Alguns apontamentos sobre a responsabilização jurídica do administrador de grupo de WhatsApp

Alguns apontamentos sobre a responsabilização jurídica do administrador de grupo de WhatsApp

É praticamente impossível convivermos atualmente sem a utilização de telefones celulares conectados a internet, os chamados smartphones, que possuem como uma de suas ferramentas principais de conectividade os aplicativos de comunicação, tais como whatsapp, telegram, sygnal, dentre outros. Além de permitir a comunicação entre dois usuários, temos a verdadeira revolução, qual seja, a comunicação em bloco em grupos, o que nos leva a uma interessante reflexão: existe responsabilização do administrador de tais coletividades virtuais?

A ascensão de uma sociedade digital, ou em rede como prefere Manuel Castells, não tem seu ponto de partida na invenção dos primeiros computadores pessoais na segunda metade do Século XX. Todavia, pensar no avanço da comunicação em massa de forma vinculada ao avanço das máquinas é não perceber como opera a sociedade e seus desdobramentos no mundo virtual, em especial nas redes sociais e aplicativos de mensagens.

Dentre todas as tecnologias de forte cunho disruptivo no campo da comunicação, é inegável que os aplicativos estabeleceram novas formas de interlocução não só pessoal, mas também entre grupos nas atividades empresariais e no empreendedorismo. Muito se fala no crescimento do metaverso, na vida digital e na inteligência artificial, mas será que manifestações e contratos on line são mais seguros do que os convencionais?

Precisamos ter em mente que nossa Constituição Federal, em seu art. 5º, elenca uma série de direitos fundamentais extensíveis a toda a coletividade, como por exemplo, a igualdade entre homens e mulheres, a proteção da intimidade, a vedação à discriminação e criminalização do racismo, dentre outros. E em nenhum momento, a carta magna distingue os ambientes virtuais como exceções aos sistemas legais de responsabilização administrativa, cível ou criminal. Ou seja, em uma primeira leitura, o ordenamento jurídico se aplica indistintamente aos nossos comportamentos e manifestações tanto em nossas atividades presenciai, quanto nas salas virtuais de whatsapp.

Desta forma, nem a evolução tecnológica e tampouco a utilização de aplicativos de comunicação, criam um ambiente cujas regras sejam dotadas de alguma flexibilidade ou permissividade em favor de influencers digitais ou debatedores nos grupos dos aplicativos. Todos esses meios se inserem em uma sociedade democrática e regulada pelas regras e princípios do Estado Democrático de Direito, caracterizado pelo império da lei e pela existência de direitos, deveres, liberdades e seus respectivos limites. Considerando os relacionamentos entre os membros dos grupos dos aplicativos, a situação é bastante clara, mas e para o administrador dos referidos grupos, há algum tipo cuidado ou responsabilização especial?

Um julgado interessante sobre o tema foi exarado pelo TJSP, onde a 34ª Câmara de Direito Privado decidiu, por unanimidade, que o administrador de grupo de whatsapp pode ser responsabilizado pelas ofensas proferidas entre os integrantes, uma vez que detém a prerrogativa de adicionar e remover pessoas, ou seja, de fazer cessar ataques e ofensas que sejam ali expostas. Caso não o faça, deixando que os insultos sejam livremente proferidos, temos a incidência do art. 186 do Código Civil, posto que comete um ato ilícito todo aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, viola direito e causa dano a outrem, ainda que exclusivamente moral. Pode também ser configurada a ocorrência do cyberbullying, nos termos dos arts. 1, 2 e 3 da Lei nº 13.185/2015.

Na mesma direção, os crimes de calunia, injúria e difamação possuem a mesma tutela penal no ambiente digital e nas redes sociais, com aplicabilidade do código penal e do código de processo penal, sem flexibilizações ou exceções.

É natural que o advento de novas formas de comunicação precise de algum tempo de adaptação e aprendizado pela sociedade, em especial quando estamos diante de mudanças tão radicais como as trazidas pelos aplicativos de mensagens. Até a popularização do e-mail, uma carta poderia levar meses, ou até mesmo anos, até chegar ao seu destinatário, e hoje um tweet é lido simultaneamente por milhões de pessoas em todo o mundo no mesmo segundo em que seu autor o concluí. O cerne da questão está no que já chamam de a habilidade do futuro: a capacidade de se adaptar e aprender, o que foi bem explicado pelo escritor inglês Aldous Huxley, ao afirmar que experiência não é o que acontece com o homem, mas o que ele faz com aquilo que lhe acontece. 

Por Paulo Roberto Vigna

Advogado, sócio do escritório Vigna Advogados Associados e da VignaTax Consultoria Fiscal e Tributária, Mestre em Relações Sociais do Direito, com MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas – FGV, pós-graduado em Direito Empresarial e em Direito Tributário pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, especializado em Gestão de Tributos pelo Instituto Trevisan (São Paulo).

Inscrito na seccional na ordem dos advogados do Brasil em Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Distrito Federal, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo e em Lisboa- Portugal.

Professor do curso de MBA em Gestão Estratégica Empresarial em São Paulo. É autor dos livros "Recuperação Judicial" e "Manual de Gestão de Contratos" e produz artigos sobre direito tributário, empresarial e tecnologia aplicada a ciência jurídica.

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