De volta à questão do câmbio
Tenho utilizado este espaço para debater a questão cambial brasileira.
Na minha opinião, deveríamos ter hoje um câmbio próximo a R$ 2,90 se a economia e as decisões dos agentes econômicos se orientassem apenas pelo lado real, isto quer dizer, pela transação de bens e serviços. Porém, a economia capitalista não é uma economia de escambo, de trocas. A moeda não desempenha apenas este papel.
Este nível de câmbio (R$2,90) baseia-se na correção do câmbio dos últimos, 10 anos, pela inflação brasileira, descontada a inflação internacional e os ganhos de produtividade.
Tenho sustentado que a economia não tem apenas o lado real dos R$ 2,90, tem também o lado monetário. Portanto, as decisões dos agentes econômicos se orientam pela combinação do custo das mercadorias e do custo do dinheiro, dos juros.
Se corrigirmos hoje, por exemplo, a taxa de câmbio de R$ 2,79 no mercado a vista de hoje pela manhã por uma SELIC de 12.5% teríamos que ter uma taxa de câmbio de , no mínimo, R$ 3,10 no fim do ano para carregar uma posição comprada em dólares. Quem correria este risco?
Não obstante , há a possibilidade desta taxa ser maior R$3,10, mas teríamos que ter um cenário de stress absoluto no mercado que poderia ser causado, por exemplo, por uma crise institucional no país ou pelo abandono de uma política fiscal e monetária mais restritiva por parte do governo. Fatores que fogem ao nosso controle, neste momento.
Acredito que o instinto de autopreservação do Governo Dilma será maior. Mesmo que a contra gosto, o mercado será atendido pela área econômica, pois não há como sair da situação em que nos encontramos sem resgatar a confiança no país. É fazer ou é o caos. Não há meio termo.
A situação de janeiro deste ano que estava relativamente tranquila com a opção do Governo Dilma de seguir um caminho virtuoso de responsabilidade fiscal, metas de inflação e acredito, lá na frente, de câmbio livre foi atropelada por uma conjunção de más notícias.
Entre estas más notícias de fevereiro, poderíamos destacar a eleição de Cunha para a Câmara que pode ( não é certo) dificultar os planos de ajuste fiscal, o arrefecimento da crise da Petrobrás e o problema hídrico no sudeste do país.
No plano internacional, a principal pressão adveio da volta do temor com aumento de juros nos EUA com dados de crescimento da força de trabalho que foram revistos.
As taxas de juros dos T-Notes de 10 anos que haviam rompido recentemente o suporte de 2% a.a. voltaram a subir. (Vide gráfico abaixo) É importante lembrar que uma normalização da política monetária (aumento de juros) nos EUA pode significar saída de capitais de países.emergentes, como o Brasil.
A única notícia que jogou a favor de uma menor pressão no câmbio foi a confirmação do programa de compra de ativos por parte do Banco Central Europeu que deve jogar mais liquidez no mercado internacional, a partir de fevereiro. Este fator pode dar mais tempo ao Brasil de orientar o ajuste fiscal e convencer o mercado que nossa dívida pública será cadente.
A combinação de todos estes efeitos jogaram o câmbio para fim de fevereiro na BMF para R$ 2,80 e romperam todos as resistências técnicas. ( Vide Gráfico que ilustra este texto)
Como não poderia deixar de acontecer as taxas de juros longas (Janeiro de 2019) e curtas (Janeiro 2016) voltaram a fechar o GAP refletindo o ambiente de risco.(Vide Gráfico abaixo que mostra a série de Juros Longos (Linha Verde) e Curtos (Linha Amarela).
A volatilidade cambial ( média/desvio) subiu às alturas. (Vide Gráfico Abaixo)
É interessante observar que toda esta pressão sobre o câmbio foi principalmente provocada pelos investidores estrangeiros. Segundo informações de mercado, 35% das posições compradas em aberto no mercado futuro de câmbio em fevereiro (dado da última sexta feira) estão na mão de estrangeiros que tentam se defender de um eventual overshooting na taxa de câmbio. Esta é uma posição recorde deste tipo de investidor e denota a maior percepção de risco dos agentes.
Sob este contexto, cabe algumas perguntas: Qual o futuro da taxa de câmbio? Ela continuará pressionada? É para comprar? É para vender?
Na minha opinião, tudo dependerá dos sinais que o Governo Dilma enviar ao mercado. Se o caminho for de austeridade fiscal podemos ter um até algum movimento de apreciação no curto prazo e de correção.
Um outro fator a observar é se o programa de compras de ativos do BCE irá neutralizar um eventual aumento de juros nos EUA, bem como se a sinalização do FED (Banco Central Americano) será mais ou menos "Dovish".
Acabou a época do dólar barato como venho insistindo deste de junho do ano passado. Acredito que R$ 2,60 é uma fotografia em nossos escritórios para a posteridade.Porém, há que se ter cautela com eventuais exageros.
Tudo mais não passa de mera especulação.
Um abraço,
Vitor Bellizia.
Em tempo: O dólar no mercado futuro hoje fechou em queda de 0.5% a R$ 2,785.