Como construir uma planilha de finanças pessoais me ensinou 5 lições de vida

Como construir uma planilha de finanças pessoais me ensinou 5 lições de vida

O que fazer com o meu primeiro salário

Todos temos o momento na vida em que estamos ansiosos pelo “nosso” próprio dinheiro. Aquele suado e esforçado, uma conquista de seus próprios desdobramentos como um profissional recém-inserido no mercado.

Profissional? Para o jovem estagiário, ganhando algumas humildes centenas de reais (que não chegam nem a um milhar), é realmente uma conquista! Mas o que fazer com tanto dinheiro? Gastar tudo numa viagem? Fazer um churrascão com os amigos? Engordar a poupança que foi aberta só para poder receber esse dinheiro, em primeiro lugar?

No meu caso, a resposta foi até que simples: meu primeiro salário como estagiário na Natura foi um emocionante salto de pára-quedas. Não tenho fotos, porque custariam 100 reais a mais do que os já muito bem investidos 300 do salto em dupla. E pagar 33% a mais naquele já bastante caro salto, naquele momento da minha vida, seria inadmissível.

Mas tenho muitas lembranças desse dia, sendo que uma delas foi justamente o sofrimento em ver as 6 notas de 50 reais deixando minhas mãos e passando para o bolinho de notas que a moça da empresa de paraquedismo tinha em suas mãos, enquanto exibia um largo sorriso, é claro. Isso aconteceu antes do salto, quando ainda tive que ouvir dessa moça uma piadinha enfatizando a necessidade de se pagar antes do salto, porque depois poderia ser tarde demais!

Outras lembranças desse dia podem ser exploradas em um próximo post, já que o objetivo aqui é outro: falar sobre o principal fruto desse dia. No mesmo final de semana em que fiz o salto, cheguei em casa e contei aos meus pais sobre o feito.

O queixo da minha mãe quase bateu no chão. “Você é louco”, ela disse, com a cara fechada. Ela já sabia das minhas intenções de saltar, mas não sabia que seria tão em breve. Tadinha: meu irmão também saltaria alguns anos depois.

Nesse dia, sentei no sofá da sala com o computador aberto e uma das ferramentas de controle financeiro que eu usava. Era um simples formulário web, que registrava mal e porcamente os meus gastos em uma tabela desestruturada, exibia uns dois ou três gráficos, separando entradas e saídas, algumas categorias (como Refeições, Festas, Viagens, Investimentos) e a data em que os gastos tinham sido feitos.

Essa ferramenta era tão precária que o sistema de login falhava frequentemente, levantando sempre a emocionante dúvida a respeito da segurança dos meus dados. Fora a total ausência de um mínimo sistema estatístico que mostrasse relatórios, ou que permitisse que eu simulasse meus principais gastos do mês ou fizesse orçamentos.

Era pior do que se eu simplesmente criasse uma tabelinha no Excel, onde pelo menos eu teria controle das estatísticas e criasse gráficos da forma que eu quisesse. E foi exatamente isso que eu fiz!

Ou não tão exatamente, já que eu tinha uma lista de requisitos mais completa, com a qual eu comecei a empreitada de criar minha própria ferramenta:

  1. Ter uma tabela completa com meus gastos, funcionando como uma Base de Dados. Teria que ter categorias (ou Centros de Custo, como eu viria a aprender depois), as contas (como a Carteira, Conta Corrente, Poupança, etc), a data do gasto, para quem eu paguei (ou de quem eu recebi) e o valor movimentado;
  2. Uma ferramenta onde eu pudesse projetar meus gastos, criando um Orçamento mensal que controlasse meu rico dinheirinho;
  3. Algum tipo de Relatório, onde eu pudesse simular gastos e entender o comportamento das categorias, contas, valores e assim por diante;
  4. Ser totalmente móvel e estar presente na Nuvem (ou seja, ser feita no Google Sheets e não no Excel, que sofre muito com problemas de versionamento e sincronização até hoje).

Criando a ferramenta dos meus sonhos em um final de semana

Eu não criei a ferramenta dos meus sonhos em um final de semana.

E essa é a primeira lição do meu projeto de criação da minha ferramenta financeira (a qual eu batizei de Logger): nada que vale a pena se cria em um final de semana.

Sim, de fato eu criei uma versão utilizável em um final de semana (a imagem acima mostra meus primeiros registros, incluindo o salto de pára-quedas). E ela realmente tinha tudo que eu listei nos requisitos acima. Inclusive, quando ela estava terminada, ao final de um dia e pouco de trabalho, eu pensei “Agora sim, tenho o que eu precisava!” A segunda lição, portanto, é sempre comece seus projetos com uma lista de resultados esperados.

Por mais que alguns dias depois eu já soubesse que o Logger tinha falhas (que deveriam ser corrigidas urgentemente) e melhorias de diversos tipos (usabilidade/estética, ideias para novas funcionalidades, refazer/eliminar funcionalidades que ficaram muito complicadas e burocráticas, etc), eu sempre trabalhei no Logger como um projeto em constante melhoria.

E quando temos um foco, com objetivos pontuais, lançar uma versão utilizável em um primeiro momento e atualizá-la aos poucos sempre rende resultados incríveis no longo prazo. Inclusive, o Logger foi a catapulta que usei para aprender muito mais sobre uma série de assuntos úteis tanto no âmbito pessoal quanto profissional. Vamos falar um pouco de cada um dos aprendizados desse projeto!

1- Orçamentos e contabilidade pessoal

Através do Logger, consegui realizar a gestão de uma série de contas, em mais de 4 bancos diferentes, ao longo de 3 anos e meio de uso, gerenciando dinheiro de papel na carteira, investimentos em poupança (e mais recentemente, em fundos de investimento e no robô da Vérios), recebimento das empresas onde trabalhei e assim por diante.

É claro, ao mesmo tempo, também criei funcionalidades para prever receita e despesas, mantendo foco sempre em guardar dinheiro como uma das prioridades.

Com tudo isso, ainda veio o interesse em ler sobre o assunto e me aprofundar, criando planos que fugiam o escopo de cada registro feito e passando a ver dinheiro em um âmbito de longo prazo.

Hoje sei exatamente qual o estilo de vida e carreira profissional que desejo ter, o que também pode ser um assunto de posts futuros.

2- Programação de planilhas (Excel e Google Sheets)

Esse é um dos meus maiores orgulhos, que se mostra uma habilidade imprescindível e fonte de elogios em todo canto que vou.

Comecei aprendendo um pouquinho de planilhas na empresa júnior Conpec, simplesmente observando as planilhas que o pessoal tinha criado e tentando replicá-las. Como as planilhas já são feitas para serem intuitivas, aprendi o básico sozinho e com bastante rapidez. E o melhor: tomei gosto pelo assunto.

Passei a desenvolver fórmulas enormes, com diversas outras fórmulas aninhadas, que faziam as coisas mais estranhas, e às vezes, até um pouco prolixas e desnecessárias. Em outras palavras, era como se eu fosse um pedreiro que descobriu o tijolo e a massa, e depois de uma ou duas casinhas, quisesse construir castelos.

Aos poucos comecei a deixar de lado as gambiarras e exageros, e passei a construir planilhas mais consistentes e caprichadas. Acho que faz parte do processo de aprendizado, dentro daquele tipo de experiência que é muito difícil de ensinar a alguém. Não adianta que alguém te diga, você mesmo precisa treinar e testar para perceber o que é realmente útil e o que é perda de tempo.

Outra característica desse aprendizado é que não quis parar nas fórmulas e funções básicas. No começo de 2015, coloquei como objetivo aprender mais sobre Scripts e Macros. Foi um pouco mais complicado começar, mas os tutoriais e documentação do Google são bárbaros e permitem muito auto-didatismo. Este é um outro aprendizado, em que você começa a manipular as APIs do Google e perceber como essa empresa conseguiu criar tantas ferramentas gratuitas, que disponibilizam muito mais poder ao usuário do que se percebe normalmente.

E depois que você percebe como é simples manipular tanto uma planilha (e vários serviços integrados, como email, Google Drive, Calendar e assim por diante) em poucas linhas de código, você entra definitivamente naquela espiral de humildade, em que achava que sabia muito sobre um assunto, mas uma nova e complexa realidade se abre diante dos seus olhos.

Eis a terceira lição do meu projeto Logger: continue aprendendo e seja humilde para reconhecer que ainda sabe pouco, e assim irá abrir muitas novas realidades à sua frente.

Organização pessoal e comprometimento com uma rotina

Quando eu tinha testado as outras ferramentas financeiras, antes de criar a “ferramenta dos meus sonhos”, eu tinha sempre tido dificuldade em manter a utilização delas de forma consistente. Depois de duas ou três semanas, o fator novidade sumia e junto com isso, meu interesse de atualizar a ferramenta ia por água abaixo.

Foi essa a primeira motivação para eu criar algo meu, que eu pudesse controlar exatamente da forma que desejasse, e não dependesse de ferramentas de terceiros. No momento, dependo apenas do Google, mas acho que eles estão em um nível de confiança (muito) maior que um formulário web no qual mal consigo fazer login.

Criando o Logger, eu poderia tanto organizar minhas finanças pessoais (o objetivo primário) como sempre mantê-lo em estado de melhoria e aprender no caminho (o objetivo secundário). Usando a ferramenta de outra pessoa, eu teria apenas o primeiro objetivo.

Hoje tenho quase 3 mil registros no Logger, em um total de 1309 dias desde o primeiro registro. Bastante comprometimento, hein! E não teria sido possível se eu não tivesse comprometimento com algo a mais do que apenas finanças.

Eis a quarta lição: comprometa-se com algo maior para você do que apenas um resultado imediato. Para mim, foi o aprendizado e sensação de criar algo meu, além de sempre ter aquela vontade de ver o Logger melhorando em direção a uma “versão final”, mesmo que eu saiba que esse projeto provavelmente nunca será completamente terminado.

Mas pode ser qualquer coisa que tenha um significado poderoso para você, que te impeça de simplesmente desistir e começar um projeto parecido do zero.

O que é mais importante do que finanças pessoais

Hoje, tenho uma criação que me dá muito orgulho, e uma lista enorme de coisas que gostaria de implementar como melhorias e novas funcionalidades.

Parece que ao longo do tempo, só vi essa lista aumentar, mesmo eliminando itens e melhorando o Logger aos poucos. Em alguns momentos, achei que estava perto de terminar.

Mas em uma conversa recente com minha namorada, ela me ajudou a perceber a quinta e mais importante lição do projeto Logger: você sempre irá perceber uma forma de melhorar. Ao invés de ficar estagnado e dizer “Pronto, acabei”, a vida sempre irá te mostrar formas de entender um ângulo diferente, e potencialmente melhor, do que você tinha visto antes.

Nesse caso, precisei de ajuda de outra pessoa para perceber algo tão importante, o que mostra que devemos estar sempre atentos para cada oportunidade. Uma frase simples como “Mas você ainda pode pensar em outras melhorias na sua planilha, não precisa assumir que ela está terminada”.

E como última reflexão, não é preciso pensar que melhoria significa aumento. Em tantos momentos, a melhor decisão de melhorar uma funcionalidade do Logger foi simplesmente eliminar coisas inúteis, que eu criei achando que seriam legais, mas só adicionaram passos desnecessários.

Simplifiquei uma série de funcionalidades (na imagem ao lado, uma funcionalidade criada em 2016, o formulário que se atualiza sozinho a cada novo registro e permite inserção e edição de dados a partir de qualquer dispositivo) e estou até fazendo testes de usabilidade com outras pessoas no momento, para entender como elas usam essa ferramenta e servir de feedback para novas melhorias. Às vezes, simplificar e eliminar não é sinônimo de destruir, mas de construir.

É um trabalho constante de criar, refletir e corrigir. E assim pretendo continuar construindo meu Logger e meus aprendizados.

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