Crianças e telas: quanto mais tarde melhor
O bebê precisa que sua mãe, pai ou cuidador direto se relacionem com ele, o percebam, o acolham e façam suas leituras de mundo. Essa construção de vínculo é fundamental para um desenvolvimento sadio, tanto físico quanto emocional. A partir dessa relação os bebês conseguem crescer, ativar seu cérebro e podem exercer sua curiosidade em descobrir o mundo.
Para isso, juntamente a esse vínculo estabelecido, que reconhece os bebês, que os validam e os faz sentir-se pertencentes e queridos, é necessário que haja um ambiente seguro para ser explorado. Em um ambiente desafiador, com obstáculos seguros ao mesmo tempo que desafiadores, eles vão realizando suas conexões neurais, desenvolvendo seus músculos, seu olhar e construindo suas narrativas.
Seguindo o fluxo natural, os bebês vão crescendo e se tornando crianças, que geralmente são pesquisadoras natas. Gostam de descobrir como abrem e fecham as coisas, como sobe e como desce, qual o maior e o menor e assim, na busca por respostas vão construindo sua capacidade de pensar. É preciso deixá-las brincando com os potes da cozinha, deixando encontrar a tampa certa para cada um, é preciso deixá-las soltas na natureza observando os bichinhos do jardim, as folhas que caem e como a terra escorre entre os dedos.
Eu poderia continuar a linha do tempo do desenvolvimento infantil, porém preciso pausar por aqui para dizer que neste momento, nós adultos já formados e desenvolvidos pegamos um aparelho que assim como a televisão é estático, e entregamos nas mãozinhas de nossas crianças pequenas. No lugar de deixá-las descobrir todas as vivências necessárias para que seu corpo se desenvolva, seu cérebro realize conexões neurais e seus músculos sejam ativados, damos a elas a chance de pular essas descobertas para receberem conteúdos mastigados, com excesso de luminosidade, com uma rapidez maior que seu cérebro consegue acompanhar e que impõe a barreira entre elas e os outros. Sem os outros a criança não aprende a se relacionar, a se conhecer e a se sentir pertencente.
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Entendo que temos no Brasil uma questão cultural e sócio econômica que precisa ser considerada nessa situação. Muitas mães chegam em casa de seus trabalhos e se deparam com a segunda jornada: os cuidados com a casa e com os filhos. Claro que aqui falamos que ela também está com saudades desses filhos e que quer sentar-se para brincar, para olhar para eles, mas muitas vezes estão cansadas e o celular entra como um ajudante. Muitos pais passam por isso também, porém trouxe aqui uma pimenta para uma questão mundial e que em países em desenvolvimento acaba sendo um ponto extremamente agravante. Vou deixar esse assunto para um próximo artigo.
A intenção desses pais é dar conta de tudo, sem muitas vezes compreenderem que essa muleta oferecida antes dos 11/12 anos trará muitos prejuízos ao desenvolvimento de suas crianças. Os prejuízos são da ordem emocional, motora, social e psíquica.
Quantas crianças estão sendo diagnosticadas com transtornos de aprendizagem quando na verdade são apenas as 4/5/6 horas nas telas que as tornam desatentas, sem foco, com falta de memória e incapazes de ouvir um comando simples de um professor, como: "Abram a página 44 do livro de matemática" (sobre um vídeo que viralizou nas redes sociais sobre um desabafo de uma professora de 4º ano que não conseguia seguir a aula pois seus alunos estavam parados neste simples pedido).
Portanto, acredito que quanto mais tarde pudermos oferecer este recurso tecnológico aos nossos filhos, melhor será para eles (e para a sociedade em geral, mas isso também é tema para outro artigo!). Há muito que se aprender no campo das sensações, das experiências. Os objetos simples que temos em casa e o contato com a natureza, oferecidos com amor e atenção na 1ª e 2ª infância (Educação Infantil e Fundamental 1), poderão favorecer para que haja uma geração livre de transtornos que poderiam ser evitados e provavelmente, mais feliz.
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5 mAmei.
Psicólogo clínico na Consultorio e clinica particular
5 mChristina parabéns pelo artigo, sensível, crítico e atual.