Conflito de gerações: a vacinação de jovens e a preocupação com populações mais idosas
Enquanto a população mais jovem está (finalmente!) sendo vacinada no Brasil e no mundo, testemunhamos outros países traçando estratégias para aumentar a proteção contra a Covid-19 em populações mais idosas ou em pessoas que tenham alguma comorbidade que comprometa o sistema imunológico. Essa preocupação faz sentido, uma vez que pessoas mais idosas tendem a responder menos às vacinas. Isso ocorre devido ao fenômeno chamado imunossenescência, ou seja, a queda da função imunológica com a idade.
Temos um corpo crescente de evidência mostrando que existe queda progressiva da proteção vacinal contra a Covid-19 em função do tempo e da idade. Por exemplo, a Pfizer afirmou, em nota, com base em estudos próprios, que a proteção vacinal começa a cair 6 meses após a completude do esquema de 2 doses. Outro estudo, esse feito com a Coronavac, também evidenciou que a eficácia vacinal cai conforme a idade aumenta.
A perda de capacidade de resposta imunológica pode ser uma armadilha no atual momento. A variante delta, apesar de não “escapar” completamente da proteção vacinal, aumenta em até 1000 vezes a carga viral, em comparação às demais variantes. Ao mesmo tempo, medidas de restrição vão sendo flexibilizadas e a circulação de pessoas tende a aumentar. Com isso, as populações mais frágeis imunologicamente estão sob maior risco de contrair a doença e desenvolver formas graves - que requerem hospitalização e pressionam o sistema de saúde -, mesmo que vacinadas.
De olho nisso, países começam a tomar providências. O Chile, que vacinou uma grande parte da população (cerca de 80% dos elegíveis) usando a Coronavac, instituiu oficialmente uma dose complementar, que será feita com o imunizante da AstraZeneca, justamente visando à maior proteção de grupos vulneráveis, como idosos. A combinação de imunizantes tem se mostrado segura e capaz de induzir respostas imunológicas potentes, de acordo com os estudos feitos até o momento.
Recomendados pelo LinkedIn
Seguindo na mesma direção, Israel, que aplicou majoritariamente a vacina da Pfizer, tornou obrigatória a terceira dose (do mesmo imunizante) para indivíduos maiores de 60 anos, visando à ampliação da proteção nessa faixa etária.
O Brasil precisa não só pensar, mas agilizar a operacionalização de um reforço imunológico para as populações mais frágeis! Temos evidência de que a terceira dose de Coronavac, em maiores de 60 anos, é capaz de gerar uma resposta imunológica muito robusta, cerca de 5 a 7 vezes maior do que com 2 doses. Já temos também autorização da ANVISA para testes clínicos da aplicação da terceira dose da AstraZeneca em quem já completou o esquema da mesma vacina.
Em suma, vivemos um cenário complexo que conjuga a circulação da variante delta (mais virulenta que as demais) e a maior vulnerabilidade de algumas populações, em termos de função imunológica. Temos evidências e temos instrumentos para endereçar esse desafio: ao passo que a ciência caminha (mostrando que a terceira dose e a combinação de vacinas são seguras e eficazes), nossa capacidade de produção de vacinas também se amplia. É inadiável traçar planos concretos para operacionalizar o reforço vacinal. Até o momento, o Ministério da Saúde sinalizou essa possibilidade, mas não coordenou e nem deu peso de normativa a essa alternativa (ainda). Precisamos agir já!
Conhece alguma experiência local ou internacional de reforço da vacinação de grupos vulneráveis? Me conta aqui.