Análise de Game Design: The Pathless
Experiência de Jogo
The Pathless é um jogo de aventura 3D com foco em narrativa conduzida pela exploração. Os jogadores mais curiosos são recompensados com histórias de mundo contadas através de pequenos textos e melhorias de mobilidade ao completar puzzles, incentivando o jogador a se manter neste ciclo. Algumas caçadas contra criaturas podem ser feitas ao longo da exploração, dando um ritmo mais agitado para o jogo e tornando a campanha menos cansativa.
Por A + B
The Legend of Zelda: Breath of the Wild + Journey
Após seu lançamento, The Legend of Zelda: Breath of the Wild, criou uma série de tendências nos jogos que vieram nos anos seguintes, como o paraglider para flutuar de um ponto a outro do mapa, o visual cartoon com shader que traz um aspecto de anime, ou o sistema de forças e fraquezas elementais nas ações dos jogadores. É indiscutível que BotW mudou o conceito de um jogo mundo aberto e tornou possível usar as inúmeras mecânicas de maneira criativa, fazendo com que anos depois do seu lançamento ainda seja possível descobrir coisas novas.
Journey é outro marco de sua época, com uma narrativa também guiada pela exploração, mas com uma história contada de maneira muito mais minimalista e interpretativa. Ele não faz uso de textos ou falas, mas suas imagens espalhadas pelo cenário e algumas poucas cutscenes em momentos chave contam sua história de maneira expressiva, fazendo o jogador unir as peças do quebra-cabeça no decorrer do jogo. Sua mobilidade é limitada apenas pelo o quão bem o jogador usa os pergaminhos que o faz flutuar pelo cenário.
É uma combinação previsível quando se trata de um jogo focado em imersão. Quando se joga The Pathless é fácil ver suas inspirações em ação. Mesmo que seja um jogo com muita personalidade, a dinâmica das batalhas, os chefões, a corrupção, a visão total do cenário para instigar o jogador, são elementos similares a BotW, já a protagonista misteriosa, a mobilidade limitada e solidão, são elementos encontrados em Journey.
Os 3Cs
Camera:
Character:
Controls:
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Os Pilares do Game Design
Alta Mobilidade:
Logo em seus primeiros minutos de gameplay, fica claro que a maior qualidade de The Pathless é sua mobilidade. Correr e acertar o timing dos talismãs pelo cenário se torna essencial para ter um bom deslocamento. Quando se acerta em sequência a aceleração é mantida, o que faz a trajetória do ponto A ao ponto B prazerosa. Avançando na campanha o jogador encontra talismãs laranjas que aceleram ainda mais a personagem e adicionam um pequeno salto, e talismãs azuis que impulsionam a personagem para o alto, melhorando a exploração vertical, uma vez que se acerta o talismã no momento correto durante a queda, o jogador consegue engajar uma sequência de saltos e assim alcançar locais mais altos. Por ter uma mira automática, não existe uma cobrança de precisão, apenas de timing, isso aumenta o incentivo da exploração, não limitando jogadores com menos engajamento.
Também é possível aumentar a quantidade de saltos que se faz com a águia, aumentando ainda mais a verticalidade, deixando o jogador planar por mais tempo pelo cenário e encontrando pontos de interesse. É fácil se desligar do mundo enquanto corre pelo cenário, já que não possui dano de queda, limitando os perigos do jogo aos chefes de área. O problema de se ter uma boa mobilidade é que as recompensas de mundo podem não ser tão recompensadoras, no fim, mesmo com pontos de história espalhados pelo cenário é fácil sentir que não tem muito para se fazer após liberar as torres necessárias para avançar, e uma vez que se avança não existe razão para retornar para as áreas anteriores, mesmo com a possibilidade de coletar todos os prismas de torres e receber um bônus permanente.
Exploração Dinâmica e Contínua:
Com a mobilidade sendo seu principal ponto forte, a exploração consequentemente acaba funcionando muito bem, justamente por tornar a trajetória do ponto A ao ponto B boa. Desde seu início, o jogo te permite ter uma visão geral do cenário, isso faz o jogador criar certa expectativa quanto aos possíveis cenários que ele vai percorrer ao longo da campanha. Isso também é bom para de cara criar um objetivo para o jogador, mesmo que ele ainda não saiba do que está acontecendo.
O clichê da corrupção que assola o mundo também é presente, além do propósito narrativo ela serve para criar limitações mecânicas na hora de resolver puzzles. Os mesmos podem ser encontrados em ruínas, templos, árvores antigas e cavernas, algumas vezes fazendo uso da chamada "Máscara dos Espíritos" que permite ver passagens secretas, objetos interativos e pontos onde o jogador ainda não resolveu os desafios. Uma vez que um puzzle é resolvido o jogador é recompensado com melhorias para o salto com a águia e prismas que servem para liberar torres do mapa, acontece que a quantidade de puzzles espalhados podem aumentar a longevidade do jogo muito mais do que o necessário, porém existem muito mais prismas do que o preciso para liberar todas as torres e progredir. Pegar todos os recursos vai de jogador para jogador, no meu caso em particular, eu gosto de descobrir todos os segredos que existem em cada ambiente.
Relação Caça e Caçador:
Para um jogo com uma proposta narrativa e contemplativa tão forte, pode ser estranho ver uma protagonista tão ativa ao longo da história. Em alguns jogos de propostas similares como o próprio Journey ou o Abzû (que é do mesmo estúdio de The Pathless) os protagonistas têm um papel muito mais passivo em meio aos problemas do mundo e são "frágeis" demais para abraçar confrontos diretos. Já aqui, a relação de caça e caçador se faz presente a todo momento. A visão inicial que se tem é de que a personagem é uma caçadora habilidosa, fazendo rápidos disparos e saltos grandiosos, passando a ideia de que ela é capaz de enfrentar facilmente os gigantes corrompidos. Entretanto, por fins de progressão, ela está limitada às três torres que precisam ser liberadas para aí sim entrar em combate.
Enquanto o jogador explora o mundo para liberar as torres, o gigante da respectiva zona persegue lentamente a personagem, obrigando o jogador a desviar rotas e fugir da criatura. Caso seja pego, é iniciada uma sessão de furtividade, onde o jogador precisa alcançar sua companheira águia para se livrar temporariamente do gigante. Algumas pessoas veem essas etapas de furtividade como um atraso para a progressão e algo que não agrega em nada, mas eu discordo, estas sessões servem como uma quebra para o loop central de gameplay, evitando que a jornada fique repetitiva já que o jogo é consideravelmente longo. Os momentos de furtividade mostram a vulnerabilidade da personagem e como ela é no fim, uma mortal em meio a deuses. A mecânica é simples e pode ser resolvida rápido o bastante para não se tornar cansativa. Por outro lado a luta contra os gigantes inverte completamente os papéis, colocando a personagem em posição de poder, onde desta vez os gigantes precisam fugir para sobreviver, as lutas são divididas em algumas etapas, tornando cada gigante um evento único a sua maneira, deixando o jogador feliz ao vencê-lo, liberando a corrupção do local e ganhando uma melhoria para a personagem.
Conclusão
The Pathless é uma experiência mista que abraça o desafio de equilibrar contemplação, narrativa, exploração e combate. São muitas tarefas sendo executadas simultaneamente, podendo deixar a proposta confusa para algumas pessoas.
O estilo visual do jogo se comunica bem com a narrativa. Nos momentos em que os acontecimentos são comunicados apenas com cutscenes sem diálogo, a informação é passada exatamente como deveria. Quando se anda pelo cenário fica claro que ele está convidando o jogador a explorá-lo, mas ao mesmo tempo é visível que existe algo estranho, que algo está errado com o mundo.
Cada cenário esconde muitos puzzles e pontos interativos de história, e apesar de ser gostoso de explorar, esses elementos não são o suficiente para manter o jogador engajado após passar pelo chefe da área. A personagem tem tanta mobilidade e tantos recursos para alcançar locais difíceis do mapa que é inevitável se questionar por que não existe muito mais para se fazer, talvez colecionáveis e talismãs liberados através da exploração já deixassem a longevidade do jogo mais natural. Já os confrontos com os gigantes são os que mais fazem falta, após serem derrotados, inimigos menores poderiam deixar a região desafiadora mesmo após ser purificada.
Independente de qualquer problema quanto a duração ou progressão, o jogo é uma experiência agradável e desafiadora, contemplativa e sombria de acordo com o momento, um verdadeiro salto de fé nos jogos de mesmo gênero.
Referências