A arquitetura na era da economia afetiva

A arquitetura na era da economia afetiva

Todo ano fazemos matéria sobre as coleções do ano que se inicia – e as tantas vertentes. Ou tendências, como muitos gostam de dizer, que nos falam de comportamentos, de pessoas, de experiências, bem além de produtos. Em anos atípicos e sem precedentes como estamos vivendo, em que apostar? Gosto da trilogia citada pela Castelatto:

Resgatar

Repensar

Ressignificar

Muitos anos atrás – mais precisamente pós queda das Torres Gêmea, há 20 anos (Nossa! Já?) – chamei de memória afetiva uma onda, que virou uma constante, da casa como oásis e com a nossa cara. Um lugar seguro, material e afetivamente, com escolhas que nos religassem com o que temos de melhor – geralmente ligado ao passado – e com o que realmente somos. Com escolhas feitas a partir do que nos deixa bem, nos faz sentir “em casa”. E não é isso que todos sonham – pelo menos aqueles que veem a casa como lar e não vitrine?

São tempos de descobertas. Ou redescobertas. O novo normal, visto como passageiro, se transformando em rotina, aumentando o valor do que temos - casa, família, hobbies, escolhas. E de quem somos. O valor das experiências, mesmo dentro de casa, como moeda de valor. Nunca o mercado de gastronomia esteve tão em alta. Nunca o mercado de reformas, jardinagem, hobbies e outras melhorias – da casa e das pessoas (vide alta nas buscas sobre meditação, livros, cursos on line) – estiveram tanto tempo nos TOP 10 de buscas na internet (bendita seja!). E que, em termos de arquitetura e design de interiores, ganham nome mais pomposo: design afetivo.

Fala-se, até, em “era da economia afetiva”. A (re)valorização do lar como oásis. E nele, num primeiro momento, da valorização do que você mesmo faz – vide aptidões, conhecidas ou não, que viraram negócios, como comidas, pães e doces.

E, para isso ou também por conta disso, a valorização de produtos e comércio locais, vicinais até, presenciais ou virtuais - inclusive com campanhas institucionais de grandes bancos. E o máximo aproveitamento de materiais – aqui numa onda de sustentabilidade que virou tsunami, a quem o planeta e as próximas gerações agradecem. São tempos de novos valores. Ou, melhor dizendo, são tempos de reais valores e não precificação. Uma, quem sabe, humanização do consumismo. O ecologicamente correto e o socialmente justo na pauta, revelando uma nova relação, a do ganha-ganha.

Isso muda, com certeza, a relação profissional-cliente, como também já havia pautado. A coprodução do arquiteto ou designer de interiores com o consumidor. Assunto descoberto, não faz muito tempo, por programas e séries de TV. Vide Mauricio Arruda, à frente do programa Decora, do canal GNT que, ao participar de um evento de lançamento de coleção do ano, confidenciou à enorme plateia virtual que hoje “a estrela do projeto é o morador e não o arquiteto”. E do como isso afeta o planejamento de um espaço, do projeto à obra. De um processo que nasce aos poucos, em colaboração com o cliente, sem o estrelismo da surpresa do projeto entregue pronto, como uma resposta unilateral do contratado ao contratante, na era da renderização, do desenho que convence, sem muitas vezes caber (no espaço e/ou no bolso). A meu ver, demoraram para descobrir. Afinal, quem vai morar dentro dele? Ou, pior, quem vai pagar por isso? Cabe aqui um conceito em alta em vários outros setores: o co - de coletivo, colaborativo, compartilhado, de cooperar, coproduzir. Afinal, já temos o coworking, e outros tantos conceitos já enraizados para o morar, o vestir, a mobilidade.

Os conceitos em pauta que aparecem como ponto comum entre várias marcas do setor vêm profundos: ressignificar, reconfortar, reinterpretar, experimentar. São tempos de repensar, dar novo ou real sentido às coisas.

Mas, o que isso afeta, literalmente, as escolhas das marcas do setor?

- Escolhas atemporais, mas sem deixar de serem pessoais, customizadas, cheias de expressão, que alguns chamam de maximalismo, em contraposição com o minimalismo reinante. Quase um movimento de contraposição, de rebeldia;

 - Liberdade de escolha. Seja em formatos, formas de usar, composições, estampas, cores. Designs que trazem à tona a criatividade – de revestimentos a mobiliário, com ou sem profissional. Vem desta pauta o conceito mix & match, misturar e combinar.

 - Produtos seguros, com fácil limpabilidade e/ou fácil manutenção. Coisa que muitos países já têm em pauta;

- Produtos sustentáveis, de marcas idem, dentro dos “5 Rs” da sustentabilidade: repensar, reduzir, recusar, reutilizar e reciclar. Entra, aqui, o pensamento circular (do berço ao berço) e conceito de upcycling (reutilização criativa), que valem uma outra matéria;

Como se vê, o mundo gira todo para um mesmo lado. A isso se chama tendência: tender a. Não seria o setor de arquitetura que iria caminhar ao contrário.


Joyce Diehl, arquiteta, especializada em branding. Editoria, construção de marca e conteúdo em Arquitetura. 

Maria Lúcia Mendes Gobbi

arquitetura at MENDES GOBBI ECO DESIGN

3 a

Joyce querida ! Li seu texto e adorei sua reflexão , que possamos saber dividir para somar !! Parabéns colega .

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