Boechat , o mascote da noite

Quando a noite desce, a sabedoria emerge. A escuridão é o momento da revelação. Estamos falando do acidente que tirou a vida do jornalista Ricardo Boechat, da Rede Bandeirantes, aos 66 anos . É de impressionar a extensão da sua popularidade, representada por um grande número de seguidores em todo o Brasil. Poucos haviam percebido.  

           Nascido na Argentina e criado por aqui, depois de conviver , na condição de repórter e comentarista, com diversos públicos dos jornais, da televisão e do rádio,  Boechat terminou captando a alma do brasileiro: o espírito nacional levemente irônico, sua graça, as angústias tragicômicas e a provincianidade diante das modernidades latentes..

          Temido pelos transgressores do mundo político, era amado pelo cidadão. A escuridão de sua morte desnudou o reconhecimento da sabedoria que o acompanhava no relacionamento com a população. Todos o assistiam e, um grande número de ouvintes e telespectadores seguiam quase religiosamente suas críticas e observações, de estilo descontraído, mas veementes.

           No rádio, então, era imbatível. Sua comunicação com a população fluía, leve e solta . Lembrava Joelmir Betting.  Sabedoria e bom senso competiam, sim, com a comunicação nas redes sociais. Não mentia . O riso irônico refletia a sensação de indignação e impotência do cidadão .Ele e José Simão, com um “Me engana que gosto”,  gargalhavam, sem constrangimentos, nem censura, ante declarações ou iniciativas públicas protelatórias ou mentirosas amplamente veiculadas .

            Boechat carregava a sabedoria do homem comum. Era invejável a facilidade com que manejava o discurso jornalístico, que, por ser crítico, não deve e não pode subestimar jamais o sentido da autonomia existencial do indivíduo e o esforço do homem pela sobrevivência. Sua morte traz mais uma luz para os espaços dos clássicos estúdios e redações e seus e seus sombrios âncoras.  

Luiz Carlos Iasbeck

Doutor em Comunicação e Semiótica PUC/SP

5 a

Caro Aylê, não sou certamente o único que o lê, mas com certeza o q sempre o comenta. Também fiquei abismado com a unanimidade positiva em torno do carisma de Boechat. Debochado, Boechat reunia o que o carioca tem de mais precioso: a ironia, a critica e a visão bem humorada das tragédias sociais, políticas e econômicas do País. Mas tb como muitos cariocas, não era levado a sério. Por isso, seus esporros eram catárticos mas não surtiam resultados.Sequer era processado. Uma figura folclórica, amado em silêncio. Foi-se, deixando um vazio e muitas questões para o romântico jornalismo “das redações”, que definha a cada dia ao tempo em que busca espaços de arejamento. Boechat foi uma lição e merece um capítulo nas salas de aula dos cursos de jornalismo... que ainda sobrevivem às mídias digitais.

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