CAIA NA REAL PORQUE OS 50 NÃO SÃO OS NOVOS 30, E OS 60 NÃO SÃO OS NOVOS 40
Arte: Lament (motion poem) by Afrodite Bitzouni

CAIA NA REAL PORQUE OS 50 NÃO SÃO OS NOVOS 30, E OS 60 NÃO SÃO OS NOVOS 40

Andam dizendo por aí e você até já deve ter ouvido, ou lido em algum lugar, que “os 50 são os novos 30” e “os 40 são os novos 60”. Mas, seja sincero (a), você acreditou e comprou o pacote completo desse slogan?

Pois eu, não. E vou explicar os porquês, não sem antes te contar que por indicação de uma amiga, dia desses li uma entrevista no popular tabloide Daily Mail, com Marian Salzman, a famosa americana visionária e “rastreadora” de tendências sociais.

Marian incluiu em seu muito aguardado relatório anual de 2019 o ageismo e a ascensão das hashtags #BeBoldClaimOld e #BeAgeProud. O que em português seria algo próximo a #SejaOusadoReivindiqueSuaIdade e #Orgulhe-seDaSuaIdade, respectivamente.

Na tal lista, tratada como uma bíblia por empresas em todo o mundo, segundo a própria autora da matéria no Daily Mail, a escritora e premiada jornalista freelancer Lizz Hoggard, a ascensão do movimento "orgulhe-se da idade" aparece ao lado de uma tríade nada alvissareira. A saber: o conflito global, o fim da civilidade (cortesia e polidez) e o desastre ecológico.

Mas, voltando aos "50 são os novos 30" e os "60 são os novos 40". É fato que ter 50 anos ou mais nos dias de hoje não é o mesmo do que era nas décadas passadas. Ainda bem. O que dizer nos séculos passados, inclusive porque, na sua maioria, as pessoas não chegavam aos 50 anos. Foi a partir de 1900 que a expectativa global de vida média mais do que dobrou e agora se aproxima dos 70 anos

Somam-se a esta "elasticidade" demográfica — graças a eventos como a evolução da Ciência e da inovação na saúde com o surgimento da Medicina Regenerativa, por exemplo —, as mudanças no comportamento e nos costumes sociais.

De maneira que, hoje, envelhecemos de forma inédita e bem diferente de nossos ancestrais. Também percebe-se um gap entre envelhecimento cronológico e biológico. Daí que nosso olhar, comportamento, mentalidade e até aparência são uma versão “mais jovem” (não no sentido maniqueísta do termo, por favor) de nossa espécie, como já disse Robert Pogue Harrison, autor de Juvenescence: A Cultural History of Our Age” ( Juvenescência: Uma História Cultural da Nossa Idade”, em tradução livre).

OS 50 SÃO OS NOVOS 50

Pois então...estes fatos & argumentos, para mim, reforçam ainda mais que os 50 são os novos 50. Acredito que se a Geração Baby Boomer, da qual faço parte, mas com a qual não me identifico na sua totalidade, e a Geração Silenciosa querem reivindicar, criar, ocupar e aproveitar os seus espaços (sejam eles no mercado de trabalho e/ou na vida social), elas têm (temos) que estar confortáveis nas suas (nossas) idades, e sentir orgulho do que e como são (somos), sem a necessidade de alegorias de linguagem para construir e usufruir uma vida e existência plenas.

Dizer que os "50 são os novos 30" me lembra as editoras de moda dos blogues e das “Vogue da vida” que, vai temporada, vem temporada, decretam que “Agora, o cinza é o novo preto” (sic). 

OS TAIS PORQUÊS

A questão é que categorias geracionais não devem ficar atreladas ou reféns de recursos de linguagem, pois elas não são mercadorias, nem produtos de moda ou cosméticos (lembrando que até a revista de moda Allure deletou o termo "anti-idade" em seu conteúdo editorial por reconhecer que o envelhecimento deve ser vivenciado como uma experiência positiva, e não como algo a ser evitado e combatido).

Além disso, acredito que:

  1. Por mais atitude que uma pessoa tenha e por mais que a Medicina e a Ciência avancem, corpo e mente de 50 anos ou mais, não são corpo e mente de 30 anos, ou menos. Em alguns casos (raros) podem até estar em melhores condições, mas não é a realidade da grande maioria da população, em especial a brasileira. Osteoartrite, menopausa nas mulheres, lapsos de memória, e doenças crônicas  gritam e marcam presença na vida de quem já passou dos 50 anos. Pelo menos, por enquanto, é essa a realidade dos "simples" mortais.
  2. Amadurecer é um processo interno que parece estar se tornando artigo de luxo nos tempos modernos e Pós-Modernos. Amadurecimento enquanto capacidade de uma pessoa de desenvolver resiliência diante do sofrimento e das ambivalências inevitáveis e intrínsecas ao longo de uma vida. Há uma silenciosa e até insidiosa desvalorização da ideia de amadurecimento e, de quebra, de um bem ainda mais precioso: a sabedoria.
  3. Alguém já disse que há um projeto histórico de se chegar à maturidade sem chegar à maturidade. A maturidade e a sabedoria estão perdendo os seus papéis na sociedade, justamente porque as suas funções estão sendo banalizadas.
  4. Nessa sociedade líquida, fazendo uma referência ao sociólogo Zygmunt Bauman, navegamos ao léu e somos constantemente chacoalhados pelas indústrias da “Felicidade Eterna” e do “Rejuvenescimento Exponencial”. E, o que é pior, as pessoas estão sendo doutrinadas a terem como projeto de vida chegar aos 80 anos com cabeça e atitude de 20. Tirando a romantização (e isso dá muito "pano pra manga") dessa hipótese, seria uma grande tolice, ou não? 

PELO DIREITO DE ANDAR DE PATINETES

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Foto: Vasily Chekorin

Assumir e ter orgulho da própria idade demonstram coragem, autoaceitação e amadurecimento. Vale lembar que há uma quantidade significativa e crescente de pesquisas que apontam como as atitudes negativas dos idosos impactam sobre suas saúde e bem-estar.

Um exemplo é Longevity increased by positive self-perceptions of aging ( Longevidade aumentada por autopercepções positivas do envelhecimento, em tradução livre) , publicada no Journal of Personality and Social Psychology.

O estudo demonstrou que as pessoas que têm atitudes negativas em relação ao seu próprio envelhecimento morrem em média 7,6 anos antes do que aquelas com atitudes mais positivas. As pessoas mais velhas que adquiriram crenças positivas sobre a velhice têm menor probabilidade de desenvolver depressão e demência.

Levando-se em conta que estamos próximos de uma expectativa de vida de 100 anos, conforme prognosticam Lynda Gratton e Andrew Scott em The 100-Year Life - Living and Working in an Age of Logenvity (A Vida de 100 anos - Vivendo e Trabalhando na Era da Longevidade, em tradução livre) e, mesmo que as pesquisas do britânico Aubrey de Gray consigam desenvolver terapias para que a população viva 1 mil anos (!), os anos vividos, as experiências acumuladas e a sabedoria devem prevalecer e contar como importante capital humano da sociedade, da cultura e das organizações.

O que não impede, e não quer dizer, que eu e você não tenhamos o direito de andar de patinetes, em qualquer idade que melhor nos aprouver. 

*************************************************NÃO AO AGEISMO / STOP AGEISM - Este texto faz parte de uma série de posts sobre o Ageismo e seus reflexos na Sociedade e no Mundo do Trabalho.

Keli Lynn Boop é jornalista freelancer. Espraiar a palavra é a sua vocação. Tem experiência em jornal, revista, rádio, TV, internet e assessoria de imprensa.

Katya Vietta

Gestão de Pessoas / Mentoria de Negócios / Desenvolvimento de Pessoas

5 a

Muitas pessoas estão aprendendo a envelhecer, mas continuam com medo de "ficar velhas". Prefiro "o direito de andar de patinetes".

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