Como Salvar nossos Estaleiros?
Na semana passada (Abril/2016), deparei-me com a seguinte notícia na mídia offshore internacional:
Os 3 Gigantes Estaleiros da Coréia podem se fundir (artigo original em inglês e tradução no final desse post).
Pensei comigo mesmo: seria isso possível no Brasil? Comecei a refletir e a tentar lembrar os fatos. Fiquem à vontade pra me corrigir se cometi algum deslize!
Nosso país conseguiu reerguer sua construção naval depois da crise dos anos 80/90. À partir do ano de 98/99, quando um armador brasileiro (CBO) iniciou a construção do primeiro navio de apoio marítimo (PSV) em solo brasileiro (Estaleiro Promar), o mercado brasileiro de navegação e construção voltou ao radar internacional, atraindo armadores estrangeiros, fornecedores e estaleiros internacionais.
No início desse século, o Estado do Rio de Janeiro era o pólo de construção naval, pois concentrava a grande maioria dos estaleiros. Havia um estaleiro em Sao Paulo, outro em Santa Catarina. Com exceção do EISA, eram estaleiros de pequeno para médio portes. Muitos estaleiros permaneciam fechados: Ishikawagima, Caneco. Outros focavam apenas no reparo.
Com o surgimento do PROMEF, outras plantas foram inauguradas: Estaleiro São Miguel, Estaleiro Aliança, Navship, Brasfels, Detroit, Erin, Keppel Singmarine, Inace. Outros acabaram falindo: Itajaí e Transnave.
Surgia um novo modelo de negócio: armadores com seus próprios estaleiros. Excelente para obter embarcações à preço de custo, com irrisória lucratividade, ou apenas para manter o estaleiro rodando, ajudando as empresas de navegação a tornarem-se mais competitivas nas licitações da Petrobras.
Com o programa da Transpetro, surgiu o segundo estaleiro de grande porte: Estaleiro Atlântico Sul (EAS), e o primeiro a ganhar uma concorrência como "estaleiro virtual". Outra novidade: trouxe empresas grandes de outras áreas (Camargo Corrêa e Queiroz Galvão) em sua composição societária, juntamente com um parceiro estrangeiro que nunca tinha estado por nossas bandas: SAMSUNG. Nessa altura, a região norte-nordeste já contava com ERIN e Inace.
Com o boom da descoberta do Pré-sal, o EAS virou exemplo. Toda construtora grande brasileira se envolveu num estaleiro virtual de grande porte. Surgiram o Enseada, Ecovix, Estaleiro Rio Grande, Jurong e OSX.
Outros estaleiros resolveram duplicar suas plantas: VARD Promar inaugurou no Recife, EISA flertava com Maceió. E com sua compra, o Grupo CBO incorporou o Estaleiro Oceana.
A atividade ía de vento em popa. Até os bancos de investimentos invadiram a construção naval e empresas de navegação.
Dizem que o ideal seria se tivéssemos crescido de forma ordenada, ou transformando certa região em um pool de estaleiros, como feito na Coreia. Porém, nosso Brasil é uma República FEDERATIVA, onde estados tem suas leis e políticas de impostos, e brigam entre si para atrair novas indústrias, gerar empregos. Existem até mecanismos mais atrativos de financiamento para certas regiões! Cresceu super rápido e desorganizadamente.
Meu sonho era ter acesso a esses business plans! Queria saber qual era a expectativa de demanda, a análise de riscos, a lucratividade esperada e o retorno de investimento. Sem falar na necessidade de obras anuais para se manter esses estaleiro enormes e a famosa produtividade brasileira, junto com a segurança que um contrato assinado tem no Brasil.
Tenho minhas dúvidas se seria sustentável, mesmo se o barril de petróleo se mantivesse nos 115 dólares.
Também gostaria de ser apresentado aos magos que convenceram um banqueiro investidor que estaleiro gera lucros consideráveis. Porque pra banqueiro investir, tem que ser bastante lucrativo! No papel, tudo é lindo.
Existe um fenômeno que só acontece no Brasil. Existem "executivos" com muita experiência no setor naval. E existem gestores capacitados em outras indústrias. As duas coisas juntas inexistem. Raríssimos são os presidentes dessas empresas com mestrados em instituições sérias aqui ou no exterior. Prevalece a "gestão" do "vamos que vamos", de cima para baixo, cercados de pessoas de confiança, "peixes, ou puxa-sacos; do manda quem pode e obedece quem tem juízo. Ou, então, um gestor com experiência na construção civil, mineradoras, cimenteiras, banqueiros, outros.
Inúmeras empresas de navegação foram constituídas pós pré-sal, ou alteraram o core business das mesmas. Os bancos de investimento também entraram no negócio. O mesmo se repetiu com as empresas de petróleo!
Bem, veio o escândalo da Lava-jato na Petrobras, Sete Brasil, Transpetro e empreiteiras. E pra piorar, veio a queda violenta do preço do barril de petróleo. E como escrevi anteriormente, os bancos fecharam as torneiras. Lamentavelmente, inclusive o BNDES, que é o nosso banco de fomento.
E na hora que a indústria promissora inicia sua queda, os investidores sao os primeiros a pular do barco, procurando outra atividade, deixando quem vive e depende da construção naval brigando sozinho.
Esperar ajuda desse ou de qualquer governo? Melhor começarmos a agir. Como poderemos sair dessa?
- Seguir a sugestão coreana?
- Pressionar o BNDES para honrar o que se comprometeu daria sobrevida a alguns estaleiros, mas e o resto da demanda pra alimentar todos estaleiros?
- Seria essa demanda os Petroleiros? Talvez. Especialmente se a Transpetro vender sua frota e estimular as licitações.
- Seria a demanda por mais FPSO's? Aqui dependeríamos do BNDES.
- Encerrar com a importação de navios estrangeiros na tonelagem construída no Brasil?
- Fiscalizar os abusos nas quebras de contrato leoninas da Petrobras?
- Com esse patamar do dólar, houve melhora. Qual seria o ponto ideal para sermos competitivos na esfera global? E na produtividade?
- Reduzir os salários estratosféricos e benefícios do management?
- Seria a Lei José Serra? Abrindo às petroleiras a possibilidade de serem operadoras? Não vejo progresso onde elas são operadoras. Tenho a impressão de que não conhecem a fundo os procedimentos e autoridades brasileiras (IBAMA, DPC, INEA, legislação, conteúdo local, etc). Muitas delas do 11 round da ANP estão atrasadas.
- Dando o direito à Petrobras de focar apenas onde ela queira? Que juntamente com seu programa de venda de ativos e aumento das ações teria um futuro melhor.
- Porta- Containeres?
- LNG carriers & FSRU's?
- Pesqueiros?
- Hubs logísticos x Navios de passageiros (crewboats) velozes e confortáveis (capazes de diminuir gastos com helicópteros) x Direitos obtidos pelo Sindipetro a viajar somente de Helicóptero?
- Regulamentar tripulação estrangeira para que empresas nacionais não sejam prejudicadas, pagando sozinha todos adicionais offshore, enquanto os tripulantes gringos nem impostos pagam (dizem em seu país que pagam aqui)?
- Mexer na política de Conteúdo local? Focando onde deveria-se focar: After market: Lembrar que peças de reposição emergenciais tem que estar disponíveis aqui. E que uma plataforma, barco de apoio, FPSO ou petroleiro não podem sair de operação por falta ou deficiência das mesmas.
- Monopólio do Aço - gerando custos absurdos na indústria naval e automobilística.
- Valores competitivos dos equipamentos e materias aqui produzidos.
- Qual mais?
- Escreva aqui sua idéia!
- Todas acima?
Fique à vontade pra comentar! Participem! Nossa indústria depende de nós.
=> Esse post foi publicado pela revistas TN Petróleo e Portal Naval às 13:13h de hoje (15/04/2016):
Tradução do artigo sobre estaleiros coreanos: Em uma tentativa de lidar com a desaceleração da indústria de navegação global, Yoon Jeung-Hyun, Ex-ministro de Estratégia e Finanças da Coréia do Sul sugeriu que os 3 maiores estaleiros sul-coreanos trabalhassem na fusão de suas operações, de acordo com a IHS Fairplay. Yoon Jeung-Hyun disse: "A indústria de construção naval e outras tem repetido o ciclo de altos e baixos. A partir de agora, no entanto, pode-se perguntar se esse padrão irá durar. "É urgente para uma indústria de excesso de oferta ser reestruturada. O número de gigantes de construção naval da Coreia do Sul, como a Hyundai Heavy Industries (HHI), Samsung Heavy Industries (SHI) e Daewoo Shipbuilding & Marine Engineering (DSME), precisa ser cortado para baixo para um ou dois ". Sung Ki-Jong, Analista pelo KDB Daewoo Securities, disse: "Dado o crescimento global decadente e preços persistentemente baixos do petróleo, encomendas de construção naval vão, inevitavelmente, diminuir. "Mas nós vemos riscos limitados de perdas adicionais em plantas offshore, e esperamos o segmento de navio mercante se tornar rentável, graças a menor exposição às ordens de baixo preço." Esta sugestão segue as notícias recentes que Samsung Heavy Industries relatou uma perda líquida de cerca de US $ 1 bilhão, o que é reflexo da atual queda na demanda global. Há também a preocupação de que os Big 3' construtores navais poderiam se perder após seus planos de reestruturação, que foram anunciadas em meados de 2015. Maiores navios de capacidade estão causando problemas para o setor portuário, e um factor de lidar com o excesso de capacidade na indústria e os altos e baixos nos portos seria encomendar menos navios e contrariando a tendência de cada ordens crescentes. Este, porém, poderia colocar os principais construtores navais de ainda mais incerteza. A união de grandes construtores poderia ser uma forma de enfrentar a presente tempestade.
DIRETOR (SÓCIO) na CERDAL ENGENHARIA LTDA.
7 aA exposição dos fatos é bastante interessante. Minha vida profissional sempre foi ligada a área NAVAL. e nunca entendi como os gestores são sempre os mesmos, passando de um estaleiro para outro, sem trazerem nenhuma novidade efetiva e as obras sempre passam a ter problemas a partir dos 50% do budget.
Inspetor de Fabricação , equipamento ,liquido penetrante, solda e Pintura
7 aBom gostaria de fazer um comentario porem da area que trabalhei nos estaleiros que foram nas plataformas da PB tanto no Brasil quanto no exterior, nao é defendendo o nosso estaleiro porque comparar a nossa a mao de obra com a do chineses é covardia pq na vhina a mao de obra pode ser barata mais o serviço é pessimo segue abaixo a diferença exigencia da Petrobras quando é contruido no Brasil e quando é contruido no exterior: 1- Aço só pode ser comprado em determinado fornecedores petrobras isso faz com que o produto fica mais caro.Na China a petobras nao sabe nem de onde foi fabricado sempre tem um fornecedor de outro fornecedor e assim subsequentemente. 2_O nivel de etapas de inspeçao nao é rigorosa iqual no Brasil. 3- A tolerancoa de desvios de nao conformidade é mais aceita no exterior do que no Brasil. 4- Segurança isso nao existe na china nao é feito treinamento e.muito menos investimentos nessa area , ja no Brasil se um colaborador torcer o pé a obra é parada até por horas. 5- A exigencia da aplicaçao da Norma Brasileira acaba fazendo que o.produto final fique caro, por que nao usar norma internacional que sao menos rigorosas.
Fiscal de Receitas Estaduais, Trabalho na SEFA- Secretaria de Estado da Fazenda-Pará
7 aGustavo, boa tarde! Foi muito bom seu artigo e a demonstração de preocupação com o setor em questão, peço-lhe a liberdade para fazer uma comparação deste setor (Estaleiros) com o da madeira, que presenciei bem de perto, trabalhando no Porto de Vila do Conde (Barcarena/Pa), quando vieram as crises impostas pelas restrições as empresas, cobrando a legalidade das mesmas, novo tipo de acompanhamento fiscal tanto para a madeira como também pata o transporte da mesma, muitas empresas madeireiras quebraram, não suportaram os encargos burocráticos, os preços do transporte, etc. Na época vi isso como um resultado de uma falta de organização do próprio setor, a qual cheguei a comentar com alguns integrantes, as empresas soltas sem poder de barganha, todas faziam e entregavam produtos iguais, sem valor agregado nos produtos, acostumadas com lucros nas internações cambiais e suas variações. Portanto penso que, a solução não passaria por fundir as empresas, mas sim a organização do setor, como um pool da atividade, corte de custos, negociação do aço para barateamento da matéria prima, enfim quase todas as opções elencadas por você, mas antes de tudo uma legislação não protetiva, mas coerente com a realidade da atividade, separação das atividades dos estaleiros por necessidade das regiões brasileiras, fazendo a análise de como cada região utiliza ou poderá utilizar a construção naval, unificar setores entre as empresas, exemplo uso comum de plataformas, embarcações de apoio, etc., para não haver a necessidade de construir várias unidades. Enfim , como uma palavra de resumo, um enxugamento profundo no setor, para tornar-se competitivo em escala mundial, isso seria o atrativo para a entrada de capital estrangeiro na confecção de embarcações.
Senior Mechanical Engineer I Static, Rotating & Thermal Equipment | Field Maintenance Supervisor | Marine & Offshore HVAC and Refrigeration Expert
7 aÓtimo texto!
Piloto de Drone Profissional / Instrutor de Drones / Inspetor de Equipamentos | END (Líquido Penetrante • Partícula Magnética • Medição de Espessura)
7 aExcelente artigo Gustavo Pedreira. Você tocou no cerne da questão. O que mais vejo, em determinadas empresas, com relação aos cargos de importante gestão, assim como no governo, é aquela famosa premissa (falha e retrógrada) de "gerir" ou "governar" visando a posição ocupada. Ter um grande poder, que mexe com a estrutura de um país (ou qualquer outra), demanda grande responsabilidade e deve ser exercido com uma postura de servidão. Olhar para o todo e não só para si. Também não vejo planos estruturados de longo prazo, ou seja, as "coisas" são feitas de forma imediatista. Não se tem um plano B para contornar um problema caso o plano A falhe. O resultado é o que se vê hoje. Um caos na economia na qual não se vê uma vontade política em dar logo a volta por cima. A questão é simples de se contornar? Não, mas acredito que um trabalho sério e a união das grandes empresas, como você mesmo diz, seria uma opção para mudar a perspectiva do triste cenário atual. Mais uma vez parabéns!