COP16: Quais os avanços? | What are the ouputs?
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[PT] COP16: E então, quais foram os avanços na conservação da biodiversidade?
Discutir clima, que já é um tema "popular", ainda gera controvérsias e dificuldade de consenso. Imaginem como isso acontece com relação à biodiversidade, um tema muito mais complexo e mais recente nas discussões de cooperação global.
A Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade de 2024 (COP16), realizada em Cáli, Colômbia, concluiu com várias realizações significativas e discussões sobre tópicos-chave, marcando marcos históricos importantes na agenda global de biodiversidade. Nem tudo foi perfeito, já que uma decisão importantíssima com relação ao financiamento não foi concluída durante a conferência, mas ainda assim, existem destaques relevantes:
Criação do Fundo de Cali
Um dos maiores destaques da COP16 foi a criação do "Fundo Cali". Este fundo foi estabelecido como um mecanismo global para arrecadar recursos econômicos provenientes do uso de informações de sequências digitais (ISD em português, ou DSI, Digital Sequence Information, em inglês) de recursos genéticos. Ou seja, países podem acessar um banco de dados de informações genéticas sobre a biodiversidade, desde que paguem por isso e esse valor seja redistribuído a quem sempre preservou esses ativos - as comunidades locais de onde os dados genéticos se originam. O objetivo é garantir um compartilhamento justo e equitativo dos benefícios derivados desses recursos, promovendo a conservação e o uso sustentável da biodiversidade. Conceito justo, de implementação complexa!
Reconhecimento das Contribuições dos Povos Indígenas e Afrodescendentes
Pela primeira vez na história das Conferências de Biodiversidade das Nações Unidas, foi realizado um fórum dedicado aos afrodescendentes. Um dos marcos significativos desta edição foi a criação de um grupo especial para garantir que os Povos Indígenas e as comunidades locais tenham voz ativa nas decisões sobre biodiversidade. Isso se relaciona a um artigo específico da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), o Artigo 8(J), que trata do respeito, preservação e manutenção dos conhecimentos, inovações e práticas das comunidades indígenas e locais que são relevantes para a conservação e uso sustentável da biodiversidade. Este grupo especial reconhece formalmente a importância das contribuições dessas comunidades para a conservação da natureza e assegura sua participação nos processos de decisão. Além disso, as comunidades afrodescendentes foram oficialmente reconhecidas, garantindo sua inclusão em futuras conferências sobre biodiversidade. Que seja o início de uma jornada mais participativa, respeitosa e de avanço para todos os envolvidos.
Acordo sobre Áreas Marinhas Ecologicamente Significativas (EBSAs)
Outro avanço importante foi o acordo sobre um mecanismo de revisão para identificar e proteger áreas marinhas ecologicamente significativas (EBSA, em inglês Ecologically and Biologically Significant Marine Areas). Este acordo é crucial para a meta de preservar 30% dos oceanos até 2030, garantindo a proteção de habitats marinhos críticos.
Mobilização e Educação Ambiental
A COP16 também se destacou por sua campanha histórica de educação ambiental e mobilização social. Milhares de pessoas foram envolvidas em atividades que promovem o cuidado e o valor da biodiversidade, consolidando a conferência como um dos maiores movimentos em prol da vida e da natureza. Foi a primeira vez que tiveram uma "Zona Verde", uma nomenclatura de COPs para uma área de acesso aberto ao público em geral, aproximando do público todos os temas que vêm sendo discutidos entre os governos e instituições na "Blue Zone".
Mobilização de Recursos e Mecanismo Financeiro
Houve um debate significativo sobre a proposta de um novo fundo global para a biodiversidade. Um texto de decisão preliminar propondo um novo fundo global dedicado à biodiversidade sob a governança da COP foi apresentado, mas foi rejeitado pelos delegados do Norte Global. A antiga discussão sobre quem financia e quem recebe continua, num "cabo-de-guerra" que está em seu limite e que indica um posicionamento firme dos países do Sul Global. A reunião foi suspensa devido à falta do número mínimo de delegados necessários, uma vez que a discussão final ficou para o fim de uma madrugada de discussões e muitas partes já não estavam mais presentes.
Sinergia com as Convenções do Rio
Foram feitos esforços para aumentar o perfil da biodiversidade dentro da crise climática, com notável engajamento político e participação de chefes de estado, ministros das relações exteriores e delegações internacionais. As três convenções defininas da Rio-92 foram a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) e Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação (UNCCD). É evidente que daqui em diante, mesmo que permaneçam conferências e agendas separadas, as discussões sobre clima, biodiversidade e desertificação precisam estar integradas.
Enfim, no geral a COP16 avançou significativamente no reconhecimento dos papéis dos Povos Indígenas, comunidades locais e comunidades afrodescendentes, estabelecendo um fundo global para informações de sequência digital, acordando sobre a proteção de áreas marinhas ecologicamente significativas e promovendo a educação ambiental. Esses marcos representam avanços significativos na agenda global de biodiversidade. Ficou faltando acordar sobre os fundos financeiros para fazer tudo isso acontecer! Ou seja, que um dos grandes aprendizados desse evento seja que a definição de recursos seja uma das primeiras discussões, para que só então sigamos discutindo o que é possível fazer com tudo isso. Do contrário, não temos o tempo de parar e reverter a perda da biodiversidade até 2030, caso já estejamos em 2026!
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[EN] COP16: So, What Were the Advances in Biodiversity Conservation?
Discussing climate, which is already a "popular" topic, still generates controversies and difficulties in reaching a consensus. Imagine how this happens with biodiversity, a much more complex and recent topic in global cooperation discussions.
The 2024 United Nations Biodiversity Conference (COP16), held in Cali, Colombia, concluded with several significant achievements and discussions on key topics, marking important historical milestones in the global biodiversity agenda. Not everything was perfect, as a crucial decision regarding financing was not concluded during the conference, but there are still relevant highlights:
Creation of the Cali Fund
One of the major highlights of COP16 was the creation of the "Cali Fund." This fund was established as a global mechanism to collect economic resources from the use of digital sequence information (DSI) of genetic resources. In other words, countries can access a database of genetic information about biodiversity, provided they pay for it, and this value is redistributed to those who have always preserved these assets - the local communities from which the genetic data originate. The goal is to ensure a fair and equitable sharing of the benefits derived from these resources, promoting the conservation and sustainable use of biodiversity. A fair concept, with complex implementation!
Recognition of Contributions from Indigenous Peoples and Afro-descendant Communities
For the first time in the history of the United Nations Biodiversity Conferences, a forum dedicated to Afro-descendants was held. The creation of a subsidiary body of Article 8(J) for Indigenous Peoples and local communities was a significant milestone, formally recognizing the importance of these communities' contributions to biodiversity conservation and ensuring their participation in decision-making processes. Afro-descendant communities were recognized within Article 8(J), guaranteeing their inclusion in future biodiversity conferences.
Agreement on Ecologically Significant Marine Areas (EBSAs)
Another important advancement was the agreement on a review mechanism to identify and protect Ecologically or Biologically Significant Marine Areas (EBSAs). This agreement is crucial for the goal of preserving 30% of the oceans by 2030, ensuring the protection of critical marine habitats.
Environmental Mobilization and Education
COP16 also stood out for its historic campaign of environmental education and social mobilization. Thousands of people were involved in activities that promote the care and value of biodiversity, consolidating the conference as one of the largest movements in favor of life and nature. It was the first time they had a "Green Zone," a COP nomenclature for an area open to the general public, bringing the topics discussed among governments and institutions in the "Blue Zone" closer to the public.
Resource Mobilization and Financial Mechanism
There was significant debate over the proposal of a new global biodiversity fund. A draft decision text proposing a new dedicated global biodiversity fund under COP’s governance was presented but was rejected by delegates from the Global North. The old discussion about who finances and who receives continues, in a "tug-of-war" that is at its limit and indicates a firm stance from the Global South countries. The meeting was suspended due to a lack of the minimum number of delegates needed, as the final discussion took place at the end of a night of discussions and many parties were no longer present.
Synergy with the Rio Conventions
Efforts were made to raise the profile of biodiversity within the climate crisis, with notable political engagement and participation from heads of state, foreign ministers, and international delegations. The three defining conventions of the Rio Earth Summit in 1992 were the Convention on Biological Diversity (CBD), the United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC), and the United Nations Convention to Combat Desertification (UNCCD). It is evident that from now on, even if separate conferences and agendas remain, discussions on climate, biodiversity, and desertification need to be integrated.
In summary, COP16 made significant progress in recognizing the roles of Indigenous Peoples, local communities, and Afro-descendant communities, establishing a global fund for digital sequence information, agreeing on the protection of ecologically significant marine areas, and promoting environmental education. These milestones represent significant advances in the global biodiversity agenda. What remains is to agree on the financial funds to make all this happen! In other words, one of the great lessons from this event is that the definition of resources should be one of the first discussions, so that we can then discuss what is possible to do with all this. Otherwise, we do not have the time to halt and reverse nature loss by 2030, if we are already in 2026!
Operations Manager at EY wavespace Canary Wharf
1 mThank you Thais...super useful!!