Ansiedade como Hábito?
A ansiedade é um dos desafios psicológicos mais comuns e incapacitantes dos nossos tempos. O livro Descontruindo a Ansiedade (no original, Unwinding Anxiety ), do psiquiatra e neurocientista Dr. Judson Brewer, oferece uma abordagem inovadora para compreender e lidar com a ansiedade. Brewer propõe uma perspectiva baseada em mindfulness e no entendimento dos hábitos mentais que alimentam esse problema, oferecendo técnicas práticas e insights sobre como desmontar o ciclo vicioso da ansiedade.
A ansiedade é uma ocorrência natural do corpo em situações de estresse e incerteza. Em muitos casos, pode até nos proteger e motivar, mas, quando se torna excessivo, passa a interferir na nossa vida cotidiana. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o país com o maior número de pessoas ansiosas na América Latina. Em um mundo em constante mudança, repleto de pressões sociais e pessoais, a preocupação se transformou em um problema epidêmico.
Nesse contexto, é urgente encontrar métodos eficazes e sustentáveis para lidar com essa condição, e é exatamente isso que Judson Brewer propõe em seu livro.
No livro, Brewer explica que a ansiedade não é apenas uma resposta emocional motivada, mas sim o resultado de hábitos mentais que se reforçam ao longo do tempo. Para ele, a ansiedade funciona como um ciclo de dependência: começamos com uma preocupação, que leva a um comportamento de rompimento (por exemplo, evitar uma situação estressante), e, quando o ciclo se repete, ele se torna um hábito.
Vou iniciar, explanando um pouco sobre medo e ansiedade. O medo é uma resposta evolutiva vital: ao percebermos uma ameaça, o corpo se prepara para agir, como na clássica situação de atravessar uma rua e reagir a um carro que se aproxima. O medo nos tira do caminho e, em segurança, permite que registremos essa experiência para que possamos atravessar com mais cautela da próxima vez. A ansiedade, por outro lado, representa um excesso dessa reação instintiva. Ela surge quando nosso cérebro tenta antecipar perigos ou situações incertas que, muitas vezes, nem ocorrerão. Esse “mal funcionamento” nos leva a um estado de alerta constante e pode desencadear uma série de sintomas como insônia, taquicardia e respiração ofegante.
O conceito central do livro é a “desconstrução” desse ciclo. Brewer sugere que, ao percebermos e desafiarmos os gatilhos e as recompensas que mantêm a ansiedade ativa, podemos reduzir o poder que ela exerce sobre nós.
A proposta é simples, mas revolucionária: em vez de combatermos diretamente os sintomas, recomendamos compreender o ciclo que os perpetua e, então, substituí-lo por hábitos mais saudáveis.
Primeiramente, é necessário compreender que a ansiedade é, essencialmente, um mecanismo de sobrevivência sobrecarregado por incertezas pode nos ajudar a aceitá-la como parte da nossa vida. A aceitação é o primeiro passo para aprender a lidar com a ansiedade de maneira saudável. A partir dessa visão, é possível direcionar nossos esforços para observar o que desencadeia a ansiedade em nossa mente e como nosso corpo responde durante uma crise. Isso nos oferece um ponto de partida para enfrentar a ansiedade com estratégias práticas e empatia por nós mesmos.
Ciclo da Ansiedade
A ansiedade se manifesta em uma sequência quase automática de preocupação e inquietação, com pensamentos como “será que vou conseguir?” ou “e se der errado?” Esses pensamentos ativam o instinto de sobrevivência do cérebro, mas, em vez de nos proteger de um perigo real, nos mantêm presos em um ciclo de medo e fuga. Essa é a armadilha: ao evitar situações que nos causam ansiedade, encontramos um alívio temporário, mas reforçamos o hábito de fuga. Esse padrão cria um “looping” que nos aprisiona em uma zona de conforto ilusória, onde fugimos dos problemas, mas, paradoxalmente, aumentamos nossa ansiedade em longo prazo.
Brewer explica que a ansiedade se alimenta de um ciclo de gatilho, comportamento e recompensa, semelhante ao ciclo dos vícios. Um exemplo seria o medo de falhar em uma apresentação: o gatilho é o medo, o comportamento é evitar a situação, e a recompensa é o intervalo temporário. Esse ciclo reforça a ao invés de resolver a ansiedade.
Para interromper o ciclo de ansiedade, precisamos enfrentar os gatilhos que despertam nosso medo. Por exemplo, uma pessoa que procrastina devido ao receio de enfrentar uma grande tarefa sente alívio ao se distanciar do problema, mas a ansiedade só aumenta. A solução é escolher, conscientemente, ações que nos levem a resolver a questão que causa o desconforto. Enfrentar a ansiedade de forma gradual e com compaixão por si mesmo é um passo importante para substituir os hábitos de fuga por comportamentos mais saudáveis e benéficos ao longo prazo.
Durante uma crise de ansiedade, nossa atenção se volta para os sintomas imediatos, como o coração acelerado e a respiração curta. O psiquiatra Judson Brewer sugere que, em vez de tentar suprimir esses sintomas, direcionemos nossa curiosidade para entender a causa que os desencadeou. Respirar profundamente, focar no ambiente ao redor e lembrar que aquele gatilho não representa uma ameaça real são formas de aliviar os sintomas. Esse método envolve redirecionar nossa atenção para o momento presente e praticar a curiosidade sobre o que estamos sentindo, o que ajuda a enfraquecer o impacto dos sintomas.
Recomendados pelo LinkedIn
Ele acredita que, ao trazer a atenção para o momento presente, conseguimos observar nossos pensamentos e sentimentos sem julgamentos, o que nos permite ver a ansiedade sob uma nova perspectiva. Em vez de sermos arrastados por ela, conseguimos observar e entender seus mecanismos.
Desenvolver uma prática consciente e curiosa sobre nós mesmos é fundamental para manejar a ansiedade.
Primeiro, reconheça o que está acontecendo – permita-se sentir e nomear o que está sentindo. Em seguida, investigue esses sentimentos de forma curiosa: qual sensação surge primeiro? Quais pensamentos vêm à mente? Por fim, anote suas observações. Registrar esses momentos pode ajudar a manter o foco no presente e a criar uma distância saudável entre você e os pensamentos ansiosos.
Brewer utiliza conhecimentos da neurociência para explicar como nosso cérebro reage a comportamentos recompensadores e como isso influencia o desenvolvimento de hábitos de ansiedade. Ele propõe que, ao considerarmos esses padrões, possamos “reprogramar” nosso cérebro para encontrar prazer em comportamentos mais saudáveis, como a prática de mindfulness.
Ferramentas para Gerenciar a Ansiedade
Desconstruindo a Ansiedade oferece diversas técnicas para que coloquemos os conceitos do livro na prática. Entre as principais ferramentas, destaco:
Transformar hábitos de ansiedade demanda tempo e persistência. Sabemos que é desafiador alterar até os menores aspectos do cotidiano, imagine então modificar uma reação profundamente enraizada no cérebro. Contudo, a paciência e a autocompaixão são ferramentas poderosas nessa jornada. Manter-se curioso sobre si mesmo, tentar novas abordagens e aceitar que esse processo envolve tropeços são atitudes que reforçam o comprometimento consigo mesmo.
Descontruindo a Ansiedade não é apenas mais um livro de autoajuda, mas uma obra embasada em estudos científicos e métodos comprovados.
A abordagem fundamentada na neurociência e no mindfulness, oferece um caminho novo para enfrentar a ansiedade, transformando nossa relação com ela. Ao invés de tentar eliminar, Brewer nos ensina a observar, compreender e, por fim, desconstruí-la.
A leitura do livro é indicada tanto para quem sofre de ansiedade quanto para profissionais da saúde mental que desejam expandir seu repertório de disciplinas.
Descontruindo a Ansiedade é, acima de tudo, um convite para que possamos desenvolver uma nova relação com nossos medos e ansiedades, cultivando uma mente mais presente e menos reativa.
Gestão Médica / Gestão em Saúde / Gestão da Qualidade / Médico Pediatra
1 mTema atual e de enorme relevância. É comprovado o aumento da ansiedade nas novas gerações e o impacto do isolamento social durante a pandemia de covid potencializou ainda mais os casos que já vinham numa crescente devido ao ritmo de vida e as redes sociais. Sem dúvida devemos buscar alternativas para mitigar as consequências. Exercícios físicos, meditação mindfullness, yoga, música, entre diversas outras opções são válidas. Adorei o texto Juliana Pan
Gestão de Projetos | Planejamento Estratégico | Metodologias Ágeis | Tecnologia | Farmacêutica
1 mÓtima indicação, Ju!
Radiologista
1 mMuito útil
Psiquiatra na Prefeitura Municipal de São Paulo com expertise em Saúde Pública
1 mExcelente texto
Professora de MBA nas instituições MBA USP/ESALQ, EINSTEIN, UNIFESP/SPDM, FIA - FEA/USP, Prof. convidada na DOM CABRAL
1 mMuito, muito oportuno!!! Obrigada querida!! bjo