Aprendemos a calar, não a co-criar
Por Paula Quintão
Em alguma parte do caminho fomos ensinados que enquanto um fala, o outro escuta. E que nossa função era escutar. Lá estava o professor diante de nós, de pé, falando por quantas horas quisesse falar, e nós, alunos, sentados em fila com o direito (e o dever) de permanecermos calados.
Foi a estrutura em que crescemos.
Foi o que aprendemos.
Aprendemos que o nosso lugar era o de aprendizes. Era o de ouvintes. Era o de receptores do conhecimento.
"Aprenda e será avaliado". Nada além disso.
Não havia um momento para nos sentarmos e criarmos conteúdo, criamos conhecimento. No máximo uma apresentação em grupo que significava: prove ao professor que você sabe mesmo aquele assunto porque ele está avaliando você. Isso não era criar, ainda era obedecer.
É fácil observar nas redes sociais quão poucas vezes nos arriscamos a escrever algo com nossas palavras, ser um pouco mais longos nos escritos. O quanto nos sentimos mais confortáveis "compartilhando" do que criando, curtindo do que comentando.
Não fomos treinados para sermos criadores.
Não nos achamos no direito.
Não nos achamos "tão bons assim".
E quando nos arriscamos a escrever algo, a produzir algo, a falar algo com as próprias palavras, algo muito sutil ainda treme dentro de nós como se a qualquer momento fosse surgir um professor para dizer que estamos errados e que merecemos uma "nota baixa".
Fico me observando para entender. Quando visitei a Escola da Ponte, em Portugal, tudo o que eu sentia enquanto aquelas duas crianças me mostravam os detalhes da escola mais genial que pude conhecer é que eu não conseguia fazer perguntas. Como pode ser tão difícil fazer perguntas? Mas foi fácil entender depois a minha dificuldade, era só olhar para a estrutura em que fui "treinada".
Fazer perguntas em sala era interromper o professor.
Não só na sala de ensino fundamental, com a tia da escola, mas também no doutorado, durante as intermináveis explicações de três horas de duração de alguns professores.
Aí está algo em que acredito: que somos todos criadores.
E que a vida e suas as estruturas, podem ser usadas para nos estimular a criar, a co-criar, a ter voz, a expressar quem somos, o que pensamos de fato, o que sentimos, o que aprendemos e o que temos a partilhar.
Não porque "temos que", mas porque "podemos".
Porque somos únicos, com histórias únicas, com experiências únicas. E somos luz uns na vida dos outros a partir do momento em que conseguimos entregar nossas criações.
Escrevi esse texto enquanto estava em processo de criação da própria Escola de Rumos.
Esses dias vamos celebrá-la.
Paula Quintão. www.paulaquintao.com.br
Escola de Rumos. www.escoladerumos.com.br