A Arte da Desconstrução: Desconstruir para Construir
‘’ Esvazie sua xícara primeiro, só então você poderá provar meu chá. Afinal de contas a utilidade da xícara está em poder esvaziar-se. Abra sua mente para receber novas ideias. ’’
Bruce Lee
Ao começar a escrever este artigo, fiquei pensando em como os últimos tempos nos proporcionaram emoções diversas pontuadas pelo sentimento, ora angustiante, ora estimulante, da incerteza. Se formos nos transportar para janeiro de 2020, ninguém poderia imaginar que apenas dois meses depois, iriamos dar início a uma jornada em meio a uma pandemia de extensão e alcance até então inimagináveis, testando os nossos limites, especialmente no que tange a saúde mental, onde fomos obrigados a nos reinventar como seres-humanos e como profissionais.
Tivemos que alterar a dinâmica de nossas relações, ao passo que o home office e a forma de trabalho remota já se impunha como uma realidade incontornável. Ao mesmo tempo, vimos pessoas perderem seus empregos, empresas fechando, e outras que tiveram que adequar seus modelos para que pudessem se manter vivas neste período tão complicado. Mas ao final das contas, o que todas essas mudanças nos ensinaram? Onde pudemos evoluir enquanto pessoas? E o que as empresas aprenderam quanto ao propósito e a forma de encarar os indivíduos e o seu papel dentro da sociedade?
Talvez, o que ficou mais evidente neste processo, foi que nenhuma realidade ou situação, por mais planejada ou controlada que seja, está imune as mudanças externas, e isso gera de nós uma disposição maior para reorganizar e desconstruir nossas crenças, certezas e percepções a respeito do mundo e de nós mesmos.
Sim, o contexto atual nos coloca em xeque a todo momento, pondo à prova aquilo que aprendemos, e principalmente, aquilo que ainda não sabemos. Mesmo com as pessoas separadas umas das outras, tivemos que aguçar o nosso olhar para o outro por meio de um espírito colaborativo que pudesse buscar soluções para as limitações físicas, emocionais e tecnológicas que foram impostas. E em paralelo, nunca tivemos que estar tão predispostos ao aprendizado. E dessa vez, um aprendizado muito mais urgente, daqueles que a gente absorve durante o processo de realização, já que o prazo para amadurecimento de uma solução é cada vez mais estreito ao passo que a digitalização gera demandas cada vez mais imediatas.
De forma paradoxal, ao mesmo tempo que parece que somos inundados por todo o tipo de informação, nos causando a sensação de ter cada vez menos tempo, nunca se discutiu tanto o bem-estar e a satisfação pessoal do indivíduo. Como o trabalho e a vida pessoal se mostram cada vez mais intrínsecos, já que o trabalho em casa/remoto explicita essa percepção, fica mais óbvio que os propósitos particulares devem se alinhar aos propósitos profissionais, visto que as pessoas querem ser encaradas como organismos plenos, com valores, alma e coração. E nisso, voltamos ao conceito da desconstrução que do ponto de vista organizacional, nos torna mais aptos para o ambiente dinâmico das corporações, agregando novas visões e competências que potencializam nosso desempenho. Mas pelo lado individual, a desconstrução de preceitos e ideias pré-concebidas nos deixa mais perto de nossa essência e daquilo que definimos como propósito de vida.
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A reconfiguração do mundo, e consequentemente das interações de vida e trabalho nos trouxe para mais perto de nós mesmos, sendo assim, buscamos atividades que não tem apenas um caráter de subsistência, mas sim, algo que realmente tenha significado e justifique acordarmos todos os dias e empregarmos nossa energia e confiança naquilo que acostumou-se a chamar trabalho, mas que pode muito bem ser nomeado por entrega de valor, para si, para os clientes, para a sociedade e ao mundo em geral.
Ao nos reorganizarmos para corresponder as demandas de uma sociedade cada vez mais acelerada, alcançamos formas de deixar nossa marca em cada coisa que buscamos realizar. O que de certa forma, é compreensível dentro de um contexto em que os clientes buscam uma identificação ou proximidade com as empresas e marcas com as quais se relacionam, conferindo humanidade a um processo, antes tratado de forma quase industrial, voltado a resultados apenas de ordem quantitativa.
O processo de digitalização das empresas permitiu um nível de interação inédito entre clientes (leiam-se stakeholders) e empresas, no qual a relação se dá num nível equitativo, sem intermediários, onde o consumidor se corresponde de forma direta com as marcas, seja para elogiar, cobrar ou sugerir novos produtos e soluções. Por outro lado, as organizações se valem dos dados e informações decorrentes destas interações para descobrir necessidades, tendências e novos padrões de comportamento, acarretando em processos ágeis e nada estáticos, exigindo uma abertura mais ampla para o novo, e um foco muito maior nos propósitos e no valor a ser entregue a comunidade, e para se atender a tamanho nível de expectativas, é preciso sempre um olhar ‘’despido’’ de preconceitos ou de definições muito sólidas a respeito do que se entende como mercado. Visto que as pessoas estão interessadas em marcas ‘’reais’’, atentas aos anseios sociais e que os compreendem como seres críticos e pensantes, que veem o ser humano como o maior ativo existente em qualquer nível de relação ou mercadológico.
E, no final, podemos dizer que a pandemia teve um efeito catalizador de inúmeras transformações que de certa forma, eram só questão de tempo para se concretizarem. O ambiente em constante movimento, e cenários que a despeito de todas as projeções, mostram um grau cada vez maior de incerteza, sejam pelas transformações sociais, culturais ou mesmo ambientais nos indica que devemos estar dispostos a angariar novos conhecimentos e competências diversas, nos transformando em profissionais multidisciplinares dentro de um espaço onde a conectividade elimina barreiras, estreitam culturas e ampliam influencias. Para isso a desconstrução pessoal e profissional é um elemento transformador, que nos coloca em uma posição de humildade perante o próximo, seja para absorver um outro ponto de vista, uma informação nova ou também, mesclar diferentes percepções que geram resultados fora do lugar comum. Para além do olhar macro, o ser-humano como centro dos processos também gera um campo de desconstrução que nos permite ir mais fundo em nosso interior, para aquilo que define a nossa identidade particular e gera a força motriz de impacto que nos permite transformar e colaborar para uma sociedade que seja cada vez mais inclusiva e diversa, onde os pontos de divergência sejam complementares e não excludentes. Assim, por mais que estejamos num contexto complexo e repleto de problemas, as oportunidades de mudanças nunca se fizeram tão presentes.
Alexandre Gomes é administrador e especialista em Marketing. Atua como Head de comunicação da Rede Brasil Startups e consultor de mercado do programa Comércio Brasil (FIA-USP/SEBRAE-SP) além de ser apaixonado por um bom café entre amigos e pelo poder existente nas palavras
C-Level, Diretora, Conselheira TrendsInnovation | Conselheiros TrendsInnovation | Conselheira Consulitva
3 aExcelente artigo!