Como conseguir reciprocidade na negociação
Uma das coisas mais difíceis em uma negociação é saber o momento e o quanto ceder, ou seja, fazer concessões. As concessões são uma parte importante de todas as negociações e é muito raro que você conduza uma negociação sem que, em algum momento, haja concessões. E, por isso, é importante ser estratégico no momento de fazer uma concessão.
Muitas vezes imaginamos que fazer concessões é sempre algo ruim, porque temos que abrir mão de alguma coisa que queremos, mas não é bem assim. As suas concessões têm que, na verdade, te conduzir ao seu objetivo principal, a conseguir aquilo que é valor para você.
Quando falamos em negociação integrativa, estamos negociando vários fatores ao mesmo tempo. Alguns tem mais valor para nós, outros para nosso interlocutor. E as negociações ganha-ganha tem essa característica. As concessões existem, mas elas permitem que as duas partes ganhem.
Se entrarmos em uma negociação acreditando que só existe um ponto a ser negociado, aí sim as concessões têm uma conotação ruim porque o que você concede, na verdade, está perdendo. É um processo PERDE-GANHA.
E ainda se entrar na negociação com zero flexibilidade, sem a disposição de fazer nenhuma concessão, você quer uma negociação GANHA-PERDE e esse é o tipo de negociação que acaba em impasse e te afasta do seu objetivo que é chegar a um acordo.
Voltamos, então, à conclusão de que o GANHA-GANHA é a única forma de ser bem-sucedido na vida profissional e na pessoal.
Ora se as concessões são quase sempre inevitáveis como assegurar que podemos usá-las justamente pra conseguir o que queremos na negociação?
Para isso, temos que ser estratégicos.
A primeira coisa, é o mindset certo. Nós temos que enxergar todas as nossas negociações como um GANHA-GANHA.
Isso vai te ajudar muito a ressignificar as concessões. Ao invés de enxergá-las como uma perda, você passa a vê-las apenas como uma etapa do processo em que as duas partes querem e precisam ganhar.
A grande sacada está em identificar o que é valor para você e para o outro lado e fazer as concessões em pontos que você não valoriza tanto, ou seja, baratos, para poder ganhar exatamente nos que você valoriza. Essa é a forma de maximizar o seu resultado.
Só que sem conceder, a outra parte não se motiva a fazer o que você quer. E isso é uma questão bastante óbvia. Por que ela faria o que você quer se ela não ganha nada com isso? Você mesmo não faria.
E não adianta ir com o mindset de que o que você quer é justo e isso por si só basta. Não basta. Primeiro porque essa questão de justiça é relativa. Depende do ponto de vista. Por mais que você ache que é óbvio, não é.
Segundo porque mesmo que ninguém entra em uma negociação para perder. Isso não faz sentido nenhum. Se você já tem esse mindset, tudo fica mais fácil. Você não vai ficar perdendo tempo em tentar impor a sua justiça ao outro e já busca alternativas para uma negociação GANHA-GANHA.
E, se o outro lado está ganhando, você não concorda que ele fica muito mais propenso a te dar o que você quer?
Outra questão importante é que você tem que valorizar a sua concessão.
É natural que o outro lado tente fazer sua concessão parecer menor do que ela é. Quanto menor for sua concessão, menos ele tem que te dar para compensá-la.
Por outro lado, se for uma concessão significativa, isso já causa um efeito inconsciente na outra parte de que ele tem que retribuir à altura. É o princípio de reciprocidade. E isso é inerente a qualquer ser humano. A ideia, então, é que você realmente mostre que sua concessão é muito importante.
Primeiro você precisa mostrar o quanto você teve que abrir mão para poder fazer essa concessão. E pode ser alguma coisa que você já tenha e vai abrir mão ou ainda algo que você quer, mas não vai poder ter só por causa da concessão.
Para exemplificar, vamos imaginar que você está negociando o dissídio com o sindicato da sua categoria. Você tem que mostrar o quanto os x% que eles estão pedindo vai representar na sua margem de lucro, as dificuldades que o segmento está passando, a dificuldade em repassar esse aumento para o cliente final e quanto de vendas você vai perder por causa disso.
Com a concessão devidamente valorizada, você pode até ceder, mas o que você está pedindo em troca fica mais significativo. Você pode pedir alguma coisa de maior impacto na troca. Se você não fizer isso, não consegue valorizar o que você vai receber e, consequentemente faz a concessão recebendo nada, ou quase nada, em troca e isso é muito ruim.
A segunda dica é mostrar para a outra pessoa o quanto essa concessão significa para ela. Antes você mostrou o impacto para você. Agora é para o outro lado.
O tamanho da vontade da outra pessoa em te ajudar, em te dar o que você quer, é diretamente proporcional ao benefício que você proporciona a ela. Se você mostra que o benefício causado pela sua concessão é muito grande, a tendência é que a pessoa fique muito mais disposta a te ajudar a conseguir aquilo que você quer.
E terceiro, você não pode abrir mão daquilo que vai se tornar a concessão de uma maneira muito fácil. E é simples de entender isso. Se você abre mão de alguma coisa muito facilmente significa que não tinha nenhum valor para você e, consequentemente, a outra pessoa se sente desobrigada a manter a reciprocidade.
Por outro lado, quando você mostra que fazer aquela concessão está "doendo" em você, você legitima a sua proposta inicial. Você ganha credibilidade e gera no outro lado essa necessidade de reciprocidade com alguma coisa que também "doa".
Agora, por mais importante que seja você valorizar a sua concessão, porque você gera na outra pessoa a necessidade inconsciente da reciprocidade, você não pode deixar isso no ar, só no subconsciente. É importante deixar a pessoa pré-disposta a te ajudar, mas você tem que deixar isso claro. Você tem que, de uma forma explícita (mas diplomática) exigir alguma coisa em troca da sua concessão.
Vamos imaginar que você tem uma empresa de projetos e você está negociando o orçamento com o seu cliente. Ele diz que o preço está alto e que precisa abaixar.
Você está disposto a fazer isso, mas tem que valorizar a concessão. Você mostra que pode reduzir, mas tem que tirar pessoas, reduzir horas extras etc. O que você precisa em troca, na verdade, é uma mudança no prazo de entrega do projeto. Você já explicou e valorizou a concessão, agora, você deixa claro o que precisa em troca, que é o adiantamento do prazo de entrega.
Quando você faz isso, você acaba deixando uma escolha para a outra parte e se o que ela está pedindo (nesse caso, o preço) é realmente importante para ela, fica mais simples de ele ceder naquilo que é importante para você (nesse caso, o prazo). Mas, se você não deixar claro e explícito que é uma coisa pela outra, uma troca, perde a oportunidade.
Quanto mais contingenciada for a concessão melhor.
Quanto mais você provar que só consegue conceder o que a outra parte quer se houver alguma compensação por parte dela, melhor. É o famoso "cobertor curto". Você só consegue cobrir a cabeça se descobrir os pés e vice-versa.
Quando você mostra que para atender o pedido da outra parte você precisa, necessariamente, de algo em troca. Não porque é um capricho, mas porque você depende disso para poder atender a solicitação dele, mais forte a chance de você conseguir o que precisa. As coisa ficam interligadas.
Por isso, quando a outra parte te pede uma concessão, não é recomendável você reagir de forma categórica dizendo não ou ainda com algum desdém, o que é bastante comum. Você já deve ter escutado ou até respondido coisas como:
“Você ficou maluco? De onde você acha que eu vou tirar isso?”
Ou ainda “Você só pode estar brincando me pedindo alguma coisa desse tipo!”
E coisas desse gênero. Quando você faz isso, pode estar perdendo uma chance interessante de conseguir alguma coisa que tem muito valor para você. Então, antes de responder, pense um pouco. Analise. Veja se você não pode tirar proveito da concessão solicitada. Usada com estratégia, a concessão é uma ferramenta muito interessante na negociação, ao contrário do que as pessoas pensam.
Uma outra dica interessante é fazer a concessão aos poucos.
Isso tem uma conotação psicológica no ser humano. Vamos imaginar que você está andando e acha uma nota de R$ 100 na rua. Você vai ficar muito feliz.
Agora vamos imaginar a mesma coisa de uma forma diferente. Ontem você estava andando na rua e achou uma nota de R$ 50. Hoje assim que saiu de casa achou outra nota de R$ 50. No final, são R$ 100 do mesmo jeito, mas os estudos mostram que a segunda situação traz muito mais felicidade para a pessoa que achou o dinheiro do que a primeira.
No caso da concessão é a mesma coisa. Seu interlocutor vai ficar muito mais feliz se você fizer a concessão em “parcelas”, ao invés de entregar tudo de uma vez. Por mais que isso pareça sem sentido, é o impacto psicológico da mesma forma que o dinheiro que você achou na rua.
E pode ser que alguém esteja pensando: “Meu cliente ou meu chefe ou meu fornecedor se recusa a dar qualquer coisa em troca. Ele quer a concessão, mas não vai dar nada.”
Isso normalmente acontece quando você não trabalha bem a questão das consequências da concessão e quando você não identifica o que é valor para você e para o outro dentro da negociação. O seu interlocutor não entende por que ele deveria te dar algo em troca da concessão pedida e esse é o problema.
Você tem que deixar muito claro o impacto da concessão para você.
Muitas vezes você pode fazer uma concessão para ganhar um negócio, por exemplo. Mas você tem que tomar muito cuidado com isso. Fazer concessões só para ganhar o negócio sem se preocupar com as consequências pode ser fatal para você.
Qualquer concessão que te leve para fora do seu limite não pode ser aceita. Mesmo que a base de troca seja um novo negócio. Eu vi várias empresas que fizeram isso com a ideia de recuperar posteriormente e acabaram na falência. Você não deve fazer concessões que te levem fora dos seus limites, independente do que está em jogo.
Você tem que ter muita consciência e análise para se assegurar que o custo-benefício entre a concessão e o que você recebe é bom para você.
E, seguindo essa mesma linha, eu não recomendo que você faça concessões para manter o bom relacionamento. Eu já vi muita gente fazer isso, mas a questão é o que o bom relacionamento vai te proporcionar. De novo é uma questão de custo-benefício. Mas tem que ser um benefício real, palpável, mensurável. Aceitar a concessão só para “ficar bem na fita” com a outra pessoa definitivamente não é uma boa estratégia.
Toda concessão tem que te trazer alguma coisa positiva e não só um tapinha nas costas. Cuidado com isso.
Um outro problema é fazer a concessão em troca de nada. Além do fato propriamente dito de dar alguma coisa sem receber nada em troca, o que não faz muito sentido, você tem uma outra consequência grave, que é a perda de credibilidade.
Quando você simplesmente concede o que a outra pessoa quer, ela imagina que você estava querendo enganá-la, por isso pediu algo muito maior do que queria só para baixar depois. Esse tipo de atitude leva a pessoa a pensar que sempre dá para tirar mais. Ela não confia que você chegou no seu limite e vai buscar mais e mais até ter certeza de que você está no limite e, com isso, você perde a oportunidade de maximizar seus ganhos.
Credibilidade é muito importante em uma negociação. Ela traz confiança. E isso faz toda a a diferença.
Então, a primeira coisa que você precisa fazer ao receber um pedido de concessão é analisar. Se você fizer a concessão, onde isso te leva?
Se for fora do seu limite, não dá para aceitar. As consequências podem ser piores do que o não acordo. Lembre-se que nenhum acordo é melhor que um acordo ruim.
Aí você tem que se perguntar por que aquilo é tão importante para o seu interlocutor? Por que aquilo é valor para ele? O que ele estaria disposto a fazer para conseguir aquilo?
A mesma coisa para você. O que é valor para você? O que você poderia ganhar se fizer aquela concessão?
A partir daí é valorizar e assegurar que seu interlocutor entenda que dar o que você quer é simples comparado ao que ele recebe. Só assim você usa a concessão de uma forma estratégica para você e ela deixa de ser um peso tão grande na negociação.