Coletivo de Literatura
Vasculhando gavetas, encontrei diversas provas antigas da já tão distante graduação em Letras. Disciplinas que eu não lembrava de ter feito, conteúdos que eu não fazia ideia de que em algum momento havia estudado, notas que não têm a menor importância hoje.
E nesse momento me veio uma pergunta: o que ficou em mim disso tudo? O que essa formação me ensinou durante os quatro anos em que estive na UERJ?
A pergunta parece simples, mas pode ser capciosa. Se buscar respostas a partir das provas empoeiradas, me parecerá que não ficou nada. Talvez eu acredite que a minha formação tenha sido uma grande farsa e que eu jamais estaria preparado para entrar numa sala de aula como professor.
No entanto, a despeito de tudo que se foi, muita coisa me ficou. E não hesito ao dizer: o que a minha graduação me deu melhor foi o eterno desassossego.
E é esse incômodo que me faz repensar todos os dias a minha prática pedagógica. Como a escola pode ser diferente? Como a sala de aula pode se tornar um verdadeiro espaço de aprendizagem? Como o ensino pode, de fato, permitir aos alunos pensar a língua a partir de seus diversos usos?
Minhas memórias enquanto aluno são quase todas transpassadas pela Literatura. Uma dessas lembranças é bem emblemática: na quinta série, a professora de Redação havia pedido para a turma escrever, a partir de uma leitura motivadora, um pequeno conto que tivesse como tema uma confusão causada por conta de palavras homófonas. Eu achei aquilo tão fantástico que, não satisfeito em cumprir a tarefa, escrevi logo TRÊS contos. Não cabia em mim ao levar as Redações para a professora que, não tão empolgada, se assustou com as três folhas e me pediu que escolhesse somente uma, devolvendo as outras. Mais tarde, numa reunião de pais, ela comentaria que eu era um excelente aluno e que, inclusive, tinha feito três redações quando somente uma era necessária. Quando meu pai chegou em casa e contou a história rindo, me senti traído como nunca antes na vida. Hoje, na mesma posição, sei que a minha professora agiu da melhor maneira possível, de acordo com o que o sistema educacional exigiu dela. Mas que foi triste, foi.
Ao longo dos anos, a cena invariavelmente se repetiu e algumas questões começaram a surgir. Vale a pena escrever poemas se ninguém lê? Havia espaço para fazer algum conto no meio de tanta dissertação-argumentativa? Por que a aula de Literatura, meu último reduto, parecia tanto uma decoreba de contextos históricos sem fim?
Terminei o Ensino Médio sem as respostas.
No entanto, a graduação em Letras me trouxe novamente as perguntas. E elas ficaram (ainda ficam) martelando a minha cabeça enquanto professor.
Nesses últimos 10 anos, tentei inúmeras vezes fazer algo diferente. Tentei em 2009 pensar a produção de textos literários no Ensino Médio e não deu certo. Tentei em 2010 criar uma Oficina Literária na Escola Estadual em que trabalhava e, depois de 5 encontros, fiquei abandonado na Biblioteca e acabei desistindo. Tentei em 2012, numa escola particular do Rio de Janeiro, mais uma vez construir um espaço para pensar e produzir Literatura e até obtive certo sucesso, mas eu queria mais. Tentei em 2014 e 2015 reviver a Oficina numa escola da Barra da Tijuca e a ideia nunca saiu do papel.
Mas o bom do desassossego é isso. Ele te coloca sempre em movimento. Há exatos dois anos, na Escola Nova Gávea, apresentei à coordenação o projeto da minha Oficina de Escrita Literária que virou, depois de alguns tropeções, o Coletivo de Literatura. Do Coletivo nasceu o selo editorial Enova e a publicação de nosso primeiro livro, em novembro do ano passado, o Décimo terceiro signo. Esse ano, temos o dobro de integrantes, somos dois Coletivos e teremos dois livros publicados.
Vocês não podem imaginar o orgulho que me dá isso tudo. No dia 3 de dezembro, na Livraria Travessa Shopping Leblon, estaremos lançando Corpo carvão e Meio cheio. Livros pensados, escritos, ilustrados e produzidos pelo Coletivo de Literatura.
É nesse momento que faz sentido toda a minha formação. E é pra isso que a gente se torna professor.
Espero todos vocês lá!
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Lançamentos Enova 2017: Corpo carvão e Meio cheio
3 de dezembro - Domingo
Livraria Travessa Shopping Leblon
- Corpo Carvão (8° ano) - 16 horas
- Meio cheio (9º ano) - 18 horas
Venda antecipada dos livros
A reserva de exemplares está sendo feita com os alunos do Coletivo de Literatura ao valor de R$ 40. Os livros serão entregues na Livraria da Travessa durante a nossa sessão de autógrafos.
Não haverá venda no dia do lançamento.