Como montar um portfólio de investimentos?

Como montar um portfólio de investimentos?

A jornada para dominar a alocação de ativos é essencial na arte da gestão de recursos, o que inspirou profundos debates acadêmicos e revelou insights indispensáveis para a construção de um portfólio ideal. Vamos mergulhar nas principais lições aprendidas que podem guiar você na montagem da sua carteira de investimentos como um profissional:

Teoria Moderna do Portfólio (TMP)

A primeira grande teoria que abordou esse assunto foi Teoria Moderna do Portfólio (TMP). Desenvolvida por Harry Markowitz em 1952, é um marco na gestão de portfólios, e introduz a ideia de que a diversificação deve ser usada para otimizar a relação entre risco e retorno dos investimentos.

Considerando que o risco de mercado de um ativo é dado pelo desvio padrão (ou variância) dos retornos de determinado período - o que passou a ser conhecido por volatilidade -, o risco do portfólio pode ser minimizado através da combinação de ativos que não se movem de maneira idêntica — ou seja, ativos descorrelacionados.

A variância de um portfólio com dois ativos, por exemplo, não depende apenas das variâncias individuais dos ativos, mas também da correlação entre eles.

Curiosidade:

A fórmula para calcular a variância de um portfólio de dois ativos é:

σ²(p)=w1²⋅σ1²+w2²⋅σ2²+2⋅w1⋅w2⋅σ1⋅σ2⋅ρ1,2;

em que:

  • σ²(p) é a variância do portfólio,
  • w1 e w2 são os pesos dos ativos no portfólio,
  • σ1² e σ2² são as variâncias dos retornos dos ativos,
  • ρ1,2 é a correlação entre os retornos dos dois ativos.

Modelo de Precificação de Ativos de Capital (CAPM)

Uma segunda grande revolução nesse tema foi a introdução do CAPM. Desenvolvido na década de 1960 por William Sharpe, John Lintner e Jan Mossin, o modelo avançou nos conceitos da TMP ao descrever a relação entre o risco sistemático de um ativo e seu retorno esperado.

Ele traz o conceito de prêmio de risco, que é a ideia de que o retorno de um investimento deve não apenas superar o seu benchmark, mas também compensar o investidor pelo risco assumido.

A equação do CAPM é usada para determinar o retorno esperado de um ativo é:

E(Ra)=Rf+β(E(Rm)−Rf)

  • E(Ra) é o retorno esperado do ativo,
  • Rf é a taxa de retorno livre de risco,
  • β é o Beta do ativo,
  • E(Rm) é o retorno esperado do mercado,
  • E(Rm)−Rf é o prêmio de risco do mercado, representando o retorno adicional esperado de um investimento de mercado sobre um ativo livre de risco.

Curiosidade:

O beta (β) pode ser calculado através da regressão linear entre a série de preços do ativo estudado e a série de mercado.

Detalhando o beta (β) do ativo:

β=Cov(Ra,Rm)/Var(Rm)

  • Cov(Ra,Rm) é a covariância entre o retorno do ativo Ra e o retorno do mercado Rm,
  • Var(Rm) é a variância do retorno do mercado.

Essencialmente, o CAPM sugere que o retorno esperado de um ativo é igual ao retorno livre de risco mais o prêmio de risco ajustado pelo Beta do ativo. Este modelo ajuda investidores e gestores a avaliar se um ativo está sendo negociado a um preço justo, considerando seu risco.

Modelos de Fatores de Risco

Os modelos de alocação de portfólio baseados em fatores de risco visam melhorar a compreensão e a gestão do risco e do retorno dos investimentos, decompondo os retornos dos ativos em componentes atribuíveis a diferentes fatores de risco.

Estes modelos avançaram significativamente após a elaboração do modelo APT (Arbitrage Pricing Theory), que busca ser uma alternativa ao CAPM, sugerindo que o retorno esperado de um ativo financeiro pode ser modelado como uma função linear de vários fatores macroeconômicos ou índices representando riscos sistemáticos não diversificáveis. Diferentemente do CAPM, que assume um único fator de mercado, o APT permite a inclusão de múltiplos fatores de risco, proporcionando assim uma visão mais detalhada das forças que afetam os retornos dos ativos.

Matematicamente, o modelo APT pode ser expresso pela seguinte equação:

E(Ri)=Rf+βi1(F1−Rf)+βi2(F2−Rf)+⋯+βin(FnRf)+ϵ

  • E(Ri) representa o retorno esperado do ativo i,
  • Rf indica a taxa de retorno livre de risco,
  • F1,F2,…,Fn são os fatores de risco que influenciam os retornos dos ativos no mercado,
  • βi1,βi2,…,βin são os coeficientes que medem a sensibilidade do retorno do ativo i em relação a cada fator de risco,
  • ϵi é o termo de erro, que representa os fatores específicos do ativo e o risco idiossincrático não capturado pelos fatores sistemáticos.

Os fatores Fj simbolizam diferentes fontes de risco sistemático que podem afetar todos os ativos no mercado, mas com intensidades distintas. Os coeficientes βij quantificam quanto o ativo i é sensível a cada fator de risco j.

Portanto, o retorno esperado de um ativo é expresso como uma combinação linear dos fatores de risco, ajustada pelo retorno livre de risco.

Modelo de Três Fatores de Fama-French

É um modelo que sucede o CAPM e APT e considera, além do risco de mercado (beta), o tamanho das empresas (small minus big, SMB) e o valor (high minus low, HML) como fatores adicionais que explicam os retornos das ações.

Tem entre suas principais lições, a percepção da importância de considerar o prêmio de risco associado a empresas de menor capitalização e ações de valor (com baixas razões preço/livro) na construção de portfólios.

Modelo de Quatro Fatores de Carhart

É um modelo baseado na contribuição de Fama-French, mas adiciona mais um fator de risco: O momentum (MOM). Esse fato se refere à tendência de ações com bom desempenho no passado continuarem a ter bom desempenho no curto prazo. A lição aqui é a utilidade de incluir estratégias de momentum na alocação de portfólio para capturar prêmios de risco adicionais no curto prazo.

Curiosidade:

Dentre os fatores de risco mais tradicionais, esse é o que tem maior poder explicativo para o caso de ações brasileiras. Isso é evidenciado no estudo semanal do NEFIN, núcleo de estudo de finanças da USP

Relatórios - NEFIN

Relatório NEFIN - 08/23

Modelo de Cinco Fatores de Fama-French

Este modelo expande o de três fatores adicionando dois novos fatores: lucratividade das empresas (robust minus weak, RMW) e investimento (conservative minus aggressive, CMA).

A lição é que empresas mais lucrativas e aquelas com estratégias de investimento mais conservadoras tendem a oferecer melhores retornos ajustados ao risco.

Curiosidade:

O fator de risco de qualidade costuma apresentar um ótimo desempenho globalmente e em vários momentos da história.

A XP escreveu um relatório muito interessante sobre o assunto: Um guia sobre Factor Investing em ações no Brasil

Black-Litterman

O modelo de Black-Litterman é uma evolução na alocação de portfólio que mescla as visões subjetivas dos investidores sobre os retornos esperados dos ativos com a estrutura de equilíbrio de mercado derivada da Teoria Moderna do Portfólio.

Desenvolvido por Fischer Black e Robert Litterman, este modelo procura superar as limitações associadas às estimativas de retorno altamente sensíveis da TMP, orientando-se por um ponto de partida baseado no mercado.

Ao permitir a inclusão de expectativas pessoais do investidor na análise, proporciona um meio de personalizar a alocação de ativos sem desviar-se completamente das ponderações sugeridas pelo mercado. Isso é feito combinando matematicamente essas visões subjetivas com os retornos implícitos do mercado, levando a uma alocação otimizada que reflete tanto o conhecimento do mercado quanto as convicções específicas do investidor.

Através deste modelo, aprende-se a importância de balancear informações objetivas de mercado com insights subjetivos na tomada de decisões de investimento, destacando a valorização do julgamento humano e da análise fundamental.

Além disso, o modelo de Black-Litterman oferece uma solução para o problema de alocações extremas que podem surgir de estimativas incertas, puxando as decisões de volta para um ponto de equilíbrio de mercado. Isso promove uma gestão de riscos mais sofisticada, ajustando as alocações não apenas à volatilidade esperada dos ativos, mas também à confiança nas próprias previsões do investidor.

Matematicamente:

Π=δ⋅Σ⋅weq

E[R]=Π+Ω⋅[P^T⋅(Σ^(−1)+P⋅Ω^(−1)⋅P^T)^(−1)⋅(QP⋅Π)]

  • Π representa os retornos esperados do equilíbrio do mercado,
  • δ é um parâmetro de aversão ao risco,
  • Σ é a matriz de covariância dos ativos,
  • weq são os pesos de equilíbrio do mercado para cada ativo,
  • E[R] são os retornos esperados ajustados,
  • Ω é a matriz de covariância das visões (ou erros de previsão),
  • P é a matriz que indica quais ativos são afetados por cada visão,
  • Q é o vetor das visões dos investidores sobre os retornos esperados dos ativos.

Modelo de Fatores de Risco Macro

Esse modelo é uma consequência dos modelos anteriores. Utiliza a ideia de que o retorno de um ativo é composto vários fatores de risco. No entanto, nesse caso, as performances dos fatores de risco são explicadas por indicadores macroeconômicos como inflação, taxas de juros, dados de atividade econômica, entre outros.

Eles ensinam que a compreensão das condições econômicas globais pode ser crucial para a gestão de portfólio, permitindo aos investidores ajustar suas estratégias de acordo com o ciclo econômico.

Esses ajustes acontecem justamente através da metodologia de Black-Litterman.

Modelos baseados em Fatores Alternativos

Há uma variedade de modelos que incorporam fatores alternativos, como liquidez, qualidade e fatores ESG. Esses modelos sugerem que além dos fatores tradicionais, há outros riscos sistemáticos que podem influenciar os retornos dos ativos e devem ser considerados na construção e gestão de portfólios.

Qual modelo utilizar?

Os modelos mais utilizados atualmente costumam realizar uma integração das ideias supracitadas, buscando maximizar a diversificação através dos fatores de risco e incluir vieses macroeconômicos.

Isso acontece porque, entre outros motivos, os modelos de fatores possuem uma alta capacidade de serem ajustados à novos dados, de modo que se tornam uma alocação baseada em evidências.

Além disso, permitem uma customização mais fina dos portfólios para atender aos objetivos e à tolerância ao risco dos investidores.

Exemplo prático em etapas

Defina os fatores de risco, como por exemplo:

  • Developed World Bonds,
  • Emerging Markets Bonds,
  • Developed World Stocks,
  • Emerging Markets Stocks,
  • Commodities.

Defina indicadores macroeconômicos para acompanhar, como por exemplo:

  • Indicador de Condições Financeiras dos países analisados,
  • Taxas básicas de juros dos países analisados,
  • Inflação (ex: Índice de Preços ao Consumidor - CPI e Índice de Preços ao Produtor PPI) dos países analisados,
  • Dados de PIB dos países analisados,
  • Índices de Confiança do Consumidor e Empresarial dos países analisados,
  • Balança Comercial dos países analisados,
  • Estrutura de taxas de juros nominais e reais dos títulos públicos de cada um dos países analisados,
  • Índices de Preços de Commodities, como por exemplo o CRB,
  • Taxas de Desemprego,
  • Resultado fiscal dos países analisados,
  • Relatório de Riscos Globais.

Com base nos fatores macroeconômicos, defina vieses para cada um dos fatores.

Por exemplo, em períodos de expansão econômica, as empresas tendem a reportar maiores lucros, o que pode impulsionar o preço das ações. Nesse sentido, um bom desempenho do PIB de um país geraria um viés positivo para ações.

Um outro exemplo, é quando o aumento da percepção de risco em países emergentes leva a fortes variações nas curvas de juros e/ou taxas de câmbio. Nesse caso, a percepção de instabilidades políticas ou desacelerações econômicas gerariam vieses negativos.

É importante que o viés seja representado numericamente, para que seja possível indicar para o modelo matemático a relação de proporcionalidade entre os fatores.

Defina os limites de risco

A definição de pesos máximos e mínimos é a principal ferramenta desta etapa. Essa prática ajuda a assegurar que o portfólio permaneça diversificado e alinhado com o perfil de risco do investidor, limitando a exposição a movimentos adversos em qualquer fator específico ou ativo individual. Nessa etapa, portanto, devem ser definidos os limites de exposição de cada fator de risco, bem como o limite de alavancagem deles e do portfólio como um todo.

Com essas regras definidas, passa a ser possível acompanhar o Value at Risk (VaR) do portfólio, tanto utilizando o desempenho histórico das séries de preços, como realizando projeções - como é feito no modelo de Monte Carlo.

Definindo as correlações

Conhecer as correlações entre os ativos é crucial no processo de otimização de portfólio, pois permite aos investidores entender como diferentes ativos ou classes de ativos se movem em relação uns aos outros sob diversas condições de mercado.

A correlação, que varia de -1 a 1, indica o grau em que os ativos se movem em sincronia; uma correlação positiva sugere que os ativos tendem a se mover na mesma direção, enquanto uma correlação negativa indica movimentos opostos. Utilizar essas informações ajuda a construir portfólios diversificados que podem reduzir o risco sem necessariamente sacrificar os retornos.

As correlações históricas, calculadas com base em retornos passados, são frequentemente usadas para estimar como os ativos podem se comportar conjuntamente no futuro. Contudo, confiar exclusivamente em dados históricos pode não ser suficiente, especialmente em mercados financeiros onde as condições estão sempre mudando.

Por isso, a previsão de correlações futuras torna-se uma ferramenta valiosa na otimização de portfólio. Uma metodologia útil para estimar essas correlações futuras é o uso de Modelos Vetores Autorregressivos (VAR). O VAR é uma abordagem estatística que captura as relações lineares entre múltiplas séries temporais e pode ser utilizado para prever a dinâmica das correlações entre ativos ao longo do tempo.

Por meio da análise de como cada variável no modelo é afetada por seus próprios atrasos e pelos atrasos das outras variáveis, os investidores podem obter insights sobre como as correlações entre ativos podem evoluir, permitindo uma gestão de portfólio mais adaptativa.

A otimização

A otimização de portfólios é a penúltima etapa da construção do portfólio.

Quando o retorno esperado, risco esperado (usualmente medido pela volatilidade), e as correlações entre os ativos são conhecidos, é possível realizar a otimização dos pesos através dos já citados métodos de Markowitz e Black-Litterman.

Além deles, têm se utilizado técnicas de otimização por inteligência artificial. Dentro desse grupo, os modelos mais utilizado são os de Programação Não-linear. Essas técnicas são usadas para encontrar as melhores combinações que maximizam ou minimizam a função objetivo quando estão sujeitas a várias restrições, como os limites de risco, ou vieses estabelecidos.

Revisão do modelo

Por fim, a etapa mais importante é a implementação desses passos de maneira rotineira, para que o portfólio esteja sempre o mais próximo possível de seu ponto ótimo.


Se você está buscando aprimorar sua estratégia de investimentos e deseja insights mais profundos sobre a construção de portfólios vencedores, convido você a se conectar comigo. Vamos compartilhar conhecimento, explorar estratégias inovadoras e descobrir juntos como navegar no dinâmico mundo dos investimentos.

Leonardo Quaranta

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