Createfy - Uma introdução ao fim do K.I.S.S — Keep it Simple Stupid

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“A palavra complexidade só pode exprimir nosso incômodo, nossa confusão, nossa incapacidade para definir de modo simples, para nomear de modo claro, para ordenar nossas ideias” ( Edgar Morin).

O post desta semana será o primeiro de uma série sobre o pensamento complexo, uma breve introdução à teoria da complexidade, baseado na obra de Edgar Morin — antropólogo, sociólogo e filósofo francês.

Antes de mais nada, sinto-me obrigado a dizer que as linhas a seguir não simplificam o entendimento da teoria, muito pelo contrário: a ideia aqui é mostrar para você as implicações e as consequências do nosso pensamento simplificador.

O pensamento simplificador está enraizado culturalmente em nossa sociedade: de acordo com Morin, ele tem início na separação entre a filosofia e a ciência. Não podemos negar que a ciência por si só trouxe e ainda nos traz diversos benefícios, porém, as consequências dessa ruptura só seriam sentidas séculos depois.

O pensamento simplificador é mutilador, pois, para analisar algo, ele separa o que é importante do que é considerado desnecessário. Ele desintegra a realidade e a decompõe em menores pedaços para analisá-la. Além disso, considera como realidade total esse fragmento analisado, descartando todo o seu meio e as interfaces de interação com o todo.

Nesse momento você perguntará, assim como eu: como aprenderíamos o que precisamos para viver se isso não fosse feito em pedaços? Passamos 17 anos estudando no sistema escolar brasileiro, nossa formação é segmentada por natureza. Isso me faz acreditar que pensamos de forma simplificadora, pois somos criados e ensinados a pensar dessa forma.

A ciência, durante muito tempo e ainda hoje, tem como tarefa dissipar a complexidade aparente dos fenômenos. Assim, torna-se evidente que ela produz mais cegueira do que elucidação, o que faz surgir o problema: como considerar a complexidade de forma não simplificadora?

Entretanto, esse problema não se apresenta imediatamente, pois a complexidade não tem uma grande herança filosófica, científica e epistemológica. Ao contrário, ela tem uma grande carga semântica: quando pensamos em complexidade pensamos em confusão, incerteza e desordem.

Logo, sua definição não traz um significado claro: é complexo tudo aquilo que não pode ser resumido a uma palavra-chave ou reduzido a uma lei ou ideia. Então é complexo tudo aquilo que não é simples? Acho que o dicionário não nos ajuda muito nesse sentido.

Seguindo essa lógica, o “complexo”, por assim dizer, não poderia então nem mesmo ser reduzido à palavra complexidade. Afinal, estaríamos reduzindo-o a uma palavra-chave, assim simplificando a complexidade. O que podemos entender a partir daqui é que a complexidade é uma palavra-problema, e não uma palavra-solução.

Espero que até aqui estejam todos bem. Pare um pouco de ler, respire, abra seu Facebook, leia os três primeiros memes da sua timeline. Isso deve dar aquela sensação de relaxamento (com sorte terá algum gif de gatinho), e podemos continuar.

Bom, como podemos ver, se não é possível definir a complexidade em uma palavra, tampouco conseguiríamos defini-la neste post. Mas imagino que você, assim como eu, está curioso para saber o que isso tem a ver com nossas vidas e irá me acompanhar nesta introdução.

A complexidade surge nos primeiros limites e na insuficiência do pensamento simplificador. Isso quer dizer que, quando você pensa em uma bola, é simples dizer o que é. Da mesma forma, quando você pensa em uma mesa, rapidamente ela se projeta em sua mente. Mas quando você pensa em sociedade, economia, mercado e na sua vida, o que acontece?

Imagino que uma enxurrada de pensamentos variados — compostos pelas suas experiências, pelo seu aprendizado escolar, imaginação, Facebook, Youtube, Instagram — se transformem em algo não muito claro, disforme, cheio de conexões. Quanto mais você se aprofunda nesses pensamentos, mais as conexões se alteram e se ampliam.

Ok, estamos visualizando neste momento os limites da simplificação, e você reclamava de resumos e resenhas de livros na escola?

 

O pensamento complexo não tem a ambição de elucidar, controlar e dominar o real.

Isso, como vimos, é o papel do pensamento simplificador. Diferentemente disso, ele tem a intenção de lidar com o real e com ele dialogar e negociar.

E para isso precisamos desfazer duas ilusões que nos desviam do problema do pensamento complexo. A primeira é acreditar que a complexidade é a eliminação da simplicidade  — a complexidade nasce, sim, onde o pensamento simplificador falha, mas ela agrega tudo que põe ordem, clareza e distinção, precisão no conhecimento. A segunda ilusão é confundir complexidade e completude. O pensamento complexo aspira ao conhecimento multidimensional. Mas ele sabe, desde o começo, que o conhecimento completo é impossível: um dos axiomas da complexidade é a impossibilidade. Ele se mostra da seguinte forma: “A totalidade é a não verdade”. Ele reconhece e aceita o incerto, a incompletude e o desconhecido.

Correto, e o que tudo isso tem a ver conosco?

No meu ponto de vista, tudo. Desde nossa vida pessoal, até o nosso trabalho, a nossa sociedade, política e economia, nós tentamos prever os fenômenos, programar atividades e ações, e sentimos na pele os fracassos, pois, ao realizarmos isso, nos preparamos para o que é importante e desconsideramos o resto, o que não entendemos, o que não chama atenção, e assim por diante.

Ao invés de aprender a lidar com as incertezas, somos ensinados a nos proteger e evitar. Isso cabe a quem se protege em seus relacionamentos amorosos, vivendo relacionamentos superficiais; a gerentes de projetos que sofrem por não conseguirem medir riscos ou prever acontecimentos inesperados ou por não saberem lidar com mudanças repentinas.

Portanto, o pensamento complexo é necessário para quem trabalha com a cultura Ágil e para todos aqueles que sofrem por não compreenderem a sua própria interação com o restante do mundo. Esse pensamento amplia o entendimento do que é real, de como os sistemas se relacionam — não com o intuito de dar a você uma verdade completa da realidade, mas, sim, de saber lidar, no dia a dia, com a complexidade das incertezas e das mudanças.

Se você chegou até aqui espero que tenha gostado. Vamos aproveitar este espaço para discutir como isso se encaixa na sua vida, na sua empresa e na sua equipe. Esta foi apenas a introdução: temos um longo caminho a percorrer nessa mudança de mindset.

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