Como o Efeito de Enquadramento Influencia Nossas Decisões Diárias

Como o Efeito de Enquadramento Influencia Nossas Decisões Diárias

Já parou para pensar que a forma de apresentação de uma informação pode influenciar diretamente suas escolhas? Isso acontece em praticamente todas as decisões que tomamos no dia a dia, seja ao escolher um produto, votar em um político ou decidir sobre um tratamento de saúde. Já falamos em outro artigo sobre o efeito de enquadramento (framing effect), que refere-se à maneira como a apresentação de uma informação pode impactar nossas decisões.

Mesmo quando as opções são essencialmente idênticas em termos de resultado, a forma como elas são apresentadas pode levar a diferentes decisões. Isso ocorre porque as pessoas tendem a tomar decisões não com base apenas em uma análise racional, mas também influenciadas pelo contexto e a forma como a informação é estruturada.

Tipos de Efeitos de Enquadramento

Enquadramento Positivo-Negativo

Enfatizar os aspectos positivos ou ganhos, em vez dos aspectos negativos ou perdas, para instigar associações positivas e combater a aversão natural que temos à perda. Imagine que você precise fazer uma cirurgia e resolve perguntar ao médico sobre os riscos envolvidos. Daí ele diz: “Olha, 90% das pessoas sobrevivem a essa cirurgia”. Tranquilo, né? E se, em vez disso, ele falasse: “10% das pessoas morrem nessa cirurgia”. Aí já complica. No campo das probabilidades, ele disse exatamente a mesma coisa. Porém, a primeira versão soa muito mais positiva e te deixa mais confortável (ganho). A segunda… bem, nem precisa dizer que só de ouvir a palavra "morte", o frio na espinha é instantâneo (perda).

Você escolheria um iogurte com a informação no rótulo "99% livre de gordura" ou um com "contém 1% de gordura"? . Se um revestimento é descrito como “ecologicamente correto”, a sensação é que o projeto é inovador e responsável. Agora, se o destaque for “esse revestimento tem 20% de manutenção obrigatória por ano”, o cliente pode achar que está comprando dor de cabeça, mesmo que o produto seja de altíssima qualidade. O segredo aqui, para o arquiteto, é saber qual atributo faz o projeto brilhar aos olhos do cliente.

Uma situação que eu, você e a torcida do Flamengo já passamos é a clássica oferta de um preço por um produto pago com cartão de crédito e um "desconto" para pagamento à vista. Abrir mão de um desconto (ganho) ao pagar com cartão é psicologicamente menos aversivo do que ter a sensação de pagar uma sobretaxa (perda), embora, financeiramente, o resultado seja o mesmo.


A "opção certa" versus a "aposta" (teoria da perspectiva)

Suponha que um cliente tenha uma proposta de execução de uma obra que ultrapasse seu orçamento inicial em $600 mil. Por isso, decide busca outras propostas. A Empresa A garante uma redução de $200 mil nesse custo extra. Já a Empresa B, oferece uma chance de 1/3 de que a obra não custe $600 mil a mais, mas há uma chance de 2/3 de não reduzir esse custo extra.. Você contrataria a empresa A ou B?

Se a Empresa C for contratada, o estouro no orçamento será de $400 mil. A Empresa D, oferece uma chance de 1/3 de não haver nenhum estouro no orçamento, mas uma chance de 2/3 de que a obra custe $600 mil a mais.

A maioria das pessoas escolheria as empresas A e D, o que não faz o menor sentido, já que as consequências econômicas das propostas A e C são idênticas (gastar $400 mil a mais), assim como nas propostas B e D. Portanto, pela lógica, as pessoas deveriam escolher A e C ou B e D. Isso acontece porque tendemos a preferir a opção certa em vez de "apostar" quando os resultados são positivos e escolhemos a aposta em vez do resultado certo quando os resultados são negativos. A certeza de reduzir o prejuízo em $200 mil soa melhor do que continuar gastando $400 mil a mais do que o esperado. Aversão ou preferência pelo risco não são baseadas no que é o mais lógico, mas no enquadramento.


Contabilidade mental: enquadramentos estreitos e amplos

Cenário 1: Um cliente contratou um arquiteto e pagou $10 mil pelo projeto de reforma de sua casa. Durante o processo, ele decide mudar parte do que já havia aprovado, o que vai gerar um custo adicional de $5 mil no serviço do profissional. O cliente, ao ouvir o novo preço, pensa que o custo total do projeto aumentou em 50% e começa a questionar se vale a pena seguir em frente com o projeto.

Cenário 2: O cliente chega para contratar o arquiteto e está pronto para começar o projeto, que vai custar $15 mil no total. Ele não estava esperando gastar tanto, mas pode parcelar esse valor no cartão. Por isso, concorda em seguir com o projeto.

Nos dois casos, o preço final do projeto é o mesmo: $15 mil. No entanto, as situações diferentes evocam contas mentais distintas. O pagamento extra de $5 mil é colocado em uma conta estreita, associada ao preço inicial do projeto, que parece ter aumentado em 50%. No segundo cenário, o cliente enxerga o valor total de forma mais ampla, como o custo global do projeto associado ao melhor resultado da reforma, o que não faz com que o gasto seja visto como uma “perda”.

Em vez de focar nos custos incrementais como uma “perda” extra, o cliente deveria adotar um enquadramento mais amplo, considerando o valor total do projeto. Ao pensar de maneira mais ampla e racional, ele perceberia que a decisão de seguir com o projeto deve se basear no custo total e no benefício final da reforma, não apenas na sensação de que o custo está “crescendo”. Isso leva a decisões mais racionais e equilibradas, tanto para o cliente quanto para o arquiteto, que pode ajudar a enquadrar a conversa de forma mais clara e transparente.


Opção Padrão (default)

Um escritório de arquitetura oferece dois tipos de contrato para um projeto de reforma residencial:

  • Opção 1 (opt-out): O contrato inclui um pacote completo de serviços, com acompanhamento da obra e gestão de fornecedores. O cliente receberá o serviço completo, a menos que decida “desmarcar” essa opção e escolher apenas o projeto básico, sem acompanhamento da execução.
  • Opção 2 (opt-in): O contrato padrão oferece apenas o projeto básico, sem acompanhamento da obra. Se o cliente quiser incluir o acompanhamento completo, ele precisa “marcar” essa opção e aceitar o valor adicional.

Ao contrário do que muitos imaginam, os clientes se sentem mais propensos a contratar o pacote completo na opção 1. Se o escritório configurar o pacote completo como a opção padrão, é mais provável que os clientes a escolham, já que confiarão que essa é a escolha recomendada e não precisarão pensar em alternativas ou justificar uma mudança que exigiria esforço e reflexão sobre os prejuízos causados pela "perda" dos outros serviços.


Como usar esse viés de forma ética para incentivar melhores decisões dos seus clientes?

Tenha consciência dos seus efeitos. Saber que o efeito de enquadramento pode influenciar as decisões dos seus clientes é o primeiro passo para usá-lo de forma ética. Não se trata de manipular, mas de apresentar a informação de uma maneira que facilite a compreensão e ajude o cliente a tomar uma decisão mais informada e consciente. O enquadramento deve ressaltar os benefícios reais do produto, sem criar ilusões.

Incentive o pensamento crítico nos seus clientes. Explique o produto ou serviço sob diferentes perspectivas, oferecendo transparência em cada abordagem. Quando o cliente entende o cenário completo, com os prós e contras, ele tem uma base sólida para fazer uma escolha que realmente atenda às suas necessidades.

Mantenha a verdade. Use o efeito de enquadramento para apresentar os benefícios do seu produto de formas diferentes, sempre mantendo a verdade. Por exemplo, se um cliente está preocupado com o custo inicial de um projeto, mostre o valor em termos de economia a longo prazo. Se o foco é o impacto ambiental, realce o benefício sustentável. A ideia é ajustar a comunicação ao que é mais relevante para o cliente, ajudando-o a ver o valor real da solução.

Sempre priorize o conteúdo essencial do seu produto ou serviço. Um enquadramento ético destaca o que é importante para o cliente sem distorcer a realidade. Apresente os dados e informações de forma clara, de modo que o cliente possa avaliar o produto ou serviço pelo que ele realmente é, não apenas pela maneira como é descrito.


O uso ético do efeito de enquadramento pode ser uma poderosa ferramenta para destacar o valor dos seus produtos, beneficiando tanto quem vende quanto quem compra. Ao adotar essa abordagem transparente e focada no conteúdo real, você constrói uma relação de confiança com seus clientes, gerando decisões mais informadas e conscientes.

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Referências:

BENARTZI, Shlomo; THALER, Richard H. Heuristics and biases in retirement savings behavior. Journal of Economic Perspectives, v. 21, n. 3, p. 81-104, 2007.

JOHNSON, Eric J.; GOLDSTEIN, Daniel. Do defaults save lives? Science, v. 302, n. 5649, p. 1338-1339, 2003.

KAHNEMAN, Daniel; TVERSKY, Amos. Prospect theory: an analysis of decision under risk. Econometrica, v. 47, n. 2, p. 263-291, 1979.

SAMUELSON, William; ZECKHAUSER, Richard. Status quo bias in decision making. Journal of Risk and Uncertainty, v. 1, p. 7-59, 1988.




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