Compliance - DETECÇÃO VII -

Em que mundo vivemos? Por um momento, imaginemos que vivêssemos num mundo perfeito. Neste mundo, as pessoas seriam igualmente perfeitas, não sujeitas às fraquezas que tanto conhecemos, não cometeriam erros, desvios de conduta, não seriam gananciosas, jamais colocariam as mãos naquilo que não lhes pertencem, não cobiçariam, nem mesmo se importariam com o que o outro possui ou com as conquistas alheias. Inveja seria um sentimento desconhecido, a paz e a harmonia reinariam absolutas. Num mundo como este, não haveria polícia, juízes, advogados, prisão e, nem mesmo, auditores. Seriam profissões inexistentes simplesmente por não fazerem o menor sentido. Maravilha, não?

Por outro lado, imaginemos um mundo no qual não houvesse nenhuma virtude, onde todos fossem igualmente maus e não se importassem nunca com as consequências de seus atos sobre aqueles que os cercam. Neste mundo, a única lei seria aquela conhecida, a de Gerson, e todos buscariam apenas o seu próprio bem-estar, o seu próprio interesse sem se importar com qualquer dano ou prejuízo causado aos semelhantes. Um desastre completo. Nada funcionaria e a sociedade viveria o mais profundo caos. Num mundo como este, não seria nenhuma surpresa a própria extinção da humanidade.

Infelizmente não vivemos naquele mundo perfeito e, felizmente, também não vivemos no seu extremo oposto, onde falta toda e qualquer virtude. Digamos que, para fins deste exercício de imaginação, vivemos em uma sociedade que está em algum ponto entre estes extremos. Em alguns locais e momentos históricos, um pouco mais para lá, em outros, um pouco mais para cá. Neste cenário, de uma sociedade plural nos sentidos ético e moral, o grande desafio que está sempre diante de cada um de nós é o de construir uma ambiência que restrinja cada vez mais a proliferação de valores negativos e promova a multiplicação do bem e da virtude.

Se não vivemos naquele mundo ideal e temos que conviver com a dura realidade dos desvios de conduta aqui e acolá, precisamos envidar todos os esforços possíveis no sentido de restringir o máximo possível a ocorrência destes desvios. É exatamente neste sentido que as ferramentas de detecção entram em cena. Até então, tratamos da importância de uma destas ferramentas, o canal de denúncias, e como este canal deve ser valorizado e ter a necessária credibilidade para ser efetivo.

Agora, o meu foco se volta para a auditoria, como elemento essencial na defesa do compliance e na detecção de desvios. No entanto, não vou me restringir aos tradicionais departamentos de auditoria interna que boa parte das organizações possui. Estes, a despeito de toda a competência que possam ter, são muito limitados na sua atuação, uma vez que trabalham por amostragem ou por solicitações pontuais, cujo alcance é muito pequeno diante da amplitude de todos os processos da organização.

A compartimentação de responsabilidades e atribuições em departamentos específicos faz com que as organizações percam muito em sinergia e eficiência. No meu ponto de vista, todos devem ser transformados em auditores, sendo todos, desse modo, igualmente responsáveis pelos resultados corporativos. Se há algum desvio de conduta, a organização falhou, não foi competente para evitar que ele ocorresse e todos saem perdendo com cada uma destas ocorrências indesejadas.

Se encararmos a dura realidade da infiltração da corrupção em todos os níveis e segmentos da sociedade, então teremos que nos preparar de todas as formas possíveis para enfrentar esta deplorável condição. Não sabemos quem, nem quando e nem onde pessoas com más intenções levarão à frente seus projetos escusos para tirar vantagens pessoais ou em favor de alguém. Portanto, como os macrófagos no nosso corpo, cada membro da organização deve atuar como um auditor e ser incentivado a agir diante de qualquer suspeita ou ameaça. Este espírito deve ser amplamente promovido nas organizações.