A Centralidade da Família no Cuidado do Idoso
A Família pode ser considerada aquela que proporciona o bem estar de seus componentes, em seu espaço é que são absorvidos valores éticos e humanitários, é também no seu interior que se constrói as marcas entre gerações e são partilhados os valores culturais. É a partir da família que se constitui os grupos sociais. Assim a família reflete as transformações sociais e simultaneamente atua sobre elas desempenhado um importante papel no movimento da sociedade.
Na CF/88 a família é apresentada como a base fundamental da sociedade e a promotora da dignidade humana de todos os seus membros. O Estatuto do Idoso reconhece o compromisso da sociedade e do poder público, no entanto, também aponta a família como a primeira responsável pelo idoso dependente. Nesse sentido, segundo Camarano (2013) a preocupação do estatuto em “proteger” o idoso e manter os vínculos familiares resulta em mais responsabilidade e sobrecarga sobre os seus familiares.
Assim, verificamos que as políticas de proteção ao idoso foram implementadas mediante a distribuição de responsabilidades entre os membros da família e o Estado. Observa se que no Estatuto do Idoso há a obrigatoriedade dos filhos cuidarem de seus pais idosos em situação de pobreza e doença. O estatuto prevê a obrigatoriedade da família no cuidado do idoso, e em caso de abandono e omissão; a família fica sujeita a responder processo judicial, ficando passiveis a cumprir pena de detenção.
Extraído da literatura gerontológica os termos; cuidado formal e cuidado informal expõem um tipo de organização de apoio que atua baseada nas relações profissionais e relações familiares ou de amizade.
Assim, o cuidado formal é realizado pelos hospitais, ambulatórios, consultórios, abrigos,centro-dia, unidades de apoio a família. Tanto o idoso quanto o seu cuidador podem ser objeto do cuidado formal.
O cuidado informal é oferecido pela família; o cônjuge, filhos, netos, genros e noras. Os amigos mais próximos, vizinhos, grupos comunitários, padre, pastor integram a rede de cuidado informal social.
Entretanto, antes de no aprofundarmos na questão da centralidade da família no cuidado do idoso e a transferência de responsabilidade do Estado, é necessário observar a realidade demográfica em relação a mobilidade da pessoa idosa.
O envelhecimento da população nos impõe uma nova realidade, é notório que a população idosa conserva satisfatória capacidade funcional por muitos anos e parte desses idosos participam ativamente da vida social.
Nesse sentido é importante ressaltar que o fator socioeconômico é determinante para essa realidade. Podemos observar que em determinadas regiões do Brasil há menor participação dos idosos na vida social.
Verificamos que 24,4% das pessoas de 60 anos ou mais de idade relataram participar de atividades sociais. Quanto as atividades funcionais, 6,8% possuem limitações para:comer, tomar banho, ir ao banheiro, vestir-se, andar em casa de um cômodo para outro no mesmo andar, e deitar-se. Segundo Nunes (2006), o envelhecimento está ligado a um processo biológioco de “declínio das capacidades físicas” associado a fragilidades psicológicas e comportamentais. Assim o autor corrobora que o estar saudável passa a ser compreendido como a capacidade do corpo em responder as necessidades da vida cotidiana.
Ainda de acordo com a pesquisa verificou-se que, quanto mais elevada a idade, maior a proporção de pessoas com tais limitações, variando de 2,8%, para aquelas de 60 a 64anos, a 15,6%, para as de 75 anos ou mais de idade.
Assim, entre os idosos que possuem fragilidades e perda de mobilidade, devido a doenças que são inerente a idade ou por algum tipo de deficiência, verificou-se que 84% necessitam de ajuda para realizar atividades da vida diária, 17,8% recebiam cuidados remunerados de familiar ou não, da mesma residência ou não; 78,8% recebiam cuidados de familiar com ou sem remuneração. (IBGE /PNS, 2013)
Segundo Camarano (2016) pautada em informações disponíveis, as projeções apresentam um pequeno crescimento na taxa de predomínio de demência na população acima de 65 anos; de 7,6% em 2010, para 7,9% em 2020, serão 55 mil novos casos por ano.
A autora afirma que 66% dos casos de perda de autonomia, foram causadas por doenças crônicas. Entre elas as que se destacaram:
QUADRO 10 DOENÇAS
CRÔNICAS
Transtornos Neuropsiquiátricos
19%
Doenças Cardiovasculares
13%
Doenças Respiratórias
8%
Cânceres
6%
Doenças Musculoesqueléticas
6%
Diabetes
5%
Fonte: Política Nacional do Idoso: velhas e novas questões, Camarano 2016
Os Transtornos Neuropsiquiátricos, são a maior causa de perda de autonomia da pessoa idosa, ocasionam prejuízos cognitivos como alterações de memória, de julgamento, de linguagem, de habilidades visuais e espaciais, de raciocínio, de concentração, de aprendizado, além de desorientação em relação ao tempo e ao espaço, e dificuldade de realização de tarefas complexas. Apresentam mudanças comportamentais,alterações de personalidade e podem provocar quadros de demência. Assim, observa se que essas condições causam forte impacto nas relações familiares (CARVALHO, 2009).
Em seguida as doenças cardiovasculares; Acidente Vascular Cerebral AVC, é caracterizado pela perda rápida de função neurológica. O paciente pode apresentar paralisação ou dificuldade de movimento dos membros de mesmo lado do corpo, dificuldade na fala ou articulação das palavras e défice visual súbito de uma parte do campo visual, como Outras doenças cardiovasculares o AVC pode deixar sequelas que afetam a mobilidade da pessoa (BASTO,2009).
Nos casos de demência e desordem mental, segundo Karsch (2003) é comum que somente as esposas e filhos se habilitem ao papel de cuidador. Esse idoso exige diferentes modos de atenção, apresentam comportamentos violentos, o que causa grande desgaste para família principalmente para o cuidador.
Nesse sentido, mesmo quando os cuidados com o idosos são partilhados entre diferentes membros da família, há uma tendência em responsabilizar uma pessoa, que seria o cuidador principal. O Cuidador principal é aquele que tem absoluta responsabilidade em prover os cuidados. (Karsch, 2003)
A Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa PNSPI define o cuidador como:
"a pessoa, membro ou não da família, que, com ou sem remuneração, cuida do idoso doente ou dependente, no exercício das suas atividades de vida diárias, tais como alimentação, higiene pessoal, medicações de rotina, acompanhamento aos serviços de saúde ou outros serviços que requeiram no cotidiano, excluídas as técnicas ou procedimentos identificados com profissões legalmente estabelecidas, particularmente na área de enfermagem."
O Ministério da Saúde MS compreende o cuidador como:
"cuidador é a pessoa, da família ou não, que presta cuidados à pessoa idosa que apresenta dependência (em maior ou menos grau). Suas tarefas envolvem o acompanhamento nas atividades diárias, como auxílio na alimentação, higiene pessoal, medicação de rotina entre outros; auxiliando na recuperação e na qualidade de vida dessa pessoa."
Assim, observa se que essa responsabilidade recai sobre a mulher, que pode ser a esposa que por sua vez também é idosa, filha ou nora. O Cuidador é sobrecarregado devido ao desgaste físico e desgaste emocional especialmente quando o idoso apresenta comportamento agressivo. É evidente que há um desgaste na relação afetiva existente entre o cuidador e idoso.
Em relação a questão da mulher de acordo com Camarano (2016) A proporção de idosos dependentes de familiares é um indicador de fragilidade, física ,mental, financeira e social, As mulheres vivem mais, cuidam dos seus maridos, e, quando estes morrem, vão morar com filhos ou outros parentes.
A responsabilidade na atenção do idoso, na garantia do seu bem estar, é totalmente relacionado a preservação da dignidade e direito a vida, o que significa estar assistido em suas necessidades. Nesse sentindo, a família não pode ser a única fonte de provisão de cuidados de seus idosos enfermos e fragilizados. Para Karsch (2003)
É um erro considerar que, por estarem nas casas de suas famílias, e terem uma pessoa cuidando deles, os idosos frágeis e dependentes não estariam necessitados de formas sistemáticas de apoio, esclarecimentos, demonstrações de cuidados físicos, e visitas de profissionais de saúde e de amparo social.
De acordo com autor, formas sistemáticas de apoio, pressupõem a participação do Estado no cuidado do idoso. Entretanto a “complementaridade”entre família e Estado parece cada vez mais inconsistente.(Gueiros, 2003)
O Estado tem restringido sua participação na solução de questões inerente ao cuidado do idoso dependente. Coube a família assumir esse papel sem o suporte do poder público. Percebe se que há uma tendência em instituir a família como uma das alternativas de enfrentamento de determinadas expressões da questão social. Nesse sentido, Yazbek (2001, p37) afirma:
Assim o “modelo” é um Estado que reduz suas intervenções no campo social e que apela à solidariedade social, optando por programas focalista e seletivos caracterizados por ações tímidas, erráticas e incapazes de alterar a imensa fratura entre necessidade e possibilidades efetivas de acesso a bens, serviços e recursos sociais. Cresce o Terceiro Setor. Aparece com força a defesa de alternativas privatistas para a questão social envolvendo a família, as organizações sociais e a comunidade. Esta defesa écomo já afirmamos é legitimada pelo nascimento de ideias liberais que referendam a desigualdade. Assim as propostas neoliberais, em relação ao papel do Estado quanto à questão social, são propostas reducionistas que esvaziam e descaracterizam os mecanismos institucionalizados de proteção social. São propostas fundadas numa visão de política social apenas para complementar o que não se conseguiu via mercado, família ou comunidade.
Assim observamos que o Estado conta com a solidariedade social realizando poucos esforços em direção ao suporte as necessidades do idoso. Um bom exemplo são os programas de assistência domiciliar,como o Melhor em Casa e Estratégia Saúde da Família (ESF),que apresentou aprimoramento, mas continua sendo focalista e seletivo.Os planos privados de saúde têm apresentado mais resultados positivos, o que corrobora Yazbek quando discorre sobre as “alternativas privatistas para questão social”.
Ainda em relação aos programas de assistência domiciliar,verifica se que a equipe de Saúde da Família oferece assistência limitada, apenas ao idoso. O cuidador não recebe o devido valor, não é visto como alguém que também precisa de cuidados. De acordo com Karsch (2003) 39% dos cuidadores possuem idade entre 60 e 80 anos e cuidam de idosos da mesma faixa etária o que nos faz pensar que esses cuidadores são doentes em potencial.
Em contra partida o cuidador ocupa o papel de aliado da equipe do ESF, o que seria também uma das razões para valorizar e acolher o cuidador, tendo em vista a melhoria do cuidado do idoso.
Segundo Camarano (2016) cerca de 3,2 milhões de idosos são cuidados por suas famílias em suas residências. Até 2020 cerca de 4,5 milhões de idosos serão dependentes precisando de ajuda para realizar atividades da vida diária e necessitarão de cuidados. Esses cuidados ainda serão assumidos pelas famílias.
Nesse sentido a responsabilização pelo cuidado do idoso que recai sobre a mulher, até por uma questão de tradição na vida da mulher brasileira; devido a transformação do seu papel na sociedade e avanço de sua atuação no mercado de trabalho, será exigido que o Estado assuma seu papel no cuidado ao idoso.
Assistente Social Andreia Almeida