CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE REMUNERAÇÃO PAGA A EMPREGADA GESTANTE EM DECORRÊNCIA DA PANDEMIA
A Receita Federal publicou no dia 17/1/2023, a Solução de Consulta Cosit nº 11/2023, a respeito do afastamento de empregada gestante das atividades presenciais durante a pandemia de Covid-19, nos termos da Lei nº 14.151/2021.
O art. 1º da referida Lei, em sua redação original, previa que a empregada gestante deveria permanecer afastada de suas atividades presenciais. Posteriormente, a sua redação foi alterada pela Lei nº 14.311/2022, passando a determinar que “a empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada” contra o SARS-CoV-2, deveria permanecer afastada do trabalho presencial. Contudo, uma vez afastada do trabalho presencial, a empregada deveria ficar à disposição do empregador para exercer suas atividades por meio do teletrabalho, sem prejuízo do recebimento de sua remuneração.
Entretanto, quanto à impossibilidade de a empregada exercer as suas atividades por meio do teletrabalho, a lei foi omissa.
Nesses casos, empresas cujas atividades não podem ser desenvolvidas remotamente, entenderam se enquadrar na situação prevista no artigo 394-A da CLT, em que a impossibilidade de atuação em ambiente salubre configura gravidez de risco, ensejando a percepção do salário maternidade, que é antecipado pela empresa e repassado ao Poder Público mediante compensação do salário pago à empregada com as contribuições previdenciárias devidas.
Este foi o caso da Consulente. Para esta, o tratamento jurídico aplicado à questão deveria ser o mesmo que havia sido aplicado na Solução de Consulta Cosit nº 287/2019. Nessa SC, a Receita Federal havia consignado o entendimento de que a previsão legal do art. 394-A, §3º, da CLT, conferia ao contribuinte o direito de realizar a dedução integral do salário-maternidade pago à empregada que exerça atividades consideradas insalubres durante todo o período de afastamento. Para tanto, é necessário que não seja possível o exercício de suas atividades em outro local que seja considerado salubre. Nesse sentido, restaria caracterizada a hipótese de gravidez de risco.
Assim, a Consulente buscava saber se o seu entendimento de considerar a remuneração paga no período integral de afastamento de suas empregadas gestantes, na forma prevista pela Lei nº 14.151/2021, como salário-maternidade, estava correto. Por conseguinte, questionou se poderia deduzir o valor pago da base de cálculo das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados a pessoas físicas que lhe prestem serviços, nos termos do art. 72 da Lei nº 8.213/1991.
Ao analisar o caso apresentado pela consulente, contudo, a Receita Federal entendeu que o cenário tratado pela referida Lei não se confunde com o desenvolvimento de atividades em ambientes insalubres, objeto do art. 394-A da CLT.
O Fisco lembra que o artigo 1º da norma foi alterado pela Lei nº 14.311, de março de 2022, em que foi vetada a previsão de pagamento de salário-maternidade em substituição à remuneração, caso a situação fosse considerada como gravidez de risco, até estar completa a imunização, no caso de trabalho incompatível com a forma remota.
Dessa forma, não há dispositivo legal que permita considerar a remuneração paga nos termos da Lei como salário-maternidade.
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Diante da nova consulta, entendo que a existência dessas duas soluções de consulta (esta de 2023 e a de 2019) mostra uma contradição dentro dos próprios atos da Receita Federal, além de ser mais um desincentivo à contratação de mulheres, questão que foi motivadora quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade.
Não obstante, a conclusão apresentada pela Cosit é equivocada, visto que é de conhecimento público que as mulheres grávidas são extremamente vulneráveis e a proteção à maternidade é um direito social fundamental, previsto na CF, mais especificamente em seu art. 6º e art. 201, II. Nessa senda, proteger a maternidade é um dever primordial do Estado, cuja função é constitucionalmente atribuída à Previdência Social. Portanto, é desarrazoado que a Receita Federal pretenda que esse ônus recaia apenas sobre a empresa empregadora, e não pela coletividade.
Por fim, cabe ressaltar que decisões proferidas no âmbito judicial asseveram que “os ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador”. Neste sentido, em precedente da Primeira Turma do TRF4 (AG 5012975-48.2022.4.04.0000), cujo entendimento é seguido em diversos julgados. No referido precedente, julgou-se compatível ao ordenamento jurídico enquadrar como salário-maternidade os valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sobretudo frente à impossibilidade de exercer o trabalho remotamente, haja vista que a natureza de determinadas atividades exige a prestação presencial.
Em consequência do enquadramento das citadas remunerações como salário-maternidade, as decisões judiciais igualmente afirmam o direito do empregador à exclusão dos respectivos pagamentos da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais destinadas à previdência social e aos terceiros, bem como afirmam o direito à compensação dos valores correspondentes ao salário-maternidade pago à empregada gestante afastada de suas atividades presenciais em razão da pandemia.
Nesse contexto, com base no entendimento firmado pelo Judiciário, orientamos aos empregadores que se enquadrem nesta situação o ajuizamento de ação judicial para o reconhecimento deste direito.
A Equipe Tributária do Coelho & Morello está à disposição para avaliar as providências cabíveis por parte das empresas que aplicaram o tratamento de salário-maternidade nesses casos.
THIAGO MARTINS GARCIA SILVA