Como será que os os jovens estão vivendo o distanciamento social?

Como será que os os jovens estão vivendo o distanciamento social?

E os nossos jovens e adolescentes, como estão em meio a isso tudo?

Se para nós, que já nos afastamos da casa dos 40, que já vivenciamos crises e momentos difíceis e sabemos que no final tudo passa, não tem sido fácil lidar com tantas incertezas e manter-se em distanciamento social, fico imaginando para quem nem chegou aos 20 e está no auge da convivência social.

A cabeça cheia de planos e ideais, buscando sua identificação e identidade nesse mundo, quando se tem pressa e se quer aproveitar tudo o que a vida tem para oferecer. Nesta fase, tudo o que não queríamos era ficar em casa, convivendo com os pais, assistindo TV e lendo livros, lembram-se? E olha que eu nem fui do tipo “baladeira” e tenho muito viva essa lembrança.

 Além dos efeitos do turbilhão hormonal e emocional comum desta fase, conseguem imaginar o que é, para um jovem, entre 14 e 20 anos, não poder ir para a escola ou faculdade? Não poder encontrar os amigos? Ver o objetivo de ingressar na faculdade, fazer um intercâmbio, o estágio e o Enem sumirem do radar?

Outro dia, durante uma caminhada com a minha cachorra (Morar no mato tem suas vantagens em momentos como esse. Dá para sair com o cachorro.), cruzei com um vizinho querido, um jovem na faixa dos 18 anos e que acabara de ingressar em uma faculdade no interior. Dias antes de eclodir todo esse cenário, estávamos na casa dele comemorando com a família a sua conquista. Apartamento alugado, enxoval pronto para a “liberdade”, autonomia, morar sozinho. Quando o avistei, na hora me veio à mente: nossa ele ainda está por aqui. 

Não resisti e perguntei: - E então, começaram as aulas? Você chegou a ir para a faculdade?Ele respondeu: - Fui por 3 dias e tudo parou.

Fiquei olhando para ele por um tempo e comentei: - Não deu nem tempo de ser calouro, não é?

Ele respondeu: - Pois é... Com um sorrisinho no rosto.

Fiquei pensando: Nossa, que frustrante! Tanto tempo e esforço para entrar na tão sonhada Universidade Pública, planos para quando estiver morando sozinho, expectativas sobre a nova vida, poder fazer as coisas do jeito dele, no tempo dele, novos amigos e conhecimentos. E quem é que foi estudar no interior e não pensou nas festas do campus, que atire a primeira pedra.

E, de repente, sem esperar, de uma forma inimaginável, as coisas tomaram outro rumo. E as fantasias, medos e ansiedades que podem estar rondando a cabeça. Coisas do tipo, será que isso vai acabar? Quando? E quando acabar, como será o mundo lá fora? Vai ter trabalho para mim?

Tenho uma filha de 14 anos. Uma menina doce, carinhosa, sensível, inteligente, habilidosa e com vocação artística, mas também de gênio forte, menina de opinião, como se diz por aí. Após mais ou menos 35 dias de quarentena, entre férias escolares forçadas, aulas online, privação da convivência com amigos, estar afastada do seu esporte favorito, sem contar a montanha russa hormonal manifesta no rosto por algumas espinhas, veio o primeiro protesto. Choro, xingamentos, fantasias do apocalipse, até mal agouro aos chineses, que segundo ela, inventaram de comer morcego e “criaram” o novo coronavírus.

E eu ali, a postos, ouvindo tudo e tentando entender e pensar rapidamente no que fazer, mas sem saber muito como lidar. Fiquei escutando as reclamações que eram da ordem: “justo agora, com a minha geração, por quê? Bem agora que eu estou no 9º. ano, o último do fundamental? O último ano com todos os amigos da turma na mesma escola. E todos os pedágios que iriamos fazer na escola para arrecadar dinheiro para a formatura? Ai a formatura... não vou ter formatura. Isso não é justo!”

Enfim... foram aproximadamente 10 minutos de choro e lamentações.

Confesso que no início fiquei irritada, entrei na vibe das emoções e soltei: escuta aqui menina, olha o seu entorno e agradeça a Deus, por tudo o que você tem e a forma como você está vivendo esse momento. O conforto de sua casa, seus pais, sua saúde, por ter um espaço confortável e silencioso para estudar, falar com os amigos quando tiver vontade, olhar pela janela e ver a natureza que a cerca. Já parou para pensar que a maioria das pessoas não tem metade disso que você tem o privilégio de ter?

Acabei citando exemplos que ambas conhecemos, além de dados que temos acompanhado sobre a grande parcela da população que perdeu sua renda da noite para o dia e que está sob ameaça de não ter o que comer, caso não receba ajuda e solidariedade de alguém. E aqueles que estão sentindo a doença, a dor de perder alguém amado?

Achei que tinha que trazer essa realidade para ela. Talvez, a forma não tenha sido a melhor, uma vez que percebi as lamentações como falta de gratidão, o que é algo que me incomoda profundamente. Depois, veio a culpa por não acolher a sua angústia que também é genuína. Afinal, todo o discurso é permeado pelo sentimento de porque justo agora, bem na minha vez. Agora que comecei a sentir o “gostinho” da tão sonhada liberdade. Fora o medo do desconhecido, que nem os adultos conseguem explicar. Pode parecer exagero, mas é assim que muitos deles se sentem.

Para os jovens e adolescentes os sentimentos e emoções são sempre extremos. Hoje eu ADORO, amanhã eu ODEIO, tudo com a mesma intensidade. Para fazermos alguma empatia com os jovens e adolescentes, basta viajarmos no tempo, de volta a nossa adolescência e lembrarmos o quão intensos eram os nossos sentimentos. Talvez, alguns de nós tivéssemos menos espaço para expressá-los, mas eles estavam lá.  Com quanta intensidade sentíamos ternura e raiva se misturando ao longo de um mesmo dia, por uma mesma causa ou pessoa.

Tudo isso me fez pensar como estamos olhando para esses jovens e adolescentes que estão ao nosso redor. O que eles estão sentindo? Seus medos, suas fantasias, suas angústias. Como estão lidando com a ansiedade que esse desconhecido tem trazido?

Como estamos atuando enquanto adultos e como eles nos tem percebido nisso tudo? Será que estamos sendo adultos de verdade? Reagindo com sabedoria, pensando antes de falar, nos preparando para atuar, lidando com nossos sentimentos e emoções de forma apropriada? Sem esconder, mas também não nos descontrolando e descabelando com os vários desafios impostos a nós todos.

Eu sei bem que o momento não está fácil para ninguém. Se é novo para eles, também é para nós. Creio que nenhum de nós, pais de adolescentes, passou por situação semelhante no passado. As incertezas são enormes, nossa vulnerabilidade escancarada. O que não nos falta são preocupações como: insegurança financeira e política, medo da doença, da morte, incertezas de toda ordem, inclusive com o futuro de nossos filhos.

Escrevendo esse texto, pensei: Poxa vida, e quem olha por nós?

Pois, é, não está fácil mesmo! Mas cada um de nós precisa olhar para dentro, encarar suas angústias e procurar formas de lidar com elas para assim, conseguirmos apoiar esses jovens e adolescentes que ainda tem poucos recursos internos para lidar sozinhos com isso.

Por mais que a vida esteja nos cobrando, nos colocando a prova, precisamos pausar. Essa pausa precisa ser primeiramente física. Sim, já reparou como saimos da correria real para a virtual? São milhões de lives, webinars, party house. Fora o trabalho remoto, as tarefas domésticas e o homeschooling. A agenda está lotada!

Desobstruindo a agenda, encontraremos tempo e espaço para a pausa emocional, mental e psicológica. Com tantas preocupações que o momento nos impõe e todas essas informações com as quais estamos “lotando” a nossa mente, como silenciar?

É muita coisa para processar. Somos incentivados a estar conectados o tempo todo, mas precisamos encontrar uma convivência mais saudável e amistosa com a WEB. Entendo que o chamado é para PAUSAR, reavaliarmos como estamos usando o bem mais precioso que temos: o TEMPO.

Se não tivermos um TEMPO para NÓS, não haverá TEMPO de QUALIDADE para OFERECERMOS aos OUTROS. Como estarmos inteiros com alguém, escutando atentamente e acolhendo, se estamos acelerados?

O leitor deve estar pensando, mas esse texto não era para falar sobre os jovens?

Então, fiz esse “adendo” pensando em algo tipo aquelas orientações sobre como proceder em caso de emergência que os comissários de vôo nos dão durante a decolagem: “Em caso de despressurização da aeronave, coloque a máscara primeiro em você, depois ajude quem está ao seu lado.”

Seja um tempo para meditar, escutar música, uma leitura leve, um cochilo fora de hora, um banho mais demorado ou ter um ombro amigo para desabafar, vale qualquer coisa para termos um tempo dedicado a nós e só então teremos espaço de escuta para nossos jovens.

Na maioria das vezes, tudo o que eles precisam é sentirem-se ouvidos, querem atenção genuína. Precisam que façamos uma curadoria das informações que estão chegando a eles. Uma breve passada de olho na Internet já nos coloca em estado de alerta para o apocalipse. Será que sabemos ao que nossos filhos estão expostos na WEB? Para os mais novos, há algum tipo de trava que os impede de ter acesso irrestrito aos conteúdos?

Conversar com eles sobre o que está havendo com sinceridade, baseados em fatos, dados e números que tragam a realidade do mundo e daqueles que o cercam. Esta pode ser uma boa oportunidade para juntos chegarmos a fontes confiáveis de informações na Internet. Pode ser também uma boa hora para estreitar ou abrir esse canal de comunicação, expor as possíveis dificuldades que a família esteja passando e ouvir ideias e contribuições que eles possam nos dar. Tudo isso dito com carinho, cuidado e a mente aberta para ouvirmos o que eles pensam, suas opiniões e posicionamentos.

Tenho pensando muito naqueles que estão próximos de prestar vestibular, concluindo o ensino médio. Ao acessarmos qualquer rede social, encontramos vários gurus com suas bolas de cristal prevendo as profissões do futuro, aquelas que desaparecerão, quem ficará rico da noite para o dia, entre tantas outras coisas. Se tais profecias já são amedrontadoras para nós, e para eles então?

A escolha de uma profissão não é algo simples. A crença de que essa é a escolha que definirá o futuro para o resto da vida, por si só, já é angustiante, em tempos como o que estamos vivendo então... pior ainda. Muito embora, saibamos que, principalmente hoje em dia isso não é verdade, é assim que eles pensam e sentem. Não bastasse isso, o desgoverno ao qual estamos submetidos, traz a cada instante mais incertezas sobre volta às aulas e sobre o ENEM.

Como lidar com isso?

Mais uma vez, meu convite é para que voltemos ao passado e revisitemos como foi para nós. Sim, eu sei, no nosso tempo era diferente. Na maioria das vezes não tivemos opção, aceitamos o que tínhamos ou que era possível, mas nem por isso foi mais ou menos angustiante. Sofremos, e precisamos saber que eles também sofrem, embora, algumas vezes não pareça. Cada um tem o seu momento, o seu tempo.

Cuidado com a armadilha que eu chamo de “a maldição das gerações futuras”, que consiste em: a geração anterior, no caso a nossa dos pais, sempre acha que a geração atual, a dos filhos, é a pior. Foi assim com você, e sem perceber, muitos de nós fazemos isso com nossos filhos. Apenas acolha as angústias e inseguranças, traga informações verdadeiras, exemplos positivos, sugestões de resoluções e uma escuta carinhosa. Tenha em mente que se houver possibilidade, investir um ano a mais fazendo um cursinho ou trabalhando, não é perder tempo. Muitas vezes é ganhar maturidade, preparo emocional e tempo para uma escolha com sentido, especialmente nesse momento de tantas incertezas.

É preciso estarmos atentos também aos sinais que eles nos dão de que alguma coisa não está bem.

É verdade que alguns jovens buscam certo isolamento nesta fase da vida, quando estão em casa costumam passar boa parte do tempo sozinhos, em seu quarto, mas tudo tem um limite. Passar o dia todo no quarto, dormir muito, não participar dos momentos em família, irritabilidade além do normal. Tudo isso pode ser um sinal de que podem estar sendo muito afetados pelos acontecimentos do momento e que estão precisando de ajuda. É importante lembrar que a tristeza também faz parte da vida, que a incerteza do momento traz sentimentos como esse à tona. Hoje em dia há uma falsa ilusão de que sofrimento é fraqueza, fases de melancolia são vistas como depressão e que devemos viver em estado de felicidade plena.  

Uma dica lúdica para refletirmos um pouco sobre isso é o filme DIVERTIDAMENTE. Brilhantemente e de maneira simples mostra através de personagens denominados como as nossas emoções, como funcionamos e a importância de cada uma delas em nossa vida. VALE MUITA A PENA!

Dicas para adolescentes e jovens durante o período de distanciamento social:

  • Medo e ansiedade são sentimentos normais em momentos como esse. Caso estejam se sentindo assim, extravasar é o melhor a fazer. Chorar, escrever sobre o que sente, conversar com um amigo ou um adulto em quem tem confiança e afinidade, ajuda muito.
  • Incentive a aproveitar o momento para aprender coisas novas. Conhecer novas culturas, quem sabe até tentar um novo idioma. Usar o tempo para refletir sobre o futuro profissional, pesquisar sobre as profissões. Mas cuidado com o excesso, não queira abraçar o mundo e aprender tudo de uma vez.
  • Este é um bom momento para ajudar na curadoria dos conteúdos aos quais os jovens tem acesso na Internet. Ensinar responsabilidade quanto aos conteúdos que assiste, checar a origem e veracidade das informações e ter muito cuidado com o que posta e com quem fala na internet.
  • Um bom momento para exercer a solidariedade e compaixão. Muitos jovens são hábeis em mobilizar grupos e podem usar isso para criar uma ação de apoio a quem precisa como: ajudar idosos com as compras, arrecadação de alimentos, fazer leitura online para crianças.
  • A dica aqui é para toda a família. Permitam-se momentos de privacidade. Todos precisamos de momentos a sós. Que seja no próprio quarto ou algum cômodo da casa destinado à descompressão.
  • A vida social nesta fase é importante e pode e deve continuar. Incentive os jovens a usar adequadamente as ferramentas tecnológicas para isso. Facilite para que tenham bate-papos, comemorem os aniversários, organizem festas online. Há diversos aplicativos para isso.
  • Se o jovem já praticava atividades físicas estimule-o a manter, se possível. Caso não, pode ser uma oportunidade de iniciar. Há vários aplicativos, professores e academias oferecendo aulas e séries de exercícios como pilates, funcional, yoga que podem ser praticados em casa. Para ficar divertido, a família toda pode se envolver. 
  • É importante que a família tenha uma rotina onde cada um tenha sua responsabilidade nas tarefas domésticas, assim ninguém fica sobrecarregado. Além do mais, nessa fase, já é mais do que tempo de cuidar das próprias coisas. Definidas as tarefas de cada um, ajude os jovens a criar uma rotina própria de atividades incluindo o tempo de escola, estudo extra, tarefas domésticas e tempo para relaxar.
  • Relaxar é preciso! Permita-se e incentive espaços na agenda para fazer nada. Estamos todos dedicando muito tempo às telas, TV, Computador, Celular. Fechar os olhos, ficar no escuro ou apenas contemplando a vista da janela. Sair do virtual e apreciar o real!

 Andréa Santos - Psicologa e Orientadora Profissional/Vocaional


 


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