Abra os olhos e também o coração

Assessorar a Defesa Civil de Salvador durante a Operação Chuva deste ano (que ocorreu nos meses de abril, maio e junho) foi um grande desafio para a minha carreira profissional. Nos primeiros dias de operação foi como se estivesse assistindo a um filme acompanhando a movimentação dos profissionais indo a deslizamentos, desabamentos, incêndios e tantas outras situações no mínimo difíceis que ocorrem cotidianamente.

No dia 9 de abril a sirene do Sistema de Alerta e Alarme foi acionada na comunidade de Mamede, no Alto da Terezinha, no Subúrbio Ferroviário de Salvador, para indicar que havia alto risco de deslizamentos de terra e que era necessário que os moradores saíssem de suas residências, com brevidade, para que suas vidas permanecessem em segurança. Aqui tive um choque de realidade.

Senti, mesmo a distância, o peso da responsabilidade que os profissionais carregavam na ânsia de ajudarem os moradores para que suas vidas fossem preservadas. Pensei em como era difícil estar na condição em que é necessário deixar seu lar, que muitas vezes é todo o patrimônio conquistado ao longo de toda uma vida dura para trás, sem saber se ao retornar ele ainda estará de pé. Era esta a situação que as pessoas estavam enfrentando e não havia como não me compadecer daqui.

Me emocionei conhecendo a história de pessoas como Dona Valdênia, voluntária da Codesal a cinco anos em Mamede, que ficou debaixo de chuva até às 4h da manhã ajudando seus vizinhos a se abrigarem nos espaços disponibilizados pela Prefeitura. Quando a entrevistei para uma matéria sobre a importância do voluntariado, o sentimento que ela plantou em mim foi de cooperação. Imaginei o quanto nossa sociedade tem potência para se reerguer das dificuldades sociais se tratarmos desta pauta com o devido comprometimento coletivo. Aprendi que a união é um dos gestos mais nobres que podemos pôr em prática.

O que eu não sabia ainda era que abril de 2021 seria um dos mais chuvosos dos últimos anos e que depois do acionamento do alerta em Mamede, mais sete locais teriam o sistema ligado nos dias seguintes. E por vezes, pelas semanas seguintes, eu trabalhei mais de quatorze horas por dia para atender a todos os profissionais de imprensa que me procuraram para obter informações sobre as chuvas em Salvador.

Aqui, do meu home office, senti vontade de ir as ruas para acolher as pessoas e demonstrar minha solidariedade. Refleti, muitas vezes com lágrimas nos olhos, que como jornalista eu tinha como impactar vidas proporcionando informação precisa e de linguagem acessível. Assim eu fiz.

Escrevi textos que foram publicados pelos mais diversos veículos, pautei equipes de televisão que se deslocaram para as comunidades para reforçar a importância dos cidadãos se abrigarem em locais seguros, mantive em alerta os soteropolitanos sobre a intensidade das chuvas. Escrevi balanços diários de ocorrências de chuvas por 91 dias ininterruptamente além de respostas a demandas de cidadãos e matérias de trabalhos preventivos. Agendei um quantitativo tão alto de entrevistas para o meu gestor, Sosthenes Macêdo, que me questionei como ele conseguia manter a calma para prestar tantos esclarecimentos a população.

Conheci profissionais de excelência que embarcaram nas minhas pautas, por vezes de última hora, para levar a informação a população porque eles acreditam no impacto do trabalho que realizam. Descobri como uma equipe com propósitos alinhados e dedicada pode trazer frutos tão positivos no serviço público.

Ao fim deste período me sinto duplamente realizada. Do ponto de vista profissional, consegui emplacar a Defesa Civil até mesmo nacionalmente. A assessoria de imprensa prestada teve êxito porque chegou as pessoas mais vulneráveis socialmente, que são as maiores impactadas pelas chuvas fortes. Porém, do ponto de vista humano, o ganho que tive é imensurável. Tive ensinamentos que, sem dúvida, me tornaram uma pessoa com o olhar mais apurado para vida. Sinto-me grata por ter vivido dias tão ricos de aprendizados.