Cessão de direitos hereditários e a alegação de usucapião: limites e aplicações
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Cessão de direitos hereditários e a alegação de usucapião: limites e aplicações

A cessão de direitos hereditários, regulada pelo art. 1.793 do Código Civil, permite que um herdeiro (cedente) transfira a terceiros (cessionários) sua expectativa de direitos sobre uma herança, seja de forma onerosa ou gratuita. Esse processo ocorre por meio de escritura pública, sem necessidade da prévia abertura de inventário, o que possibilita a circulação antecipada de bens.

Entretanto, é importante salientar que essa cessão não confere ao cessionário a titularidade imediata dos bens herdados, mas apenas a expectativa sobre o quinhão hereditário. Assim, a titularidade definitiva somente se consolida com o término do inventário e a partilha formal dos bens.

Usucapião e seus requisitos legais

A usucapião, por sua vez, é um meio de aquisição originária da propriedade, prevista no Código Civil, que exige o cumprimento de determinados requisitos. A posse exercida deve ser contínua, mansa e pacífica, sem vícios de clandestinidade ou precariedade.

Entre as diversas modalidades de usucapião, destaca-se a usucapião especial rural, que abrange áreas de até 50 hectares. Para seu reconhecimento, o possuidor deve ocupar a terra por 5 anos ininterruptos, sem oposição, tornando-a produtiva por meio de trabalho familiar e estabelecendo residência no local.

Neste sentido, deve-se dizer que esta modalidade visa garantir a função social da propriedade, promovendo a regularização fundiária de pequenos produtores rurais.

Cessão de direitos hereditários e usucapião: conexões e limites

No contexto da usucapião, a cessão de direitos hereditários detém grande relevância, especialmente quando o de cujus já ocupava um imóvel em condições que poderiam configurar a posse ad usucapionem. Neste caso, o cessionário assume os direitos do cedente, podendo continuar a ocupação nos mesmos moldes e, eventualmente, pleitear a usucapião do bem.

Entretanto, a cessão de direitos hereditários, por si só, não confere a titularidade plena do imóvel. O cessionário ainda precisa cumprir os requisitos da usucapião, incluindo o prazo e a posse qualificada. Assim, a cessão pode servir como um elemento adicional, mas não substitui os critérios legais necessários para a usucapião.

        Ademais, a posse originada de um direito hereditário não se equipara à posse qualificada necessária para a usucapião, uma vez que a jurisprudência entende que não é possível somar as posses do cedente e do cessionário para fundamentar a aplicação do instituto, o que impede a regularização de um imóvel apenas com a cessão de direitos hereditários.

Conclusão

Embora a cessão de direitos hereditários seja uma ferramenta válida no direito sucessório, ela não constitui uma via direta para a aquisição de propriedade por usucapião. Para que esta modalidade de aquisição originária seja válida, é imprescindível que o cessionário cumpra todos os requisitos legais, incluindo o tempo de posse qualificada.

Além disso, o cessionário não pode fundamentar sua expectativa de aquisição automática do bem, pois a cessão de direitos hereditários não confere imediata titularidade. A propriedade se consolida apenas após a quitação dos débitos do espólio e a partilha formal dos bens. Portanto, a cessão exige cautela e conhecimento jurídico, especialmente para evitar frustrações quanto às expectativas do adquirente sobre a regularização da propriedade.


Matheus Cirqueira é Analista Jurídico e Maria Eduarda é estagiária no escritório João Domingos Advogados.

Luciano Faria

Advogado tributarista | Sócio na João Domingos Advogados

3 m

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