DESCOBERTA DE ACERVO MUSICAL POR AMIGO JORNALISTA ME FAZ PENSAR EM CLICHÊS E EM CONSTANTE DILEMA HUMANO SOBRE NOSSAS ESCOLHAS
Composição de imagens do arquivo do pai de meu amigo bem como chamada de capa e texto publicado na Folha Curitibana

DESCOBERTA DE ACERVO MUSICAL POR AMIGO JORNALISTA ME FAZ PENSAR EM CLICHÊS E EM CONSTANTE DILEMA HUMANO SOBRE NOSSAS ESCOLHAS

Tenho conversado com um amigo jornalista de longo data – que também foi músico, junto com seu pai, durante sua juventude – sobre um determinado momento em minha vida quando, ao pesquisar para meu trabalho de conclusão do curso de Jornalismo na UEPG, sobre a música paranaense, ouvi a pergunta de alguém “Por que ao invés de falar sobre essas figuras conhecidas você não aborda a difícil vida dos músicos profissionais, muitos desconhecidos, que tocam em festas, bares e afins para ganharem seu sustento?”. Na época minha resposta foi “Porque quero falar deles, já conhecidos...”. Hoje, 27 anos depois, estaria apto a esta empreitada muito mais prazerosa e que tem servido de assunto em inúmeras conversas com o dito colega que, no início deste mês de março, encontrou um acervo musical de seu pai, já falecido. O acervo o surpreendeu, disse-me. A mim, não – respondi – sempre soube que deveria haver algo semelhante. Mas a descoberta me fez meditar sobre a verdade dos clichês e sobre um constante dilema humano. Mais precisamente em frases a respeito das surpresas da vida e o sentimento de que poderíamos ter tomado uma decisão diferente no passado.

Ouso chamar de clichê – embora verdadeiras – frases tipo “a vida é uma caixinha de surpresa”. Sites como Pensador ou Frases do Bem estão repletos de citações dos mais diversos autores. E tudo é verdade. Dentre algumas uma me chamou a atenção, de Monica Crema: “A vida te dá surpresas e as surpresas te dão vida”. Bem isso.

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Mas vamos à história: ao voltar para Brasília – onde trabalha atualmente – meu amigo postou no Facebook “Horas antes da saída, visito o acervo de meu pai no anexo que, por muitos anos, serviu de audição e ensaios das bandas dele e das minhas. O registro fotográfico e de material impresso é vasto. Isso sem esquecer da discoteca que contempla inúmeros estilos. Ao abrir o armário com centenas de vinil, me deparo com Oscar Peterson e Jeff Back (este, um presente dele a mim na época do Rock in Rio 1985, quando o guitarrista se apresentou)”. A postagem vem acompanhada de algumas imagens, que republico aqui”. 

Durante uma passagem por esta Folha Curitibana, ocasião em que escreveu alguns textos sobre esta época de sua vida e as histórias contadas pelo pai, disse a ele que, certamente, haveria imagens que poderiam ilustrar os textos. Aliás, para o primeiro texto publicado, quando o apresentei como articulista, fiz uma imagem dele neste mesmo anexo de seu pai, perante uma estante repleta de vinis e outros materiais. Foi naquele momento que tive a certeza que há muito para ser explorado. A começar por uma ampla coleção de cartas de sua mãe enviadas a seu pai, que encontrei casualmente, fato sempre mencionado por ele, por sinal.

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Regressemos agora a 1988, Ponta Grossa, UEPG, curso de Jornalismo: ainda o tenho em minha mente como se fosse hoje. Aliás, tenho praticamente perfeitas lembranças de quase toda a turma. E também de quem eu era, obviamente. Os dias foram decorrendo e, em dado e único momento, esse amigo começou a caçoar de mim remedando a minha maneira de falar. Ao seu lado, rindo e concordando positivamente com seu desempenho um outro colega que viria a se tornar meu amigo, inseparável – aquela coisa tipo “três mosqueteiros”, que formaríamos com um terceiro.

Naquele momento, perante aquela cena, os últimos anos de minha vida se abriram como em um vídeo em um computador em minha frente. Anos e mais anos de bullying iniciados na quarta-série. Não! Na faculdade, não!! O basta foi me afastar dele, o que não exigiu muito, pois ele trancaria o curso e voltaria algum tempo depois. Quando retornou, já havia uma distância construída entre nós. 

Mas focalizemos no clichê “vida caixinha de surpresa”: nos encontramos, aqui e ali, pela vida a fora até que, quando vivia nos Estados Unidos, em 2000 e alguma coisa, recebo um e-mail dele. Reatamos contato. Enquanto que referente ao amigo que rira do remedo nessa época já estava um tanto quanto distante. Quando retornei ao Brasil, ao constatar que definitivamente não pertencíamos ao mesmo mundo, colaborei para que as circunstâncias da vida nos afastassem de uma vez por todas, algo que tem acontecido com muitos outros, gradativamente. São desaparecimentos de uma ou de outra parte. Abandono e também sou abandonado e, para salientar toda essa realidade, nosso mundo virtual facilita tudo: atenção e desatenção. 

Enfim, através das conversas com meu amigo jornalista ex-músico, iniciadas via e-mail, passando por telefonemas e, agora, WhatsApp, mencionei a tal pergunta a mim feita no início de 1992 – a respeito do trabalho de conclusão de curso – por que não falar da vida dos músicos profissionais, muitos desconhecidos, que tocam em festas, bares e afins para ganharem o sustento? The answer my friend is blowing in the wind, talvez esta seja a melhor resposta, roubada da letra de Bob Dylan: a resposta, meu amigo, está com o vento...

Meu amigo chegou a me dizer “se tivesse falado comigo!”. Sim, ele não se formou comigo, não poderíamos fazer o trabalho juntos, mas, certamente, seria de grande utilidade na pesquisa, na indicação de pessoas, no fornecimento de material; afinal, esta era sua vida, a vida de seu pai. Faziam parte do meio!! Mas, para tudo isso, eu também deveria ser outro, naquela época. Não posso me isentar de minha parcela de culpa, mesmo que a inexperiência talvez seja a maior das justificativas. 

Em sua postagem, publicamente, me convidou para ser curador de imagens de um livro que pretende escrever, acerca dos músicos “invisíveis” da noite curitibana. “Os músicos de baile, verdadeiros operários da arte”, escreveu ele. 

Talvez, agora, apesar de todos nossos afazeres de uma vida profissional e mil e uma responsabilidades pessoais, possamos, juntos, criar algo em cima de todo esse material e acervo. Sim – quem sabe – afinal, a vida é uma caixinha de surpresas. 

FOTOS: A partir do alto, músico pai de meu amigo (no teclado) com uma banda em Lages (SC); uma noite em que seu pai (último à direita) acompanhou Cauby Peixoto, em Curitiba; meu amigo (jovem, segundo a partir da esquerda) com colegas músicos; ele com o pai (penúltimo) em foto de 1991; acima, à esquerda, chamada de capa da Folha Curitibana sobre coluna assinada por ele e, abaixo, o primeiro texto, com foto perante o arquivo de seu pai.

Emildo Coutinho é jornalista, escritor, fotógrafo, professor de inglês e editor da Folha Curitibana. Com 26 anos de profissão, formou-se em 1992 pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG); atuou em diversos jornais e outros meios de comunicação de massa de Curitiba e no jornal norte-americano The Beltsville News, em Washington D.C., Estados Unidos, onde foi colunista. Atualmente é mestrando em Linguagens e Tecnlogia na Universidade Federal Tecnologica do Paraná (UTFPR), na linha de pesquisa Estéticas Contemporâneas, Modernidade e Tecnologia e formando em Letras Inglês-Português; emildocoutinho@gmail.com



Anhador e registrador de ventos , caro amigo ; prossiga pois ❗❗❗

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