Caldeiras de Recuperação Química (Papel e Celulose)
A tecnologia de aproveitamento da energia térmica e dos produtos químicos nos rejeitos de extração da celulose é uma característica das caldeiras de recuperação química. O processo tem a particularidade de gerar vapor para atender as necessidades da própria instalação, como ainda de reciclar até 90% dos insumos de produtos químicos exigidos no cozimento da madeira. A participação destes insumos na fabricação da celulose é tão representativa que sua recuperação promove expressiva redução no custo de produção. O Líquido residual da fabricação da celulose possui teores de sólidos totais de 13 a 17% com concentração de 60 a 63%, e aspecto de um líquido negro viscoso que apresenta características de um combustível (Leite, 2008 e Arthur, 2002).
Esta concentração atingindo 63% de sólidos totais contém ainda 37% de água, sendo as partes sólidas, representadas por substâncias de natureza orgânica e inorgânica. Estas últimas fazem parte dos componentes químicos que atuam nos cozimentos de madeira para liberar a celulose. O liquido negro concentrado, injetado na caldeira, sustenta uma combustão, graças ao seu teor de matérias orgânicas, gerando calor numa quantidade tal que funde a parte mineral da sua constituição e ainda gera vapor, suficiente para dar autonomia energética ao próprio processo de fabricação da celulose. O principal objetivo de caldeiras de recuperação química é recuperar os inorgânicos, como por exemplo, a soda caustica (NaOH). A outra função é de gerar o vapor, ao aproveitar o calor dos gases de combustão. Parte da energia do vapor produzido na caldeira abastece as diferentes etapas de produção e o restante do vapor é utilizado para gerar energia elétrica, via turbo gerador. A recuperação dos inorgânicos se dá por meio de bicas, pela parte inferior do equipamento (figura 1b). Os componentes inorgânicos do fundido são basicamente sulfeto de sódio (Na2S), carbonato de sódio (Na2CO3) e cloreto de sódio (NaCl) (Leite, 2008 e Arthur, 2002).
As caldeiras de recuperação possuem o fundo inclinado para que o fundido inorgânico escorra por gravidade até o tanque de dissolução. A partir dessa parte o fundido é transferido para outra etapa do processo. Os tubos da região da fornalha e as bicas são revestidos por material resistente a corrosão. È comum o revestimento dos tubos da fornalha e das bicas apresentarem trincas induzidas por mecanismo de corrosão sob tensão. Fazendo-se necessário o reparo do revestimento removendo as trincas e recompondo o revestimento após 12 meses (Leite, 2008).
As trincas são formadas por mecanismo combinado de corrosão sob tensão caustica e fadiga térmica. Os inoxidáveis ferríticos, como A 430, são mais resistentes à corrosão sob tensão que os inoxidáveis austeníticos, como A 304L. Existem três formas de prevenir a corrosão sob tensão caustica em fornalhas. A primeira é utilizar tubos extrudados compostos de dois materiais dissimilares, a exemplo o aço carbono com o aço inoxidável. A segunda é aplicar um revestimento soldado de aço inoxidável ferrítico ou duplex contra a corrosão. E a terceira é a aplicação de um revestimento tipo cimento orgânica, pouco usada (Arthur, 2002).
A corrosão sob tensão caustica nas paredes d´agua em caldeiras de recuperação é um problema que aumentou nos últimos anos devido a dois fatores. O primeiro é a introdução de leitos (figura 1b) mais inclinados para favorecer a eficiência térmica e fluidez do fundido, mas que também favorece a formação de pites de corrosão. O segundo é a transição de combustíveis fosseis para os renováveis, como biomassa e resíduos. Estes tendem a ter níveis mais elevados de metais alcalinos, como o Sódio, e Cloro (Pettersson, 2009).
Conforme dados apresentados pela Associação Brasileira de Celulose de papel (BRACELPA), entidade que possui inúmeras empresas do ramo de papel e celulose do Brasil associadas a ela, o país ocupa o sexto lugar no mundo na produção de celulose e possui mais de duzentas empresas atuando no segmento, sendo que dessas, vinte sete atuam na fabricação de celulose.
Caldeiras de recuperação química são tanto do ponto de vista de processo quanto do ponto de vista de segurança, um equipamento chave dentro de uma indústria de celulose. A indisponibilidade da caldeira de recuperação ocasiona a parada geral da fábrica, com prejuízos econômicos significativos. Do ponto de vista de segurança, tanto patrimonial quanto das pessoas (BRACELPA, 2008).
Existe uma preocupação com o monitoramento dos danos que uma caldeira de recuperação está susceptível. Mentz (2005) afirma que as associações que congregam as indústrias de celulose em diversos países compõem grupos de trabalho dedicados exclusivamente à segurança das caldeiras de recuperação e o Brasil não é exceção à esta regra. Há vários anos, a Associação Brasileira de Tecnologia de Celulose e Papel (ABTCP) criou o Comitê de segurança em Caldeiras de Recuperação do Brasil (CSCRB). Um dos sub-comitês do CSCRB, o de Manutenção e Inspeção, dedica-se exclusivamente a estudar e difundir boas práticas que garantam a confiabilidade operacional das caldeiras de recuperação, através da aplicação de procedimentos de inspeção e manutenção adequados.
Por razões de segurança normas a Nr 13 preceitua que caldeiras de qualquer tipo sejam inspecionadas com regularidade. A Nr 13 estabelece procedimentos, prazos, responsabilidades e demais requisitos para estas inspeções. Há, contudo, um reconhecimento geral, na indústria de celulose, de que a segurança das caldeiras de recuperação de química requer cuidados de inspeção que transcendem as exigências oficiais genéricas para geradores de vapor (Balsamo, 2006).