CURTIS C-46 COMMANDO DA VASP
Por volta dos anos 60 eu estava noivo de uma moça que era secretaria da diretoria da VASP (Viação Aérea São Paulo) cujo escritório ficava num hangar do Aeroporto Santos Dumont.
Alias, ela não era exatamente secretaria da companhia aérea, mas era secretaria da amante do Governador da São Paulo , Dr. Adhemar de Barros, este sim o “dono” da empresa VASP. Esta digna senhora era apelidada de “Brigadeiro” na companhia.
Então, como funcionaria da VASP minha noiva tinha direito a bilhetes aereos em suas férias para viajar para qualquer ponto do Brasil com direito a acompanhante (eu).
O único senão era que só entravamos no avião se tivesse lugar disponível, mas ela tinha também alguns privilégios e certeza de que escolheria o lugar e embarcaríamos.
Resolvemos fazer uma viagem de 20 dias pelo Nordeste brasileiro, cabendo a mim pagar os hotéis e a ela obter as passagens. O roteiro que previa Salvador, Natal, Recife, Fortaleza e São Luiz. Outras cidades entraram por acaso, pois os aviões faziam escalas e aproveitávamos os dias neste lugares.
Bem, saímos daqui num DC-4 à tarde do Aeroporto Santos Dumont apinhado de gente, só faltando ir gente de pé ou levando cabras ou galinhas. Tremenda mistureba.
A primeira escala foi em Vitoria e lá pegamos um temporal que atrasou a saída para Salvador. Para cúmulo da pouca sorte, quando estávamos chegando ao destino já era noite e deu pane na iluminação da pista do Aeroporto Internacional de Salvador (hoje Aeroporto Deputado Luís Eduardo Magalhães) e o avião teve de fazer um desvio para a João Pessoa, na Paraiba. A VASP foi muito prestativa a alojou todos num hotel até que no dia seguinte o voo seguisse para Salvador.
Mas aí se deu o inevitável.
A VASP só mandou pegar a conta justa dos passageiros que pagaram passagem.
Nós estávamos de fora.
Minha noiva era decidida e armou um tremendo quiproquó , mas não teve jeito. O avião de resgate estava literalmente lotado.
Bem, naquela época não tinha computador (e.mail), fax, tudo tinha que ser resolvido por telefone e o Aeroporto Presidente Castro Filho de João Pessoa tinha apenas um aparelho de uso geral, onde se tinha de pedir a ligação para o Rio a uma telefonista e aguardar horas até que se completasse. Quando minha noiva conseguiu falar com a companhia armou uma tremenda saia justa exigindo que um outro avião fosse lá nos pegar (a esta altura o voo de resgate já tinha partido).
A sede do Rio não conseguia resolver, então ela apelou para o “Brigadeiro” que falou com o Adhemar de Barros e este mandou que um avião fosse lá nos pegar.
Enquanto esperávamos vimos mais 2 pessoas discutindo no balcão (se é que se podia chamar de balcão, ali ao ar livre) da VASP, pois eles também queriam aproveitar e embarcar neste “voo extra”
Lá pelas 2 da tarde, debaixo de um sol terrível (não tinha nem um barzinho no aeroporto para tomarmos um refrigerante e não pensamos em sair de lá, pois ele ficava a 8 Km. da cidade e não queríamos ter risco de não pegar o avião que fosse). Foi então que vimos o avião se aproximar e era um CURTIS C-46 COMMANDO cargueiro da 2ª. Guerra Mundial.
Eu – que sou fã de aviões – achei o máximo, pois nunca na vida imaginei que voaria no Curtis Commando, mas ali na pista a coisa estava encrencando a cada minuto enquanto o avião taxiava.
Ocorre que estas 2 pessoas eram um padre católico (de batina preta) e um rapaz muçulmano que dizia jamais embarcaria num avião com um padre.
Era contra a religião dele, alem de dar azar.
O padre era meio contemporizador e não queria encrenca, só faltou propor batizar o rapaz, mas este estava inflexível.
“Com padre, neste avião eu não vou.”
O Comandante do avião estava assistindo a pendenga lá de cima da janela envidraçada (o Curtis Commando tem a proa toda envidraçada, como se fosse um bombardeiro) e resolveu intervir, primeiro lá de cima mesmo, depois ele e o copiloto saíram e foram tentar solucionar o impasse.
Disse “Ou vão os dois ou não vai nenhum”.
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O padre rapidinho subiu a escadinha e se aboletou no assento, eu e minha noiva fizemos o mesmo enquanto o rapaz insatisfeito andava de um lado era o outro ali na pista.
É importante informar – como eu disse antes – que era um Curtis Commando cargueiro, então tinha uma só fileira de 4 assentos perto da cabine, o resto era aberto para cargas – e o avião esta cheio e pallets.
Como minha noiva e eu sentamos nos 2 assentos da direita e o padre junto à janela da esquerda, depois de muito reclamar o rapas vendo que não tinha jeito subiu o avião –e, outro choque – viu que teria de viajar ao lado do padre.
Bem, eu estava em lua de mel com minha noiva e não fiquei olhando para os 2, mas depois que o avião decolou com destino a Salvador, cada um pegou o seu terço (o muçulmano tinha uma pulseira muçulmana de madeira com 99 contas) e foram rezando para seus deuses até o final da viagem.
General Manager na OLMC - Orlando Lopes Media Consultant
1 aQue aventura e tanto!
SVP, Creative Director, FCB Health New York. Green Card Holder. 2024 New York Health, Webby Awards and Anthem Awards Jury.
1 aQue confusão :)