BRASIL: FORA DA ROTA
Ilustração: Sinéas S.

BRASIL: FORA DA ROTA

Sinais, incontestes, de retrocesso e de perda da razão que impedem a mudança.

Vivenciamos, na atualidade, um período de transição e de incertezas. Nesses momentos as velhas ordens lutam para permanecer no curso das ações, mesmo perante fatos que demonstram o contrário. A nova estrutura vai se formando, na medida em que os ajustes ocorrem, e estabelecendo novos contornos ao que está por vir. Todavia, observamos sinais, de perturbação, que frustram, inexorável, transformação.

Castração da liberdade de expressão e diálogo entre as partes divergentes - observamos o fechamento de segmentos sociais que, por medo, convicção ou falta de capacidade, impedem o decurso, inevitável, da evolução humana - sobretudo na área social. Criam e disseminam ideologias alienantes ao mesmo tempo em que detonam o sistema de educação, deixando os potenciais insurgentes longe do despertar da consciência e do saber, cultivados pelo livre pensamento.

Sucessivas imposições, de segmentos religiosos, ao modo de vida contemporâneo, mas sem atingir fatos contundentes e imprescindíveis como a fome, a miséria, o combate e a extinção das doenças (em detrimento ao sustento das medicações paliativas) - demência perante a crescente revolução do crime e das mercantilizações que promovem os lucros e alienam a população (que nunca consegue participar de uma evolução cultural). Assim, a teologia da prisão serve, novamente, ao que tanto se criticou na Idade Média, não importa quantos discursos se elaborem para justificar o injustificável. Ainda assim, muitos seguem o antagonismo e servem, fiéis como cães adestrados, com a fé cega e sem discernimento.

Reincidentes agressões aos segmentos vitimados há tempos (sexualidade, etnia, credo, ideologia) - uma vez que a lei (como expressão da vontade da maioria) determina e a razão orienta, o respeito (a todos os cidadãos e segmentos) deve existir - independente das divergências. Mas o que vemos, imperar, é a falta de compreensão e a imposição das intolerâncias perante as realidades mais diversas, ainda mais no Brasil das pluralidades e das riquezas culturais mais ricas do planeta. Onde mais se come, se bebe, se diverte, se aprende, se estuda, se vive e se respira tanta multiplicidade e abundância cultural? Estrangeiros estudam aqui o que não encontram e nenhum outro lugar do mundo. Então que sejamos os primeiros a reconhecer o nosso potencial cultural, concedendo espaço a todos os que se manifestam de forma pacífica e ordeira.

Governos aumentando impostos, promovendo ações descabidas e justificando atos de despotismo - bastante contrário ao que se lê no Hino ao Dois de Julho (data que consolidou a expulsão das tropas portuguesas do Brasil, em 1823): " "Nunca mais, nunca mais o despotismo regerá, regerá nossas ações. Com tiranos não combinam brasileiros corações. - ironia sem precedentes. O que constatamos é que foram-se os portugueses e permanecem as práticas de exploração. Exagero? Em 1970 pagava-se os impostos em 76 dias de trabalho e em 2016 foram necessários 5 meses para sustentar um sistema de governo - inviável, parasita, indolente, perdulário, impositivo, opressor e explorador (fato) - que nunca justificou a existência.

População fatigada, combalida, medrosa, retraída e receosa como nos governos antigos - esse ponto é o mais simbólico no que se refere ao passado, longínquo. Como nas sociedades antigas a brasileira segue cansada de tanta desfeita, tanta violação, tanta humilhação; está doente após vivenciar tantas situações ilusórias e prometidas pelos seus passado representantes - fruto da sua falta de articulação, comodismo e, imensa, ingenuidade; teme tudo o que se passa porque se tornou cativa das grandes enganações, promovidas por grupos de interesse que jamais se importaram com as leis, a ética ou qualquer princípio moral. Então eles se mantiveram nos domínios do poder, nos pináculos das articulações, para se perpetuarem e disseminarem a sua marca: a afirmação da sua hegemonia e a desgraça da população; e acanhada a população segue, com alguns momentos de desabafo e nenhuma continuidade nas ações, muito menos as efetivas; a apreensão domina a massa enquanto os governos, especialmente o federal, continua a praticar o seu espetáculo de horrores que mata a população (segurança), tortura (saúde) e humilha (educação) de forma ininterrupta.

Segurança pública e sistema prisional falidos - o que a imprensa denuncia todo o tempo, nos boletins, matérias e reportagens diários. A população segue, entregue a sí mesma, o que provoca o estímulo aos meios, próprios, de exercer a punição, através dos métodos que divergem dos princípios que, apesar de escritos, nunca foram exercidos com plenitude, seriedade e distinção.

Sistema jurídico aberto a todo tipo de apelação, favorável aos marginais e aos fora da lei - situação que tem enfraquecido a sociedade de direito e cultivado o campo da criminalidade. E, há muito se tem noticiado que as organizações criminosas estão financiando os seus próprios defensores - algo estarrecedor e muito aterrorizante!

Professores desrespeitados pelos alunos (guiados pelas trevas da ignorância e da alienação) e atacados por pais insanos (tutores e mentores de sociopatas) - e não seria isso, em última análise, a reprodução de uma sociedade destinada ao crime? Seria o modelo de escola, imposto pelo terror, um cursinho preparatório para a vida do crime, o treinamento ou iniciação da carreira da marginalidade e suas vertentes? Observa-se que pais omissos criam filhos tortos, mas se os responsáveis são os primeiros a defender a ideologia do crime então teremos uma geração de sociopatas.

Culto ao tecnológico, ao imediato, ao supérfluo, ao transitório, ao superficial, ao espetáculo - o exercício nas vulgaridades humanas é o que temos observado na contemporaneidade. Se, por uma suposição, afirmássemos que há uma ordenação que deseja suprimir características humanas, a fim de converter gente em máquina, então diríamos, que o plano está ocorrendo com sucesso; o imediatismo em lugar da paciência, os impulsos em lugar do controle, a insanidade em lugar do discernimento, a frivolidade em lugar da estima, o ódio em lugar do amor, e etc.

O crime se organiza para tomar o Estado - é o que vemos, todos os dias, nos noticiários, quando tomamos conhecimento de mais um banco ou caixas 24 horas que foram explodidos para financiar o, pesado, armamento das facções (fundamentalistas que atuam nos presídios como igrejas) e que já combatem a, desprovida, polícia cujos armamentos são inferiores e ainda sofrem de impedimentos (legais) para usar aparato que se equipare ao da bandidagem. Percebe-se a omissão do Estado que, pelo que se percebe, corre o risco de ser tomado pela articulação criminosa - atuante em várias regiões do país e em constante contato com organizações de outros países.

Diante de toda essa loucura  muitos dirão que o fim está próximo. Mas essas perturbações, ocorridas em muitos períodos históricos, demonstram que a mudança é inevitável mas que a desordem e o caos é proporcional a falta de provisão e de previsão. E, se a melhor maneira de prever o futuro é inventá-lo e que toda ação corresponde a uma ação devemos nos recordar de um pensamento antigo que enuncia que quem semeia ventos colhe tempestades. Se estamos passando por um período pesado é porque não fizemos o dever de casa, ignoramos a ordem do dia, delegamos, aos solapadores, o que era da nossa responsabilidade. Estamos pagando o preço. Mas que a lição seja entendida e que nos preparemos para o que está por vir.

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