Antes do baile verde - Lygia Fagundes Telles
Olá! Bem vindos a mais um texto de Book Talk! Eu sou a Mari Suter, sou das Letras, poeta, uma leitora ávida, e falo de Literatura na Internet.
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Hoje trouxe um livro que nos apresenta variadas combinações de destinos humanos. Eu falo de “Antes do baile verde” de Lygia Fagundes Telles.
E essa variedade de veredas por onde a história de uma pessoa pode se embrenhar contidas nessa obra talvez se explique pela vastidão de tempo em que os contos foram criados. A primeira edição do livro se deu em 1970, mas os textos foram escritos entre 1949 e 1969 – uns bons vinte anos de cobertura. Ou ainda pelas diferentes experiências da autora, que formada advogada trabalhou como procuradora previdenciária, além de ter sido presidente da Cinemateca Brasileira. Ou simplesmente porque ela tinha um olhar aguçado para as nuances da vida. Ou tudo isso junto.
São 18 contos realistas sem nenhuma divisão ou agrupamento específico, e que tratam de temas diversos como a traição, a infelicidade dentro do casamento, a doença, a loucura, o prazer, a dificuldade do ser humano em lidar com os diferentes âmbitos da vida, a necessidade de fazer malabarismo entre amores e sofrimentos, a solidão, e a eminência da morte.
Acho que o modelo de texto em conto e essa estrutura de livro sem grandes classificações têm um por quê: o conto traz o aspecto episódico da vida, e a mistura de temas também reflete essa casuística sem nexo inerente ao viver. Afinal, a vida só tem os sentidos que nos atribuímos a ela.
Essa dança que a gente dança com a vida, sendo um ponto de fascínio para autora parece explicar o aspecto fragmentado da linguagem que ela usa nos textos. Somos convidados a preencher lacunas, juntando frases soltas, informações vagas, diálogos sem contexto. E a verdade é que há certas experiências humanas que são tão universais - mesmo que as nossas vidas sejam diferentes - que instintivamente a gente vai fazendo conexões dessas histórias com as nossas histórias, e assim inferindo o que não está explícito no texto.
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No conto que dá nome ao livro, por exemplo, a conversa entre duas personagens que estão se arrumando para sair serve de moldura para uma conversa paralela e mais importante. Tatisa, a jovem que vai ao baile e dá os retoques finais na sua roupa verde, tenta convencer Lu, a empregada doméstica que trabalha ali, a ficar em casa naquela noite. Lu, já está pronta para o que parece ser a sua folga e tem receio de que o namorado se irrite com o atraso causado pelo pedido de ajuda de Tatisa com a saia.
Enquanto colam as lantejoulas no tecido, Lu diz “ele está morrendo” – uma frase que a princípio parece desconexa e que aos poucos revela a história por traz da história: as duas se lembram de bailes passados, reclamam do calor que faz naquele dia, falam de sensações antigas e entre essas memórias a realidade volta sempre ao debate: o pai de Tatisa está doente, por recomendação médica foi mandado para casa depois de sair do hospital e as duas se alternam cuidando dele, mas naquele dia ambas vão sair e ele ficará sozinho.
A Lu é a voz da razão, e traz os fatos nus e crus pra conversa: alguém precisa cuidar do doente, e essa pessoa é a Tatisa. A filha, de maneira infantil, egoísta ou escapista – o adjetivo fica a critério de quem lê – vai buscando justificativas para fugir dessa obrigação e ir ao baile.
Então é como se a gente visse os contrastes que o ser humano vivencia internamente – personificados pelas duas personagens: a racionalidade versus o instinto de prazer; o senso de dever contra a irresponsabilidade; a capacidade de encarar a vida como ela é em oposição à fantasia; a habilidade de tomar as rédeas das próprias vontades em oposição à facilidade de culpabilizar o outro.
Acho que o livro e seus contos nos mostram a dança que a gente faz com duas energias básicas ligadas a experiência humana e que Psicologia chama de Pulsões – a pulsão de vida e a pulsão de morte. Lygia Fagundes Telles nos mostra que a beleza da vida está no balanço entre as duas, porque é através do contraste que enxergamos o todo. Afinal de contas, a morte é um destino inevitável, mas até ela chegar, estamos vivos!
E aí, já leu esse livro? Não? Ficou com vontade de ler? O que você achou desse texto? Conta aqui nos comentários, eu vou adorar bater um papo com vocês.
É isso! Tchau!