"Depende"

Uma sexta-feira dessas à tarde, eu e minha esposa fomos a uma loja que restaura e vende violinos no interior de São Paulo. E por falar em violinos e música, confesso que começar a mergulhar neste universo tem sido encantador, e percebo que ter iniciado os estudos do instrumento há cerca de dois anos foi talvez uma das mais acertadas decisões que tomei nos últimos tempos.

A loja de violinos é um mundo à parte. É especializada no instrumento e em outros instrumentos de corda, como viola e violoncelo, mas pude perceber que a paixão e o negócio lá giram predominantemente em torno dos violinos.

A visita à loja durou cerca de duas horas. Na verdade, ela foi recomendada pela minha professora, que insistia já há algum tempo de que eu precisava visitar o local.

O proprietário da loja, violinista profissional e integrante de uma filarmônica da cidade, nos recebeu muito cordialmente. Com muita simpatia e entusiasmo, descortinou diante de nós um mundo novo com suas explicações, mesmo para um estudante já iniciado. Durante a visita, fomos apresentados a violinos das mais diversas regiões e épocas. Conhecemos alguns violinos novos e uns tantos restaurados. Instrumentos com muita história, como um Hofner da década de 40 do século XX e um Suzuki de quase a mesma idade. Também tivemos a oportunidade – e que oportunidade - de ouvir o violinista tocar a composição Schindler´s List de John Williams em um violino francês de quase 100 anos, e também a linda composição do maestro Morricone feita para o filme Cinema Paradiso em um violino que foi entregue recentemente por um luthier brasileiro.

Nesta visita, que ouso chamar não apenas de técnica, mas de uma aula consultiva que recebemos, aprendemos que apesar das inúmeras tradições em torno da concepção e produção dos violinos, nem sempre a nacionalidade e a idade do instrumento são os elementos que mais importam. Descobrimos algumas diferenças entre os violinos produzidos em fábricas, os produzidos em oficinas e os produzidos por luthiers. A importância do tipo de madeira usada na preparação do tampo, do espelho, da voluta. O rigor e a atenção dispensada aos detalhes. Os materiais usados no arco. Do tipo de madeira à procedência da crina. Tudo isso importa, pois assim como na vida e no trabalho, os detalhes fazem a diferença.

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Além dos aspectos técnicos e característicos dos instrumentos em si, a visita também nos levou para dentro do ambiente da orquestra. Há o maestro, o spalla de um naipe (violinista líder de um grupo sinfônico, que o é pela qualidade e desenvoltura), os demais violinistas e os outros músicos e instrumentistas. Todos com seu papel cuidadosamente pensado e orquestrado para executar as composições.

Ao nos explicar sobre a ressonância, o alcance e os harmônicos de um violino, o violinista nos contou sobre uma ocasião em que um músico muito talentoso teve sua candidatura à uma orquestra recusada, após executar uma composição com seu violino. A sonoridade de seu violino e o alcance de sua ressonância era maior do que a do violino tocado pelo spalla. Acabaria por sacrificar a qualidade harmônica de toda a orquestra e poderia vir a atrapalhar o bom andamento do trabalho.

A visita valeu o dia. Minha esposa que é estudante de piano ficou encantada com tantos detalhes e saímos de lá com uma vontade tremenda de treinar. Estou seguro de que além da magnífica aula que tivemos sobre violinos, tivemos também um curso aprofundado sobre gestão, trabalho em equipe e inteligência emocional. 

Mas talvez o amigo ou a amiga se pergunte onde vi lições sobre gestão, trabalho em equipe, inteligência emocional e outras tantas coisas relacionadas à vida pessoal e profissional durante esta visita.

Se não entendeu, sugiro ler novamente o texto com atenção. Afinal, todos nós temos momentos na vida e no trabalho que se assemelham ao papel de um violinista, de um maestro, de um spalla, de um candidato à uma orquestra, e às vezes até de um luthier. 

Minha professora de violino havia me dito que eu sentiria naturalmente a necessidade de substituir meu instrumento por um instrumento melhor. Penso que ainda é cedo para isso. Mas me encanta a possibilidade de precisar de outro violino em breve. Se aquele violino feito no capricho pelo cuidadoso luthier brasileiro que ouvi chorar a peça do maestro estiver disponível, acho que vou nele. Não é o mais antigo e não tem a melhor história. Mas produziu o melhor som aos meus ouvidos. E assim como tudo na vida, em termos de escolher o melhor violino, impera a palavra “depende”.


Elias Felipe S. Cruz é gestor na indústria farmacêutica, mercado onde atua há mais de 18 anos. Possui formação nas áreas de negócios, saúde e humanidades. É estudante de violino e atualmente reside com sua família no estado de São Paulo. 

Vinicius Dias dos Santos

Fundador, Facilitador & Coaching na Santos Insights | MBA em MKT

3 a

Sensacional Felipe. A leitura para estar seguida de uma trilha sonora imaginária de cordas...; parabéns

Que legal 😃😃😃 como o detalhe no saber, o cuidado no sentir e a alegria em oferecer, fazem a diferença👏🏼👏🏼👏🏼 muito bom.

Thiago Viana

Rep - Momenta Farmacêutica (Grupo Eurofarma)

3 a

Felipe olha ...que DOM ... que você tem pra escrever, e para texto ! Poxa vida .... E SIM .... Inteligente Emocional (IE) ... é sermos como o "Violino" que você colocou.

Evandro Rosalen

Life Planner na Prudential do Brasil

3 a

Textualizando o mundo da música, para ser um grande musicista é imprescindível que além de muita dedicação aos estudos, o músico esteja com os ouvidos e o coração bem abertos pra que música posso penetrar no seu mais íntimo e reverberar aos ouvidos e corações de quem o ouve....é uma troca genuína de profundas experiências certo? Parabéns Felipe pelo texto e que vc continue reverberando lindas notas junto as pessoas de seu time. Abç

Parabéns meu caro, fico feliz no seu entusiasmo. A vida é assim, vivendo e aprendendo.

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