COMO O CORONAVÍRUS (COVID-19) IMPACTA NAS RELAÇÕES CONTRATUAIS E POR QUE DEVEMOS TODOS COOPERAR
A vida de toda população mundial sofreu severas modificações nos últimos meses, onde os efeitos provocados pela pandemia do coronavírus (Covid-19) se estenderam a todas verticais de atuação humana, incluindo, evidentemente, as relações comerciais.
Embora o foco do momento é (e deva ser) o empenho de governos e da sociedade civil em meios e maneiras de contenção da doença e viabilização de soluções médicas para o enfrentamento desta crise, as relações contratuais estabelecidas previamente devem ser revisitadas e objeto de devida atenção.
O código Civil brasileiro prevê em seu artigo 393 que no caso de inadimplemento de obrigações, não há responsabilização da parte devedora quanto aos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não tenha se responsabilizado nesse quesito. O caso fortuito ou força maior tem relação direta com situações em que não era possível evitar ou impedir seu acontecimento.
Já o artigo 478 da mesma lei, nos diz expressamente que “ nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato.”
Em uma visão superficial e desconexa de todo ordenamento legal, pode-se passar a impressão de que dentro do cenário atual de pandemia global, todas as obrigações estão desoneradas, mas tal interpretação é equivocada. Verifica-se então que o bom senso (como sempre) deve imperar no cenário atual, conforme orienta o artigo 479 do C.C., previsto no mesmo ambiente jurídico do seu artigo anterior citado acima:
Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato.
Isso porque se houver possibilidade de prestação diversa dos termos pactuados que seja segura e de acordo com as regulamentações das autoridades médicas, tais caminhos devem ser adotadas, sob pena de possíveis descaracterizações futuras em massa de “desonerações por força maior” fraudulentas, que buscam oportunizar um período sensível da história global, baseado somente em fins mercadológicos.
A recomendação geral é que se busque a comunicação segura com a outra parte do contrato e juntos possam chegar a consensos sob formas de prestações diversas, prazos, meios de viabilização ou mesmo períodos temporários de paralisação, se possível.
As relações comerciais são extremamente importantes, onde direitos e obrigações devem sim ser protegidos, mas não podemos nos esquecer que essa interação é essencialmente uma relação humana, e em tempos tão difíceis, a prática de características como empatia, colaboração e entendimento devem ser sempre incentivadas.
Como reflexão final, vale mencionar o descrito no livro Homo Deus, de Yuval Noah Harari (2016, p.117), com óbvias ressalvas da citação ao contexto integral da obra, mas de extrema precisão ao momento atual:
“o Homo sapiens é a única espécie na Terra capaz de uma cooperação flexível e em grande escala. Inteligência e fabricação de ferramentas foram, obviamente, muito importantes. Porém, se os humanos não tivessem aprendido a cooperar com flexibilidade e em grande escala, nossos cérebros astutos e nossas mãos ágeis ainda estariam quebrando lascas de pedra, e não átomos de urânio.”
Cuidem-se de si mesmos e de seus próximos, e vamos juntos!