Como a tecnologia pode (ou não) ajudar na humanização da educação à distância
Quer você goste de estudar, quer não, você provavelmente aprendeu muito na escola. E sobre coisas que vão bem além de conjugar verbo no pretérito mais-que-perfeito, calcular razões trigonométricas ou desenhar a fórmula molecular da cafeína. E nem todo aprendizado acontecia em sala de aula (os mais interessantes, talvez, costumavam acontecer fora dela).
Isso porque toda instituição de ensino, para além de um ambiente de aprendizagem, é um espaço de interação social. Fazer amigos, ter desentendimentos, trocar bilhetinho no meio da aula, levar bronca da professora, colar na prova, comemorar uma nota boa, chorar por uma nota ruim: tudo isso faz parte da experiência escolar.
O que me leva a questionar: como ficam essas vivências todas no cenário pandêmico de hoje, em que as aulas estão acontecendo majoritariamente à distância e num virtual improvisado? O que os alunos estão ganhando? E o que eles estão perdendo?
Bem, como profissional de TI, eu seria bastante hipócrita se dissesse que não enxergo o valor que a tecnologia agrega à educação. Indiscutivelmente, ela é uma ferramenta para disseminação de informações, que permite o aprofundamento e a autonomia do aluno na construção do conhecimento.
Nos meus primeiros anos de escola, se eu quisesse saber mais a respeito de qualquer coisa que o professor tivesse falado em sala de aula, ou eu torcia para o livro didático ser complementar ou eu ia para uma biblioteca para fuçar enciclopédias, revistas e jornais. Hoje, para se aprofundar em qualquer assunto possível e imaginável, basta uma simples pesquisa no Google. Porque o Google é ótimo.
Acontece que ele não é humano.
Por mais que a gente saiba pesquisar com rigor e separar as boas das más fontes, os professores de carne e osso ainda têm um papel fundamental no processo educacional dos seres humanos. O vínculo entre professores e alunos - e entre alunos e alunos - é um dos fatores que mais ajudam a evitar a evasão escolar. O diálogo, a orientação, a intermediação: tudo isso é essencial na construção do saber. E nada disso pode ser vivenciado plenamente na relação entre homem e máquina.
Desde que concluí a minha graduação, há mais ou menos oito anos, eu não tenho uma experiência de aprendizado presencial, somente online. E por mais que as aulas sejam ao vivo, em vez de gravadas, e os professores incentivem o networking via grupos de WhatsApp e outras plataformas de comunicação, não é a mesma coisa que estar em uma sala de aula. Especialmente para alguém como eu, um pouco mais extrovertido. Presencialmente, a interação me parecia mais fácil, mais natural, mais fluida. Inevitável, de certa forma.
Nesse momento, você pode estar pensando: se a tecnologia vem evoluindo tanto, não é possível que ela não seja capaz de melhorar essa experiência de aprendizado online.
É possível, sim. Sempre fico pensando em uma realidade virtual onde os alunos tenham a sensação de que estão sentados lado a lado, interagindo entre si e até cochichando enquanto o professor fala. Acontece que isso não me parece uma responsabilidade exclusiva da tecnologia. Uma questão de socialização, tal como essa, demandaria o envolvimento das ciências sociais.
Uma equipe multidisciplinar, com psicólogos, sociólogos, pedagogos, filósofos e profissionais de tecnologia, talvez dê conta de desenvolver essa solução. Que não: não vai ser barata nem acessível - especialmente no Brasil, país onde mais de 50% da população vive em condições de insegurança alimentar, sem saber se vai ter o que comer no dia seguinte, quem dirá um equipamento sofisticado dessa natureza. Portanto, é uma saída. Mas não é a saída.
A tecnologia é ótima e pode nos proporcionar soluções incríveis para vários problemas do mundo. Mas, infelizmente (ou felizmente), ela ainda não é capaz de resolver todas as questões humanas. Como já dizia Paulo Freire, “divinizar [ou diabolizar] a tecnologia ou a ciência é uma forma altamente negativa e perigosa de pensar errado”.