rebobina essa fita:
Nesta terceira edição, falamos sobre o luto e como ele impacta a nossa criatividade. Muitas vezes, a dor nos faz querer apagar tudo, mas, se aprendemos algo aqui, é que tentar apagar o passado também é apagar partes de nós mesmos.
Ao nos despedirmos desta edição, quero deixar uma reflexão:
Permitir-se sentir, lembrar e criar a partir do que ficou — é também permitir-se florescer de novo, de um jeito novo, com a malinha de mão que a vida trouxe até aqui.
☝️ Essa era eu no meu dia mais normal, evitando me permitir sentir minhas emoções e escondendo minha confusão mental e emocional na malinha de mão que a vida me deu.
Às vezes, a gente só precisa pegar uma mala maior e deixar pra despachar. E tá tudo bem.
🗒️ Bloco de notas da böa:
🫂 “Cada perda é um encontro que eu ainda não tive" – Assista este vídeo e sinta o conforto das palavras de Eduardo Galeano sobre perdas
Agradeço por se juntarem comigo nesta jornada intensa de autoconhecimento e sentimentos à flor da pele. Até a próxima böa nova. :)
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